terça-feira, fevereiro 07, 2012

Miséria do urbanismo - VLADIMIR SAFATLE

FOLHA DE SP - 07/02/12


Quem olha para o céu de São Paulo tem, muitas vezes, os olhos aprisionados por emaranhados de fios elétricos que mais parecem teias metálicas de aranha.

Eles fornecem a melhor metáfora involuntária das cidades brasileiras. Tudo se passa como se, nesses fios resultantes de uma gambiarra infinita, encontrássemos as marcas mais evidentes da lógica da precariedade urbana e da ausência de qualquer planejamento de longo prazo.

Mesmo em bairros nobres da capital paulista, eles estão lá para lembrar que a miséria que vive o urbanismo brasileiro é uma das poucas coisas que, aqui, desconhece divisão de classe social.

Podemos afirmar que, nesta incapacidade crônica da classe dirigente do Brasil de pensar como devem ser as suas cidades, encontra-se a verdadeira imagem do nosso desenvolvimento.

Em cinco anos, seremos a quinta maior economia do mundo, mas nossas cidades continuarão dignas de países africanos, como o Egito ou a Nigéria. Pois há muito o Estado brasileiro deixou de apelar aos urbanistas para que interviessem em nossas cidades.

A capital federal, Brasília, foi o ápice e o fim deste modelo de gestão pública. Hoje, o Estado prefere deixar esse trabalho para a especulação imobiliária.

Isto talvez explique por que, da mesma forma como a riqueza produzida pelo desenvolvimento nacional não circula, nossas cidades têm sua infra-estrutura viária bloqueada.

Para um país no qual as classes mais favorecidas preferem estar desconectadas, mais interessante do que aumentar a conectividade viária é isolar-se em paraísos artificiais sob a forma de condomínios fechados.

Há pouco, o ministro das Cidades caiu. O mais interessante foi notar como seu ministério, que deveria ser fundamental para a transformação do desenvolvimento em melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, era simplesmente irrelevante -sem capacidade propositiva, sem corpo gerencial técnico capaz de desenvolver estudos de médio e longo prazo que orientariam políticas públicas.

Em sua criação, ele representava uma ideia interessante. Tal ideia, infelizmente, perde-se em alguma negociação com "a base aliada".

Por fim, fica cada dia mais claro que a esperança de que eventos de grande porte -como a Copa- produzam um novo momento na reflexão urbana de nossas cidades é uma piada de mau gosto.

Os benefícios que tais eventos deixarão na infraestrutura das cidades são, mais uma vez, insuficientes e limitados, isto quando não serão simplesmente mais uma adaptação provisória.

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