terça-feira, abril 05, 2011

MARCO ANTONIO VILLA - Governo cinzento


Governo cinzento 
MARCO ANTONIO VILLA
O GLOBO - 05/04/11

Analisar a política brasileira não é tarefa fácil. Nada parece ser o que realmente é. O cenário sempre é confuso. Verdade e mentira se misturam facilmente. O diz que diz supera a discussão programática. Há um gosto especial pela fofoca, pela pequena política. As polêmicas tem a profundidade de um pires.

A presidente Dilma completou cem dias de mandato. É vista como um verdadeiro fenômeno. Elogiada por todos, até pela oposição. Todos louvam sua habilidade política e a capacidade gerencial. Alguns lamentam ter votado na oposição, tão eficiente é a sua gestão.

Contudo, ninguém consegue identificar algo relevante realizado pela presidente nestes cem dias. O que ela realizou de tão brilhante? Quais os projetos apresentados? E os resultados daqueles desenvolvidos desde 2003? Ninguém sabe, ninguém viu. Só os áulicos - e haja áulico como no Brasil - é que saúdam o nada, o vazio. Pior, o governo revelou incapacidade e inoperância administrativas raramente vistas no Brasil.

Vamos aos fatos. Nos últimos três anos cresceu a demanda por etanol em mais de 70%. Já a oferta cresceu cerca de 20%. O resultado só poderia ser este a que estamos assistindo: desabastecimento somado com uma disparada nos preços. Frente à grave situação, o governo resolveu importar etanol e aumentar a adição de água. Convenhamos, é inacreditável. A presidente tem quatro ministérios que poderiam ter observado esse problema no seu nascedouro: Minas e Energia, Agricultura, Planejamento, além da Secretaria de Assuntos Estratégicos. Claro que esses ministros não se destacam pela competência, vivacidade, brilho e conhecimento das áreas pelas quais são responsáveis. Mas não é um problema nosso. Qualquer pessoa sensata não convidaria Edison Lobão sequer para tomar um café; mas a presidente o convidou para gerir um dos ministérios mais importantes do seu governo.

As grandes obras civis do PAC são um fracasso. Os episódios de Jirau foram a gota-d"agua. Das poucas obras que estão sendo realizadas, todas estão com os cronogramas atrasados, o que aumenta ainda mais os custos, além de deixar de apresentar resultados no prazo estipulado. A infraestrutura do país está em frangalhos. Nada funciona a contento. Todos os principais portos têm graves problemas. As estradas de rodagem federais estão abandonadas. Basta uma chuva para que desabem dezenas de pontes, criando sérios obstáculos à circulação de pessoas e mercadorias.

A economia está sem direção. A meta da inflação de 2010 foi superada, e a de 2011 - ainda em março - foi considerada pelo BC como inviável. Portanto, teremos dois anos (alguns estimam também que em 2012 o fato vai se repetir) com as metas estouradas. A presidente assiste passivamente à disparada dos preços e à retomada paulatina da indexação. Vê dentro do próprio Palácio uma guerra surda contra o titular da Fazenda. Nada faz. No fundo, até gostaria de rapidamente se livrar de um ministro que não foi escolhido por ela. No Brasil presidencialista, o Ministério é formado por imposições (não indicações) de oligarcas e, como no caso atual, por solicitações pessoais do ex-presidente Lula.

Os programas sociais patinam. Minha Casa, Minha Vida" não conseguiu atingir sequer 20% da meta. Mesmo assim, demonstrando enorme eficácia propagandista, foi lançada a segunda etapa, isto quando faltam entregar 80% das casas da fase anterior.

E a Educação e Ciência e Tecnologia? Como é possível desejar ser um país emergente com os péssimos indicadores nestas duas áreas? Faltam verbas e, inegável reconhecer, faltam gestores. Os dois ministros são ruins. O que foi planejado nestes cem dias? Quais os passos dados para alcançar as metas? O Brasil comemora ser sede de uma Copa do Mundo. Claro que é bom, mas quando comemoraremos um Prêmio Nobel de Física?

Falando em Copa do Mundo, é notável a incompetência dos gestores, especialmente do ministro Orlando Silva. Tudo caminha para o improviso e para a realização de obras com licitações duvidosas, justificadas pela necessidade do evento cumprir o cronograma. Quaisquer crítica ou denúncia serão consideradas impatrióticas, claro. Silva, ainda nos vemos, mas onde está o titular do Turismo? Em São Luís? Como é mesmo o nome dele?

A ineficácia governamental é evidente. A máquina está inchada. Virou (e já faz algum tempo) instrumento de apresamento partidário. A quantidade de ministérios é tão grande que a presidente não deve se lembrar de todos. Mas, não satisfeita com a estrutura herdada de Lula, resolveu deixar a sua marca: criou mais um ministério, o das Pequenas Empresas. Mesmo assim não ficou plenamente satisfeita: vai criar mais um, o da Aviação Civil. Somos, entre as democracias ocidentais, o país que tem o maior número de ministérios.

Deveríamos ter um planejamento estratégico. Mas como tê-lo tendo à frente da secretaria Moreira Franco? Como falar em planejamento, se o ministério que leva este nome só faz o orçamento (e mal, como vimos, com os cortes de 50 bilhões)? Como pensar e bem planejar o futuro?

O país vai caminhando como um avião com piloto automático. Não deverá ocorrer alguma bobagem, mas também não haverá nenhuma ousadia. Faremos a lição como um aluno bem-comportado, como aqueles que não pensam, mas reproduzem docilmente às solicitações da professora. Estamos perdendo um tempo precioso. O Brasil pode aproveitar muito bem suas potencialidades, ser ousado. Deixar de lado elogios baratos é um bom começo. Reconhecer que o governo é cinzento revela somente realismo.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Um golpe para Lula


Um golpe para Lula
EDITORIAL
O Estado de S. Paulo - 05/04/2011

A Polícia Federal (PF) levou nada menos de 6 anos para confirmar que o esquema petista de pagamentos ilícitos a políticos conhecido como mensalão, trazido à tona em 2005, não é a "farsa" de que fala cinicamente o ex-presidente Lula, mas um fato objetivo, documentado e que não comporta mais de uma interpretação. Assim não fosse, o Supremo Tribunal Federal (STF) não teria aceito praticamente na íntegra a denúncia do então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, contra os 40 membros da "organização criminosa" liderada pelo titular da Casa Civil, José Dirceu, e autora do maior escândalo de corrupção já identificado no País.

Dezenas de parlamentares de cinco partidos receberam no mínimo um total de R$ 55 milhões, ou para votar com o governo ou, no caso de deputados do PT, para abastecer seus cofres eleitorais. Neste último fim de semana, faltando menos de meio ano para prescrever talvez o principal delito de que são acusados os mensaleiros - o de formação de quadrilha, mencionado mais de 50 vezes na peça incriminatória acolhida pelo Supremo -, a revista Época revelou ter tido acesso às 332 páginas que formam o relatório final da PF, do qual transcreveu trechos contundentes. A investigação não deixa em pé nenhuma dúvida sobre a origem do dinheiro usado para comprar políticos venais e reforçar as finanças da companheirada.

Na esmagadora maioria dos casos, foram os contribuintes que pagaram indiretamente a lambança, mediante recursos transferidos da área pública para as empresas do publicitário mineiro Marcos Valério Fernandes de Souza, o operador do mensalão recompensado com opulentos contratos com setores da administração federal. O Fundo Visanet, do qual participa o Banco do Brasil, repassou R$ 68 milhões a Marcos Valério. As datas dos recebimentos tendiam a coincidir com as dos pagamentos que fazia aos políticos. O dinheiro saía das contas do publicitário no Banco do Brasil e passava pelo Banco Rural antes de chegar aos beneficiários. Não havia portas no governo Lula que não se abrissem para Valério, concluiu a PF.

