segunda-feira, abril 25, 2011

NOTA do GIPSI do INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA UnB SOBRE a TRAGÉDIA DE REALENGO - RJ

NOTA do GIPSI do INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA UnB SOBRE a TRAGÉDIA DE REALENGO - RJ
Prof. Dr. Ileno Izídio da Costa
Coordenador do GIPSI


Nota enviada ao blog pela Drª ANA CRISTINA MILANEZ

Absolutamente consternados com evento tão violento e chocante, assim como toda a população brasileira, o GIPSI vem a público, na qualidade de estudantes, professores, pesquisadores e profissionais, especialistas na área (sofrimento psíquico grave) - considerando estar sendo demandado para se posicionar -, socializar sua primeira leitura de episódio tão trágico como forma de contribuir para uma compreensão mínima possível e a necessária discussão acadêmica, profissional e social sobre o ocorrido.

De pronto enfatizamos a complexidade do episódio, descabendo qualquer explicação de ordem meramente linear e/ou causalista. Fenômenos como este são multicausais e autopoiéticos, ou seja, implicam causas e dimensões diversas, que se interpenetram e se retroalimentam. Desta feita, qualquer atribuição de causalidade, no formato de culpabilizações ou responsabilizações únicas, não contribuem para se ter uma leitura mais complexa e ética possível da realidade. Assim, psicologizações, psicopatologizações, psiquiatrições, criminalizações ou julgamentos morais apressados e baseados em dados minimalistas não darão conta da compreensão complexa do fato nem nos ajudarão a aprofundar o necessário debate do fenômeno.

Deixando em suspenso o inevitável e forte apelo emocional e afetivo - porém sem desconsiderá-lo, por certo -, cremos ser necessário ter alguns cuidados com nossas opiniões, julgamentos e propostas de compreensão e ação conseqüentes.

Para além do aspecto midiático - que até entendemos ser legítimo e necessário para que possamos fazer tantos lutos ao mesmo tempo e para tentarmos canalizar nossa dores (pessoais, familiares e sociais) implicadas - temos que apontar algumas questões cruciais para o cuidado possível de abordagem.

Na dimensão individual, posto que todos estejam à procura de uma explicação individualizada, repudiamos todo e qualquer processo diagnóstico de uma pessoa que não tivemos acesso de forma longitudinal e que agora apenas avaliamos com base em dados minimalistas, muitos dos quais possivelmente imprecisos, enviesados, subjetivados e alvo fácil de generalizações e afirmações narcisistas e projetivas desnecessárias. Neste sentido, não reputamos o rapaz autor do fato como esquizofrênico, psicopata, “mass murder”, assassino, fascínora, psicótico etc, posto que a posteriori não se pode mais fazer tais ilações. Socialmente cabe denunciar esta fácil psicopatologização e psiquiatrização de um evento que vai além de uma “suposta doença mental, psicose, loucura ou transtorno mental”. Até para que não caiamos na postura, também fácil e muitas vezes desejada por muitos, de não olharmos nossa contribuição social no evento, de tudo atribuirmos, preconceituosamente, à “doença mental” e isto signifique a adoção de posturas, procedimentos e até mesmo políticas sociais discriminatórias, excludentes e repressivas.

As dores envolvidas são muitas, em especial nas perdas de pais, crianças e adolescentes de forma tão trágica e inesperada, e sem desconsiderá-las (pelo contrário, nos solidarizando com elas), gostaríamos de enfatizar, como nos cabe como especialistas da área, o sofrimento que o rapaz (um ser humano, produto legítimo nosso, no sentido de ter sido construído em nossas relações humanas e sociais de nosso meio, de nossa cultura) vivenciou em seu também curto período de existência. “Filho adotivo”, “mãe esquizofrênica”, “adolescente rejeitado” (eventuais bullyings no formato das gozações, das rejeições de modo de ser diferente, taxado de “gay”, rejeitado e ridicularizado por meninas e meninos etc), “esquizotípico”, ensimesmado, solitário, religioso evangélico, sexualmente virgem e sem rede de amigos e apoio afetivo-social: estes qualificativos - e não diagnósticos - são apenas indicadores de um sofrimento. Psicótico? Não necessariamente... O máximo que podemos afirmar neste momento, cremos, é que estava construindo seu mundo próprio, com os sofrimentos inerentes (pessoais, sexuais, familiares, sociais) e para tanto seu sofrimento estava sendo estruturado de forma grave... Não sabemos, em especial a posteriori, se do tipo psicótico. Quantos de nós, “outros” (“normais”, “engajados”, “estudiosos”, “sãos” etc), não estamos assim fazendo?

Quantos de nós, em nossa sociedade, assim não está, desamparado, à mercê de sua própria sorte ou da sorte construída socialmente? Vários, diversos... Assim, rejeitamos formalmente os diagnósticos fáceis de esquizofrenia e psicopatia, em especial a irresponsabilidade de ditos especialistas que, com veemência, contribuem para o obscurecimento da complexidade envolvida e lançam na sociedade preconceitos e visões ultrapassadas e estereotipadas de um sofrimento essencialmente humano... Este rapaz não foi construído por uma doença, mas por uma existência de sofrimentos que a estavam estruturando...

As dimensões familiares, sexuais, relacionais, sociais e, por conseqüência, de isolamento (morava sozinho, com seu gato e seu cachorro, por exemplo), autoreflexão com conclusões próprias, fechadas em si próprias, incluindo as religiosas, o estavam conduzindo a um mundo próprio, particular, o único possível para dar conta de tantos sofrimentos... Construção delirante? Pode até ser, mas plenamente calcado na realidade e derivado dela, até porque suas ações demonstraram pleno contato com ela... Desta feita, não vamos apenas “individualizar a sua doença”...

Assim, entendemos que os sistemas familiar (anterior, pais biológicos e atual, adotivo), escolar, religioso, relacional e, enfim, social não deram conta de dar continência ao sofrimento construído nos seus 24 anos de idade... Sem culpabilizações de quaisquer ordens, todos estes sistemas não estiveram - e muitos não estão - de detectar, dar a atenção devida ou fazer a abordagem possível de um processo em construção. Neste sentido, cabe apontar deficiências dos sistemas envolvidos, sem, no entanto, responsabilizá-los individual, causal e linearmente, como alertamos no início de nossa nota. A rigor e ao cabo, a família, a escola, a religião, os professores, os profissionais, o estado não estão preparados para perceber e lidar com a detecção precoce de tais sinais, que na nossa abordagem chamamos de pródromos... Mas isto não se resolve meramente criticando, rotulando ou afirmando verdades absolutas de qualquer sorte... É preciso pensar, no nível da saúde mental de nossa população, em termos de política global, por exemplo, em promoção de saúde, intervenções precoces, capacitações e efetivamente um aumento de mecanismos e dispositivos de acolhimento e escutas de tantas dores e tantos sofrimentos, muitas vezes desconsiderados, rejeitados ou mesmo ignorados, como cremos, ocorreu no caso deste rapaz...

Neste sentido é que nosso grupo tem trabalhado, pesquisado (financiamento do CNPq) e há 9 anos vem construindo uma possibilidade de abordagem possível de eventos prévios a fatos como este (crises psíquica graves) e, neste particular, que o Centro de Atendimento e Estudos Psicológicos (CAEP) e a atual Direção do Instituto de Psicologia está investida na construção de um Centro de Serviços Psicológicos cada vez mais inclusivo de nossa comunidade interna (UnB), DF e entorno, incluindo a instalação de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), docente-assistencial, dentro da política pública do Ministério da Saúde de Reforma Psiquiátrica, no novo prédio do CAEP, com o apoio da atual administração do Instituto de Psicologia e central da UnB.

Solidarizamo-nos com os pais e as vítimas, incluindo os do próprio agente principal de tamanha tragédia...
Que o fato, absolutamente doloroso para todos nós, sirva de exemplo para que tenhamos discussões e tomemos ações complexas e conseqüentes, abrindo mão de explicações e soluções fáceis e meramente paliativas...
Informamos que estaremos organizando, o mais rápido que pudermos, um debate com especialistas na área (Psicologia, Antropologia, Direito, Serviço Social, dentre outros)para contribuirmos com o debate acadêmico, profissional e luto social em nossa comunidade.

Prof. Dr. Ileno Izídio da Costa
(ileno@unb.br, ilenoc@gmail.com)
Coordenador do GIPSI, em nome do Grupo
Referência de leitura: “Da psicose aos sofrimentos psíquicos graves”. Ileno Costa e Colaboradores, Kaco Editora, 2010.

