domingo, dezembro 18, 2011

Aparecendo demais - J. R. GUZZO - REVISTA VEJA


REVISTA VEJA

É pouco provável que exista no mundo algum outro país em que juízes, desembargadores, ministros de tribunais superiores e integrantes do Poder Judiciário em geral apareçam tanto na impressa como acontece hoje no Brasil. Bom sinal com certeza não é, sobretudo quando se considera o tipo de noticiário em que costumam aparecer. Ora é porque estão em greve, ou ameaçando entrar em greve , por aumento de salário. Ora é porque estão processando o governo, em açõpes que serão julgadas por colegas nas instâncias acima deles, para receber equiparações, compensações e outros benefícios em dinheiro. Vivem, através das suas associações de classe, publicando manifestos a favor de si próprios. Vão a resorts de luxo, com despesas pagas por gente de quem deveriam estar longe, e ficam revoltados quando a imprensa publica informações sobre isso.

Com frequência inquietante, e pelo país inteiro, saem notícias sobre magistrados investigados ou processados por ofensas ao Código Penal. Episódios de conduta incomparável com a função judicial tornam-se cada vez mais comuns.

Não causaram nenhuma estranheza, por exemplo, as informações, reforçadas por fotos, que a Folha de s.Paulo publicou há pouco sobre a campanha feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ari Pargendler, em favor de sua cunhada Suzana Camargo, candidata a uma vaga na corte presidida por ele. O mesmo aconteceu com a notícia, divulgada no começo de dezembro, revelando que dezessete desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo estão sendo investigados pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça sob a acusação de receber pagamento ilegais; há investigações, também, sobre magistrados paulistas suspeitos de ter patrimônio incompatível coom a sua renda. Brasília, então, é um capítulo à parte. Como descreveu recentemente uma reportagem de VEJA, juízes das mais altas instâncias do país vivem em estado de aberta promiscuidade com advogados dos grandes escritórios do Rio de Janeiro, de São Paulo e de lá mesmo, políticos envolvidos em processos de corrupção e grandes empresários enrolados com a Justiça - para não falar de réus com processos em andamento. Cruzam-se em festas de aniversário, casamentos, feijoadas, torneios de golfe. em vez de esconderem, advogados exibem em público sua amizade com magistrados, deixando correr a impressão de que podem ganhar qualquer causa; seus honorários não sofrem nada com isso.

Todo esse caldo vem sendo consideravelmente engrossado, de uns tempos para cá, pela ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal deJustiça e atual titular da Corregedoria Nacional de Justiça. Essa ministra tem um problema sério: acredita que deve cumprir, realmente, suas obrigações de corregedora, segundo determina a lei. Solicita investigações. Ouve denúncias. Tenta apurar delitos, violações éticas e outras malfeitorias atribuídas a autoridades judiciárias. É apenas o seu dever - mas por fazer o que manda a lei, a ministra Eliana está com índices de popularidade próximos a zero entre os seus colegas. Em nada a ajudam, é claro, sua inclinação a falar exatamente o que pensa e sua pouca paciência para adoçar o que falta. Recentemente, por exemplo, disse que o Judiciário sofre de "gravissímos problemas" causados pela "infiltração de bandidos escondidos atrás da toga", referindo-se ao fato notório de que a todo momento, e em todo o Brasil, vêm a público denúncias de corrupção entre juízes, desembargadores ou ministros dos tribunais superiores. O presidente do Supremo Tribunal Federal,Cezar Peluso, declarou-se "indignado" - não com os bandidos, mas com Eliana. Disse que suas palavras eram uma "ameaça à democracia", e assegurou que em quarenta anos de carreira nunca tinha visto "coisa tão grave".

O minisro poderia ter dito que em seus quarenta anos de carreira a situação do Judiciário brasileiro nunca foi tão calamitosa como hoje - e que, no caso, o que realmente ameaça a democracia é a impunidade para juízes criminosos. Mas é claro que não disse. Como acontece com tantos outros magistrados hoje em dia, ele acredita que seus deveres de solidariedade com a categoria vêm antes de seus deveres como juiz. É uma pena que esse apoio não se estenda aos milhares de juizes honestos que existem no Brasil - e que podem perder a vida por causa de sua integridade, como ocorreu com a juíza fluminense Patricia Acioli, assassinada com 21 tiros e em agosto último por aplicar a lei contra o crime organizado. Nenhum ministro do STF se deu ao incômodo de comparecer ao enterro.

"É uma pena que o apoio do ministro Peluso não se estenda aos milhares de juízes honestos do Brasil, e que podem perder a vida por causa de sua integridade"

A IMPUNIDADE ANUNCIADA - REVISTA VEJA


REVISTA VEJA

BEM DEVAGAR
Indicado por Lula, amigo da família do ex-presidente e próximo aos petistas, o ministro Ricardo Lewandowski está no centro de várias celeumas envolvendo o julgamento do mensalão. Na semana passada, o ministro Cezar Peluso mandou liberar cópias do processo para não atrasar ainda mais o desfecho do caso

Ministro diz que, como o julgamento dos mensaleiros só deve acontecer em 2013, muitos dos crimes podem prescrever. A afirmação preocupante criou um enorme mal-estar entre os colegas no Supremo Tribunal Federal


PAULO CELSO PEREIRA E LAURA DINIZ


Em fevereio de 2006, o desembargador Ricardo Lewandowski foi indicado pelo presidente Lula para ocupar uma cadeira na mais alta corte do país, o Supremo Tribunal Federal. Era o primeiro ministro nomeado pelo petista desde a descoberta, no ano anterior, do escândalo do mensalão, o maior esquema de corrupção da história do país. Ao ser entrevistado por emissários do Planalto e conversar com Lula antes da indicação, Lewandowski já tinha plena consciência de que teria, nos anos seguintes, a missão de julgar o processo que resultaria da revelação de que o governo do PT pagara mesada a parlamentares em troca de apoio político. O ministro não só conhecia essa realidade como era próximo a figuras de proa do partido. Formado na Faculade de Direito de São Bernardo do Campo, berço sindical do petismo, e professor com mestrado e doutorado na Universidade de São Paulo, ele conhecia a família Lula desde jovem. Sua mãe, por exemplo, era vizinha da ex-primeira-dama Marisa Letícia. Relações pessoais com poderosos não impedem ninguém de assumir cargos públicos de relevo. Para assentos no STF, são exigidos notório saber jurídico e reputação ilibada. Além desses dois requisitos constitucionais, espera-se de um ministro da suprema corte independência com relação ao presidente da República que o indicou. É nessa seara que a movimentação de Lewandowski tem causado apreensão.

Desde que foi empossado, sua atuação só chamou atenção quando foi portadora de maus presságios - para a opinião pública e as instituições - sobre o cado do mensalão. Na semana passada, essa situação chegou ao paroxismo. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, ele informou que só pretende concluir seu voto no processo em 2013 - o que prorrogaria ainda mais o desfecho do caso, cuja conclusão está prevista para o primeiro semestre de 2012. Por trás de uma questão meramente temporal há uma série de desdobramentos políticos, todos eles favoráveis ao PT e à camarilha que figura como ré no processo. O próprio Lewandowski admite que, com o adiamento, poderá haver prescrição de boa parte dos crimes imputados aos mensaleiros. Entre os quais, o de formação de quadrilha, acusação que pesa sobre os ombros do comissário José Dirceu, ex-chefe da Casa Civil.

Outro possível desdobramento tende a influir no mapa dos votos. No próximo ano, os ministros Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto terão de se aposentar. Os dois fazem parte de um grupo de cinco ministros apontados como defensores da condenação dos réus. Se Lewandowski consumar o adiamento para 2013, Britto e Peluso não participarão do julgamento. Darão Lugar a substitutos indicados pela presidente Dilma Rousseff. Se depender do PT, tais substitutos serão camaradas exemplares e, obviamente, pró-absolvição. Desde 2006, o partido conseguiu emplacar ministros com esse perfil mais amigável. Dilma manteve a toada com a recente nomeação de Rosa Maria Weber, uma juíza do Trabalho de carreira, com pouca intimidade com questões criminais. Ou seja: se o julgamento ocorrer após a aposentadoria de Britto e Peluso, o PT terá mais chance de conseguir formar uma maioria segura na corte que impeça a condenação de seus líderes. Assim, poderá evitar que o maior caso de corrupção da história do Brasil prejudique os projetos eleitorais do partido. Essa estratégia ardilosa, obviamente, não passa despercebida no plenário do Supremo.

Atento à movimentação, ministros do STF já reagiram. Lewandowski justificou a possibilidade de adiamento com um argumento sólido como as nuvens: só leria todos os volumes do processo depois de receber uma espécie de resumo do caso elaborado pelo relator do processo Joaquim Barbosa. No papel de revisor, Lewandowski teria de começar tudo do zero, como afirmou. Uma heresia jurídica devidamente rechaçada. Logo após a entrevista ter sido publicada, o presidente do STF, Cezar Peluso, enviou um ofício a Joaquim Barbosa pedindo que ele disponibilizasse imediatamente a íntegra do processo para todos os ministros, a fim de que eles já pudessem estudar o caso a fundo e, se quisessem, preparar os votos. A medida não era necessária. Há anos todos os autos do processo do mensalão estão disponíveis na internet para os advogados dos réus, os integrantes do Ministério Público e, obviamente, os ministros da corte. O ofício de Peluso era, na verdade, apenas um gesto para deixar claro o incômodo com a ameaça de adiamento. “Não vou deixar a presidência do Supremo sem colocar esse processo em pauta. Quero fazer isso em agosto, no máximo”, diz ele.

