domingo, março 18, 2012

''Curió'', o herói da ditadura - ELIO GASPARI

O GLOBO - 18/03/12
Sete procuradores tentaram processar o tenente-coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, o "Major Curió", pelo sequestro, há 40 anos, de cinco prisioneiros na região do Araguaia. Ex-oficial do Centro de Informações do Exército, ex-agente do SNI, ex-prefeito de Curionópolis (eleito pelo PMDB), e ex-deputado federal, ele é um dos personagens emblemáticos da anarquia da ditadura. Começou sua carreira em 1973, no extermínio da Guerrilha do Araguaia, iniciativa do PC do B que começou com a fuga do chefe político, e terminou com a fuga do chefe militar. Transformado em condestável da maior mina de ouro a céu aberto do mundo, em Serra Pelada, em 1984 liderou a maior revolta popular ocorrida na região. Mobilizando dezenas de milhares de garimpeiros, dobrou o governo federal.

Curió já foi comparado ao mítico Kurtz, personagem de "No Coração das Trevas", de Joseph Conrad, recriado por Francis Ford Coppola no Marlon Brando de "Apocalypse Now". Algum dia aparecerá alguém capaz de mostrar o Macunaíma que há nesse Kurtz tropical que virou nome de cidade. Ele começa participando de uma matança, torna-se monarca numa mina e, aos 78 anos, é um patriarca municipal e megalomaníaco.

Não se sabe se Curió participou das execuções de que é acusado, mas ele conhece como poucos a história do Araguaia. Atribuem-lhe dois valiosos vazamentos de informações sobre a ação do Exército. Curió tornou-se o mais conhecido entre os oficiais, mas nunca comandou a operação. Era detestado pelos militares, que viam nele um oportunista.

Curió poderia ser um precioso depoente. Os comandantes militares dizem que os documentos do Araguaia foram destruídos. Meia verdade. É possível saber quais foram os cabos, sargentos e oficiais mandados para lá. Basta requisitar a documentação das concessões de Medalhas do Pacificador entre 1973 e 1975.

Nem todos aqueles que as receberam estiveram no Araguaia, e muitos foram condecorados por relevantes serviços, mas todos os que lá estiveram as receberam. Nesses papéis estão registradas as épocas em que lá serviram. Quem chegou àquele fim de mundo depois de outubro de 1973 sabe que a ordem, vinda de Brasília, era de matar todo mundo. Executaram os prisioneiros, inclusive aqueles que acreditaram em folhetos que os convidavam à rendição. Foram cerca de 50 pessoas, na maioria jovens.

Curió pode ter executado prisioneiros, mas não foi o único a fazê-lo, e quem o fez estava cumprindo ordens. De quem? Dos ex-presidentes Emílio Médici e Ernesto Geisel, e dos ministros do Exército: Orlando Geisel, Dale Coutinho e Sílvio Frota. Por terem cumprido essa e outras ordens, Curió e os demais combatentes do Araguaia receberam a medalha.

''Bolsa-Malfeitor''

Em 2010, durante o Congresso de Auditores da Receita, apareceu uma proposta de criação de um fundo, custeado pelos servidores, para pagar os salários de colegas demitidos de seus cargos a bem da administração pública. (Cerca de R$ 12 mil mensais.) Rebarbada, a ideia ressurgiu sob o patrocínio da delegacia de Santos do Sindifisco.

Chamada aqui de "Bolsa-Malfeitor", a crítica aborreceu a diretoria daquela delegacia sindical, considerando-a um "deboche", com "informações incorretas e até mesmo maldosas". Os doutores divulgaram uma carta, buscando uma retratação, "sob o risco de o ''malfeitor'' ser justamente quem publica inverdades".

Jogo jogado. Na semana passada, o então presidente da delegacia sindical de Santos do Sindifisco, o auditor Clemente Feijó, outros quatro servidores do fisco e mais 15 pessoas foram presos pela Polícia Federal, a partir de uma investigação da Receita Federal, na operação Navio Fantasma. São acusados de levar mercadorias de luxo ao porto de Santos como se fossem peças de navio. Se a "Bolsa-Malfeitor" estivesse em vigor, os servidores não teriam com que se preocupar.

O trem-bala não existe, mas já tem conta

Quando o governo lista os investimentos do PAC, deveria fazer a caridade de excluir o trem-bala. Desde 2008 ele está na coluna de promessas, enganando a patuleia. Sua previsão de investimento subiu de 11 bilhões de dólares para 20 bilhões de dólares, e o trem circula apenas entre papeladas e leilões fracassados.

Por enquanto, o principal passageiro do trem-bala foi o embaixador Ruy Nogueira, secretário-geral do Itamaraty. Ele viajou de avião a Roma para apagar o incêndio do bloqueio dos depósitos do governo brasileiro, pedido pelo consórcio italiano Italplan, que vendeu um projeto delirante para a Valec do "Doutor Juquinha" e quer receber R$ 585 milhões.

Em fevereiro de 2009, como chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff foi à Itália para conhecer o projeto da Italplan. O trem não iria a Campinas, e faria o percurso Rio-São Paulo sem paradas intermediárias. Além disso, sua planilha de demanda era uma fantasia, glosada pelo Tribunal de Contas.

Craques

De um escorpião que vive na base de apoio do governo:

"Ideli Salvatti derrotou Romero Jucá e Cândido Vaccarezza. A seleção de Borat, do Casaquistão, goleou a do Uzbequistão".

Kadhafiduto

Se alguém puser a mão no caixa dois de doações políticas do ditador líbio Muammar Kadhafi, não será só o francês Nicolas Sarkozy quem terá perdido algumas horas de paz. Ele é acusado por Saif al-Islam, o filho querido do ditador, de ter sido beneficiado com um repasse de 65 milhões de dólares.

Em 2010, a diplomacia das empreiteiras amparou uma visita de Saif ao Brasil. Ele veio na qualidade de artista plástico e expôs quadros medonhos.

Missão Columbia

Chegam nesta semana ao Brasil o presidente da universidade de Columbia, Lee Bollinger, e o vice-reitor John Coatsworth.

Se os deuses ajudarem, algum dia a Columbia abrirá um escritório do Brasil. Coatsworth é um dos maiores historiadores da economia latino-americana. Além disso, enquanto esteve em Harvard, fundou o David Rockefeller Center para estudos da região.

Há poucos anos, como diretor da escola de assuntos internacionais, ele e Bollinger receberam para uma palestra o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad. Quando lhe perguntaram se acharia razoável convidar Hitler para uma conferência em 1936, deu uma reposta que deveria ser lembrada por todos aqueles que batalham pela liberdade acadêmica: "Se ele estivesse disposto a debater com os estudantes e professores de Columbia, é claro que eu o convidaria".

Bolsa-Consultoria

Um conhecedor do sindicalismo patronal e das mumunhas praticadas no Sistema S acredita que a Federação das Indústrias de Minas Gerais, quando presidida pelo doutor Robson Andrade, não tirou dinheiro dos seus cofres para pagar R$ 1 milhão em consultorias ao ex-prefeito e atual ministro Fernando Pimentel.

O dinheiro teria vindo de empresários e a federação fora uma simples repassadora. Nesse caso, a Fiemg teria funcionado como lavanderia, apagando o rastro político dos mimos.

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