A Casa da mãe Joaninha - REVISTA VEJA



A Casa da mãe Joaninha
JÚLIA DE MEDEIROS
REVISTA VEJA



Uma sucessão de vexames públicos, escândalos administrativos. protestos populares e ondas de boatos corroem o já minguado capital político da prefeita de Fortaleza Luizianne Lins, do PT, é desde o ano passado a detentora do título de a prefeita mais mal avaliada do país, segundo o Datafolha. Os últimos acontecimentos mostram que ela não deve perder o trono tão cedo. Em fevereiro a prefeita tirou uma licença médica de dez dias. Voltou no grito de Carnaval, envergando uma fantasia de joaninha. com direito a antenas e microssaia de bolinhas. Assim a trajada abriu a folia em Fortaleza, para, logo em seguida. bater asas para Salvador. onde curtiu a folia no camarote da cantora Daniela Mercury. Há duas semanas, decidiu retribuir a hos¬pitalidade da artista contratando-a para cantar no aniversário de 285 anos da capital. I o show, Luizianne novamente surpreendeu a população: escalou uma atriz para discursar em seu lugar e evitou. assim, as vaias com as quais a oposição pretendia ofuscar a apre¬sentação da baiana. O show de DanieIa Mercury custou 385000 reais. Pegou mal. O valor é maior do que a dívida da prefeitura com um dos principais fornecedores de material cirúrgio da rede municipal de saúde. A falta de pagamento causou a suspensão das entregas do material na semana passada. "Ela pagou para o povo pular e. beber cachaça em vez de cumprir suas obrigações com a saúde", diz José Frota Neto, um dos credores.
Não foi a primeira vez que a prefeita usou o" dinheiro público para de¬monstrar todo o seu apreço pelos cantores baianos. presença garantida nos réveillons que ela promove em Fortaleza. Quatro dessas festas terminaram em pendengas jurídicas. Em rodas, o motivo foi o mesmo: ausência de licitação e pagamentos de serviços não comprovados. Por exemplo. Luizianne declarou ter pago 715000 reais de cachê a Caetano Veios o na úlrima celebração. Alegou que o valor cobriu as passagens, as diárias e o transporte de equipamentos dos músicos que acompa¬nhavam o cantor. O•detalhe desconfortável é que Caetano havia feito um show-solo. A VEJA. o músico acusou a prefeitura de ter pago despesas que ele não fez nem cobrou.
Mesmo quando consegue comprovar suas despesas, a petista encontra problemas para justificá-Ias. O Tribunal de Contas do Ceará descobriu que. em 2007. ela u ou o cartão corporativo pago pela prefeitura em uma loja de eletrônicos na Itália. Em 2008, Luizianne reincidiu. Mãe de um menino de 11 anos, foi flagrada passando o cartão em uma loja de brinquedos de Fortaleza. Aperreada com a repercussão do caso, requereu segredo de Justiça sobre os papéis. Sua mãe, a supleme de depurada estadual Luiza Uns, é outra fome de problemas. Luiza não só construiu uma casa no meio de uma reserva ambiental como a está ampliando. Para não ser f1agrada, pôs a obra em nome de um laranja. Só voltou atrás quando a ilegalidade foi desco¬berta pelo Ministério Público Federal. Diame da casa em que mora. doze guardas municipais costumavam ficar postados até o Ministério Público estrilar. Apesar da proibição legal, Luizianne saiu em defesa da medida, alegando que ela visa à segurança do seu filho. que passa os dias com a avó.
TantaS são as rei nações da petisra em Fortaleza que acabaram inspirando a oposição a usar a lnternet para organizar manifestações públicas contra ela - no Ceará assim como no Egito. O movimento é liderado pelo dono de uma loja de manutenção de computadores. Tarsis Rocha. Ele conectou 7000 eleitores em redes sociais nas quais são divulgadas críticas e notícias sobre a prefeita. No dia 10 de abril, Rocha tentou converter a Rua São José. sede da prefeitura, em uma versão cariri da Praça Tahir, que sediou o movimento responsável pela queda do ditador Hosni Mubarak. Na ocasião, Rocha não conseguiu reunir maIs do que 250 revolrosos. Espera ter mais sucesso na segunda passeata. marcada para o fim deste mês.
Solteira. alegre e jovial aos 42 anos, Luizianne não faz segredo de que mantém uma forte amizade com o empreiteiro Carlos Fujita. Os rumores de que os dois teriam um romance aumentaram de volume quando a prefeira ergueu (com dinheiro público, claro) um jardim japonês na orla de Fortaleza, em frente ao prédio onde mora Fujita. Recém-inaugurada, a obra homenageia o avô de Fujita e sua execução coube a uma prima do empresário. Luizianne disse que o jardim não foi feito para agradar ao nipo-namorado. mas para homenagear a comunidade japonesa de Fortaleza. São 300 famílias.

DIEGO ESCOSTEGUY e MURILO RAMOS - Companheiro de toga



Companheiro de toga
DIEGO ESCOSTEGUY e MURILO RAMOS
REVISTA ÉPOCA

O governo nomeia para o STJ Antônio Ferreira, advogado sem currículo - mas ligado ao PT

O advogado Antônio Carlos Ferreira formou-se numa faculdade que nem sequer consta da lista das 87 recomendadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Não fez mestrado. Em 30 anos de carreira, nunca publicou um artigo jurídico. Só teve um grande cliente: a Caixa Econômica Federal, onde entrou há mais de 25 anos. Nas poucas e magras linhas de seu currículo oficial, porém, não há menção ao dado mais relevante de sua trajetória: desde 1989, ele é filiado ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, entidade alinhada com o Partido dos Trabalhadores. Militante informal do partido, Antônio Carlos fez carreira na Caixa com a ajuda dos companheiros. Em 2000, a pedido do atual tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, tornou-se chefe do setor jurídico do banco no Estado de São Paulo. Quando Lula assumiu a Presidência, três anos depois, o PT emplacou Antônio Carlos no comando da Diretoria Jurídica da Caixa - uma posição para lá de poderosa, da qual dependem todos os grandes negócios do banco.

Antônio Carlos, um companheiro discreto e disciplinado, nunca criou problemas para o partido. Deu aval a contratos tidos como ilícitos pelo Ministério Público Federal, como no caso da multinacional de loterias Gtech, e testemunhou silenciosamente ações ilegais, como a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo. No caso da Gtech, acusada pelo MP de pagar propina ao PT para renovar por R$ 650 milhões um contrato com a Caixa, Antônio Carlos e sua equipe mudaram o entendimento jurídico sobre o assunto - o que permitiu a renovação exatamente nos termos pedidos pela multinacional, ainda no começo do governo Lula.

Anos depois, em 2006, ele jantava com o então presidente da Caixa, Jorge Mattoso, quando um assessor do banco entregou a Mattoso um envelope com os extratos bancários do caseiro que denunciara malfeitorias do ministro Antonio Palocci. O misterioso perdão milionário concedido pela Caixa ao grupo Bozano e ao Banco Santander, revelado por ÉPOCA na semana passada, também passou, sem nenhum questionamento, pelo crivo da turma de Antônio Carlos. (Por meio de sua assessoria, ele negou participação nos casos que passaram por sua área e disse não ter visto o conteúdo do envelope com os extratos bancários do caseiro.)

Antônio Carlos permaneceu na diretoria da Caixa até agosto do ano passado. Na última terça-feira, a presidente Dilma Rousseff o nomeou para uma vaga no Superior Tribunal de Justiça, o STJ, a segunda corte mais importante do país. Para ocupar esse cargo, a Constituição exige que o candidato detenha "notório saber jurídico" e "reputação ilibada". Caberá agora ao Senado sabatiná-lo. A reputação foi colocada em xeque por sua atuação na Caixa. Com relação ao notório saber jurídico, é difícil encontrar lentes para enxergar esse atributo em Antônio Carlos - a não ser lentes vermelhas, partidariamente embaçadas.

Ao comparar-se seu currículo ao dos demais 29 ministros da corte ou aos de seus concorrentes ao posto, as credenciais de Antônio Carlos parecem frágeis. Todos exibem cursos de pós-graduação ou, no mínimo, longa carreira no Judiciário. Foi, portanto, preciso muito lobby para que o nome de Antônio Carlos chegasse à mesa da presidente Dilma - lobby do PT e de ministros que foram ligados ao partido, como Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF). Foi uma espécie de retribuição. Como sempre tratou muito bem o poder, pelo poder também foi muito bem tratado. Quando Antônio Carlos era diretor jurídico da Caixa, o banco concedia generosos patrocínios para eventos do Judiciário. O banco deu R$ 40 mil para financiar a festa promovida para Dias Toffoli, quando ele conseguiu ser nomeado para o STF, em outubro de 2009. Antônio Carlos foi à festa, claro.

A indicação de Antônio Carlos veio de uma lista sêxtupla da OAB. Na votação entre seus pares, ele ficou em sexto. Encaminhou-se essa lista ao STJ. Antônio Carlos pulou para o primeiro lugar na lista enviada ao governo. Os dois competidores finais de Antônio Carlos apresentavam cursos de pós-graduação - mas pouca simpatia político-partidária. Em Brasília, é essa a linha que conta mais no currículo.