Ayres Britto, o outro ministro ameaçado de não participar do julgamento, também manifestou sua insatisfação. Questionado sobre a possibilidade de não julgar o mensalão, foi sucinto e irônico: “Não trabalho com essa hipótese. Quem sabe o ministro (Lewandowski) recebendo fisicamente o processo não facilite”. Lewandowski tem uma posição particularmente privilegiada para atravancar o processo. Ele exerce o papel de revisor da ação. Em ações penais, como a do mensalão, dois magistrados têm o dever de avaliar o processo antes dos demais: primeiro, o relator; depois , o revisor. Mas é o segundo que fica responsável por pedir que seja marcada a data do julgamento, depois de analisar o caso e preparar seu voto. Não existe legalmente um prazo para que ele cumpra essa tarefa, mas ministros ouvidos por VEJA estimam que três meses seriam suficientes para analisar o caso do mensalão. Na prática, tudo dependerá do embate entre a pressão do PT em favor do adiamento e a pressão de integrantes do Supremo e da sociedade em defesa do bom andamento das instituições. O próprio Dirceu já disse que acredita em sua absolvição no voto, por falta de provas, e não por prescrição. Portanto, que ocorra a votação em tempo hábil.

Chamado de “chefe de quadrilha” na denúncia do Ministério Público, Dirceu responde por formação de quadrilha e corrupção ativa. A prescrição de tais crimes, se comprovados, depende diretamente da pena aplicada. Como o processo se arrasta há anos, muitos réus só serão punidos se forem condenados a penas de longa duração. Trata-se de algo pouco provável. Como quase todos são primários e não têm antecedentes negativos, dificilmente receberão penas máximas. Isso se prevalecerem aspectos meramente técnicos. Ministros do STF afirmam, no entanto, que a ofensiva petista no processo pode ter um efeito contrário: aumentar a pressão política em defesa da adoção de penas mais severas justamente a fim de impedir a prescrição. “É muito cedo para saber se vai ocorrer a prescrição. Temos de aguardar a conclusão sobre a culpa e a fixação da pena”, diz o ministro Marco Aurélio Mello. “No entanto, é impensável majorar a pena para fugir da prescrição, bem como adiar o julgamento por causa das eleições municipais de 2012”.

Desde que foi oferecida a denúncia contra os réus, em 2006, Lewandowski protagonizou as principais celumas em torno do caso. As duas primeiras ocorreram durante a aceitação da denúncia, em 2007. A princípio, o ministro foi flagrado no dia do julgamento trocando mensagens de computador com a ministra Cármen Lúcia sobre os votos dos colegas. A revelação das mensagens provocou enorme mal-estar na corte. Dias depois, Lewandowski agravou ainda mais a situação ao afirmar que os ministros haviam votado “com a faca no pescoço” e que a tendência do Supremo seria “amaciar para o Dirceu”. Durante o julgamento que transformou os mensaleiros em réus, foi Lewandowski quem mais divergiu do relatório de Joaquim Barbosa, opondo-se inclusive ao enquadramento de José Dirceu e José Genoíno no crime de formação de quadrilha. Seu alinhamento com a pauta petista é um péssimo sinal para o vigor de uma instituição fundamental como o STF.

A QUADRILHA AGRADECE


Se as profecias jurídicas do ministro Ricardo Lewandowski se confirmarem, os principais personagens envolvidos no escândalo do mensalão podem comemorar: o crime compensou

José Dirceu
Formação de quadrilha e corrupção ativa
- Se Lewandowski estiver certo, o chefe da quadrilha poderá escapar da cadeia


Delúbio Soares
Formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro
- Se Lewandowski estiver certo, o caixa do mensalão poderá ser condenado no máximo, a dez anos de prisão

João Paulo Cunha

Lavagem de dinheiro, corrupção ativa e peculato
- Se Lewandowski estiver certo, o deputado, que pediu para a mulher sacar dinheiro do esquema na boca de um caixa, poderá responder apenas a uma das acusações – lavagem de dinheiro

Duda Mendonça
Lavagem de dinheiro e evasão de divisas
- Se Lewandowski estiver certo, o publicitário, que recebeu 10 milhões de reais do PT em contas secretas no exterior, poderá enfrentar apenas a acusação de lavagem de dinheiro

Marcos Valério
Corrupção ativa, lavagem de dinheiro, peculato e formação de quadrilha
- Se Lewandowski estiver certo, o operador do mensalão, assim como Delúbio, vai responder apenas por lavagem de dinheiro

José Genoíno

Corrupção ativa e formação de quadrilha
- Se Lewanadowski estiver certo, o então presidente do PT é mais um que poderá sair impune do processo do mensalão


A morosidade prejudica a Justiça
O Supremo Tribunal Federal pode ser muito célere – ou extremamente lento -, dependendo da vontade de seus ministros. O caso do processo envolvendo o peemedebista Jader Barbalho ilustra ambas as posturas. Desde março deste ano, quando a corte decidiu que a Lei da Ficha Limpa não valeria para as eleições do ano passado, vários políticos que receberam votos suficientes para se eleger, mas foram barrados pela lei, tomaram posse. Foi o caso dos senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e João Capiberibe (PSB-AP). Jader, dono da segunda maior votação para o Senado no Pará, ficou à espera de uma decisão dos ministros. Era dado como certo que a sentença lhe seria favorável, mas ela não tinha data para sair. Na semana passada, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, decidiu dar fim à questão. Depois de receber intensas pressões de líderes do PMDB, valeu-se de uma de suas prerrogativas como presidente para desempatar a votação e liberar a volta de Jader ao Parlamento.

Peluso usou o chamado “voto de qualidade”, um recurso previsto no regimento do tribunal que dá ao voto do presidente o peso de dois. Esse instrumento é aplicado em julgamentos que terminam empatados, realizados durante a vacância de um ministro. Desde agosto, quando Ellen Gracie saiu do STF, a corte funciona com dez integrantes. Sua substituta, Rosa Weber, só tomará posse no ano que vem. O curioso é que o próprio Peluso havia se recusado a recorrer ao poder do voto de qualidade no ano passado, durante o julgamento do ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz, um caso semelhante ao de Jader. Assim como o paraense, Roriz renunciou para fugir de um processo de cassação no Conselho de Ética do Senado. Quando se encerrou o julgamento, empatado, Peluso justificou a decisão de não atribuir ao seu voto um peso maior que o dos demais magistrados alegando “não ter vocação para déspota”. Ainda não foi definida a posse de Jader. Diz o jurista Dalmo Dallari: “Não cabia outra decisão. Condenável foi apenas a demora do tribunal em tomá-la”. Peluso demonstrou que, quando quer, o STF pode pronunciar-se com rapidez em questões essenciais. Espera-se que seja veloz para encaminhar o julgamento do mensalão.

Suspeita de fraude na Caixa pode causar perda de R$ 1 bi


FOLHA DE SP - 18/12/11

Pane em sistemas de informática ajudou corretora a lucrar negociando títulos. Fundos de pensão e outros investidores que compraram papéis pagaram preços acima do valor de mercado


natuza nery
DIMMI AMORA
DE BRASÍLIA
RUBENS VALENTE
ENVIADO ESPECIAL AO RIO




Segundo maior banco estatal do país, a Caixa Econômica Federal está no centro de uma série de transações financeiras suspeitas que podem gerar perdas de R$ 1 bilhão para os cofres públicos.

Graças a uma omissão misteriosa ocorrida na própria Caixa, uma corretora carioca chamada Tetto vendeu papéis da dívida pública de baixo ou nenhum valor por preços acima do mercado.

Entre os compradores, há empresas e pelo menos um fundo de pensão estatal.

No período em que foram realizadas as transações, de setembro de 2008 a agosto de 2009, o sistema de informática da Caixa responsável por informações relativas aos papéis ficou fora do ar.



O banco público classificou a pane como "erro", atribuindo-o a uma empresa de informática terceirizada.

Ou seja, foi como se um carro tivesse sido vendido sem que o vendedor informasse que ele tinha multas justamente no momento em que o sistema do Detran estava fora do ar.

O que sumiu do sistema correspondia a R$ 1 bilhão que deveria ser descontado do valor dos papéis (veja quadro nesta página).

Como os papéis eram garantidos por um fundo do governo, se todos os compradores forem à Justiça cobrar tudo o que gastaram, a União terá de arcar com o R$ 1 bilhão. Um dos compradores já se manifestou nesse sentido.

Diante do episódio, o banco acionou a Polícia Federal e entrou com um processo na Justiça acusando a Tetto de vender "gato por lebre". A Folha teve acesso aos autos da ação judicial sigilosa.

Tanto um dos compradores -o fundo de previdência complementar Postalis, dos funcionários dos Correios- como o setor da Caixa responsável pela falha eram controlados, na época, por dirigentes indicados pelo PMDB.

O departamento onde ocorreu o problema é vinculado à vice-presidência de Loterias e Fundos de Governo, hoje no centro de uma disputa entre PT e PMDB, os dois partidos que controlam os principais postos no banco.

Na época em que essas transações foram feitas, o vice-presidente de Loterias e Fundos era o atual ministro Moreira Franco, chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência.

Seu substituto, Fábio Cleto, é apadrinhado do PMDB do Rio e tem a recondução ao Conselho Curador do FGTS ameaçada por pressão do PT.

MICO
O problema com os papéis não era desconhecido do mercado. Eles são originários de uma outra fraude cometida pela Tetto em 2004, que resultou em prejuízo de R$ 700 milhões ao Estado do Rio, segundo a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), xerife do mercado financeiro.

Em 2008, um mês após o apagão no sistema da Caixa, a corretora começou a negociar os papéis. No período de um ano, vendeu todos os seus contratos "micados", segundo narrou a Caixa na ação.

No mercado financeiro, esses papéis são classificados como de "altíssimo risco".

"Vou falar em tese: se, de fato, ficar provado que essa corretora tinha plena ciência das características [do papel] e, ainda assim, as omitiu do comprador obtendo lucro fácil em cima disso, em tese pode ter havido estelionato", afirmou o advogado Jair Jaloreto, especialista em crimes financeiros. "Em tese também, a corretora pode alegar em sua defesa que as compradoras sabiam do preço real".

A Caixa diz que outro fundo de pensão estatal controlado pelo PMDB participou das negociações, o Real Grandeza, dos empregados de Furnas. Mas o fundo diz que os papéis que comprou não têm relação com as fraudes.

Os bancos Bradesco, Santander e BRB e outros investidores também compraram papéis da Tetto na época em que os sistemas da Caixa ficaram fora do ar.