A apuração, requerida pelo ministro Joaquim Barbosa, relator do processo no STF, acrescenta aos acusados de envolvimento com o mensalão nomes como os do atual ministro do Desenvolvimento, o petista Fernando Pimentel, e do líder do governo no Congresso, senador Romero Jucá, do PMDB. Mas, principalmente, trouxe Lula mais para perto do escândalo. Em agosto de 2006, este jornal já havia revelado que Freud Godoy, segurança do então candidato presidencial em 1998 e 2002, recebeu R$ 98,5 mil do valerioduto. Agora se sabe que Godoy disse aos federais que o dinheiro obtido de Marcos Valério se destinava a cobrir parte dos R$ 115 mil da conta que apresentara ao PT pelos serviços prestados na campanha lulista. Foi o partido que o encaminhou à agência de Valério.

Claro que Lula poderá alegar que não teve nada com isso, assoberbado que estaria com questões mais importantes do que o custo e a forma de pagamento do seu segurança (e amigo há 20 anos). Poderá também repetir, como disse quando rebentou o escândalo do mensalão, que "foi traído" - naturalmente, sem apontar os presumíveis traidores. Penitente, poderá mais uma vez afirmar que "devia desculpas" ao País. Mas a volta do mensalão ao noticiário, a partir de um documento da Polícia Federal que não apenas corrobora o que já era de conhecimento público, porém adiciona novos nomes e fatos, como a conexão Lula-Godoy-PT-Valério, é um golpe para a pretensão do ex-presidente de sair por aí desmoralizando a denúncia que marcou para sempre o seu governo.

O alvo do ex-presidente é o Supremo. Contando com a erosão da memória nacional, ele decerto há de ter calculado que a passagem do tempo e a pressão implícita na sua anunciada campanha acabariam pesando na decisão da Corte sobre o destino dos 38 réus remanescentes no processo. A sentença está prevista para 2012. Paradoxalmente, dependendo do que a Justiça fizer com o tardio relatório da PF, os acusados poderão ensaiar novas manobras para protelar o que, pelas evidências recolhidas, só poderia conduzir a uma condenação exemplar.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Internet lenta e cara


Internet lenta e cara
EDITORIAL
O Estado de S. Paulo - 05/04/2011

Cara, lenta, com cobertura geográfica desigual e deficiente e com metas de expansão muito tímidas em comparação com as necessidades do País e a situação e os planos de outros países. Estas são as características do sistema brasileiro de internet de banda larga constatadas por um estudo que a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) apresentou há dias ao ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e ao presidente da Anatel, Ronaldo Sardenberg.

O ministro Paulo Bernardo concordou que os preços da banda larga no Brasil são altos, mas observou que o governo está concluindo um acordo com as operadoras com o objetivo de reduzir os preços e melhorar a velocidade de conexão. Para a população de baixa renda, a melhora poderá vir "nos próximos meses", segundo o ministro.

O governo, de fato, está executando dois planos para melhorar, baratear e ampliar os serviços de internet no País, o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) e o Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU). Em 2014, deverão estar atendidos com serviços de conexão em banda larga 50% dos domicílios brasileiros, todas as micro e pequenas empresas e todos os órgãos públicos. Até lá, deverão estar em operação pelo menos 100 mil telecentros. Até 2024, as escolas, bibliotecas e unidades de saúde deverão ter conexão à velocidade de 1 megabyte por segundo (Mbps, medida da velocidade de transmissão de dados). Não foi definida a velocidade mínima para o atendimento a domicílios e empresas nesse prazo.

É importante para as empresas que atuam no setor, para as demais empresas, que dependem de conexão rápida e confiável com a internet, e para os cidadãos em geral conhecer as metas oficiais para os próximos anos. Mas, no caso da banda larga, as metas são pouco ambiciosas se comparadas com as de outros países e levando-se em conta as necessidades futuras do País.

Para 2014, a Alemanha prevê o atendimento de 75% dos domicílios com acesso à velocidade de 50 Mbps e a Austrália, 90% dos domicílios com 100 Mbps, por rede de fibra ótica.

A velocidade de acesso no Brasil é muito inferior à média atual e às metas programadas para o futuro próximo em muitos outros países. No Brasil, como mostrou o estudo da Firjan, o serviço mais simples oferece velocidade de download de 150 Kbps (kilobyte por segundo, um milésimo de Mbps), cerca de cinco vezes menor do que a velocidade mínima considerada como banda larga nos EUA. No Japão, a velocidade mínima é de 12 Mbps, 80 vezes superior à brasileira; na França, de 8 Mbps, 53 vezes maior; na Itália, de 7 Mbps, 45 vezes mais rápida; e no Uruguai, de 3 Mbps, 20 vezes.

Além de lento, o serviço brasileiro é muito caro. Aqui, a conexão à velocidade de 1 Mbps custa, em média, R$ 70,85 por mês, o equivalente a US$ 42,80. Esse serviço custa US$ 9,30 na Alemanha, US$ 12,40 em Taiwan, US$ 28,60 no Canadá e US$ 40 nos Estados Unidos. Surpreendentemente, embora seja mais caro do que na Alemanha, no Chile e em Taiwan, o serviço de banda larga de 10 Mbps no Brasil, que custa em média US$ 63,60, é mais barato do que em países como Rússia, China e México.

O estudo da Firjan constatou também grandes disparidades regionais de preços e serviços. No Amapá, a banda larga de 1 Mbps, velocidade mínima para uma microempresa, custa R$ 429,90, seis vezes a média nacional, por causa das dificuldades de conexão. A internet de 100 Mbps, considerada a mais rápida e mais adequada à grandes empresas, só existe em 13 Estados.

A tributação é apontada como um dos principais responsáveis pelo alto custo. Estima-se que, do valor da assinatura mensal, os tributos representem 40% (no Japão, correspondem a 5% e na Argentina, a 27%). O ministro Paulo Bernardo previu que, com o corte de tributos federais, a banda larga popular poderá custar R$ 35. Se os Estados reduzirem o ICMS, o valor poderá ficar abaixo de R$ 30 por mês. É uma medida elogiável, mas ainda insuficiente, diante do custo da banda larga no País.