Verba, Jabá e água fresca - REVISTA VEJA




Verba, Jabá e água fresca

FERNANDO MELO

Revista Veja 

O MST e outros grupos que dizem lutar pela reforma agrária perderam seguidores e tornaram-se nanicos. Mas seus líderes nunca receberam tanto dinheiro do governo

O MST encolheu, mas seu apetite por verbas públicas sÓ fez crescer.Segundo relatório divulgado na semana passada pela insuspeita Comissão Pastoral da Terra, braço marxista da Igreja Católica no Brasil, O Movimento dos Trabalhadores sem Terra representa hoje apenas 14509 fanu1ias - incluindo as que estão acampadas sob um pedaço de lona à margem de rodovias e as que participaram de algum tipo de invasão no ano passado. É menos da metade da torcida do time de futebol da Portuguesa. Em parte, o ape-
quenamento do MST se deve aos próprios fracassos. Seus assentados vivem em situação de miséria, como mostrou pesquisa do Ibope de 2009: 37% sobrevivem com renda familiar de até um salário mínimo. outroS 35% ganham. no máximo, dois salários por família. Apenas I % tem acesso a rede de esgoto. Mas o que mais contribuiu para a crescente . irrelevância do grupo liderado por João Pedra Stedile foi o naufrágio do modelo de reforma agrária do país. A ideia de oferecer "um pedaço de terra" e um par de enxadas para os assentados tocarem sua própria produção não resultou em mais do que um punhado de mexericas
mirradas que ninguém quer comprar. Sem o uso de tecnologia intensiva, não há como avançar na reforma. Prova disso é que não apenas o MST perdeu massa, mas também todas as outras entidades que orbitam em tomo da causa. Em 2003, havia 124600 famílias em acampamentos ali invasões de terras. No ano passado, segundo a Pastoral da Terra. esse número tinha despencado para 20400 (já somado o pessoal do MST), uma queda de vertiginosos 83%.

Contrariando a lógica, porém, os movimentos dos sem-terra, cada vez mais nanicos, nunca estiveram tão bem alimentados - por verbas públicas, claro. Entre 2003 e 20 10, os repasses do Ministério do Desenvolvimento Agrário para o MST e demais entidades ligadas à reforma agrária aumentaram nada menos do que 285%. Chegaram a 282.6 milhões de reais. Os números foram levantados a pedido de VEJA pela ONG Contas Abertas, uma referência de qualidade e independência no controle dos gastos públicos.

A justificativa oficial para o gastO dessa montanha de dÍ11heiro é que ela serve para pagar cursos de aprimoramento agrícola e outros projetOs que beneficiem pequenos agricuJtores incluídos no programa de reforma agrária. O governo poderia fazer isso direrameme, mas desde a administração Fernando Henrique Cardoso decidiu usar o MST e outras ONGs como intermediários. Isso amansa as lideranças, que, por sua vez, podem torrar as verbas como lhes dá na telha. já que a fiscalização dos gastos é ínfima. Uma análise feira por VEJA detectou que, em 2011, sessenta organizações que atuam como "laranjas" do MST receberam 29 milhões de reais do governo. Mas a fatia da turma de Stedile pode ser ainda maior. "Nos últimos dez anos, o MST ganhou muito espaço na divisão de verbas. Certamente, fica com mais de 50% do que é repassado", afirma o engenheiro agrônomo Xico Granano, ex-presideme do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária no governo do PSDB.
Há muito o interesse do MST não é conseguir terra para quem quer terra, mas, por meio da fomentação da discussão sobre reforma agrária, manter acima da Unha-d"água o pescoço de seus líderes e seu poder de barganha junto ao governo. É por isso que Stedile costuma repetir a lorota de que há "4 milhões de famJ1ias" na fila para receber um lote. E é por isso também que todo ano o MST promove o Abril Vermelho, uma série burocrática de invasões cujo único objetivo é ocupar páginas de jornal. Eles querem passar a impressão de ser maiores do que na verdade são, como um baixinho que recorre a sapatos com salto carrapera. Nessa tarefa, comam com o apoio de seus parceiros do PT. que ecoam as manifestações e muitas vezes dão apoio logístico a elas. O caso mais recente ocorreu na Bahia. Um grupo acampou diante da Secretaria de Agricultura do estado exigindo mais dinheiro para os assentamentos do MST. O governador Jaques Wagner, em vez de retirar os manifestantes, decidiu mostrar seu espírito hospitaleiro. Com dinheiro público, instalou na área chuveiros e banheiros químicos e ainda abasteceu os invasores com 600 quilos de carne por dia. durante mais de uma semana. Foi tanta comida que o pessoal teve de salgar e secar pane do carregamento, para preservá10. Jabá assim é duro de engolir.

PAULO GUEDES - Descontrolado




Descontrolado

PAULO GUEDES
O GLOBO - 25/04/11

Os deuses sempre se respeitaram e foram também compreensivos com os incrédulos. A intolerância era típica de sacerdotes e fanáticos. E nada poderia ofender mais aos seguidores de uma crença religiosa do que homenagens em seu próprio templo a deuses de outra doutrina.

Sim, eu cometera o sacrilégio. Havia elaborado modelos macrodinâmicos em que falhas de mercado eram corrigidas por políticas públicas. Mercados privados disfuncionais e governos virtuosos em plena Universidade de Chicago, à época o melhor Departamento de Economia em todo o mundo nos meus campos de especialização. Eu praticara um ritual pagão na Capela Sistina.

Eram apenas experimentos em uma sequência de cursos em economia matemática. Mas renderam-me longas conversas com os deuses, sérias e respeitosas, e o profundo estranhamento com os medíocres sacerdotes. O tema investigado era a "controlabilidade" de sistemas dinâmicos, uma extensão do trabalho de Kenneth Arrow, Prêmio Nobel de Economia de 1972.

Um governo precisa calibrar a trajetória de seus instrumentos de controle, como os gastos públicos, as taxas de juros, a política cambial e os níveis de encargos trabalhistas, de modo a garantir as desejadas trajetórias de seus objetivos macroeconômicos, como a maior taxa de crescimento sustentável, inflação baixa ou mesmo estabilidade de preços, o pleno emprego e o equilíbrio das contas externas.

Um dos maiores desafios é justamente a coordenação eficaz desses instrumentos, a "controlabilidade" do sistema para a consecução dos objetivos desejados. A chave do enigma é a atribuição de metas atingíveis aos instrumentos de maior impacto sobre os objetivos desejados. E há algo de profundamente equivocado em nossas práticas macroeconômicas ao longo das últimas duas décadas e meia.

Em sua busca insaciável de recursos, o governo calibrou uma trajetória ascendente de encargos sociais e trabalhistas, o que se tornou uma arma de destruição em massa de empregos exatamente entre as faixas de mão de obra menos qualificadas. Outro exemplo de descoordenação macroeconômica é a trajetória ascendente dos gastos públicos em percentual do PIB como instrumento de criação de empregos. Sobem as taxas de juros e afunda a cotação do dólar, derrubando as trajetórias do consumo, dos investimentos, das exportações e da produção nacional de substitutos de importações. Estamos ainda longe do desejável grau de "controle".

MARCO ANTONIO ROCHA - Os cupins da governança irresponsável se alastram




Os cupins da governança irresponsável se alastram
MARCO ANTONIO ROCHA

O Estado de S. Paulo - 25/04/2011


Ooops... deu cupim na "cumiera"?

É o que parece.

E quem apontou o cupim foi a Standard & Poor"s (S&P), uma das "três grandes" do mercado financeiro mundial empenhadas no duro ofício de avaliar a dose de risco apresentada por países - os chamados "riscos soberanos", que na maioria dos casos envolvem países que não têm soberania nenhuma.

Mas agora a coisa parece séria, porque o que ocorreu na semana passada foi que a agência, em nota oficial, colocou sob "perspectiva negativa" os títulos emitidos pelo governo americano, os mais seguros do mundo. Equivaleria a dizer que barras de ouro são de latão...

E o que é que coloca sob perspectiva negativa um título desses? É a possibilidade de que seu emissor (no caso o governo americano) possa vir a não honrá-lo num futuro qualquer, em virtude de o crescimento exponencial da sua dívida torná-la impagável. Em outras palavras, a economia americana estaria perdendo condições de gerar os recursos necessários ao financiamento da dívida do país, e o governo ianque acabaria tendo de se declarar em default e dizer algo como: devo, sim, mas só pago a metade, ou um terço, ou seja lá o que for, mas não tudo. Como já fez o governo da Argentina tempos atrás.

Só que a dívida da Argentina não era de abalar o mundo.

Uso a imagem cabocla do cupim na cumeeira porque os títulos do governo americano são as telhas do telhado que cobre o imenso circo em que se transformou o mercado financeiro internacional. E todo mundo sabe que cupim pode fazer desabar todo o telhado. De modo que, quando uma firma de engenharia financeira, como a S&P, acha que tem cupim nesse principal telhado, todo mundo olha para cima para ver se ele já está desabando ou olha para os lados para saber como sair debaixo.