O Postalis pagou à vista pelos papéis comprados da Tetto, mas permitiu que a corretora os administrasse.

Ou seja, o fundo não tem os papéis registrados em seu nome e a Tetto pôde vender novamente os mesmos títulos para outros compradores, segundo o processo.

Em junho de 2011, quase três anos após a operação com a Tetto, o Postalis encaminhou ofício à Caixa onde afirma ter sido lesado pelo banco e pela própria Tetto. O banco abriu uma sindicância.

No período do apagão no sistema da Caixa, cerca de 12 mil créditos imobiliários foram negociados, quase 90% deles pela Tetto. 

Caixa diz que houve erro em seu sistema e investiga o caso
Corretora que vendeu os títulos no mercado atribui ao banco estatal os problemas com os papéis que negociou
DE BRASÍLIA

A Gestora de Recebíveis Tetto, que comercializou créditos imobiliários de baixo ou nenhum valor no mercado, atribuiu os problemas dos papéis à Caixa Econômica Federal. A empresa disse que obedece "às autoridades envolvidas, inclusive a Caixa e suas informações".

E complementa: "Se houvesse erro, não seríamos capazes de emitir os créditos. E nós não acreditamos que uma instituição idônea como a Caixa tenha cometido erros ao fornecer uma informação que nos levasse a esse tipo de situação".

A Caixa informou, por meio de sua assessoria, que instaurou sindicância para apurar o que chama de erro provocado pela empresa que presta serviços de informática. Também iniciou processo interno para punir os eventuais responsáveis.

O banco entende que os vendedores sabiam que os créditos eram problemáticos.

A instituição financeira disse que, pela legislação, "não vende nem participa" das negociações de contratos imobiliários e que a Tetto "comercializou diversos créditos por meio de instrumentos particulares, dos quais a Caixa não participa".

O Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, defendeu os investimentos feitos e afirma que estuda entrar com ação judicial contra a Caixa para "preservar o patrimônio dos seus participantes".

O fundo afirma que tinha conhecimento do processo da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) contra a corretora carioca Tetto antes da compra, mas informa que ele "não tem vinculação com o atual problema".

De acordo com nota da instituição, seu presidente Alexej Predtechesnky "se tornou presidente do Postalis por indicação técnica da bancada do PMDB no Senado Federal". Predtechesnky foi sócio do filho do senador Edison Lobão (PMDB-MA).

O ministro de Assuntos Estratégicos, Moreira Franco (PMDB), responsável pela área da Caixa na qual houve o apagão no sistema, disse que só soube do problema depois que saiu do banco.

"Meu cargo era de natureza decisória, e este problema não teria chegado a mim", disse Moreira Franco.

No processo, a Caixa também responsabiliza a corretora ASM, mas a Justiça considerou os indícios insuficientes. A ASM informou que pretende colaborar com a Caixa em suas apurações.

O BRB, um dos compradores dos títulos de baixo ou nenhum valor, informou que abriu um processo administrativo para investigar as compras de títulos. Santander, Bradesco e o fundo de investimento Aymoré não responderam.

O BNY Mellon informou que é administrador dos fundos que adquiriram os papéis da Tetto e, nessa posição, não é responsável por decidir quais investimentos são feitos. Esse papel, disse, cabe aos gestores do fundo.

A Vision, outra empresa apontada pela Caixa, informou que administra lotes que não tiveram problemas.

O Real Grandeza, apontado pela Caixa como comprador, afirmou que não adquiriu papéis com problemas e que fez um investimento num fundo da ASM em 2006 e os mantêm em sua carteira. 

Dono da Tetto é acusado de fraude no Rio de Janeiro
do enviado ao rio
de brasília

O médico e empresário Eugênio Pacelli Marques de Almeida Holanda, 48, dono da corretora Tetto, é alvo de investigação que levou à maior multa já aplicada pela Comissão de Valores Mobiliários.

A CVM cobrou de Holanda R$ 65,5 milhões em 2010. A decisão, contudo, está suspensa desde o ano passado por ordem judicial.

Ele foi acusado de irregularidades na cessão de créditos imobiliários do governo do Rio. Para a CVM, o governo foi levado a erro, pois os papéis valiam muito mais.

Um ano antes, Holanda recebeu a mais alta distinção da Câmara Municipal do Rio, a Medalha Pedro Ernesto, por sugestão da vereadora Nereide Pedregal (PDT).

A assessoria de Nereide informou que a indicação partiu de Kathia Kozlowski, ex-candidata a vice-prefeita do Rio na chapa do senador Marcelo Crivella (PR), em 2004, e "ex-assessora do governador" Anthony Garotinho.

Holanda não deu entrevista, falando apenas por meio da assessoria de imprensa da Tetto sobre o caso da Caixa.

Segundo o currículo entregue à Câmara, Holanda é médico formado pela Universidade Federal da Paraíba.

Ele enfrenta uma disputa pelo controle de R$ 207 milhões gerados pela venda de créditos imobiliários supostamente "micados".

Eduardo Saad, um ex-executivo da Merrill Lynch, banco de investimentos dos EUA, alega que foi enganado por Holanda, que é defendido por um dos mais bem remunerados advogados do Rio, Sérgio Bermudes. Ele diz na ação que a acusação contra Holanda é "pura invencionice".

O OVO DA SERPENTE - REVISTA VEJA


REVISTA VEJA

Em conversa gravada pela Polícia Federal, estelionatário fiz que a Lista de Furnas era a salvação do ex-presidente Lula no escândalo do mensalão

GUSTAVO RIBEIRO


Entre os meses de março e maio de 2006, o nível de turbulência política em Brasília atingiu o seu ponto mais crítico desde o impeachment do presidente Fernando Collor, em setembro de 1992. A Comissão Parlamentar de Inquérito que investigava o mensalão havia desbaratado a quadrilha de petistas que atuava no coração do governo, desviando dinheiro público para subornar poíticos e financiar as campanhas do partido. A crise ameaçava o mandato do então presidente Lula. Era preciso fazer algo e, conforme demonstrou uma reportagem de VEJA da semana passada, o PT contratou e pagou um estelionatário para fabricar a chamada Lista de Furnas - um documento falso que tentava envolver políticos da oposição com caixa dois eleitoral. Uma estratégia para nivelar por baixo a classe política e minimizar a gravidade do esquema de pagametno de propina montado pelo partido. A Lista de Furnas, descobre-se agora, tinha um objetivo bem mais ambicioso do que apenas confundir os incautos: ela foi produzida pelos petistas para tentar salvar o presidente Lula.

A confissão está registrada em um relatório da Polícia Federal anexado ao processo que corre em segredo de Justiça na 2a. vara Criminal Federal, do Rio de Janeiro. VEJA teve acesso ao conteúdo do documento. Durante o escândalo do mensalão, a PF monitorou por vários meses conversas telefônicas entre o estelionatário Nilton Monteiro, o autor da Lista de Furnas, e seus comparsas - deputado e assessores do PT. Os diálogos mostram o grupo combinando os detalhes da farsa ("Nós vamos acabar com eles tudinho"), colhendo as assinaturas que dariam "credibilidade" à trama ("Eu já estou aqui com o José Carlos Aleluia") e negociando pagamento de honorários, ora em dinheiro, ora em negócios com empresas estatais ligadas ao governo federal ("São aqueles negócios que eu pedi da Caixa e do Banco do Brasil para liberar pra mim..."). Na página 29 do relatório, os investigadores transcrevem o motivo do crime nas palavras do próprio criminoso: "O documento é a salvação de Lula".

Em uma confiência à sua mulher, captada pelos policiais, Nilton Monteiro diz que mostrou uma cópia da Lista de Furnas aos petistas, e "o pessoal ficou doido". O documento, nas palavras do falsário, era uma tábua de salvação para o presidente e os petistas envolvidos no mensalão. Ciente do trunfo que tinha em mãos, ele ainda comenta, como estelionatário profissional que é, que havia chegado a hora de acertar seu pagamento. As investigações policiais pararam aí, mas o que aconteceu depois é de conhecimento público. Nilton Monteiro apresentou a falsificação ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal, deu entrevistas, prestou depoimentos e desapareceu.Hoje, o falsário está preso em Belo Horizonte por achacar advogados e políticos, sempre usando documentos forjados. Ele responde a 55 processos, a maioria por estelionato. Desde outubro, data de sua prisão, ele teve três pedidos de liberdade negados pela Justiça.

Na semana passada, após as revelações de VEJA, o DEM e o PSDB entraram com um pedido de investigação do caso junto à Procuradoria-Geral da República. "Episódios como esse mostram que o PT insiste em usar a truculência - e afronta a democracia", afirmou o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia. Os financiadores também podem ser obrigados a responder pela trama. A oposição pediu que a Assembléia Legislativa mineira abra um processo de apuração por quebra de decoro parlamentar contra o petista Rogério Correia, que aparece nas gravações ajudando - e remunerando - o estelionatário Nilton Monteiro. Se politicamente os parlamentares envolvidos podem se enrolar, na esfera criminal existem previsões sombrias de que, assim como no mensalão, tudo termine em impunidade. A única investigação oficial que corre sobre o caso ainda não chegou a nenhuma conclusão, apesar de aberta há longos cinco anos, inclusive com um laudo confirmando a montagem dos documentos. E, pior, a Lista de Furnas nem é considerada um ponto nevrálgico do processo. "O foco é nas licitações de Furnas. A lista é apenas uma parte do caso", diz a procuradora da República Andrea Bayão. O plano petista ainda pode dar certo.

Os presos políticos na era bolivariana - MARC MARGOLIS


O Estado de S. Paulo - 18/12/11


O governo Evo Morales transforma ato lícito em corrupção e zelo administrativo em atentado contra povo e nação para pôr os inimigos na prisão.



Pergunte às autoridades bolivianas sobre os presos políticos e prepare-se para a resposta padrão: "No hay". Assim afirma o governo de Evo Morales, líder eleito e reeleito por maiorias expressivas, em eleições democráticas e abertas. Portanto, todos os detentos bolivianos são apenas presos comuns e ponto final.