JOÃO PEREIRA COUTINHO - Problemas de visão


Problemas de visão
JOÃO PEREIRA COUTINHO 
FOLHA DE SÃO PAULO - 05/04/11

A possibilidade de escolher geneticamente o "resultado final" geraria uma sociedade de insatisfação permanente


TIGER WOODS, considerado o melhor jogador de golfe de todos os tempos, tinha problemas de visão. Em 1999, incapaz de ler as letras maiores no ABC do oftalmologista, submeteu-se a cirurgia a laser. Recuperou a visão plena e tornou-se o fenômeno conhecido.
Mas o que diríamos nós de Tiger Woods se a intervenção médica tivesse transformado uma visão "normal" numa supervisão, muito acima da média? Uma visão capaz de detectar os buracos do campo a quilômetros de distância? Sentiríamos ainda o mesmo respeito pelas proezas do golfista?
Boa pergunta. E boa resposta, avançada pelo filósofo Michael Sandel em ensaio brilhante sobre a era da engenharia genética. Intitula-se "The Case Against Perfection" (o caso contra a perfeição), da Harvard University Press (162 págs.). A resposta de Sandel, como o título sugere, é negativa.
Corrigir uma visão deficiente faz parte da missão da medicina. "Curar" é o verbo.
Mas "alterar" ou "manipular" a natureza humana, proporcionando ao sujeito uma supervisão, uma superforça, uma supervelocidade, é mais do que curar. É entender que um ser humano pode ser objeto de ambições prometeicas.
A admiração que sentimos pelo talento natural e pelo esforço individual de um atleta desvanece-se perante a manipulação artificial.
E se assim é no esporte, assim é na vida: cresce o número de pais que, pelo menos nos Estados Unidos, gostariam de manipular geneticamente a descendência em gestação. Para que os filhos tivessem a combinação perfeita de beleza física e agilidade mental, cruzamentos apurados de Brad Pitt com Albert Einstein. A medicina tem recusado essas ambições. Mas até quando?
Sandel não sabe. Mas, adivinhando a emergência desse tempo, avisa: quando esse dia chegar, estaremos a alterar profundamente, não apenas o que somos mas, mais importante ainda, a forma como nos relacionamos uns com os outros em sociedade.
O interesse do ensaio de Sandel, talvez o melhor que li sobre o assunto, não está na inteligência com que repele o conhecido mantra "liberal" de que a manipulação genética é um atentado contra a autonomia do sujeito.
História conhecida: quando determinadas as feições, características ou comportamentos dos filhos, interferimos de forma abusiva numa vida que não nos pertence. Exercemos, no fundo, uma forma de "tirania paternal", ou de "eugenia privada" sobre eles.
Sandel contrapõe, e contrapõe bem, que esse não é o problema central da engenharia genética. Desde logo porque os seres humanos não são radicalmente autônomos nas suas existências: a natureza, o acaso ou, para os que acreditam, a existência de um Deus criador também determinam parte do que somos e nem por isso somos menos livres para perseguir vidas responsáveis.
As verdadeiras implicações de uma aceitação plena da engenharia genética "à la carte" estariam no tipo de sociedades que acabariam por emergir: sociedades onde a humildade e a solidariedade deixariam de pautar as nossas condutas.
Hoje, os filhos são considerados "dádivas". O termo não remete necessariamente para uma dimensão metafísica, ou religiosa; apenas sublinha a forma como os recebemos e amamos. Incondicionalmente. Sem que o "resultado final" desfigure a relação entre pais e filhos.
É compreensível que desejemos o melhor possível para os nossos. Mas também somos capazes de aceitar o inesperado porque nem tudo é moldável aos nossos desejos. O inesperado é a base dessa aceitação e dessa humildade.
A possibilidade de escolher o "resultado final" geraria uma sociedade de insatisfação permanente, incapaz de lidar com as contingências que fazem parte da vida humana.
Mas geraria também uma sociedade incapaz de lidar com os inesperados. Com os menos afortunados da loteria genética, os doentes, os fracos, até os feios e que seriam rapidamente convertidos em erros humanos. Ou, pior ainda, em erros da negligência humana. Precisaremos mesmo desse acréscimo de culpa e infelicidade?
A engenharia genética pode ter as suas vantagens, ao prevenir e curar a doença. E, nesse sentido, Sandel não recusa a polêmica pesquisa com células-tronco.
Mas a imperfeição humana não é uma doença. Doentes são os que acreditam no contrário.

ANCELMO GÓIS


Barca e Ponte juntas
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 05/04/11

Ontem, estava praticamente fechada a transferência da concessão das barcas Rio-Niterói para a CCR, consórcio liderado pela Andrade Gutierrez e pela Camargo Corrêa. A CCR administra 2.437km de rodovias — inclusive, a Via Dutra e a Ponte Rio-Niterói. 

Segue...
O governo estadual torce para que, com a capitalizada CCR, aumentem os investimentos no transporte marítimo na Baía de Guanabara. Quem administra atualmente as barcas é a empresa de ônibus 1001, fundada pelo empresário Jelson da Costa Antunes,
falecido em 2006. 

Lei Bolsonaro
Corre na internet uma petição para ser enviada a Dilma com um pedido de aprovação de uma lei mais dura contra a homofobia. É batizada de “Proteja o Brasil do Bolsonaro”. Ontem, já havia sido assinada por 70 mil internautas. 

Mão de obra

As voadoras brasileiras reclamam cada vez mais que faltam pilotos — sobretudo, de helicópteros — no país. 

Aliás...
Só a Azul já repatriou uns 50 pilotos brasileiros que foram para o exterior depois do colapso da Varig. 

Ponte Rio-São Paulo
Não será surpresa se o PSD, partido assexuado fundado por Kassab, apoiar no Rio a reeleição de Eduardo Paes, ano que vem. 

Pepê no cinema
A vida de Pedro Paulo Guise Carneiro Lopes, o Pepê, surfista e campeão mundial de asa delta que morreu em 1991 numa competição do esporte, vai virar filme. A família já negocia com um produtor.

Calma, gente
Ao falar da escassez de domésticas, domingo, no “Canal Livre”, na Band, Delfim Netto disse: “Quem teve este animal teve. Quem não teve não terá mais.” A ONG Doméstica Legal reúne-se hoje para decidir uma reação. Mas o ex-ministro, que tem estilo bem informal de falar, certamente, não quis ofender. 

UPP da Alerj
A Assembleia do Rio será invadida, dia 15 agora, por exchefões do tráfico de drogas. Foram recuperados pelo pastor Marcos Pereira, que receberá a Medalha Tiradentes por ter “tirado mais de 7 mil do crime”.

Guerra ao fumo

A 8a- Câmara Cível do Rio condenou a Philip Morris a indenizar em R$ 150 mil Cláudio Rodrigues Bernhardt, viúvo de Letícia, que morreu de câncer por causa do cigarro. A relatora foi a desembargadora Mônica Maria Costa.

W no Rio
A bandeira americana de luxo W Hotels, que tem 41 hotéis pelo mundo, negocia um terreno na Zona Sul carioca. De cada 100 hóspedes do W Santiago, no Chile, único hotel da rede na América do Sul, com diária que pode chegar a R$ 5 mil, 22 são brasileiros.

Família Braz
Hoje, às 21h, no Unibanco Arteplex, no Rio, será exibido o documentário “A família Braz”, de Dorrit Harazim e Arthur Fontes. Há dez anos, eles retrataram nas telas o cotidiano de uma família de classe C da periferia de São Paulo. Uma década depois, a dupla revisitou a família Braz. Eles moram no mesmo lugar. Ainda assim, tudo mudou. 

Crime da chupeta 
O Supermercado Guanabara foi condenado pela desembargadora Mônica Toledo de Oliveira, da 4a- Câmara Cível do Rio, a pagar R$ 5 mil a Kelly dos Santos, acusada injustamente de furtar uma chupeta. 

O outro lado

O Viva Rio diz que não está despejando o Villa Venturoza. Afirma que o ateliê encerrou seu contrato de aluguel — e, a partir de agora, o prédio será locado pela ONG. 

Trovão azul 
Um segurança da badalada Boate da Praia, na Lagoa, no Rio, oferece aos clientes, na fila
para pagar a conta, comprimidos de... Viagra, a R$ 30 cada.
— Vai um “trovão azul” aí?
— pergunta, discreto, a quem sai acompanhado. — É para dar uma ajuda!...