E a ironia do caso é que ninguém tem como sair debaixo. As bolsas despencaram no dia da nota da S&P, mas depois se estabilizaram. Sim, porque todo mundo sabe que não há o que fazer: se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. Não há como se livrar dos títulos do governo americano. Para fazer o quê? Trocar por títulos do governo inglês, do governo francês, do governo italiano, irlandês, português, grego? Mas, se o governo americano entra em default, os desses países também vão para o brejo.

A China seria de longe a maior vítima de um calote dos EUA, pois tem mais de US$ 3 trilhões de reservas, dos quais a maior parte deve ser em treasuries bonds. Em tempos antigos corriam no Brasil histórias de incautos que caíam no conto do bonde - do caipira paulista que vinha conhecer a capital, ficava maravilhado com os bondes da Light e logo um vigarista lhe propunha que comprasse um. Não sei se alguém já caiu nesse conto, mas o mundo moderno caiu no conto dos bonds americanos. Não por ingenuidade ou falta de cautela, mas por não ter onde mais aplicar o dinheiro. O problema é que o mundo, hoje, produz mais liquidez financeira do que bons negócios para absorvê-la. Isso começou na primeira grande alta dos preços do petróleo, no final de 1973, viabilizada por pelo menos dois fatos: o abandono do padrão-ouro pelo governo americano (*); e os EUA terem deixado de ser autossuficientes em petróleo e passado a importadores.

Essa primeira onda de liquidez errática, dos "petrodólares", fascinou vários governos de países pobres, inclusive o do Brasil. Aquela dinheirama não encontrava projetos, empresas e empreendimentos sérios onde fosse aplicada com segurança. Começou, então, a ser "vendida", sob forma de crédito barato, para governos perdulários, que queriam dinheiro para gastar a rodo (como sempre querem). O nosso vivia, então, sua fase de "pra frente Brasil", com o que engambelava o povão da época, e os bancos internacionais apostaram num governo estável (pois, claro, era militar), que pagaria suas dívidas. Enchemos os bolsos... de dívidas - que mais tarde nos encheriam de vergonha.

Mas as ondas de liquidez se sucederam, a partir de então, por razões que só economistas podem tentar explicar. O fato é que o mundo navega numa delas atualmente.

Dinheiro em excesso produz as pressões inflacionárias, sempre ameaçadoras, que os governo tentam enquadrar, a cada ano, com maior ou menor sucesso; e uma outra "inflação", a de empresários de papel - essas figuras que amealham fortunas imensas, a partir de "ativos" que nada mais são do que o computador, a caneta e o papel timbrado.

A grande arte do "financista" moderno não é "empinar papagaios", como o roleiro de antigamente com as notas promissórias. O de hoje empina IPOs. Mas os governos empinam papagaios e IPOs, e o dos EUA é o mais audacioso do planeta nesse mister: mais de US$ 14 trilhões de papelório empinado é para qualquer larápio das arábias morrer de inveja...

Toda essa desordem está em busca de uma nova ordem. Deve ser isso que George Soros pensava quando, há dias, reuniu um grupo de luminares da economia e finanças em Bretton Woods, o mesmo lugar onde nasceu o FMI.

(*) Em 1971 o governo americano rompeu o compromisso de entregar sempre uma onça-troy de ouro por US$ 35 (hoje ela vale US$ 1.500).

ANCELMO GÓIS - Nove e meia


Nove e meia
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 25/04/11

Ontem, quem saiu às 10h de Búzios chegou à Barra da Tijuca, no Rio, às 19h30m. 

Aliás...

Pesquisa da Coppe estima que, entre 2016 e 2020, o Rio terá cerca de 500 automóveis para cada mil habitantes. Ou seja, um carro para cada dois moradores. 

Segue
A estimativa é de que a frota de 1,867 milhão de automóveis que circula hoje no Rio ultrapasse os 3 milhões até 2020. O estudo é do professor Paulo Cezar Ribeiro. 

Para concluir
Nos últimos dez anos, a frota dos municípios do Rio e de Niterói, segundo o estudo, cresceu em média 28%, enquanto Campos apresentou um aumento de 43% e Duque de Caxias e Nova Iguaçu, 38%.

Mario Dilma Llosa
O candidato Ollanta Humala, tido como da esquerda mansa tal qual Lula e que tem o apoio discreto de Dilma, terá o voto na eleição peruana do liberal Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura, mas com ressalvas: 
— Se ele radicalizar, serei o primeiro a ir protestar nas ruas. 
Humala disputa o segundo turno dia 5 de junho contra Keiko Fujimori, filha do Fujimori.


Dilma mandou o Itamaraty não se assanhar na eleição do Peru. Mas é grande a torcida por Humala. Caso ele vença, o Mercosul abrirá suas portas para o Peru. 

Maracujá
Kate Middleton, a noiva do príncipe William, além de gostar e usar roupas da estilista brasileira Daniela Helayel, adora sucos dos trópicos. A futura rainha da Inglaterra é vidrada no suco de... maracujá. Eu também!

Viva Macalé!
Jards Macalé está gravando o primeiro DVD de sua carreira nos estúdios da Biscoito Fino. A direção do projeto leva a assinatura de Eryk Rocha, filho de Glauber, e será uma espécie de documentário musical, rodado também em externas, repleto de convidados como Luiz Melodia e Roberto Frejat. O lançamento será no segundo semestre deste ano. 

A Fazenda
Sabe Luisa Marilac, aquele travesti que virou sensação na internet com um vídeo gravado em sua cobertura, na Espanha, em que bebia uns drinques? Está sendo sondada pela TV Record para participar do reality show “A Fazenda”. 

Chão
Lenine decidiu o nome de seu novo disco, que sai em julho pela Universal. Vai se chamar “Chão”. 

Rio na moda
A GP Investimentos, pela primeira vez na sua história, faz no Rio a reunião com seus investidores. Começa hoje com palestra de Henrique Meirelles, ex-presidente do BC. O banco paulista foi fundado por três cariocas: Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles . 

Marcha da maconha 

Dia 7 será realizada a 8a- Marcha pela Legalização da Maconha, no Rio. Mas este ano os problemas começaram mais cedo. A Polícia deteve três organizadores da marcha que estavam distribuindo panfletos na Lapa. 

Calma, gente
Afastado do Fluminense por indisciplina, Emerson, o Sheik, resolveu se vingar dos seus vizinhos em Portobelo, onde Sérgio Cabral também tem uma casa. Ontem, ele acordou todo o condomínio às 5h30m com funks recheados de palavrões. 

A ‘rolha’ do bolo
O restaurante Arab, em Copacabana, no Rio, cobra R$ 20 de quem levar o bolo de casa para assoprar as velinhas no local. 

Eu apoio!

Romaric Büel, ex-adido cultural do Consulado da França, criará comitê em defesa da reabertura do Museu Internacional de Arte Naïf, no Cosme Velho. 

O lado fofo
Adriano, o Imperador, dias antes da contusão, encontrou Suzana Vieira num restaurante. Mandou servir o champanhe mais caro da casa à atriz e disse que era seu fã desde menino.

ZONA FRANCA

 Prorrogada a temporada de “Lula Contra o Mau”, o show de humor de Maurício Menezes e Lula Vieira, no Teatro Vanucci.
 Lars e Torben Grael participarão da I Regata de Veleiros Clássicos de Angra, no Resort Novo Frade, dia 29.
 Sexta, a professora Liliana Bastos, do curso de Letras da PUC, autografa “Estudo de identidade”, em Ipanema.
 Rachel Chreem lança coleção da Issa London hoje, na Alberta.
 Amanhã será lançado o 6o- Festival Brasil Sabor, da Abrasel, no MAM.
 Exart lança catálogo com nova coleção de manequins infantis, feito pela agência ATM Comunicação.
● Noemi Ribeiro inaugura exposição quinta na Candido Mendes do Centro da cidade.

GUSTAVO CERBASI - Homem x mulher: quem erra mais?


Homem x mulher: quem erra mais?

GUSTAVO CERBASI 
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/04/11


Elas compram por precisar do ato da compra; será que não falta algo na vida que realmente lhes dê prazer?