Mas a democracia na era de Evo, franqueada ao "socialismo do século 21", do pacto bolivariano de Hugo Chávez, sempre foi um pouco diferente. Considere o caso do ex-presidente do Banco Central, Juan Antonio Morales.

Morales, que não tem parentesco com o presidente, está em regime de prisão domiciliar. Desde 7 de setembro, só sai de sua casa em La Paz com ordem expressa do juiz. Seu delito? Bem, aí o enredo se perde nas brumas dos Andes. Mas, em suas peculiares entrelinhas, surge o desenho mais fiel e preocupante da democracia disfuncional bolivariana. Primeiro, porém, uma nota biográfica.

Juan Antonio Morales presidiu o Banco Central da Bolívia de 1995 a 2006. Tornou-se não só decano dos banqueiros centrais da América Latina, senão um pilar de estabilidade e lisura em um país desacostumado a ambas. Em seus 11 anos à frente do BC, viu nove ministros da Fazenda da Bolívia.

Armínio Fraga o considera um profissional "muito respeitado". Entre os bolivianos, é tido como "o economista mais importante do país". Foi protagonista da estabilidade econômica da Bolívia, outrora país recordista em hiperinflação na América Latina.

Nos anos 80, paguei a diária de hotel com uma maleta de pesos e já vi camponeses no Chapare pesando tijolos de cédulas na balança, em vez de contá-los. Ao final do mandato de Juan Antonio no BC, a inflação boliviana caíra para 5% ao ano. Pelo conjunto da obra, em 2005, foi indicado banqueiro central do ano pela Emerging Markets, respeitada publicação que circula nas cúpulas do Banco Central e do Fundo Monetário Internacional.

Agora ao prontuário. Contra o ex-servidor Morales, não há até o momento nenhuma ação penal formal, apenas a vaga e danosa acusação de corrupção, pois teria embolsado um abono "ilegal" de 6,4 mil bolivianos (US$ 1 mil à época) por mês acima do salário base de 30 mil bolivianos (US$ 5 mil). De irregular, não tinha nada. Na inflacionária década de 90, o abono era a arma que o governo dispunha para manter seus melhores quadros, sempre tentados pelos salários da iniciativa privada. Mas, com a nova Lei Quiroga Santa Cruz, que passou em 2010 pelo rolo compressor de Evo, o abono legal virou sinônimo de ganância e Juan Antonio Morales, de corrupto.

Como os valores supostamente surrupiados são pífios, ultimamente a fiscalização de Evo também acrescentou outra acusação mais grave, desenterrando um caso há muito já solucionado. Foi o empréstimo do BC ao Citibank para o resgate do Banco Hipotecário boliviano. A operação foi um sucesso. O banco foi salvo e o empréstimo, de US$ 43 milhões, quitado, quatro anos antes do prazo. Mas, pelo retrovisor de Evo, foi trambique, um crime de "lesa-pátria".

Eis a alquimia invertida bolivariana. Transforma ato lícito em corrupção e zelo administrativo em atentado contra povo e nação. Como seriam crimes contra o Estado, jamais prescrevem, dando aos mandatários superpoderes de reinventar o passado e converter desafetos em criminosos. Tudo com o verniz da Justiça, instituição tocada ao sabor do Executivo.

Hoje, quatro ex-presidentes respondem a ações penais. Leopoldo Fernández, ex-governador de Pando, está há três anos na prisão, embora jamais tenha sido condenado a crime algum. Idem para o alto comando das Forças Armadas do ex-presidente Gonzalo Sánchez de Lozada.

Em comum com Juan Antonio Morales, eles cometeram dois erros imperdoáveis. Todos serviram governos anteriores ao de Evo e possuem ideias próprias, o suficiente para os transformarem em inimigos de Evo e, portanto, do Estado. Tudo em um país sem presos políticos.

Melhor não adoecer - JOÃO UBALDO RIBEIRO


O Estado de S.Paulo - 18/12/11


Acho que, como eu, pelo menos alguns de vocês às vezes resolvem, embora saibam que não dará certo, não ler mais jornais, nem querer saber de noticiários. É tanta desgraça acontecendo, tanta catástrofe, tanta monstruosidade, tanta gente sofrendo adversidades tão medonhas que ou desviamos os olhos e o pensamento, ou perdemos de vez a fé na humanidade e até mesmo qualquer esperança no futuro. Mas não adianta. Jornal e noticiário são vício e necessidade, no meu caso redobrados, porque me enfiaram numa redação de jornal aos dezessete anos e, de certa forma, jamais saí dela inteiramente.

Claro, não adianta fugir e, para poder escrever, tenho de saber o que está acontecendo. Ligo a televisão para pegar o jornal da manhã. Aparece uma senhora chorando. Precisa fazer uma biópsia com urgência, mas a seguradora à qual pagou pontualmente anos a fio abriu falência. Corte para um senhor de voz meio embargada, ar desalentado. Pagara seu plano com igual pontualidade, por mais de quinze anos. Em caso semelhante ao da senhora, o plano também falira e ele não sabia o que fazer, mesmo se o Estado garantisse a migração para outro plano, porque ele não tinha dinheiro para quitar as novas mensalidades. A reportagem informou ainda que, de 2010 para cá, cerca de oitenta planos faliram, deixando, imagino eu, milhões de pessoas na mesma situação.

Olhei para o semblante dele. Menos idade que eu, talvez, mas mais ou menos na mesma faixa. Deve estar aposentado, deve ter trabalhado a vida toda e agora se esforça por sobreviver com dignidade. Podia ser eu, podia ser a encantadora leitora ou o gentil leitor, Deus nos guarde. A velhice, antes mais ou menos tranquila, tanto quanto a velhice possa ser, vira subitamente um pesadelo. Todo dia nos aterrorizam com histórias e reportagens terríveis sobre os hospitais da rede pública, vemos gente empilhada em corredores infectos, centros de terapia semelhantes a pocilgas, agonizantes à míngua de socorro, mulheres parindo junto a ratos e baratas, tragédias familiares irreparáveis e quase tudo o que tenha descrito do inferno quem, como Dante, já lá desceu. O sujeito faz sacrifícios, priva-se de muita coisa, mas se assegura de que não terá que enfrentar essa assombração. E aí, de supetão, tudo desmorona, nada a fazer.

Sim, ele podia ser qualquer um de nós, o mundo dá muitas voltas. Podia ser eu mesmo, se bem que meu plano não faliu e seja bastante improvável que venha a falir. Fiz Bradesco e com certeza tenho muitos companheiros de plano entre vocês. Mas fiz nos bons tempos, hoje a situação é diferente, como sabem os companheiros. Lembro que, na época meio duro, condição desagradavelmente costumeira em minha sofrida categoria profissional, não pensei em economizar, ao contratar um plano para mim e minha pequena família. Procurei uma empresa de solidez inconteste, perguntei qual era o seu melhor plano, o camarada me disse, eu engoli em seco e assinei. Foi-me vendida a expectativa de sempre contar com atendimento médico conforme minha necessidade.

E até que não tinha queixa, a não ser dos aumentos nocauteantes que se sucedem em cascata, à medida que o segurado vai ficando mais velho. No mais, fui hospitalizado algumas vezes e tudo se deu como previsto e esperado. E, apesar, de geralmente eu pagar aos médicos fora do plano, já fui atendido por médicos credenciados, sem pagar. Mas agora as coisas estão mudando. Segundo eu soube, minha seguradora não quer mais saber de clientes individuais, só empresas e organizações. Deve ser isso, pois a impressão, admito que meramente subjetiva, embora acentuada, é que ela está fazendo o possível para os clientes individuais desistirem de tudo o que já pagaram, praticamente ao longo de toda a vida adulta. Exames de laboratório mais ou menos corriqueiros ainda são fáceis de conseguir, apesar das filas crescentes. Mas exames mais complicados são outra conversa. Cada dia é preciso esperar mais tempo por um agendamento, cada dia o número de hospitais ou clínicas renomados parece diminuir. E os reembolsos, tanto os feitos aos segurados quanto aos médicos, hospitais, laboratórios e clínicas, são ridículos. Um advogado amigo meu me disse que as seguradoras estão adotando, em certos casos, a velha tática de jogar o barro à parede, para ver se cola. O freguês vai se operar do fêmur, o seguro diz que não paga uma determinada prótese, só paga uma outra, considerada pelo médico inferior ou inaceitável. Aí o segurado entra em juízo e, me diz esse amigo, invariavelmente ganha e os planos sabem disso. Apenas, como primeira reação, negam o pedido. Se o prejudicado não tiver a ideia ou a cachimônia de procurar um advogado, a caixinha mais uma vez tilinta no plano de saúde. Como aconteceu comigo, aliás, numa operação de catarata. O Bradesco disse que não pagava a lente prescrita, mas somente outra, bem mais barata, que o médico não aceitava. Aí eu paguei o raio da lente, miséria pouca é bobagem e pouco dinheiro eu tenho muito.

Apesar de citar meu caso, não escrevi nada acima por interesse pessoal. Apenas achei o que me acontece mais ou menos típico, na chamada classe média e com a maioria dos leitores, daí interessar a quase todos. E, como não ia contar mentira nenhuma, disse logo o nome da seguradora. Não é campanha, nem nada, é a veiculação de uma queixa geral, não apenas dos bradesquistas. Os seguros de saúde não deviam nortear-se por padrões de conduta meramente empresariais, não deviam ter o lucro como objetivo em última análise exclusivo. Sua área não é a de um comércio qualquer, a saúde é um bem e um valor da mais alta relevância para a coletividade, uma questão de segurança nacional, como se dizia antigamente. Mas, infelizmente, a coletividade não tem lobby, só deputados mesmo - e eles estão ocupados em garantir seu feliz Natal e próspero ano-novo.

Bacanas em apuros - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 18/12/11

Dois jatinhos de bacanas (um deles um Falcon 900, brinquedo de uns US$ 30 milhões) foram apreendidos em Campinas. Seus donos foram acusados de usá-los como... “táxis aéreos piratas”.