LUIZ GARCIA - Boas notícias


Boas notícias
LUIZ GARCIA

O GLOBO - 05/04/11 

Verdades desagradáveis têm o desagradável costume de se recusarem a ser esquecidas.
O escândalo do mensalão, que estourou há cinco anos, parecia destinado a ser ignorado pela opinião pública desde que começou o seu julgamento, em agosto de 2007, pelo Supremo Tribunal Federal. Não por culpa do Judiciário, mas pela natural lentidão de um processo com 38 réus, todos eles com recursos para pagar bons advogados. Por falta de novidades importantes, mídia e opinião pública deixaram o assunto de lado até agora, e o assunto parecia condenado a não ser lembrado, pelo menos até a decisão final da Justiça, sabe-se lá quando.
Na época da denúncia, o escândalo ganhou manchetes diárias, e até repercussão na mídia estrangeira. Jornais americanos, por exemplo, adequadamente, mas sem muita graça, traduziram "mensalão" para "big monthly allowance". E "big" a mesada era mesmo. Isso foi confirmado agora, num trabalho da Polícia Federal encomendado pelo ministro Joaquim Barbosa, do STF. A PF ouviu quase cem pessoas e comprovou que o lobista Marcos Valério recebera do governo Lula, em diversos contratos, R$350 milhões - e parte desse dinheiro formou o caixa do mensalão.
A existência do esquema de financiamento de campanhas eleitorais, com o objetivo de fortalecer a base parlamentar do governo Lula, não é novidade. As provas agora reveladas simplesmente confirmam a gravidade do crime e acrescentam alguns nomes à longa lista dos políticos envolvidos. Dois deles estão associados ao governo atual: o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, e o líder do governo no Senado, Romero Jucá.
Isso cria um problema político para a presidente Dilma. Ela tem à sua disposição duas atitudes. Pode, simplesmente, pedir aos dois que se afastem do governo. Mas também tem à sua disposição o argumento de que são inocentes até decisão da Justiça em contrário. Em ambas as hipóteses, há um preço político inevitável.
Deixando de lado a presumida dor de cabeça presidencial, o trabalho da Polícia Federal e o fato de que ela pode executá-lo sem interferências indevidas são boas notícias para o país. Quanto mais não seja, podem contribuir para desestimular eventuais cidadãos interessados em serem, digamos assim, os Marcos Valérios da nova geração. 

MERVAL PEREIRA - Nos trilhos



Nos trilhos 
MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 05/04/11

O relatório final da Polícia Federal sobre o mensalão, que está na mesa do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pode ser a peça que faltava para que a denúncia criminal seja feita antes de agosto, quando prescreve o crime de formação de quadrilha contra os 38 acusados do processo. O que impede a prescrição é a denúncia, que tem que ser feita pelo Ministério Público através do procurador-geral da República. 
O relatório, fruto de seis anos de investigações, recoloca as coisas em seus devidos lugares e enterra a tentativa em curso de desqualificar o processo que foi acolhido pelo Supremo e tem uma novidade explosiva que, mais uma vez, leva o mensalão para dentro da campanha presidencial de Lula em 2002. 
O ex-segurança e amigo de Lula, Freud Godoy - envolvido também no caso dos aloprados da campanha de 2006, apanhados tentando comprar um dossiê contra os candidatos tucanos - confessou à Polícia Federal que recebeu R$98,5 mil do esquema ilegal como pagamento pelos serviços de segurança prestados na campanha de 2002 e durante o período de transição, entre a vitória na eleição e a posse de Lula na Presidência. 
Em 2005, quando estourou o caso do mensalão com a denúncia do presidente do PTB, o então deputado Roberto Jefferson, houve um momento decisivo na CPI que apurava os desvios. 
Foi quando o marqueteiro Duda Mendonça confessou que recebeu parte do pagamento pela campanha presidencial de Lula em uma conta no exterior, dinheiro do esquema montado pelo empresário Marcos Valério que acabou conhecido como mensalão. 
Não foram poucos os petistas que consideraram que ali havia chegado o fim da linha para o partido e o próprio governo, apanhados em falcatruas diversas. 
O uso de dinheiro ilegal para pagamento da campanha presidencial tipificava crime de responsabilidade pelo presidente da República, pois o pagamento fora feito já com Lula no Planalto, e chegou-se a falar na oposição de pedido de impeachment contra o presidente. 
Naquele momento delicado, os principais assessores de Lula chegaram a analisar, segundo depoimento do então secretário particular do presidente, Gilberto Carvalho, a hipótese de o presidente Lula não concorrer à reeleição. 
Os então ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, chegaram certa vez a sugerir ao presidente Lula que fizesse um acordo com a oposição: em troca de poder cumprir todo o seu mandato, abriria mão da reeleição. 
Há relatos de que Márcio Thomaz Bastos chegou a procurar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para tentar um acordo nesse sentido. 
A oposição, no entanto, temia uma reação dos chamados "movimentos sociais", e o próprio Fernando Henrique alertou para o perigo de se criar um "Getulio vivo" com a deposição de Lula. 
Chegaram à conclusão de que seria melhor deixá-lo "sangrando" até o fim do governo, certos de que ele seria derrotado na reeleição, um erro de cálculo grosseiro, como se pode constatar. 
Agora, está comprovado que outro componente importante do esquema pessoal de Lula na campanha presidencial também recebeu dinheiro do que ficou conhecido como valerioduto, esquema de uso de dinheiro público montado por Marcos Valério para comprar apoio no Congresso ao governo Lula e locupletar os dirigentes petistas. 
O relatório da PF traz mais provas confirmando o que já está no processo do Supremo: a maior parte do dinheiro para compra de políticos tinha como origem o fundo Visanet do Banco do Brasil. 
A Polícia Federal também conseguiu provar que o banqueiro Daniel Dantas cedeu à chantagem do PT, depois de uma reunião com o então chefe do Gabinete Civil, José Dirceu, e se comprometeu a dar uma "ajuda financeira" ao partido no valor de US$50 milhões, dos quais pelo menos R$3,6 milhões teriam sido repassados ao publicitário pouco antes de estourar o escândalo. 
As novas provas da Polícia Federal servem para esvaziar a tentativa de refazer a história que estava em curso pelo PT, com a ajuda pessoal do ex-presidente Lula. 
A indicação do deputado João Paulo Cunha, um dos mensaleiros, como presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados faz parte dessa manobra petista, que visava a constranger o Supremo no julgamento do mensalão que se avizinha, tratando os acusados como virtualmente absolvidos.
O ex-presidente Lula, que em 2005 fez um discurso à nação dizendo-se traído, tem se dedicado nos últimos anos a tentar apagar da História do país o maior escândalo de corrupção já registrado, alegando que se tratou de uma tentativa de golpe para tirá-lo do governo. 
Ainda na Presidência, Lula recebeu no Palácio o ex-ministro José Dirceu, acusado pelo procurador-geral da República de ser o "chefe da quadrilha" do mensalão. Dirceu saiu alardeando que Lula se dedicaria, quando deixasse a Presidência, a esclarecer "a farsa" do mensalão para provar que ele não passara de um golpe político. 
O próprio Lula, na campanha do ano passado, usou o palanque em que fazia a defesa da candidatura Dilma para acusar: "Mais uma vez (sic) se tentou truncar o mandato de um presidente democraticamente eleito." 
Também o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares, expulso do partido ainda em 2005, e o ex-secretário-geral do partido Silvio Pereira, que pediu desfiliação na mesma época para evitar a expulsão, estão querendo que a direção partidária reconsidere suas situações. 
Silvinho, como era conhecido, já não está mais entre os acusados pelo mensalão no processo do Supremo: através de um acordo com a Procuradoria Geral da República, aceitou fazer 750 horas de serviços comunitários em três anos, numa aceitação de culpa. 
O crime de que ele era acusado, o de formação de quadrilha, pode prescrever ainda em agosto deste ano caso a condenação venha a ser de apenas um ano. Outras nove pessoas, entre elas, José Dirceu, estão acusadas nesse crime e podem ser beneficiadas pela prescrição. 
O relatório final da Polícia Federal pode ajudar o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, a fazer a denúncia criminal antes de agosto ou então fortalecer a convicção dos juízes do Supremo, justificando uma eventual condenação pelo Supremo Tribunal Federal a pena maior que um um ano, o que anularia a prescrição. 