O ESTEREÓTIPO da mulher consumidora é aquela que sai do shopping center com várias sacolas, a maioria delas com sapatos e bolsas, extasiada pelo prazeroso banho de loja. Algumas estatísticas confirmam que a mulher erra com frequência maior do que os homens, mas a maioria delas conclui que a mulher é mais conservadora nos investimentos e detalhista nos controles financeiros. Por que, então, o estereótipo?
Na verdade, a mulher tem realmente maior potencial de errar. O problema não está nos hormônios ou no número de neurônios, mas no simples fato de que, tradicionalmente, é papel da mulher se expor mais ao consumo.
Até o século passado, o homem trabalhava e a mulher administrava a verba deixada por ele para manter a casa abastecida. Se as contas não fechavam no fim do mês, a culpa só podia ser da mulher -talvez venha daí o estereótipo. Hoje, homens e mulheres trabalham e ganham para manter o lar.
O papel de consumir está dividido? Não. Por tradição, a mulher ainda é responsável pelos pequenos gastos. Se você for neste momento a uma farmácia, verá que é a mulher quem compra os medicamentos de alguém doente na família. Se for a um shopping, durante a semana e fora do horário do almoço, verá que 75% do público é de mulheres. Se for a uma papelaria, verá muito mais mulheres do que homens comprando material escolar para os filhos.
As mulheres participam de todas as decisões, mas cabe a elas fazer as pequenas compras e aos homens cabe o pagamento das grandes escolhas -casa, carro, pacote de férias, por exemplo. O homem erra?
Sem dúvida, mas apenas nas poucas situações em que se expõe ao consumo, e erra em valores maiores.
O casal decide qual carro comprar, ele assume o fechamento do negócio e acaba agregando ao carro novo uma roda mais esportiva ou um DVD de teto.
A mulher, por outro lado, erra em valores pequenos, mas com maior frequência. E errar não necessariamente significa jogar dinheiro fora.
Pode ser comprar aquilo que é importante, mas que não estava nos planos. Ao ir à farmácia comprar um medicamento para o filho, ela se lembra do algodão que está em falta em casa. Ao ir à papelaria com o filho, ele pede um estojo com o personagem da TV, mais caro. Pequenos ajustes nos gastos podem se somar em uma grande falta no fim do mês.
Por que erramos? Erramos porque todo ato de consumo é um processo de sedução. Toda loja é projetada para seduzir, com elementos como aroma agradável, música agradável, cores atraentes, mostruários cativantes e vendedores elegantes, bem trajados e comunicativos. Esses vendedores são também bem treinados, criando uma grande desvantagem para o inocente consumidor que quer apenas satisfazer uma necessidade, mas ao entrar na loja descobre ter necessidades que até então desconhecia.
O erro, portanto, não pode ser associado ao sexo do comprador. Não há estudos que confirmem isso categoricamente. Após acompanhar as finanças de cerca de 750 famílias, entre 2001 e 2008, percebi que em 33% dessas famílias era a mulher quem administrava as finanças e em praticamente nenhuma delas havia reclamação de dificuldades de manter as contas em dia. Nos 67% das famílias em que o homem era o gestor, cerca de 25% dos casos relatavam desequilíbrios recorrentes. Concluo que a mulher realmente leva jeito para cuidar das finanças, provavelmente devido a seu comportamento mais conservador, conciliador e minucioso. O erro nas compras, por outro lado, certamente pode ser associado ao despreparo do consumidor antes de se submeter ao prazeroso e sedutor processo de compras.
O que dizer, então, das mulheres que realmente adoram sair do shopping com seis pares de sapatos? Minha resposta: elas compram porque precisam. Não dos sapatos, mas do ato da compra. Será que não está faltando algo na vida que realmente lhes dê prazer?

ROBERTO ZENTGRAF - Pobre Diego...




Pobre Diego...

ROBERTO ZENTGRAF
O Globo - 25/04/2011

Não podia dar outra: com a inflação em alta, o Banco Central decidiu por aumentar a taxa de juros novamente, gerando assim debates e manchetes acaloradas. O ideal seria termos taxas mais baixas dizem especialistas. Mas será que estamos preparados para isto? Sei que irei mexer em vespeiro, mas acompanhe comigo, meu querido leitor, a simulação do artigo de hoje.

Se tudo se repetisse como aconteceu nos últimos 12 meses, investidores mais atentos poderiam obter em termos líquidos, e já descontada a inflação, algo próximo dos 4,13% ao ano de rentabilidade - o equivalente a 0,3378% em bases mensais - desde que aplicassem nos títulos do Tesouro, NTN-F de 2021 (acumularam 13,50% no ano encerrado em 20/04/2011) e pagassem 0,30% ao ano de custódia e taxas no Tesouro Direto, além dos 15% de impostos e 6,5% de inflação, quando medida pelo IPCA.

Agora imaginemos que estes investidores tenham como expectativa de vida 80 anos e planejem parar de trabalhar aos 65 anos... Desde que recebam salários inferiores ao teto do INSS, suas aposentadorias serão integralmente pagas pelo governo, mas o que fazer se ganharem mais que o teto? Neste caso, precisarão de um complemento, seja por meio dos planos de previdência, seja por conta própria. Simulando com os 4,13% reais que citei antes, veja o que aconteceria para alguém que desejasse R$5 mil mensais complementares à aposentadoria oficial: no momento em que largasse o emprego, deveria ter um saldo acumulado de quase R$673 mil que, mantido aplicado sob as mesmas condições, lhe garantiria 15 anos de retiradas. Como acumular este valor? Analisemos alguns casos (todos os valores estão expressos a dinheiro de hoje, ou seja, já expurgados dos efeitos da inflação):

1. Antônio (25 anos) teria 40 anos de poupança pela frente, e, assim, desde que depositasse R$562 mensais, aos 65 anos conseguiria o complemento desejado.

2. Bruno (35 anos) teria 30 anos de poupança pela frente e, portanto, com menor tempo para acúmulo, precisaria depositar R$961 mensais para conseguir o mesmo complemento.

3. Carlos (45 anos) teria ainda 20 anos de poupança pela frente e, portanto, com menos tempo ainda, veria seu depósito mensal subir para R$1.825 mensais, caso quisesse o mesmo complemento que os demais.

4. Diego (55 anos) teria somente 10 anos de poupança pela frente e, assim, com muito pouco tempo para acumular, seria forçado a depositar R$4.561 mensais para acompanhar os colegas do artigo.

Percebe-se que deixar para depois tal decisão é encrenca certa diante dos valores dos depósitos, que crescem vertiginosamente, conforme a idade aumenta. Mas o que aconteceria se, com a combinação de inflação e juros mais baixos, imitássemos a China, por exemplo, onde a taxa real de juros é de aproximadamente 1% ao ano? Repito a pergunta feita no início do artigo: será que estamos preparados para isto? Conclua você, querido leitor: simulando para inflação zero, verifiquei que para terem os R$5 mil complementares, Antônio precisaria poupar R$1.708 mensais, Bruno R$2.317, Carlos R$3.535 e Diego R$7.192... Xiiii, complicou, não é mesmo?

Um grande abraço e até a próxima semana!

FÁBIO GIAMBIAGI - Uma cidade global




Uma cidade global
FÁBIO GIAMBIAGI

O Globo - 25/04/2011

O que o Rio vai ser no futuro? Sabemos todos o que não queremos que seja: um lugar decadente como aquele em que nos tocou viver durante décadas de contínua degradação, com fuga de indústrias e de cérebros, sequestros, insegurança e instituições aviltadas. Sabemos todos também o que temos que fazer até 2016, ano das Olimpiadas. Há uma vasta lista de obras a executar, tarefas a cumprir e serviços a melhorar, nos diversos níveis de Governo.

A grande pergunta, porém, é: e depois? Passados os jogos, o.que o Rio vai querer ser depois de 2016? Por isso, com André Urani organizamos o livro "Rio .- A hora da virada", com o intuito de contribuir no sentido de organizar essa reflexão. Nele, no artigo em coautoria com Lucas Ferraz ("Uma Rio-Disney: pensando no pós2016"), defendemos a ideia de que o Rio deveria começar a planejar intensamente as ações para o pós-2016 e que, como ingrediente desse planejamento, deveria colocar no "radar" das ações de longo prazo a perspectiva de a cidade ser a sede de um parque da Disney a ser localizado na América do Sul (uma Rio Disney).

Há três fortes razões que justificam tal postulação: I) se o país não cometer muitos erros, a economia brasileira tem boas possibilidades de ter pela frente uma década de prosperidade; II) os grandes eventos esportivos de 2014 e 2016 representarão uma oportunidade ímpar de colocar o Brasil e o Rio na vitrine do mundo, catapultando o número de turistas que poderiam passar a visitar o país a partir de então; e Ill) é razoável defender o argumento de que, caso o Grupo Disney pretenda um dia dar continuidade à expansão associada à instalação de seus parques fora dos EUA - casos por exemplo da Euro disney de Paris e do parque em construção em Xangai - e decida colocar um pé na América do Sul, não parece haver melhor lugar do que o Rio para isso ocorrer, pela sua localização central no mapa, a marca do lugar e as consequências positivas que se espera ter da realização das Olimpíadas.