Na verdade...

A acusação foi uma forma de a Receita Federal driblar dezenas de ricaços brasileiros que voam pelos céus do país, mas, para fugir dos impostos, registram seus aviões no exterior.

Obra de arte...

Por falar em jatinhos, outro dia, a Receita Federal apreendeu a bordo de um desses brinquedos, num aeroporto do Norte do país, um quadro de um artista estrangeiro cujo valor beira uns US$ 4 milhões. Ao contrário dos EUA, por exemplo, que estimulam a entrada de obras de arte lá, aqui a Receita penaliza o importador.

A volta de Dercy

A Globo Livros lança em 2012 uma edição revista e ampliada de “Dercy de cabo a rabo”, biografia de Dercy Gonçalves, de Maria Adelaide Amaral, lançada originalmente em 1994.

Blog do Orlandinho

Orlandinho, personagem de Daniel Torres na novela “Aquele beijo”, da TV Globo, vai lançar o blog Emergência Poética. Apaixonado por Belezinha (Bruna Marquezine), usará a internet para expressar seu amor. O blog, que é de verdade, está no ar desde sexta, e os telespectadores podem participar com sugestões de poemas. Miguel Falabella, autor da trama, pensa em usar os melhores na novela.

Transversal do tempo

Um registro do lendário show “Transversal do tempo”, de Elis Regina, foi recuperado pelo pesquisador Rodrigo Faour. A íntegra do áudio do espetáculo, de 1978, será lançada em CD, em 2012, quando a morte da cantora completa 30 anos.

O DOMINGO Éde Giovanna Ewbank, a linda atriz paulista de 25 anos, que, para a saudade dos fãs, está fora da telinha desde “Escrito nas estrelas”, novela de 2010, na TV Globo. Mas a bela volta dia 2 de janeiro na minissérie “Acampamento de férias III — O mistério da Ilha do Corsário”, estrelada por Renato Aragão. Na trama, será Helena, monitora do acampamento, que viverá um romance com Mateus (Bruno Udovic). O programa, do núcleo de Jayme Monjardim, será dirigido por Marcus Figueiredo. Vai ao ar de 2 a 6 de janeiro

‘Big Brother’ no TST
A 5a- Turma do TST considerou “lícita” filmagem feita pela Águas Amazonas S.A., fora do local de trabalho, para mostrar que um empregado não estava incapacitado para o serviço, como alegara ao pedir licença. O rapaz, acidentado em 2005, ficou fora até 2008. Depois, apesar de já considerado apto, continuou sem trabalhar e acabou demitido por justa causa.

Em seguida...

O homem entrou na Justiça, alegando “violação de direitos”. Aí, a empresa, para “comprovar a justa causa”, passou a filmá-lo até em frente de casa.

Só que...

O empregado descobriu a bisbilhotice e pediu indenização de R$ 100 mil. Não levou. Segundo o TST, a empresa “não teve a intenção de prejudicar o trabalhador nem de atentar contra sua honra ou imagem”. É. Pode ser.

O arquivo de Prestes
Dona Maria Prestes, 81 anos, viúva de Luís Carlos Prestes (1898-1990), vai doar ao Arquivo Nacional o acervo que guarda do marido. É composto por documentos e escritos — sobretudo do período 1970-1990 — e será entregue em cerimônia, no Rio, dia 3 de janeiro, quando o velho Prestes faria 114 anos.

Segue...

Os documentos vão se juntar a cópias de três manuscritos doados ao Arquivo Nacional, em 2010, cujos originais estão no Arquivo do Estado Russo de História Política e Social, em Moscou.

Ellen na Lagoa

Ellen Gracie, a ex-presidente do STF, é a mais nova praticante de remo na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio. Todo dia, chega às 6h da manhã para treinar no Flamengo. Segundo seu treinador, está em forma. Não é fofa?

Pegou em Israel

Acredite. Chegou a Israel o sucesso da música “Ai, se eu te pego”, do brasileiro Michel Teló. Uma versão em hebraico feita por brasileiros, rebatizada como “Kacha teargi oti”, já teve mais de cinco mil exibições no YouTube. Confira só em http://bit.ly/svF4Iv.

Papai Noel gay

O sucesso de vendas neste Natal na Saara, shopping popular a céu aberto no Rio, são umas fantasias, digamos, saidinhas de um Papai Noel... gay. Acredite. A roupa do Bom Velhinho alegre é cor-de-rosa pink, com sunga fio dental.

O Cristo e a Copa de 14
O projeto do monumento esculpido em concreto do Cristo Redentor, que em outubro passado completou 80 anos, era, originalmente, assim. Repare na foto. Como se vê, a mão direita segurava uma cruz, e a esquerda sustentava uma esfera que representava o globo terrestre. 

Quando o desenho foi exposto numa vitrine na Avenida Rio Branco, no Centro do Rio, então capital do país do futebol, ganhou do carioca o apelido de... “Cristo da Bola”. A gaiatice, lembra Jorge Scévola de Semenovitch, autor do livro “Corcovado — A conquista da montanha de Deus”, chegou aos ouvidos do então cardeal Dom Sebastião Leme, que, por isso, pediu um novo projeto. Vêm daí os braços abertos que tanto sucesso fazem e a todos nós abençoam.

O Isordil e a Copa de 14
Em janeiro agora, o coleguinha Paulo Henrique de Noronha lança pela Monte Castelo Ideias o livro “É disso que o povo gosta”, sobre João Nogueira. 

A obra fala da paixão do genial sambista pelo Flamengo. É dele aquela adaptação para os versos de “Samba rubronegro”, de Wilson Batista, que virou um dos hinos do clube: “Flamengo joga amanhã, eu vou pra lá/Vai haver mais um baile no Maracanã/O mais querido tem Zico, Adílio e Adão/Eu já rezei pra São Jorge/ Pro Mengo ser campeão.”

Diogo Nogueira, que herdou o gosto do pai pela música, conta que João, quando ia ao Maracanã, levava Isordil, vaso-dilatador, pois tinha medo de enfartar.

— Uma vez, um cara teve um enfarte no Maracanã, do nosso lado. Meu pai enfiou um Isordil embaixo da língua do sujeito e fechou a boca dele até o bombeiro chegar. E ficava acalmando o cara: “Guenta aí, meu compadre, que tu vai ficar bom.” Depois, os bombeiros disseram: “Tu salvou a vida do cara!” — conta Diogo no livro.

No mais...
Faltam 907 dias para a Copa.

Colapso de um sistema - CELSO MING


O Estado de S. Paulo - 18/12/11


O presidente da França, Nicolas Sarkozy, vem insistindo num ponto de vista que precisa de mais atenção.

Ele tem dito que a crise do euro reflete problema bem mais profundo: o fracasso das políticas de bem-estar social adotadas depois da 2.ª Grande Guerra por grande parte da Europa.

Antes de mais nada, é preciso dar o devido desconto para afirmações do gênero feitas por Sarkozy. É um político conservador que, hoje, tem todo interesse de bater nos princípios defendidas pelos social-democratas - adversários nas eleições de 2012. Essas doutrinas enfatizam políticas de bem-estar social: serviços básicos universais de educação, saúde e previdência; amplo seguro-desemprego; menos horas de jornada de trabalho e mais lazer; subsídios para obtenção de casa própria e tudo o mais. Mas não dá para descartar sumariamente o diagnóstico de Sarkozy.

Enquanto puderam desfrutar das vantagens proporcionadas pelas políticas neocolonialistas, potências europeias levaram adiante esses luxos da sociedade moderna. Mas isso mudou. O que foi durante pelo menos 60 anos prometido, não pode ser mais entregue à população. Essa quebra do sonho se deu porque uma revolução está em curso. E ela tem a ver com a redistribuição internacional do trabalho.

Os números variam conforme a aferição, mas não está errado dizer que, a cada ano, nada menos que 30 milhões de chineses são incorporados ao mercado de trabalho e ao sistema de consumo - em toda Ásia, mais de 40 milhões.

O impacto sobre o emprego nos Estados Unidos e na Europa é enorme. Cada par de meias exportado pela China ou pela Tailândia corresponde a empregos que se abrem na Ásia e se fecham pelo mundo. Grandes multinacionais que ainda não operam a todo vapor na China têm esses planos e, assim, vão instalando na Ásia unidades de produção que, anteriormente, seriam abertas nos países de origem.

Há dois dias, o filósofo Zygmund Bauman chamava a atenção na Espanha para um número desolador: na Europa, 51% dos jovens com formação universitária não conseguem trabalho para o qual estão qualificados. Há alguns anos, acreditava-se que bastava mais educação e mais treinamento para garantir boa ocupação. Hoje, não é mais suficiente colecionar diplomas e certificados de conclusão de curso.

Isso significa que o desemprego nos países ricos (não só na Europa) não cresceu apenas por causa da crise e da retração da atividade econômica. Simplificando, aumentou porque o chinês está sendo incluído no mercado internacional de trabalho.

Como produzem e exportam menos, países ricos também geram menos renda e arrecadação. E, no entanto, têm de enfrentar despesas muito maiores com seguro-desemprego, saúde pública, aposentadorias precoces e capitalização de bancos. Ou seja, nas atuais condições do mercado internacional do trabalho, o sistema de bem-estar social, tal como tem funcionado, já não dá conta do financiamento da crescente despesa pública.

É provável que, à medida que se aprofundar a crise, se consolide também a ideia de que já não será possível manter propostas social-democratas. A que preço e em que condições essas rupturas serão superadas são enormes incógnitas para quem se aventura a desvendar os novos tempos e modelos de produção e de política que tomarão o lugar dos hoje fornecidos.

Reflexos da crise - MIRIAM LEITÃO


O Globo - 18/12/11


A crise dos Estados Unidos e países da Europa é tratada sempre pelo ponto mais agudo: o risco de colapso financeiro de bancos e países. Mas na esteira do roldão que arrasta a saúde fiscal dos governos e mina a confiança nos bancos, pessoas e famílias vivem dramas devastadores. O relatório que Michelle Bachelet entregou à presidente Dilma registra números inquietantes.