CAROLINA BRÍGIDO - As provas do mensalão e o relógio


As provas do mensalão e o relógio

CAROLINA BRÍGIDO
O GLOBO - 05/04/11


Relatório final da PF não será incluído na ação do STF para não atrasar julgamento

BRASÍLIA

O relatório da Polícia Federal que descreve minuciosamente o caminho do dinheiro que teria abastecido o mensalão do PT não vai integrar a ação penal número 470, a principal frente de investigação do esquema que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) contra 38 réus. O documento da PF foi divulgado pela revista "Época". Por meio da assessoria de imprensa, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que o relatório não vai constar do processo para não atrasar as investigações. Pelo mesmo motivo, o ministro Joaquim Barbosa, relator do caso, também não quer que o documento seja incluído na ação - que já está na reta final.

Segundo previsão de Barbosa, os 38 réus devem ser julgados em 2012. Assessores do ministro admitem que o relatório da PF tem muitas novas provas do uso de recursos públicos para abastecer o esquema coordenado por Marcos Valério. Mas, se o novo documento fosse inserido na ação, o julgamento teria de ser adiado, dando maior sobrevida aos investigados. Isso porque o relatório da PF menciona pessoas que não prestaram depoimento. A fase de depoimentos do processo do mensalão terminou no ano passado, e precisaria ser reaberta.

O mensalão, esquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio em votações no Congresso, é investigado em duas grandes vertentes no STF. Uma delas é a ação penal 470, a parte mais adiantada das investigações. Já foram colhidas provas e ouvidas testemunhas. Agora, começou a fase de alegações finais dos réus e do Ministério Público. O relatório de Joaquim Barbosa deve ficar pronto até o início de 2012. Depois, o ministro Ricardo Lewandowski, revisor da ação, fará um relatório. Caberá ao plenário do STF julgar os réus.

Pimentel aparece como beneficiário

Ao mesmo tempo, tramita no Supremo o inquérito 2474, elaborado com base no relatório da CPI dos Correios, do Congresso. Essa frente, que tramita em sigilo, traz provas mais robustas de que o esquema de fato existiu. É nessa investigação que está o relatório da PF. O documento está agora com o procurador-geral da República. Caberá a ele fazer uma ou mais denúncias contra as pessoas que aparecem na investigação - como o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, citado no relatório da PF como um dos beneficiários diretos do mensalão.

As novas denúncias serão submetidas ao plenário do STF em data ainda não definida. Se os ministros da Corte concordarem com o procurador, o inquérito será transformado em ação penal. Este processo será julgado bem depois da ação penal 470.

Joaquim Barbosa contesta a tese de que o crime de formação de quadrilha está prescrito para réus como José Dirceu e Delúbio Soares. A pessoas próximas, ele tem dito que é prematuro afirmar isso antes da análise detalhada do processo. Entre os réus da ação principal também estão Marcos Valério, suposto operador do esquema, o publicitário Duda Mendonça, o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), hoje presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o ex-deputado José Genoino e o delator do esquema, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ).

O novo relatório da PF confirma o pagamento de propina a deputados e o desvio de dinheiro público para custear campanhas. O documento revela que Freud Godoy, amigo e ex-segurança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, admitiu ter recebido dinheiro do esquema. Sobre a suposta participação de Pimentel, a PF identificou um pagamento, em 2004, de R$247 mil da SMP&B para o tesoureiro da campanha de Pimentel à prefeitura de Belo Horizonte. Pimentel disse que não falaria sobre o caso porque não conhece o relatório da PF.

JOSÉ SIMÃO - Socuerro! O mundo datenou!


Socuerro! O mundo datenou! 
JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SÃO PAULO - 05/04/11

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Sábado eu estava assistindo à Globo News: "Seiscentos mortos na Costa do Marfim, 40 mortos na Líbia, 60 feridos na Síria, 1.220 contaminados no Japão". Parecia o programa do Datena! Datena Internacional. O mundo datenou! Rarará!
E depois do Jean Chera, o Corinthians vai contratar o Maradona? Rarará!
E finalmente foi revelado o que a Jaqueline Roriz disse quando foi vista recebendo propina: "Só vim pegar o troco pro meu pai!". E os bueiros do Rio estourando? Manchete do Sensacionalista: "Nasa vai lançar foguetes a partir dos bueiros do Rio". Rarará!
E acentuar é uma das coisas mais difíceis da língua portuguesa. Olha mais duas sensacionais no blog ococotaseco: "Edifícil Maria Pequena". Ah, é difícil mesmo. E no Ceará: "WC mascúlino". Isso é lugar de botar acento em masculino? Rarará!
E aqueles bueiros do Rio estourando? E esse Bolsonaro? A cada entrevista piora! Eu já disse, ele vai entrar pro Guinness! Parece um pato desarranjado, uma cagada após a outra! Rarará!
E o Eramos6 diz que o Bolsonaro toma aquele uísque Black&White em copos separados. E só come feijão branco! Rarará! E não admite humor negro!
E sabe o que uma amiga falou quando viu a entrevista do Bolsonaro no UOL? "Eu tô bege." E a outra: "E eu tô Preta Gil". Rarará! E pena alternativa pro Bolsonaro: varrer a avenida Paulista após a Parada Gay! Com a língua. Rarará!
E avisa pro Bolsonaro que até muro é mais liberal que ele. Eu tenho a foto do muro: "É proibido mijar, homem, mulher e outros". Até o muro já entendeu! E avisa pra ele que, se Deus fosse gay, o mundo seria mais arrumadinho! Rarará!
E mais uma do Gervásio. Olha a placa que ele colocou na empresa em São Bernardo: "Se eu ouvir aqui algum zé ruela bocudo falando bem ou defendendo aquele parlamentar racista, vou fazer esse Hitler reencarnado conhecer o Gervásio bomba atômica. Conto com todos. Assinado: Gervásio". O Gervásio adotou o Xô Preconceito. O Paladino de São Bernardo!
Um leitor mandou perguntar se o Gervásio aceita placa sob encomenda. Rarará!
A situação tá ficando bolsonárica, líbia, datênica! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza.
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

JARBAS PASSARINHO - Deplorável prescrição do mensalão


Deplorável prescrição do mensalão

JARBAS PASSARINHO

CORREIO BRAZILIENSE - 05/04/11

Inédito na era republicana, envolvendo na mesma putrefação moral Executivo e Legislativo, foi o apelidado de mensalão, logo no início do mandato de Lula. Não tendo votos para aprovar por maioria absoluta as suas propostas de projetos de lei, e menos ainda de três quintos de cada Casa para reformar a Constituição, o governo os obtinha pela compra, em dinheiro, de deputados venais. O descarado procedimento dos venalizados, mostrava-os a televisão a tentar a negação das provas.