Em um empreendimento desse tipo, o espaço de tempo que separa o sonho inicial da sua concretização se mede em torno de uma década. Transformar uma ideia vaga em um projeto concreto, com planos e de estudos de viabilidade, toma entre um e dois anos; as negociações com o Grupo Disney implicariam, na melhor das hipóteses, entre dois e três anos; e é difícil imaginar que um parque desse porte seja construído em menos de cinco anos. Em outras palavras, estamos falando de algo que, se um dia virar realidade, estaria pronto para 2020 - ou depois. Porém, planejamento é isso: pensar dez anos à frente. O que o Rio vai ser depois de 2016 depende das iniciativas que forem tomadas até lá.

Caso contrário, teremos um miniboom por cinco anos, seguido apenas de boas lembranças.

A tentativa de trazer a Disney para o Rio deveria envolver uma estratégia mista, assemelhada à dos esforços para que a cidade fosse a sede das Olimpíadas e para fazer o Porto Maravilha. A iniciativa deveria estar associada, primeiro, a uma estratégia convincente de atração do Grupo para o Brasil; segundo, a uma campanha de marketing especializado junto aos responsáveis por esse tipo de decisão; e terceiro, à formação de uma equipe, por parte das autoridades, altamente profissional e com esse tipo de expertise para negociar, com profissionalismo e paciência, os termos da vinda do Grupo ao Brasil.

A vinda da Disney coroaria o projeto de fazer do Rio uma cidade com o status que têm Nova York, Paris, Londres ou Xangai, atraindo turistas do mundo inteiro. Tom Jobim disse há décadas que "o Brasil só será feliz quando for uma grande Ipanema". Aquele charme da "cidade que me seduz, mas onde falta água e não tem luz" se perdeu nos anos em que ganhou água e luz, mas degradou-se. Se queremos evitar que o brilho da marca se apague depois de 2016, o desafio é maiúsculo.

Sempre teremos a praia, mas no futuro o Rio tem que ser a cidade que tenha um pouco de tudo: museus, shoppings, Lapa, Maracanã, a simpatia do carioca, o centro de pesquisas da Petrobras - e uma Rio Disney. Temos que ser uma cidade global, para que o Rio seja para seus habitantes e os turistas o que Paris foi para Julio Cortázar: a representação de um estado de espírito.

Tom Jobim dizia: " O Brasil só será feliz quando for uma grande Ipanema"

EDITORIAL - O ESTADÃO - Emigrar para competir


Emigrar para competir
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 25/04/11

Em busca de competitividade, indústrias brasileiras estão fechando unidades no País e transferindo suas atividades para o exterior, por meio de investimentos em novas fábricas ou aquisição de empresas já em operação. Em parte desses casos, as indústrias não procuram mercados próximos de seus novos centros de produção, pois continuam a atender preferencialmente o mercado brasileiro. Mas, para competir internamente com os produtos importados, preferem produzir no exterior.

Escassez e custo muito alto de mão de obra, tributação excessiva, juros elevados, concorrência desleal, infraestrutura precária e cara e valorização do real estão entre os principais fatores apontados pelos dirigentes dessas empresas para reduzir ou encerrar as atividades no País e desenvolvê-las no exterior.

O caso relatado pelo Estado (18/04), da maior fabricante de calçados do País, a Vulcabrás, que decidiu comprar uma fábrica na Índia para ali produzir a parte do tênis de sua marca que mais emprega mão de obra, é o mais recente numa lista de empresas brasileiras que decidiram produzir no exterior. A empresa adquirida emprega mil trabalhadores e o plano da Vulcabrás é expandir o quadro de pessoal para 5 mil pessoas em 18 meses. Como a indústria trabalha também com empresas terceirizadas, é possível que, nesse período, sejam gerados até 8 mil empregos. Na unidade indiana, a Vulcabrás produzirá a parte superior do tênis, feita de tecido, couro e material sintético. Na fabricação de um tênis, essa é a parte que mais emprega mão de obra, cujo custo, para a fabricante, será bem menor na Índia, compensando o custo adicional do transporte desse componente até o Brasil, onde o produto será completado.

O governo brasileiro já adotou uma tarifa antidumping, de US$ 13,85 por par, contra o calçado proveniente da China, o maior concorrente do produto nacional, mas a medida não limitou a entrada do similar chinês no mercado doméstico, pois os exportadores daquele país adotaram a prática conhecida como "triangulação", de embarcar seus artigos em outros países - como Malásia, Vietnã e até Paraguai -, como se nesses tivessem sido fabricados. Essa também é uma prática condenada pelas regras internacionais, mas o processo de punição é demorado, daí a opção de indústrias brasileiras pela produção no exterior.

A balança comercial brasileira continua a registrar um superávit expressivo no comércio de bens tradicionais da indústria. Nos primeiros três meses do ano, esse segmento da indústria registrou superávit de US$ 8,5 bilhões. Mas o resultado deveu-se basicamente a duas categorias de produtos - alimentos, por causa do alto preço no mercado internacional e da alta eficiência da agroindústria brasileira, e produtos de madeira, papel e celulose. Nas categorias em que a competitividade é fortemente afetada pela mão de obra, como têxteis e calçados, pela primeira vez em mais de duas décadas a balança comercial no primeiro trimestre do ano registrou déficit, que alcançou US$ 342 milhões. Esse dado também explica a decisão das empresas do setor de produzir no exterior.

Uma empresa brasileira do ramo de cosméticos decidiu fazer parcerias com empresas do México, Colômbia e Argentina, como primeiro passo para estabelecer-se nesses países. O objetivo inicial é abastecer o mercado local, mas a empresa pode transformar essas unidades no exterior em base para sua expansão para outros países da América Latina. Outra empresa do setor de calçados, que chegou a operar 21 unidades industriais no Rio Grande do Sul, para produzir 4,5 milhões de pares por ano, com o trabalho de 3 mil pessoas, decidiu mudar-se para a Nicarágua, de onde continuará a exportar para os Estados Unidos, seu principal mercado. A empresa brasileira líder da América Latina na fabricação de índigo e brim anunciou recentemente o acordo com um grupo da Argentina para lá iniciar a produção de denim.

O fenômeno pode ser duradouro. Dirigentes das empresas que decidiram transferir a produção para o exterior consideram remota a reconquista pelo Brasil da produtividade que vem perdendo nos setores intensivos em mão de obra.

RICARDO VÉLEZ RODRIGUEZ - Jirau, Dilma e a herança maldita


Jirau, Dilma e a herança maldita
RICARDO VÉLEZ RODRIGUEZ
O Estado de S.Paulo - 25/04/11

Está a se efetivar o maior processo de entropia republicana da nossa História. O fenômeno poderia ser ilustrado com a frase, um tanto esquisita, do prefeito de São Paulo, quando falou da formação de novo partido, mais ou menos nos seguintes termos: não é uma organização nem de direita, nem de esquerda, nem de cima, nem de baixo. A frase do prefeito lembra a definição que do ser fazia o pré-socrático Heráclito de Éfeso: não é nem quente, nem frio, nem branco, nem preto, nem alto, nem baixo. Enquanto a definição heraclitiana ficou nas névoas da metafísica grega, o significado da afirmação de Gilberto Kassab é relativamente simples de ser desvendado: trata-se da ressurreição do velho "centrão", criado na era Sarney para fazer as delícias de políticos de carreira e burocratas de plantão, que não queriam largar o osso das benesses oficiais. Todo mundo com o governo, ninguém contra, que não somos de ferro!

Gravíssima situação que faz lembrar o pesadelo antevisto por Tocqueville para as democracias, efetivado pela onipotência da maioria, banida como desserviço à pátria a presença de qualquer oposição, mesmo que esta se traduza em singelos protestos veiculados pela mídia. É a síndrome chavista da "vontade geral" pura e simples, encarnada no líder e que impede que os cidadãos se expressem pela boca dos seus representantes. É a perversa tendência à anulação de qualquer signo de insatisfação da sociedade por meio da imprensa livre, protagonizada, ao longo da última década, pelo casal Kirchner, nesse tango de mau gosto de um passo para a frente e dois para trás, em que ficou enredada a democracia argentina.

Felizmente, as coisas não chegaram ainda, no Brasil, ao extremo da entropia total, dada a presença no Congresso Nacional de vozes que se erguem contra essa tendência. Mas que a força do rolo compressor oficial está em andamento, disso não há dúvida. O mostrengo mostrou as suas garras ao ensejo da recente visita do presidente americano ao Brasil, quando os policiais cariocas deram tratamento à margem da lei aos jovens que protestavam no centro do Rio, ou no atentado de que foi vítima conhecido blogueiro que se caracterizou por criticar as políticas do governo fluminense. Ensaios de intimidação e de prepotência que em nada ajudam a vida democrática e a defesa dos direitos humanos, tão badalada pela atual presidente.