Ambientes de crises criam uma dinâmica que tornam mais agudos velhos problemas. O mundo tem absurdos inaceitáveis. Sempre foi assim, mas nas crises tudo se agrava. O relatório diz que o PIB global em 2010 foi dez vezes superior ao de 1950, um aumento per capita de 260%. O mundo melhorou, milhões foram incluídos nos frutos do progresso. Qualquer análise dos indicadores mostrará isso, mas com um salto dessa proporção as perversidades deveriam ser menores.

Uma mulher morre por minuto no mundo por complicações de gravidez ou parto. A morte materna cai apenas 2% ao ano desde 1990. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, 5,1 bilhões de pessoas, 75% da população mundial, não estão cobertos por sistema adequado de seguro social. A FAO, agência das Nações Unidas para o alimento, diz que quase um bilhão sofrem de fome crônica. Os macronúmeros desanimam, mas em períodos de maior reflexão, como o fim de ano, ajudam a lembrar em que mundo estamos.

O relatório da ONU tem como enfoque o "Piso de Proteção Social", espécie de carteira de benefícios mínimos que os países precisam garantir aos cidadãos. Bachelet me disse que gosta muito das iniciativas brasileiras como Bolsa Família e Brasil sem Miséria, que são parecidas com outras redes de proteção social aplicadas em outros países. Mas isso não basta. Um dos objetivos é o de saneamento básico para todos. O Brasil tem números catastróficos nessa área, e a última Pnad mostrou queda da cobertura. Um espanto.

Os programas para garantir o mínimo à população não custam caro. Uma parcela irrisória, se comparados aos custos dos exorbitantes resgates financeiros. Estudos da OIT e FMI mostram que programas sociais em países pobres como Benim, El Salvador, Moçambique e Vietnã para dar um piso aos mais pobres custariam de 1% a 2% do PIB. Na África do Sul foi dado benefício à criança em situação de risco que protege 7,5 milhões de crianças e custa 1% do PIB. A China tem o programa de inclusão mais rápido da história. Entre 2003 e 2008 aumentou a cobertura de saúde básica de 15% para 85% da população e em dezembro de 2009 lançou um programa piloto de previdência rural que quer cobrir 700 milhões de chineses que vivem na área rural. Na Índia foi lançado o seguro-desemprego Mahatma Ghandi para o trabalhador rural que dá 100 dias de seguro por ano.

Não estou dizendo que se pode deixar bancos quebrarem em cadeia, criando risco sistêmico. Isso provocaria um colapso social. Não é uma escolha entre resgatar bancos ou pessoas. É mais sofisticado que isso. O resgate das instituições tem que ser feito não para manter a riqueza de acionistas, os bônus dos executivos - como vimos recentemente - mas para manter a economia funcionando.

O ponto do relatório é que apesar da extraordinária riqueza das últimas décadas, da pujança econômica, o mundo vive tragédias inaceitáveis. E que neste momento em que a crise econômica ronda países ricos, e a globalização faz com que todos estejam no mesmo barco, os riscos de problemas sociais aumentam. "O impacto de choques, tais como uma crise econômica, é absorvido e assimilado por mecanismos de enfrentamento das famílias e pode ter consequências duradouras no desenvolvimento humano, mesmo que as privações tenham sido de duração relativamente curta."

A Europa há muito tempo tem rede de proteção social bem montada e em alguns casos até extravagante com benefícios caros e concedidos à classe média. Mesmo assim, há população exposta, diz o relatório: "Cerca de 80 milhões de pessoas na UE vivem em risco de pobreza, e 25% são crianças."

A Europa terá que manter seus governos solventes, bancos saudáveis, cortar gastos sociais para fazer o ajuste necessário e ampliar a rede social para os mais pobres. Tudo ao mesmo tempo. Há quem defenda que o governo apenas amplie o gasto social, ou ache que os ajustes fiscais são perversos e impostos pelo mercado. A confusão aqui é que a Itália, por exemplo, já tem alta carga tributária e dívida de 120% do PIB. Se o país ampliasse o gasto, em vez de propor um ajuste, como faz o governo Mario Monti, os poupadores teriam que ser convencidos de que é seguro continuar financiando o endividamento crescente do país. Isso é que torna a receita mais complexa. É preciso fazer o ajuste e escolher melhor o destinatário do dinheiro público.

O desemprego está alto e o risco é que aumente se a crise se agravar. E dos 212 milhões de desempregados do mundo em 2009 apenas 33 milhões tinham seguro-desemprego. No Brasil, é bom lembrar que mais de 40% dos trabalhadores não têm direito ao seguro-desemprego porque estão no mercado informal. Tanto no Brasil quanto no mundo a proteção social aumentou na última década. Mas é ainda insuficiente. E se a crise não for debelada, a conta será paga pelos mais frágeis.

A ficção do Amaury - MERVAL PEREIRA


O Globo - 18/12/11


O livro "Privataria tucana", da Geração Editorial, de autoria de Amaury Ribeiro Jr, é um sucesso de propaganda política do chamado marketing viral, utilizando-se dos novos meios de comunicação e dos blogueiros chapa-branca para criar um clima de mistério em torno de suas denúncias supostamente bombásticas, baseadas em "documentos, muitos documentos", como definiu um desses blogueiros em uma entrevista com o autor do livro.

Disseminou-se a idéia de que a chamada "imprensa tradicional" não deu destaque ao livro, ao contrário do mundo da internet, para proteger o ex-candidato tucano à presidência José Serra, que é o centro das denúncias.

Estariam os "jornalões" usando dois pesos e duas medidas em relação a Amaury Jr, pois enquanto acatam denúncias de bandidos contra o governo petista, alegam que ele está sendo processado e, portanto, não teria credibilidade?

É justamente o contrário. A chamada "grande imprensa", por ter mais responsabilidade que os blogueiros ditos independentes, mas que, na maioria, são sustentados pela verba oficial e fazem propaganda política, demorou mais a entrar no assunto, ou simplesmente não entrará, por que precisava analisar com tranqüilidade o livro para verificar se ele realmente acrescenta dados novos às denúncias sobre as privatizações, e se tem provas.

Outros livros, como "O Chefe, de Ivo Patarra, com acusações gravíssimas contra o governo de Lula, também não tiveram repercussão na "grande imprensa" e, por motivos óbvios, foram ignorados pela blogosfera chapa-branca.

Desde que Pedro Collor denunciou as falcatruas de seu irmão presidente, há um padrão no comportamento da "grande imprensa": as denúncias dos que participaram das falcatruas, sejam elas quais forem, têm a credibilidade do relato por dentro do crime.

Deputado cassado e presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson desencadeou o escândalo do mensalão com o testemunho pessoal de quem esteve no centro das negociações, e transformou-se em um dos 38 réus do processo.

O ex-secretário de governo Durval Barbosa detonou a maior crise política da história de Brasília, com denúncias e gravações que culminaram com a prisão do então governador José Roberto Arruda e vários políticos.

E por aí vai. Já Amaury Ribeiro Jr. foi indiciado pela Polícia Federal por quatro crimes: violação de sigilo fiscal, corrupção ativa, uso de documentos falsos e oferta de vantagem a testemunha, tendo participado, como membro da equipe de campanha da candidata do PT, de atos contra o adversário tucano.

O livro, portanto, continua sendo parte da sua atividade como propagandista da campanha petista, e evidentemente tem pouca credibilidade na origem.

Na sua versão no livro, Amaury jura que não havia intenção de fazer dossiês contra Serra, e que foi contratado "apenas" para descobrir vazamentos internos, e usou seus contatos policiais para a tarefa que, convenhamos, conforme descrita pelo próprio, não tem nada de jornalística.

Ele alega que a turma paulista de Rui Falcão (presidente do PT) e Palocci queria tirar os mineiros ligados a Fernando Pimentel da campanha, e acabou criando uma versão distorcida dos fatos.

No caso da quebra de sigilo de tucanos, na Receita de Mauá, Amaury diz que o despachante que o acusou de ter encomendado o serviço mentiu por pressão de policiais federais amigos de José Serra.

Enfim, Amaury Ribeiro Jr, tem que se explicar antes de denunciar outros, o que também enfraquece sua posição.

Ele e seus apoiadores ressaltam sempre que 1/3 do livro é composto de documentos, para dar apoio às denúncias. Mas se os documentos, como dizem, são todos oficiais e estão nos cartórios e juntas comerciais, imaginar que revelem crimes contra o patrimônio público é ingenuidade ou má-fé.

Que trapaceiro registra seus trambiques em cartórios?

Há, a começar pela escolha do título ? Privataria Tucana ? uma tomada de posição política do autor contra as privatizações.

E a maneira como descreve as transações financeiras mostra que Amaury Ribeiro Jr. se alinha aos que consideram que ter uma conta em paraíso fiscal é crime, especialmente se for no Caribe, e que a legislação de remessa de dinheiro para o exterior feita pelo Banco Central à época do governo Fernando Henrique favorece a lavagem de dinheiro e a evasão de divisas.

É um ponto de vista como outro qualquer, e ele tenta por todas as maneiras mostrar isso, sem, no entanto, conseguir montar um quadro factual que comprove suas certezas.

Vários personagens, a maioria ligada a Serra, abrem e fecham empresas em paraísos fiscais, com o objetivo, segundo ilações do autor, de lavar dinheiro proveniente das privatizações e internalizá-lo legalmente no País.

Acontece que passados 17 anos do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, e estando o PT no poder há 9 anos, não houve um movimento para rever as privatizações.

E os julgamentos de processos contra os dirigentes da época das privatizações não dão sustentação às críticas e às acusações de "improbidade administrativa" na privatização da Telebrás.

A decisão nº 765/99 do Plenário do Tribunal de Contas da União concluiu que, além de não haver qualquer irregularidade no processo, os responsáveis "não visavam favorecer em particular o consórcio composto pelo Banco Opportunity e pela Itália Telecom, mas favorecer a competitividade do leilão da Tele Norte Leste S/A, objetivando um melhor resultado para o erário na desestatização dessa empresa".