Um deles foi particularmente chocante. Disse que os R$ 50 mil, a propina que mandou a esposa receber, não fora senão para pagar a consulta de um ginecologista, no mesmo endereço.

A pesquisa da opinião pública refletiu a indignação que fez desabar, de 80% para 20% apenas, a taxa de apoio popular de Lula. Acabrunhado, posou de inocente, para a mídia impressa e televisionada. "Não sabia de nada", repetia como se fosse possível ignorar o que era tramado na sala ao lado da sua, ou supor que as retumbantes vitórias nas votações, que seu antecessor não lograra, derivassem do surpreendente prestígio numa Câmara em que seu partido não elegera nem um terço das cadeiras do plenário. O que parecia inverossímil foi, paulatinamente, acolhido por parte de seu público cativo dos metalúrgicos, e da postura do companheiro torneiro mecânico que se fez presidente da República. Somou, aos crentes, a maioria dos estudantes universitários da USP.

Era pouco. "Fui traído", acrescentou. Premido pelas circunstâncias, não demitiu o suposto e não confessado traidor. Aceitou o pedido de demissão e derramou-se em gentileza ao responder-lhe a carta de demissão com o vocativo carinhoso de "Meu querido Zé". Seu ministro da Justiça, o experiente criminalista Thomaz Bastos, ofereceu-lhe o argumento: "Diga que se trata de caixa dois, que não é crime". Disse-o de Paris, onde estava, a uma jornalista desconhecida, acrescendo que caixa dois não é crime, todo mundo faz. Baseado no penalista, quando o honrado procurador-geral da República, nomeado por ele, denunciou a "organização criminosa" ao Supremo, já Lula discordava publicamente da denúncia, que dizia descabida.

Finalmente, quando terminou seu governo, afirmou que não descansaria senão após a absolvição dos mensaleiros, pobres vítimas da sanha da imprensa. Sua promessa, dela servirá a exorbitante lentidão da Justiça, a partir da manobra capciosa de leguleios a indicar testemunhas imaginárias dos 40 meliantes, até de moradores no estrangeiro longínquo, para serem ouvidas no processo, mediante carta precatória. A manobra buscava obter a prescrição, ou seja, a extinção da punibilidade dos mensaleiros, esgotado o prazo para o julgamento do crime.

Leio no Estado de S.Paulo de 27 de março passado grave insinuação: "O Supremo, ao aceitar a denúncia, em agosto de 2007, criou a ilusão de condenação, mas os ministros intimidaram-se com revelação de trocas de mensagens entre os ministros Ricardo Levandowski e Cármen Lúcia, por meio do sistema de comunicação interno do STF, sobre uma possível articulação de colegas para derrubarem integralmente a denúncia do mensalão". Embora seja admitido que o Supremo, excepcionalmente, julgue casos segundo a conveniência política - e no caso o governo se empenhava - estou certo de que os ministros pautam seus votos exclusivamente pela lei, segundo o velho lema dura lex sed lex.

O calendário do processo, feito pelo judicioso jornal, mostra a seguinte sequência, que transcrevo literalmente: "Agosto de 2007, o Supremo recebe a denúncia; Agosto de 2011, o crime de formação de quadrilha prescreve, passados dois anos do recebimento da denúncia. Dos 40 réus, 24 foram denunciados também por formação de quadrilha; Fevereiro de 2012, Joaquim Barbosa espera concluir seu voto no início de 2012; Fevereiro de 2012, a ação é encaminhada para o ministro Ricardo Levandowski, para revisar todo o processo e preparar voto paralelo ao de Barbosa; até dezembro de 2012 o Ministro Ricardo Levandowski estará com o voto pronto e o processo estará liberado para julgamento; Fevereiro de 2013, o processo deve ser colocado em pauta, se as vagas abertas com a aposentadoria de Cezar Peluso e Ayres Brito já estiverem preenchidas". Como se vê, 24 dos 40 mensaleiros já terão peremptos, em agosto deste ano, seus crimes de formação de quadrilha.

A esse quadro decepcionante, entretanto, opõe-se a rapidez com que as denúncias de um delator, amparado pelo Ministério Público, provocaram o chamado mensalão de Brasília, levando à prisão do governador do DF, sua imediata expulsão do partido a que pertencia e a perda de mandato de deputados distritais, mesmo que apelassem para o conceito salvador de caixa dois de Thomaz Bastos.

Considera-se esse mar de corrupção inerente a estados totalitários, mas estamos numa democracia. Giovanni Sartori, no seu Democratic Theory, a respeito da confusão das diversas definições de democracia, cita de Eliot essa boutade: quando um termo se tornou universalmente santificado pergunta-se se significa algo concreto, em face da multiplicação de significados que lhe são atribuídos. A nossa, com tamanha diferença de conduta, lembra a que foi classificada de "democracia relativa".

JANIO DE FREITAS - Notícia de viagem


Notícia de viagem
JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SÃO PAULO - 05/04/11

AINDA ESTAMOS fora do Brasil. E é impossível prever por quanto tempo mais.
Este lugar de acontecimentos políticos inofensivos e rasteirinhos, com noticiário da altura de Gilberto Kassab e de um ou outro pretendente a explorar o "segundo escalão"; onde uma presidente alcança nível extraordinário de aprovação por seus primeiros cem dias, e há meses não estoura escândalo de corrupção governamental, este lugar em que estamos não é o Brasil que conhecemos.
Mas, a continuarmos nele ou sermos forçados a deixá-lo, dependemos de uma entidade que até parecia inerte -a Procuradoria-Geral da República. E do que veremos com o reaparecimento do "mensalão" no palco.
Não se pode desconsiderar a priori nenhum dos fatos publicados pela revista "Época" como partes de novas conclusões da Polícia Federal ligadas ao "mensalão". Os precedentes não autorizam as descrenças. Mas cair no aproveitamento da novidade pela oposição, desesperada para encontrar o que dizer seja lá sobre o que for, não é menos inadequado ao caso.
As investigações e conclusões da Polícia Federal vão passar pela apreciação da Procuradoria-Geral. Podem ser aceitas por inteiro, objeto do pedido de investigações adicionais, alteradas por exclusões parciais -enfim, as primeiras conclusões efetivas virão da Procuradoria-Geral, como preliminares às definitivas que cabem ao Supremo Tribunal Federal. Tudo semelhante ao primeiro capítulo do "mensalão" apenas na aparência.
A Procuradoria dispõe para sua nova tarefa, caso não se alterem demais as condições vigentes, de ambiente oposto, por exemplo, ao caso Collor-PC Farias e ao próprio "mensalão". Em ambas as ocasiões, a Procuradoria-Geral esteve cercada por um ambiente de exaltação a que não poderia ficar imune, em tal ou em qual direção. Ainda que brilhantes, os textos de seus pronunciamentos conclusivos, de encaminhamento do assunto ao Supremo, refletiram nas construções verbais a redução da frieza comum a esses documentos.
A pressão do ambiente sobrepôs-se a tudo.
Nos dois casos, as coisas não ficaram devidamente explicadas. No processo de Collor, basta dizer que, diante de tudo o que se passara, o recebimento de um carrinho Fiat foi a razão invocada para incriminá-lo. Do seu círculo de atividades comuns, só PC Farias recebeu algumas consequências.
No "mensalão", prejudicado também pelas pretensões políticas de utilizá-lo mais para a derrubada de Lula, o mecanismo, a extensão e o que expressou (e expressa) na política não foram alcançados -comprova-o, em parte, o aparecimento de mais investigações e outro relatório da PF. Não foram alcançados nem buscados. Na PF, talvez, em certa medida, pela pressão do ambiente para chegar às conclusões; na CPI do Congresso, por deliberação da maioria, governistas e oposição, de não se achegar à guilhotina.
Se vai perturbar o ambiente deste lugar especial em que estivemos nos últimos meses, conviria que a volta do "mensalão" , que de mensalão nada teve, fosse além de sua primeira apresentação.