Porém a sociedade brasileira, felizmente, é mais complexa do que imagina a vã sabedoria oficial. O episódio ocorrido semanas atrás no canteiro de obras da Hidrelétrica de Jirau e que se estendeu como rastilho de pólvora por outros cenários do PAC 2 está a revelar que os estrategistas do governo se esqueceram de combinar os projetos desenvolvimentistas com a própria sociedade. Pior ainda, com os trabalhadores dos canteiros. A insatisfação é clara e não poupou as lideranças peleguizadas ao redor da CUT. Estas ficaram em palpos de aranha para dar uma explicação à sociedade acerca dos violentos protestos dos operários nos canteiros administrados pelo PT e coligados. O rolo compressor não conseguiu abafar os reclamos trabalhistas. Nem conseguirá, com certeza, esconder as perdas que a economia do País terá com a indevida intervenção do governo na gestão da empresa Vale, que está sendo obrigada, com a defenestração do anterior presidente, a praticar políticas econômicas nada rentáveis e atentatórias aos interesses dos acionistas.

Caberia indagar, a esta altura dos acontecimentos, onde está a "herança maldita" de que tanto falava Lula ao longo dos seus dois mandatos-palanque. Hoje, certamente, essa herança não seria identificada com o "neoliberalismo" de Fernando Henrique Cardoso, que garantiu as privatizações (as quais desoneraram o Tesouro Nacional e aumentaram o ingresso de dinheiro nas arcas oficiais) e efetivou o saneamento das contas públicas com a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A perversa herança é constituída, hoje, pelo reforço da tendência estatizante presente no coração do governo, pelas mãos do lulismo e do petismo, na versão castilhista, que, ensaiada na década passada nos pagos gaúchos, se tornou atuante em nível nacional, no atual momento, por força da identificação do núcleo duro do poder com essa tresloucada propensão. Porque a inflação está voltando, quase descontrolada, às prateleiras da economia não pela mão do saudoso controle dos gastos públicos, mas justamente turbinada pela megalomania lulista do "nunca antes na história deste país" e pelo carnaval de bolsas e subsídios oficiais pagos a eleitores pobres, ongueiros irresponsáveis, burocratas corruptos, companheiros e até a países "amigos", como se tem revelado na recente revisão dos preços da energia vendida ao Paraguai. Tanta gastança tem preço. E essa "herança maldita" afetará os bolsos de quem sempre sai perdendo na história do nosso republicanismo patrimonialista: o contribuinte.

A presidente Dilma regressou há dias da sua visita oficial à China. Tomara que a mandatária tenha aprendido as lições de realismo político do mandarinato e coloque definitivamente nos trilhos do bom senso as nossas relações internacionais, loucamente polarizadas, no ciclo lulista, pelo viés ideológico, que tudo deforma. O Brasil perdeu, no caminho dessa megalomania vácua e irresponsável, a oportunidade de conquistar, com o apoio dos grandes, a cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, bem como a liderança na Unesco e na Organização Mundial do Comércio.

A declaração final dos líderes do Bric na China, referindo-se à necessidade de renovação da ONU, foi vaga demais para as pretensões brasileiras. O Itamaraty precisa voltar ao seio da tradição do barão do Rio Branco, que fez os nossos diplomatas serem respeitados porque punham em prática políticas diuturnamente amadurecidas na análise estratégica do mundo e das necessidades do País.

DENIS LERRER ROSENFIELD - Bento XVI


Bento XVI
DENIS LERRER ROSENFIELD
O Estado de S.Paulo - 25/04/11

Acaba de ser publicado o último livro do papa Bento XVI, aliás, Joseph Ratzinger, intitulado Jesus de Nazaré, da Entrada em Jerusalém à Ressurreição. Sem dúvida, trata-se de uma grande obra de teologia, com extremo refinamento na análise filosófica, que o coloca na melhor tradição dos pensadores cristãos.

A sua obra, certamente de valor universal, tem também uma significação especial para o País, na medida em que se contrapõe a uma tendência ainda muito vigente na Igreja brasileira, a da Teologia da Libertação. Em perda de importância na Europa, continua atual na América Latina. É ela que dá forma às pastorais da Igreja, em particular à Comissão Pastoral da Terra (CPT), que criou o MST, e ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi), além de alimentar sua cruzada contra a modernização do Código Florestal. Esse setor da Igreja se alinha, e deles participa ativamente, aos ditos movimentos sociais - organizações revolucionárias que procuram abolir o capitalismo e instaurar uma sociedade socialista no País. Posicionam-se, explicitamente, contra a economia de mercado, o direito de propriedade e o Estado de Direito.

Do ponto de vista doutrinário, elevam Che Guevara, por exemplo, à posição de um mártir ou santo da Igreja, pois seria um revolucionário como Jesus teria sido. A noção de revolucionário serve para alinhá-los numa mesma posição teológico-política, como se fizessem parte da mesma tradição. Não hesitam, nessa perspectiva, em justificar a violência, como ocorre em invasões de propriedades, com armas brancas (facões e foices), cárcere privado, destruição de maquinário e morte de animais.

Nesse contexto, cabe particularmente ressaltar a seguinte passagem do livro do papa: "A voga das teologias da revolução que, segundo a interpretação de um Jesus zelote, tinha procurado legitimar a violência como meio para instaurar um mundo melhor - o Reino - acalmou-se (nos últimos anos). As consequências terríveis de uma violência motivada religiosamente estão, de maneira radical, diante de nossos olhos. A violência não instaura o reino de Deus, o reino da humanidade. É, ao contrário, o instrumento preferido pelo Anticristo - mesmo com uma motivação religiosa idealista. Ela não serve à humanidade, mas à inumanidade".

Note-se, preliminarmente, que "zelote", a pessoa que pratica o "zelo" pela "Lei", religiosamente entendida, é o que não recua diante do emprego da violência para fazer valer os seus valores. A vontade que usa desse zelo é aquela que usa a força para impor suas próprias concepções. A justificativa de um mundo melhor se torna apenas um instrumento de legitimação do uso da força e da violência, como se, assim, tudo estivesse permitido. As leis do Estado são simplesmente desconsideradas.

Observador atento do mundo de hoje, e não apenas do mundo judeu e helenístico de Jesus, Bento XVI condena de forma radical a violência política e religiosamente motivada. Já nos anos 70 do século passado havia criticado fortemente a Teologia da Libertação, mostrando a incompatibilidade radical entre marxismo e cristianismo.

É bem verdade que, no País, a onda de teologias revolucionárias ainda não se acalmou. A CPT e o Cimi têm justificado o uso da força enquanto meio de imposição de seus próprios valores, tomando esses meios como necessários para a transformação social e política. Livros, textos e material didático são produzidos, segundo essa concepção, para crianças e jovens, moldando a sua cabeça, onde a mensagem cristã é substituída pela revolucionária. Che Guevara, em textos para jovens, torna-se o herdeiro dessa linha de pensamento, bem ele que zombava, com zelo, da religião.

Evitando qualquer ambiguidade, Bento XVI chega a dizer que teologias revolucionárias são instrumentos do "Anticristo", o que é uma condenação inapelável do ponto de vista religioso. A sua atração, no entanto, não deixa de ser exercida, precisamente pelo fato de utilizar uma mensagem "idealista", como quando o discurso revolucionário aparece travestido de palavras como "solidariedade", "fraternidade", "luta contra o lucro", "combate ao egoísmo", e assim por diante.

Em termos políticos, trata-se de uma forma de capturar a opinião pública com palavras que procuram suscitar simpatia à sua causa, que seria, na verdade, em termos teológicos, uma perversão da verdadeira mensagem crística. Se estivéssemos apenas diante da violência explícita, ela seria mais facilmente condenável. Como aparece revestida de valores idealistas, o perigo é muito maior, pois a sua máscara pode não ser reconhecida como mera máscara.

O discurso moralmente superior, desta maneira utilizado politicamente, torna-se uma ferramenta da prática revolucionária. Bento XVI se posiciona contra essa concepção e essa prática de falsos humanistas, que se colocam, assim, fora do verdadeiro cristianismo. "No justo sofredor, a lembrança dos discípulos reconheceu Jesus: o zelo pela Casa de Deus conduziu-o à Paixão, à Cruz. Trata-se da virada fundamental que Jesus fez no tema do zelo. Ele transformou em zelo pela Cruz o "zelo" que queria servir a Deus pela violência. Ele estabeleceu, então, definitivamente o critério do verdadeiro zelo - o zelo do amor que se dá".

O tema da justiça é objeto de uma releitura feita a partir do sofrimento do corpo do Cristo, que, com seu exemplo, mostra um outro caminho possível para a humanidade, absolvendo, mesmo, os que o condenavam. É o amor ao outro que toma o lugar da invasão e destruição do outro.

Logo, o grande desafio que se coloca para a Igreja brasileira e, em particular, para suas pastorais, como a CPT e o Cimi, vinculados à CNBB, é se seguirão as orientações teológicas papais ou se continuarão fundamentadas na concepção de um Jesus supostamente revolucionário. As palavras de Bento XVI são claras: "Jesus não vem como destruidor; ele não vem com a espada do revolucionário".

