quarta-feira, fevereiro 08, 2012

Me dá um dinheiro aí - CELSO MING


O Estado de S.Paulo - 08/02/12


Todos os dias um figurão da União Europeia se põe a pressionar algum governo de país emergente para que canalize uma fatia de suas reservas para refinanciar o cordão dos endividados da área do euro.

Há meses, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, vem pleiteando, tanto entre emergentes como entre almas boas disponíveis, um reforço de pelo menos US$ 500 bilhões no seu orçamento destinado a operações de socorro financeiro. E, também há meses, autoridades europeias têm pedido especial generosidade dos governos emergentes no âmbito do Grupo dos Vinte (G-2o).

Na semana passada, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, desembarcou em Pequim, onde igualmente pediu que o governo da China se dispusesse a contribuir para o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, na sigla em inglês) e para o Mecanismo Europeu de Estabilidade, que vai suceder-lhe.

E, ontem, em discurso pronunciado em Frankfurt, uma das autoridades do Banco Central Europeu, Benoit Coeuré, achou-se no dever de cobrar dos governos emergentes mais disposição para refinanciar países do euro. Para ele, as reservas externas dos emergentes (cerca de US$ 6,5 trilhões) são excessivas, ao menos como blindagem contra crises, e parte desse dinheiro parado deveria, segundo ele, ajudar a recuperação dos tesouros europeus.

Nessa cruzada, há pelo menos quatro equívocos. O primeiro deles é achar que as reservas externas dos emergentes sejam recursos parados. Eles não estão amontoados nos cofres-fortes dos bancos centrais. Foram emprestados a Tesouros nacionais, mais especialmente para o dos Estados Unidos. Nesse sentido, já atuam como instrumento de refinanciamento de um grande país endividado.

O segundo erro está em pedir empréstimos aos emergentes quando a maioria das economias da área do euro, em princípio, dispõe de recursos para isso e não quer adquirir diretamente os títulos emitidos pelos vizinhos endividados, nem fortalecer o EFSF nem canalizá-los para o FMI. Então, se nem eles próprios se interessam por cumprir a parte que lhes caberia, por que os emergentes teriam de fazê-lo no lugar deles.

O terceiro engano é pretender que essas operações dos emergentes sejam feitas sem contrapartida, apenas porque será uma honra irrecusável ajudar países em dificuldades na velha Europa. O governo brasileiro já se dispôs a canalizar parte das reservas para o FMI sob a condição de contar com mais peso decisório no seu corpo diretivo.

E, finalmente, não faz sentido cobrar engajamento financeiro dos emergentes se os dirigentes políticos do euro não se têm mostrado nem suficientemente rápidos nem suficientemente empenhados numa solução.

No mais, segue o afluxo de recursos internacionais para os emergentes, como ainda ontem mostrou o Financial Times, principal jornal de Economia e Finanças da Europa. E, mais ainda, vão afluir a partir de final do fevereiro, quando o BCE abrir novamente seus guichês para operações de crédito ilimitado de três anos para os bancos.

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