MÔNICA BERGAMO


FÁBRICA DE IDEIAS
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 05/04/11

Paula Goldman, filha de Deuzeni e Alberto Goldman, ex-governador de SP, é uma das diretoras da nova produtora de publicidade Idea Factory. Ela, que estudou cinema em Nova York, filmou recentemente "Eldorado", um "docudrama" sobre tráfico de pessoas que estreou no Festival de Cinema Latino Americano.

RECEITA DE LUXO
A Receita Federal em SP já apreendeu R$ 870 milhões em 31 ações concluídas neste ano, boa parte delas em empresas do mercado de alto luxo. "Os dados abrangem, em tese, todos os fornecedores de serviços de luxo ou com alto valor agregado fiscalizados, que tendem também a ter e sonegar os maiores faturamentos", diz o fisco.

MALHA FINA

Em 2010, só na capital, a Receita recuperou R$ 2,7 bilhões nas 549 operações realizadas contra grandes sonegadores. Em média, os três primeiros meses do ano passado somaram R$ 686 milhões, valor inferior ao mesmo período de 2011.

DONOS DA CASA

A GEO, empresa de eventos da Globo e RBS, comprou o teatro do Instituto Tomie Ohtake, em Pinheiros. O espaço, sob controle do grupo Aché, nunca foi utilizado. Com o acordo, que ainda será assinado, a GEO cuidará da agenda e comercialização da casa, cujo nome ainda não foi definido.

COMPASSO...
Os acionistas da Vale -governo incluído -sempre duvidaram que diretores pediriam demissão da empresa em solidariedade a Roger Agnelli, que está sendo retirado do cargo. A questão é, digamos, matemática: se fizerem isso, eles terão que abrir mão do ILP (Incentivo de Longo Prazo), pago a cada três anos que em muitos casos corresponde a um terço da remuneração anual. Os diretores recebem cerca de R$ 9,2 milhões por ano.

...DE ESPERA
Nem mesmo a saída espontânea de Carla Grasso, diretora de recursos humanos e serviços corporativos e maior aliada de Agnelli na Vale, era esperada. Ela é um dos principais alvos do governo nas mudanças que pretende fazer na empresa.

PONTO INICIAL

O vice-governador de SP, Guilherme Afif Domingos, entrega amanhã para o governador Geraldo Alckmin as diretrizes do projeto Via Rápida para o Emprego. O programa oferecerá cursos de qualificação para eletricistas, encanadores e outras profissões onde há carência de mão de obra qualificada. A ideia é abrir 60 mil vagas em 2011 e, a partir de 2012, 120 mil por ano.

VOU NÃO

O conjunto gospel americano Madison Bumblebees of Winnsboro não virá mais ao Brasil se apresentar no BMW Jazz Festival entre os dias 10 e 12 de junho no Auditório Ibirapuera. Os músicos foram proibidos de sair dos EUA pelo pastor de sua igreja, a United House of Prayer for All People. Outra banda gospel, a Zion Harmonizers, de Nova Orleans, substituirá o grupo na programação do festival, em São Paulo.

VIAGEM-CABEÇA
Uma comitiva de médicos das universidades Berkeley e Columbia, nos EUA, desembarca no Brasil nesta sexta para conhecer serviços de referência em psiquiatria.

Supervisionados por Fábio Barbirato, da Santa Casa do Rio, 20 profissionais conhecerão também trabalhos da USP e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

A GUERRA DOS DOCES NO COLÉGIO VERA CRUZ
Uma turma de alunos do colégio Vera Cruz, no Alto de Pinheiros, em SP, decidiu resolver na bala o dilema do recreio, ontem de manhã. Com sacos de balas Sete Belo nas mãos, foram dar o troco na padaria da esquina, que costuma devolver a diferença das compras que fazem com doces em vez de dinheiro.

Às 10h30, as primeiras duas garotas, da quinta série, ofereceram porções de guloseimas para pagar. A cotação adotada para a nova moeda foi a mesma usada no estabelecimento: dez centavos por unidade. O pão na chapa, portanto, custou dezoito balas para cada uma. "Aceitaram, não acredito!", se abraçaram, à espera da comida.

Logo a "padoca" lotou de jovens uniformizados que seguravam cartazes e gritavam: "Bala não é dinheiro!".

O movimento foi organizado por Helena Allegro, 15, aluna do oitavo ano, via Facebook. Mais de cem alunos conversaram pela rede social e combinaram dia e hora do levante. Quatro foram contra. Diziam que a turma deveria se preocupar com assuntos mais sérios, como Líbia e Japão. "Política é aqui, o que acontece no recreio", diz ela, que ontem estava acompanhada da tia no protesto.

Ronaldo Antinhani, gerente da padaria Covadonga, diz ter ficado surpreso. "A gente não dá bala como troco. Para suprir a falta de moedas, a gente oferece, ninguém precisa aceitar." Obrigar cliente a receber outra forma de troco que não dinheiro é contra a lei. "Só vamos usar dinheiro agora", diz ele.

Em meio ao fuzuê, um garoto agarra uma garrafa de R$ 120 de uísque Chivas Regal e sai porta afora. Cinco minutos depois, um funcionário volta com a bebida, ainda lacrada. "Todo partido político tem gente ruim", diz um estudante à coluna.

VALSA DA DEBUTANTE
O empresário Rico Mansur organizou a festa de 15 anos de sua sobrinha Victoria. E dançou com ela a valsa de debutante. Marie Mansur, tia da aniversariante, circulou pela festa, na boate 3x4.

CURTO-CIRCUITO

A série "Somos1Só", da TV Cultura, ganha festa de lançamento no Sesc Pompeia. Às 20h30.

Julia Lemmertz, Du Moscovis e Lilia Cabral estrelam filme "Amor?", de João Jardim, que pré-estreia hoje no Espaço Unibanco, às 21h30.

Ricardo Almeida comemora com desfile no Masp seus 25 anos de ofício. Amanhã, das 20h às 23h, para convidados.

O arquiteto Fabio Souza faz festa, hoje, às 20h, na Micasa, onde passa a vender móveis usados.