LUIZ FELIPE PONDÉ - A burca


A burca
LUIZ FELIPE PONDÉ 
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/04/11

Você é contra ou a favor da lei francesa que proíbe o uso de burca e niqab em público? Eu sou a favor!


VOCÊ É contra ou a favor da nova lei francesa que proíbe o uso da burca e niqab (véu que só deixa os olhos de fora) em espaços públicos?
Alguns consideram essa lei parte da islamofobia. Outros, manipulação demagógica de Nicolas Sarkozy para ganhar votos da direita xenófoba. Outros ainda fazem "conta" de quantas muçulmanas usam burca ou niqab hoje na França, como se a questão fosse parada no tempo e não implicasse a mobilidade de hábitos privados e públicos que se dá ao longo do tempo e não numa estatística congelada.
Outros veem nesta lei um ato de intolerância com hábitos religiosos e opinam que as pessoas devem ter o direito a seus hábitos religiosos. Eu também acho que devemos ter direito a nossos hábitos religiosos, mas a coisa é mais complexa do que simplesmente "eu acredito em Jesus, você em Elvis, ela em ET, ele em Maomé, mas podemos ser amigos, tá?"
Outra coisa que me chama atenção é que muita gente, que é contra a lei porque a considera um preconceito contra o islamismo, não teria pruridos em defender a retirada do crucifixo dos prédios públicos ou mesmo de criticar duramente hábitos cristãos no ocidente. Qualquer um pode falar mal do cristianismo e do judaísmo porque pega bem, mas emitir qualquer juízo com relação às outras religiões fica parecendo preconceito.
De minha parte, sou a favor da lei francesa e acho que, sim, não se deve permitir o uso de burcas e niqab (e orações no meio da rua) em países que buscam o convívio secular como modo de vida legítima.
A "substância" que sustenta minha simpatia pela lei francesa vem de longe. Vem de Israel e da experiência razoável que tenho por conta de ter vivido naquele país por duas vezes e de ter ido lá desde 1980 inúmeras outras, além de conhecer muita gente de lá, e de parte dessa gente ser de profissionais da área acadêmica e intelectual.
Há um significativo crescimento da população ortodoxa em Israel nos últimos anos. Digo "ortodoxa" de maneira genérica para falar de pessoas que pressionam a sociedade como um todo no sentido de aceitar preceitos religiosos como leis e regras de conduta social. Ortodoxia aqui é sinônimo de radical.
A luta em Israel contra as pressões dos religiosos radicais sobre o cotidiano dos não religiosos (seculares) tem sido árdua. Sempre fui um fiel defensor de uma Israel secular, com todas as contradições que isso implica. Adoro Israel e não quero vê-la na pele de uma horrorosa teocracia.
Além do ódio que os árabes nutrem contra Israel (mesmo que ingênuos achem que não), há mais um agravante no caso israelense porque sua fundação como Estado judeu implica uma identidade que sempre resvala em crenças religiosas.
Não há nenhuma forma fácil de sustentar a identidade judaica ao longo dos séculos sem o amparo da crença religiosa como critério de convivência, de casamento e de criação dos filhos.
Sem a crença religiosa, qualquer "limite" imposto ao critério de escolha para uma "convivência judaica" resvala no risco de mera discriminação cultural ou racial.
E o que isto tem a ver com minha simpatia pela lei francesa? Tudo a ver.
Grande parte dos muçulmanos não pratica bem a separação entre religião e sociedade ou Estado, assim como "seus irmãos" ortodoxos em Israel. E esses caras não valorizam em nada a ideia de "tolerância". O que os mantém "quietos" é ser minoria.
O crescimento da população islâmica na França tem que ser pautado por um "limite prático" contra a invasão do espaço público por regras religiosas.
Recentemente, uma jovem muçulmana francesa, citada nesta Folha, criticou a lei porque "confundia coisas do governo com coisas de Alá". É uma prova cabal de que essa moça não sabe o que é secularismo e precisa aprender: não há "coisas de Alá" quando falamos de leis ou regras públicas na França.
Não se trata apenas de mal-estar com o crescimento do islamismo na Europa, se trata de mal-estar com a presença pública de formas do fundamentalismo religioso.
O problema não é a mulher sob a burca, mas o forte viés teocrático que cobre essa mulher com a burca.

MÔNICA BERGAMO - POSTO DE QUEROSENE


POSTO DE QUEROSENE
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/04/11

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) vai julgar nos próximos dias a determinação para que a Shell, que comprou a Cosan recentemente, venda a parte da empresa responsável pelo abastecimento de aeronaves no país. A Shell está pedindo que a decisão seja reconsiderada já que não haveria companhias aptas a adquirir os hidrantes que são usados no abastecimento em aeroportos brasileiros.

VAZIO

Segundo a Shell, qualquer empresa que adquirisse o negócio não conseguiria clientela por falta de experiência e tradição. Ocuparia espaço dos hidrantes sem usá-los, prejudicando a própria Shell e a BR, as duas empresas que dominam o mercado.

BRUNO LÁ
Um nome assombra o PT paulistano: Bruno Covas (PSDB-SP). Ele é considerado por boa parte da direção da legenda candidato duro de ser vencido numa eventual disputa pela Prefeitura de SP. Primeiro, pelo peso do sobrenome -hoje secretário de Meio Ambiente, Bruno é neto do ex-governador Mário Covas. Já foi testado nas urnas e tem o perfil "novo" que o ex-presidente Lula, por exemplo, acredita ser imprescindível na disputa eleitoral.

TABUADA
Caso o processo do mensalão fosse julgado hoje, os réus teriam cinco votos pela absolvição e quatro pela condenação. A conta é de um petista que responde ao processo. Os votos de dois ministros são considerados "incertos": Celso de Mello e Marco Aurélio Mello.

Eles seriam hoje os fiéis que poderiam fazer a balança da Justiça pender para um dos lados.

TRAVESSEIRO
O mesmo réu torce para que o julgamento só ocorra em 2013, quando seria maior a chance de absolvição dos investigados. Isso porque dois ministros considerados como votos certos pela condenação vão se aposentar no próximo ano: Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso. Ambos nasceram em 1942 e fazem 70 anos em 2012, quando serão obrigados a vestir o pijama.

SHOW DE PÉROLAS

Paula Toller se apresentou na festa de dez anos da joalheria Tiffany no Brasil; o empresário Carlos Jereissati Filho e a estilista Emanuelle Junqueira assistiram ao pocket show da cantora na loja do shopping Iguatemi.

EU VOLTEI

Fábio Assunção começa a ensaiar nesta semana a peça "Adultérios", de Woody Allen, com direção de Alexandre Reinecke.

No elenco, Carol Mariottini e Norival Rizzo. A estreia está prevista para julho, no Teatro das Artes, em SP.

CARIOCA

O Ministério da Cultura autorizou os produtores da peça "Trair e Coçar É Só Começar" a captarem R$ 2,1 milhão por meio da Lei Rouanet para temporada de três meses no Rio de Janeiro.

O espetáculo completou 25 anos em cartaz.

SAÚDE RUIM

José Celso Martinez Corrêa, diretor do Teatro Oficina que está atuando na novela "Cordel Encantado", da TV Globo, diz que sua saúde continua "péssima". "Meu ócio é o estresse. Nem poderia estar fazendo novela", afirma. No ano passado, o diretor foi submetido a cirurgia cardíaca para colocar um marca-passo.

PAULISTA DA GEMA

A cantora carioca Mart'nália vem a São Paulo para se apresentar no no bar Pirajá, em Pinheiros, como parte do projeto Para Ver as Meninas. Será no dia 7 de maio, a partir do meio-dia. Cantará "Cabide" e "Ela É Minha Cara". "Beleza de Diamente", gravada no disco de Moacyr Luz, será interpretada pelos dois.

CURTO-CIRCUITO


O promotor José Carlos Blat faz palestra às 19h de hoje, na sede do Sindicato das Empresas de Asseio e Conservação de São Paulo (SEAC-SP), sobre o tema "Crimes contra a Ordem Tributária".

O cineasta Newton Cannito ministra o curso "Gêneros Cinematográficos e Criação Autoral", de hoje a sexta, no Centro Cultural b- arco.

Michel Maffesoli, professor de sociologia da Sorbonne, participa de seminário de "ecosofia", relação entre o homem, o ambiente e as redes digitais. Amanhã, às 14h, e na quarta, às 9h, no teatro Aliança Francesa.

A cantora Tiê recebe Criolo em sua casa para o show "Na Cozinha ou no Jardim", hoje, às 20h, que tem transmissão ao vivo pelo Twitter dela.

Carlos Ferreirinha dará palestra sobre o mercado do luxo no dia 3, no evento Bem na Moda, em Campinas.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA, THAIS BILENKY e CHICO FELITTI