Também o Ministério Público de Brasília foi derrotado e, no recurso, o Tribunal Regional Federal do Distrito Federal decidiu, através do juiz Tourinho Neto, não apenas acatar a decisão do TCU mas afirmar que "não restaram provadas as nulidades levantadas no processo licitatório de privatização do Sistema Telebrás. Da mesma forma, não está demonstrada a má-fé, premissa do ato ilegal e ímprobo, para impor-se uma condenação aos réus. Também não se vislumbrou ofensa aos princípios constitucionais da Administração Pública para configurar a improbidade administrativa.".

O livro de Amaury Ribeiro Jr. está sem sexto lugar na lista dos mais vendidos de "não-ficção". Talvez tivesse mais sucesso ainda se estivesse na lista de "ficção"

O poder supremo de Brasília - SUELY CALDAS,

O ESTADÃO - 18/12/11
Às vezes Brasília é tomada por uma atmosfera divorciada do resto do País. Como uma Nação dividida entre uma privilegiada e minúscula minoria com poder de fazer, executar e julgar as leis em benefício próprio e a grande massa de brasileiros que sustenta esse poder pagando impostos, é obediente às leis e regras comuns a todos e que depende unicamente do esforço de seu trabalho para sobreviver. Nos últimos dias esse ar de superioridade suprema entrou em ação em Brasília e, quando isso acontece, os privilegiados espalham frustração e sensação de impotência para a grande massa dos sem privilégios.

Cena n.º 1: na terça-feira uma comitiva de pesos pesados do PMDB saiu do Congresso e atravessou a rua em direção ao Supremo Tribunal Federal, onde já os aguardava o presidente da Corte, ministro Cezar Peluso. O presidente do Senado, José Sarney, não estava no grupo, mas foi quem articulou o encontro e esperava ansioso pelo seu desfecho. O resultado da conversa foi um sucesso, tal a rapidez com que o ministro Peluso anulou os efeitos da Lei da Ficha Limpa para Jader Barbalho assumir o mandato de senador. Amigos de longa data, Barbalho foi ministro da Reforma Agrária quando Sarney foi presidente. Deixou o governo acusado de superfaturar a venda de suas próprias terras no Pará para a reforma agrária. Depois disso se envolveu com outras irregularidades e acabou barrado pela Lei da Ficha Limpa. Com sua decisão, o ministro Peluso frustrou milhões de brasileiros que, saturados por denúncias de corrupção dos políticos, se mobilizaram e pressionaram o Congresso a aprovar a lei, que impediria corruptos de tomar posse e seguir repetindo seus atos ilícitos e impunes.

Cena n.º 2: sorridente e feliz, a cúpula do PMDB cruzou rapidamente a rua de volta. Tinha pressa em reiniciar no Congresso o lobby pela aprovação do reajuste salarial do Judiciário. Afinal, tiveram seu pedido a favor de Barbalho tão prontamente atendido pelo presidente da mais alta Corte... Era preciso retribuir. Dilma Rousseff poderia até resistir, mas o PMDB contava com a pressa da presidente em aprovar o Orçamento - e com ele o reajuste salarial - antes da virada do ano. Um rolo compressor de votação no Congresso poderia funcionar, mesmo que o aumento pretendido pelo Judiciário saísse um pouco menor.

Cena n.º 3: na quarta-feira o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), decidiu adiar para fevereiro a votação do projeto que cria o fundo de previdência complementar para funcionários públicos da União que ingressarem na profissão após a promulgação da lei. Em tempos de crise financeira na Europa, seria importante romper o ano dando ao mercado, ao menos, este sinal de disposição de resolver no futuro o crônico e progressivo déficit na previdência pública, que somará este ano a espantosa cifra de R$ 57 bilhões. Mas os senhores deputados argumentaram que a votação entraria na madrugada, atrapalhando as festas natalinas de muitos deles. Afinal, o poder de Brasília lhes confere também o privilégio de antecipar o Natal e o recesso parlamentar. Tal projeto tramita no Congresso desde 2007. São Paulo saiu na frente e, na terça-feira, aprovou em tempo recorde (menos de quatro meses de tramitação) o fundo de previdência para seus funcionários com as mesmas regras do projeto federal.

Sempre que lhes convém, Legislativo e Judiciário proclamam o princípio de independência entre os Três Poderes para arrancar do Executivo algum tipo de favorecimento. É o argumento que usam quando querem aumentar seus próprios salários, não importa se ganham muito acima da média dos trabalhadores brasileiros: Brasília tem a maior renda per capita do País (R$ 4.635,00), quase o dobro de São Paulo (R$ 2.853,00), o segundo colocado.

Quando o Legislativo, escancaradamente, atravessa a rua e intercede no Judiciário em favor de um político de ficha suja não é interferência entre os Poderes. É simplesmente o exercício do poder supremo e superior que eles encarnam quando se trata de defender seus próprios interesses. E não importa o que pensa o resto da população. Onde fica a ética? Ora, às favas a ética!

Um ano sem CPI - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 18/12/11

Desde que assumiu a presidência da Câmara, o deputado Marco Maia (PT-RS) não autorizou a criação de qualquer CPI. Hoje há sete pedidos na fila. A CPI da Privatização, proposta pelo deputado Delegado Protógenes (PCdoB-SP), deve ter o mesmo destino: a gaveta. A cúpula petista está sugerindo a Maia que dê prioridade às pedidas anteriormente, como a da Exploração Sexual de Adolescentes e a da Exploração do Trabalho Escravo. Só podem funcionar cinco CPIs ao mesmo tempo.

Estaca zero

Os ruralistas querem derrubar o texto do Código Florestal aprovado pelo Senado e restaurar a proposta da Câmara. “O texto do Senado é extremamente benevolente com o setor urbano e inviável para o setor rural”, afirmou o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO). Para ele, o projeto costurado pelo senador Jorge Viana (PTAC) é irreal. “O senador Jorge Viana é o que a gente chama de cirurgião de cartolina. Na cartolina, você opera e não sangra”, disse Caiado. Já Viana diz que o pior dos mundos é o texto virar um “Frankenstein”. “Aí a presidente vai ter que entrar”, disse o senador, referindo-se a eventual veto da presidente Dilma.

Quem sabe em março não estou participando de comício?”
 — ex-presidente Lula, para o ministro Garibaldi Alves (Previdência), que foi visitá-lo no hospital

CONTERRÂNEOS. O cantor e compositor Raimundo Fagner (na foto) passou horas quinta-feira defendendo a aprovação da PEC da Música, do deputado Otavio Leite (PSDB-RJ), para o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). Durante o dia conversaram no Senado, e, à noite, Fagner fez um show em jantar na casa do senador. Eunício se comprometeu a acelerar a votação, que na Câmara demorou três anos e meio para ocorrer.

Dinheiro pelo ralo
Chamou a atenção de parlamentares o caro cartão de Natal enviado pelo Ecad. A entidade enfrenta CPI no Senado, que investiga denúncias de irregularidades na distribuição de direitos autorais. O governo quer supervisionar o Ecad.

Reforma
Sem consenso no partido, o PDT vai enviar uma lista para a presidente Dilma com sugestões para o Ministério do Trabalho: deputados Brizola Neto (RJ), Vieira da Cunha (RS), André Figueiredo (CE) e senador Acir Gurgacz (RO).

O salário-mínimo e a crise internacional
Apesar dos reiterados sinais de que a crise está chegando, o governo Dilma continua apostando que seus efeitos serão mitigados. Os líderes do PT avaliam que o aumento do salário-mínimo injetará no mercado, em janeiro, R$ 60 bilhões, e que isso contribuirá para dinamizar a economia. Por isso, eles se renderam aos argumentos do governo, de que não dá para conceder aumento para o Judiciário, pois ele iria desencadear um processo grevista incontrolável no serviço público.

Mais um
Enquanto PT e PSDB disputam o apoio do PDT em São Paulo, o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), diz que vai concorrer à prefeitura. “Por que vou apoiar alguém que tem menos voto do que eu?”, diz ele.

Contra-ataque
A pedido de vários partidos, o jurista Paulo Brossard escreveu parecer contestando o direito de o recém- criado PSD ter tempo de propaganda na TV e receber recursos do Fundo Partidário. O TSE ainda não se posicionou sobre o tema.

PODENDO. 
O líder do PTB no Senado, Gim Argello (DF), fez uma recepção de fim de ano, em sua casa, para os senadores regada ao vinho chileno Almaviva. A garrafa custa cerca de R$ 500.

NAS ALTURAS.
 A ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) contou, para um grupo de senadores, que viaja no fim do ano para Istambul, na Turquia. E arrematou: “Vou andar de balão na Capadócia.”

A PRESIDENTE
 Dilma vai entrar em campo para convencer os aliados a apoiar a candidatura de Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo.

O moderno capitalismo é sustentável? - KENNETH ROGOFF


O GLOBO - 18/12/11

Frequentemente me perguntam se a recente crise financeira global marca o início do fim do capitalismo moderno. É uma pergunta curiosa, porque parece presumir que há um substituto viável à espreita. A verdade é que, pelo menos por enquanto, as únicas alternativas sérias para o atual paradigma anglo-saxão dominante são outras formas de capitalismo.

O capitalismo continental europeu, que combina generosos benefícios sociais e de saúde com uma carga horária de trabalho razoável, longos períodos de férias, aposentadoria cedo e distribuição de renda relativamente igualitária, parecia ter tudo para ser recomendado - exceto sustentabilidade. O capitalismo darwiniano da China, com sua concorrência feroz entre as empresas de exportação, uma fraca rede de seguridade social e larga intervenção governamental, é amplamente descrito como herdeiro do capitalismo ocidental, ao menos devido ao imenso tamanho do país e à consistente taxa de crescimento. Ainda assim, o sistema econômico chinês está evoluindo continuamente.

De fato, é difícil saber agora até que ponto as estruturas política, econômica e financeira chinesas vão continuar se transformando, e se o país mais tarde vai se transformar num novo exemplar do capitalismo. De qualquer forma, a China ainda está sobrecarregada pelas vulnerabilidades sociais, econômicas e financeiras de um crescimento acelerado de um país de baixa renda.