A AM Galeria Horizonte será aberta hoje, às 19h, com coquetel. Em cartaz, mostra Perfil, de 21 artistas.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA, THAIS BILENKY e CHICO FELITTI

ARNALDO JABOR - Entre a piedade e o medo


Entre a piedade e o medo 
ARNALDO JABOR

O GLOBO - 05/04/11


Há a miséria dócil e a miséria violenta 

Outro dia, atravessei dois eventos das ruas brasileiras: a piedade e o medo. Um carro encostou a meu lado e o motorista me apontou gentilmente o pneu de trás, que estaria furado. Se eu saltasse, estaria sob um revólver - percebi e me arranquei. Depois do terror, a pena. Mais adiante, uma mendiga me enviou seu filhinho magro e sujo em busca de esmola.
Eu preferia que ele não tivesse vindo. Se ao menos ele estivesse sozinho, seria suportável; devia ter uns 12 anos e no colo carregava um irmãozinho. Ou seja, um menino miserável de 12 anos leva o outro como uma triste isca para ganhar uma esmola. Na calçada, a mãe observava o efeito da mise-en-scène, esperando o lucro dos tostões. Era como uma exibição de cinema ou peça de teatro. O menino maior se comportou como um bom ator - sua voz foi treinada com um tremolo de desespero, e ele olhou bem no fundo de meus olhos, que tentavam evitá-lo. Foi um sucesso: fui tomado de funda emoção, coisa rara, porque tenho me esforçado para ser bem frio, nesses tempos duros. Mas uma criança carregando custosamente outra (o frágil protegendo o frágil) foi irresistível. Quase chorei. O menino encostou na janela do meu carro, esperando a esmola. Por alguns segundos, fui grato ao menino, pois me deu a boa fortuna de uma emoção humanitária. Senti-me feliz e consolado por ser tão "bondoso", um sujeito sensível à dor dos outros. Meu primeiro impulso foi dar um dinheirão ao menino; mas me controlei para não ceder a uma misericórdia barata. Dei uma esmola de "mercado", sem olhar para o menino, que, no entanto, me olhava sem parar. A mãe também me olhava de longe. Por que essa divergência de olhares? A riqueza não olha a miséria, mas a miséria olha a riqueza. Não olho para não sentir culpa ou para não ferir meu universo estético em que a miséria é um fator desarmônico. A miséria não é plástica. A miséria nos lembra que a desgraça existe e, portanto, a morte também.
Assim que dou o dinheiro ao menino, sou tomado por um ódio súbito contra o estado das coisas, um tremor meio histérico contra a situação brasileira, contra os políticos, contra os ricos (os mais ricos que eu...). Acelerando o carro, sinto que a indignação me enobrece e me faz atacar vagos personagens que compõem a feia alegoria do mal, uma panóplia de latifundiários, milionários, carrascos egoístas, políticos feudais. Aos poucos, me acalmo e saio lucrando com a esmola, pois cumpri meu dever e me sinto legal, pois paguei um pedágio aos pobres por ter carro, comida e casa. A caridade me faz mais bem do que ao garoto. A miséria mantém o mundo funcionando, apesar de sujar a paisagem.
Depois disso, ainda traumatizado pelo medo do quase assalto, imagino o contrário: e se um cara maior, forte e bruto me metesse um revólver na cara, pela janela? Primeiro, o assalto inverteria a posição do caridoso sujeito que eu me considero, e passaria a ser a vítima e não mais o esmoler. A pobre pessoa seria eu e teria de soltar a grana para não morrer.
O assalto é a esmola ao contrário; você recebe a graça de viver, se for humilde como os pobres. O assaltante é que dá a esmola. Além disso, o assalto desagrega nosso universo social. A pobreza perde a face milenar de doçura e submissão e mostra os dentes da vingança. Há um sabor de sacrilégio no assalto. Um travo, um arrière gôut meio "revolucionário". O assalto não te exclui; ele te inclui; você também é culpado de ter coisas e não apenas aqueles ricos que você desprezava. Você é um deles, agora. No assalto você é vítima e culpado. Pior ainda se você for amante dos "pobres e oprimidos", um comunista talvez. Nada mais triste que um comunista assaltado...
No assalto, se inicia um processo de incriminação em que você é peça de um complexo micro-macro de injustiças que se inicia no capitalismo de Wall Street e acaba ali no teu relógio que ele arrancou. Retraçando o mapa, descobre-se que o teu Rolex foi comprado com o dinheiro que teu pai deixou, herança da fazenda que teu avô pagou com dinheiro público em nome de um laranja e depois vendeu com preço subdeclarado; isso te inclui numa estirpe de malandros culpados pela desigualdade social...
Não há remissão no assalto. Alem de te levar a grana, a culpa é tua. Com o fim da caridade todos ficam suspeitos, todos incluídos no crime. Ficam visíveis relações finíssimas: no esgar da cara de um burguês nordestino, se vê a seca desenhada como uma tatuagem; na barriga de um político ou num bigode pintado se percebem anos de corrupção e crueldade. O fim da caridade até é útil, porque acaba o mundo do escândalo farisaico e começa a bruta verdade da violência. E através dos olhos furiosos dos marginais, passamos a ver a cara real do Brasil de hoje.
Mas a miséria armada nos faz esquecer a miséria indefesa. Com a onda de violência, estamos perdendo a compaixão pelos pobres. E como ninguém sabe resolver o drama da miséria, criamos um vago rancor contra ela, um certo tédio, porque ela não some, teima em reaparecer. Houve uma época em que a miséria fazia mais sucesso, até como tema para arte e literatura. A miséria já deu lucro politico. No Brasil, miséria é uma indústria. Quanto lucro uma igreja de charlatães tem com os dízimos? Lamentar a miséria traz votos populistas.
Nos sonhos "revolucionários" dos pequenos burgueses como eu, a miséria era uma bandeira. Sofríamos com ela - a miséria dos outros era nosso problema "existencial". Hoje, esvaiu-se a "revolução" imaginária; isso gerou um desalento que aos poucos deu lugar ao cinismo, quase um alívio feliz. Mas a miséria é a ponta de um iceberg sujo e poluído no Brasil. Nós fazemos parte dela. Não existe um mundo limpo e outro sujo. Um infecciona o outro. A burocracia é miséria, nossa corrupção é miséria, a estupidez política é miséria.
A miséria não está nas periferias e favelas - está no centro da vida brasileira. Somos uns miseráveis cercados de miseráveis por todos os lados. 

FERNANDO DE BARROS E SILVA - Farsa de salão


Farsa de salão
FERNANDO DE BARROS E SILVA

FOLHA DE SÃO PAULO - 05/04/11

SÃO PAULO - Não sei se Lula teve ou terá acesso ao relatório final da Polícia Federal sobre o mensalão. Não sei também se terá paciência para um dia ler suas 332 páginas. Mas deveria. Quem sabe saísse dessa experiência menos desinformado a respeito dos meandros do maior esquema de corrupção ocorrido e desvendado em seu governo.
A versão de que o mensalão havia sido uma "farsa", uma obra de ficção arquitetada pela "imprensa golpista" se tornou uma ladainha nas hostes petistas. Intelectuais e apaniguados se valeram do êxito popular do segundo mandato para disseminar mentiras e reescrever a história com a tinta do cinismo.
Marilena Chaui, por exemplo, mereceria receber um relatório da PF em brochura. Poderia fazer um seminário a respeito. Quem sabe uma palestra na Funarte: "O Real e as Nervuras do Mensalão".
Não há, a rigor, nada que seja propriamente novo e impactante na peça da PF divulgada pela revista "Época". Detalhes de varejo, personagens periféricos que se beneficiaram da roubança, coisas assim.
O impacto está muito mais na confirmação, pela própria PF, do que já havia sido divulgado pela imprensa e consta da denúncia do ex-procurador-geral da República. Fiquemos no principal: o mensalão existiu e o esquema criminoso foi em grande medida abastecido com dinheiro público, desviado do fundo Visanet, do Banco do Brasil.
Além disso, Daniel Dantas, via Brasil Telecom, celebrou contratos de R$ 50 milhões com as agências de Marcos Valério para "conferir fachada de legalidade necessária para a distribuição de recursos".
Paradoxalmente, o documento da PF pode retardar o processo no STF. Isso vai ocorrer se o Ministério Público Federal concluir que precisa fazer aditamentos às denúncias.
É difícil avaliar, por ora, quais serão as implicações legais deste relatório. Politicamente, no entanto, a PF jogou uma pá de cal nessa farsa de salão que o PT -de Delúbio a Chaui- quis impingir ao país.