Talvez, a verdadeira questão seja que, numa ampla varredura da História, todas as formas atuais de capitalismo são em última forma transitórias. O capitalismo moderno tem tido um extraordinário curso desde o início da Revolução Industrial dois séculos atrás, tirando bilhões de pessoas comuns da pobreza. O marxismo e o socialismo têm recordes desastrosos em comparação. Mas, à medida que a industrialização e o progresso tecnológico se estenderam à Ásia (e agora à África), algum dia a luta por subsistência não será mais um imperativo básico, e as numerosas falhas do capitalismo contemporâneo podem aumentar.

Primeiro, mesmo as principais economias capitalistas fracassaram em estabelecer efetivamente preços para produtos públicos, como ar limpo e energia. O fracasso nos esforços de concluir um novo acordo sobre a mudança climática é um sintoma de paralisia.

Segundo, junto com uma grande riqueza, o capitalismo produziu imensos níveis de desigualdade. A distância crescente é, em parte, um simples efeito da inovação e do empreendedorismo. As pessoas não reclamam do sucesso de Steve Jobs; suas contribuições são óbvias. Mas nem sempre isso é o caso: a grande riqueza permite a grupos e indivíduos comprar poder político e influência, que por sua vez ajudam a gerar mais riqueza. Somente poucos países - Suécia, por exemplo - têm sido capazes de romper esse círculo vicioso sem causar um colapso do crescimento.

Um terceiro problema é o fornecimento e a distribuição do atendimento em saúde, um mercado que não satisfaz vários dos requisitos básicos necessários do mecanismo de preços para produzir uma eficiência econômica, a começar pela dificuldade que os consumidores têm de estimar o valor da qualidade de seu tratamento.

O problema só vai piorar: os custos do sistema de saúde como uma proporção da renda certamente vão subir conforme as sociedades se tornam mais ricas e mais velhas, possivelmente excedendo 30% do PIB dentro de poucas décadas. Na saúde, talvez mais do que em qualquer outro mercado, muitos países estão lutando com um dilema moral de como manter incentivos para produzir e consumir com eficiência sem produzir grandes disparidades inaceitáveis no acesso ao atendimento.

É irônico que sociedades capitalistas modernas se engagem em campanhas públicas para estimular indivíduos a darem mais atenção à sua saúde, enquanto encorajam um ecossistema econômico que seduz muitos consumidores com uma dieta extremamente não saudável. De acordo com os Centros para Controle de Doenças dos Estados Unidos, 34% dos americanos são obesos. Claramente, o crescimento econômico calculado de forma convencional - que implica um alto consumo - não pode ser um fim em si mesmo.

Quarto, o sistema capitalista de hoje subestima amplamente o bem-estar das gerações por nascer. Para a maior parte da era desde a Revolução Industrial, isso não importou, enquanto as vantagens do contínuo avanço tecnológico superavam políticas míopes. Cada geração se considerava significativamente melhor do que a anterior. Mas com a população mundial ultrapassando os sete bilhões, e arautos das restrições de recursos se tornando mais aparentes, não há garantias de que essa trajetória possa ser mantida.

Crises financeiras são, naturalmente, um quinto problema, talvez o que mais esteja provocando exames de consciência ultimamente. No mundo das finanças, a inovação tecnológica contínua não reduziu os riscos, e pode tê-los ampliado.

Em princípio, nenhum dos problemas capitalistas é insuperável, e economistas têm oferecido uma variedade de soluções baseadas no mercado. Um alto preço global para o carbono poderia induzir empresas e indivíduos a entender o custo de suas atividades poluidoras. Sistemas de impostos podem ser planejados para fornecer uma melhor redistribuição de renda sem necessariamente envolver grandes distorções, ao minimizar gastos com impostos não transparentes e manter baixas alíquotas marginais de impostos para o aumento de rendas.

Precificar efetivamente os custos da saúde, incluindo os preços do tempo de espera, poderia encorajar um melhor equilíbrio entre igualdade e eficiência, com atenção estrita ao acúmulo excessivo de débitos.

Será o capitalismo uma vítima de seu próprio sucesso ao produzir prosperidade maciça? Por enquanto, a possibilidade parece remota. No entanto, enquanto a poluição, a instabilidade financeira, problemas de saúde e desigualdade continuarem a crescer, e enquanto o sistema político continuar paralisado, o futuro do capitalismo pode não parecer tão seguro em algumas décadas como parece agora.

KENNETH ROGOFF é professor de Economia e Políticas Públicas na Universidade de Harvard e já foi economista-chefe no FMI.

Super PCs chegam em 2012 - ETHEVALDO SIQUEIRA


O Estado de S.Paulo - 18/12/11


Os novos PCs que serão lançados em 2012 nos reservam boas surpresas. Graças aos extraordinários avanços tecnológicos que serão incorporados aos desktops, laptops e ultrabooks nos próximos meses, o mercado assistirá a uma espécie de renascimento do PC.

Serão, pelo menos, quatro saltos nessas máquinas: 1) telas de toque ultrassensíveis; 2) desempenho muito mais avançado; 3) economia de energia; 4) conexões USB 3.0 - que aumentam em 10 vezes a velocidade de transferência de dados em relação à geração atual, USB 2.0.

Comecemos pelas novas telas de toque. Assim como os tablets e smartphones, os novos laptops e desktops deverão incorporar progressivamente touchscreens mais avançadas do que as atuais. A performance dos novos sistemas operacionais, como o Windows 8, talvez recomende telas mais sensíveis, em especial nos desktops e laptops.

Os progressos da microeletrônica têm sido tão grandes que alguns especialistas já dizem que o mundo está entrando na era dos superchips. Numa definição relativamente simples, um superchip é um microprocessador típico, multinúcleo, de 32 nanômetros, também chamado de system-on-a-chip, que, além de sua performance extraordinária, economiza energia.

Os superchips. Graças às novas gerações de chips, já apelidados de superchips, todos os PCs e dispositivos portáteis - como smartphones, iPods e tablets - passarão por mudanças profundas, a começar de um desempenho muito melhor. Outra consequência positiva será a redução significativa do consumo de energia. Com isso, as baterias que hoje nos asseguram pouco mais de 4 horas de trabalho contínuo nos permitirão trabalhar até 10 ou 12 horas sem necessidade de recarregar.

Eis alguns exemplos de superchips hoje presentes no mercado: Tegra 3 (da Nvidia), Intel i7, Fusion da AMD, o Cell Chip da IBM, e outros microprocessadores avançados da Qualcomm, da ARM ou da Texas.

Eles serão ideais para aplicações mais sofisticadas de geração de gráficos, de Projetos Apoiados em Computador (CAD, na sigla de Computer-Aided Design), de vídeo de alta definição (High Definition), imagens 3D, de áudio, aplicações de mobilidade e de segurança em telecomunicações.

Com a nova geração de chips, diversos modelos de smartphones a serem lançados em 2012 passarão a oferecer recursos avançados de imagem, entre as quais a recepção de TV em alta definição, bem como das imagens tridimensionais (3D).

Entre os diversos superchips que deverão ser lançados em 2012, os primeiros da geração de 22 nanômetros (nm) deverão ser os chips Intel Ivry Bridge, com transistores 3D Tri-Gate.

A nova conexão. Uma das melhores notícias para os usuários de PCs é a chegada das conexões USB (Universal Serial Bus) de terceira geração, prevista para o final do primeiro semestre.

Elas acabam de obter a luz verde para se tornar padrão dos computadores Windows baseados em chips Intel em 2012. Um dos fóruns de implementadores do padrão USB anunciou na semana passada a conclusão do chipset da Série 7 Ivy Bridge e de outros compatíveis com a certificação USB 3.0 - o novo padrão de conexões ultra rápidas que deverá substituir as atuais conexões USB 2.0.

Chipset é um conjunto de circuitos integrados cuja finalidade é executar uma ou mais funções relacionadas ao funcionamento do chip ou microprocessador principal. O novo chipset da Intel deverá chegar ao mercado entre abril e junho de 2012, nos primeiros PCs Windows que usarão o novo padrão de conexões USB 3.0.

O desempenho da nova geração SuperSpeed USB 3.0 permite a transferência do conteúdo de um disco Blu-ray (25 gigabytes), de vídeo de alta definição, em apenas 70 segundos, em lugar dos 14 minutos das atuais conexões USB 2.0. Há apenas 5 anos, as conexões USB 1.0 levavam 9h18min para transferir os mesmos 25 GB.

Além do chip Ivy Bridge da Intel, também deverão ser utilizados nos PCs Windows de 2012 os chips avançados da AMD (Advanced Micro Devices) e da NEC japonesa, entre outros.

Um dos fatos mais positivos é que a certificação das conexões SuperSpeed USB assegura a interoperabilidade ou compatibilidade retroativa com as gerações anteriores do chamado ecossistema USB, segundo explicou na semana passada um dos diretores do Grupo Soc IP do Chipset Intel.

Muitos especialistas, como Brian O"Rourke, diretor de pesquisa da empresa In-Stat, acreditam que a incorporação do padrão SuperSpeed USB 3.0 aos chipsets da Intel deverá torná-lo um padrão universal ele poderá ser oferecido virtualmente em qualquer PC. Mais do que isso, ele deverá ser usado em todos os periféricos de PCs, na eletrônica de entretenimento em geral e nos dispositivos móveis.

A Intel oferece também a alternativa da tecnologia de conexão de alta velocidade chamada Thunderbolt, já incorporada aos computadores MacBooks, mas que, talvez, não se torne tão utilizada em 2012 quanto as conexões USB 3.0.

Em paralelo com a nova geração de conexões, surgirão também conexões sem fio, já chamadas de Wireless USB, que interligarão notebooks ou caixas acústicas a velocidades de até 480 megabits por segundo (Mbps), a 3 metros de distância, que poderão transmitir todo o conteúdo de um jornal, como este Estadão de domingo, em apenas dez segundos.