segunda-feira, abril 04, 2011

WALCYR CARRASCO - Luz acesa



Luz acesa
WALCYR CARRASCO
Revista Veja - SP





Uma noite dessas, ao sair, um amigo se surpreendeu com a sala toda acesa:

— Você não vai apagar a luz?

Sem jeito, desliguei. Lembrei dos meus tempos de menino. Sempre tive o péssimo hábito de deixar lâmpadas acesas. Mamãe reclamava:

— Olha a conta! Não somos sócios da companhia elétrica!

Luz é energia. Uma energia limitada. Quando se gasta demais aqui, falta ali. Quase todas as pessoas que eu conheço estão preocupadas com a defesa do meio ambiente. Agora, com o risco nuclear no Japão, não faltam discursos contra as usinas atômicas. Boa parte das necessidades energéticas do país depende delas. E aqui no Brasil se vive sob o risco de um apagão generalizado, porque, quanto mais o país se desenvolve, mais recursos energéticos são necessários. Constatei que muitas pessoas que discursam sobre a proteção do meio ambiente na vida prática são tão ausentes quanto eu. Esquecem de apagar a luz. E a água? Na academia vejo alunos que deixam o chuveiro ligado. São pessoas de bom nível, alta escolaridade. Mas não sabem fechar uma torneira! Desperdiça-se água no banho, ao escovar os dentes.

Tenho horror da poluição. Mas sou incapaz de deixar o carro em casa. Mesmo para pequenas distâncias. Outro dia me surpreendi com um conhecido: sai de Interlagos e pedala a bicicleta pela ciclovia. Só no final da pista pega o trem para o trabalho.

— Se a ciclovia fosse mais longa, nem trem eu pegaria mais — afirmou.

Senti admiração. Eu poderia caminhar até a academia. Seria um bom exercício.

— São Paulo tem pouco verde! — comentou uma amiga.

— Por que o seu quintal é cimentado?

Ofendida, ela retrucou que falava da falta de parques, de ruas arborizadas.

— O poder público tem de se preocupar!

— Mesmo um pedacinho de chão pode virar jardim — argumentei.

Há bairros áridos, sem verde algum. A Granja Viana é um bairro com muitos jardins, árvores e até reservas florestais. Até lá ganhei um vizinho de frente que reclama das minhas árvores. O motivo? As folhas que, levadas pelo vento, caem em seu quintal!

— Que absurdo! — disse para um amigo.

— Paulistano é assim mesmo, gosta de cimentar tudo!

Atualmente estou reformando minha futura residência. O arquiteto veio falar comigo.

— Que tipo de aquecimento? E as cortinas, por controle remoto?

Escolhi o solar, do tipo mais radical, que não usa energia elétrica jamais. Mostrei minhas mãos:

— É com elas que vou abrir as cortinas!

O arquiteto se espantou. Hoje em dia se colocam motores e controles em tudo! No meu atual endereço, quase enlouqueço quando vários maquinários resolvem ficar defeituosos ao mesmo tempo!

Radicalizei:

— Quero o mínimo de automação possível. Só para economizar energia!

Choquei meus amigos ao contar minhas decisões. Um deles lembrou:

— Mas é para seu conforto!

Justamente. Em nome dos pequenos confortos, costuma-se abdicar do de todos. As pessoas se acomodam. E fogem da sua responsabilidade, mesmo mínima, na preservação do meio ambiente.

Minha casa será à antiga. Mas não correrei o risco de ficar com as cortinhas emperradas porque o motorzinho quebrou. Ou de gastar água demais lavando o quintal, porque nele terei um jardim!

Um amigo esportista me deu a boa notícia:

— Assim é melhor para sua saúde! Quanto mais controles remotos a gente usa, menos se movimenta. E ganha uns quilinhos.

Sinto que começo a entender meu lugar no mundo. Não posso resolver todos os problemas da Terra. Mas sim viver de forma positiva. E com uma vantagem extra: vou emagrecer um pouco mais.



MANOEL CARLOS - Liz

Liz
MANOEL CARLOS
Revista Veja _ RJ
Meu amigo Horácio fez 70 anos no último dia 23, e lá fomos nós, seus amigos mais íntimos, atrás de uma garrafa de vinho antecipadamente escolhida e reservada na pequena adega do Café Severino, uma geladeira climatizada para trinta garrafas, que ali adormecem na temperatura ideal. São poucos rótulos, entre tintos e brancos, mas todos escolhidos com honestidade. Éramos cinco, “a las cinco en punto de la tarde”, como no poema de García Lorca. Aliás, foi o próprio Horácio que um dia, há mais de dez anos, ao agendarmos um encontro para aquele horário, fez a referência:
— “A las cinco en punto de la tarde”, hein? Sejam pontuais!
E a expressão ficou para sempre. A esses nossos encontros vespertinos meu filho Pedro costuma chamar, com elegante humor, de matinê da terceira idade, o que não deixa de ser verdade.
Mas voltemos ao dia 23 de março. A comemoração no Severino seria rápida, já que poucas horas depois o aniversariante estaria festejando em casa a chegada da nova idade, entre filhos, genros, noras e netos, e ao lado da mulher, Amélia, com quem estava casado havia quarenta anos e que fazia jus à definição de Mário Lago no samba de Ataulfo Alves: era mesmo uma mulher de verdade.
Após o brinde e a sucessão de abraços e votos de felicidades, o silêncio caiu, por alguns segundos, entre nós, e instantaneamente todos nos lembramos da notícia que nos alcançara no começo daquele dia e que ninguém ainda mencionara: a morte de Elizabeth Taylor. Alguns leitores talvez fiquem chocados ao ver que a morte da atriz nos atingira tanto, que até mesmo pusera um tom gris naquela tarde de começo de outono, ameaçando o brinde ao aniversariante, mas devo contar, de pronto, que foi o próprio Horácio, do alto dos seus 70 anos e algumas horas, quem declarou, inaugurando o assunto, após o tinir das taças:
— Por que ela tinha de morrer logo hoje, meu aniversário?
E ele mesmo explicava a razão do seu descontentamento:
— Era a mulher dos meus sonhos e minha referência de beleza, entre todas as atrizes do mundo!
E todos nós concordamos que era um duro golpe na nossa geração. E vieram as lembranças, começando também pela voz do aniversariante:
— Um Lugar ao Sol foi o filme que mais me marcou. A dupla com Montgomery Clift nunca foi superada. Nem mesmo a que ela formou com Richard Burton.
— Para mim seu auge foi com a Gata — declarou o Otávio, referindo-se a Gata em Teto de Zinco Quente, que a atriz fez com Paul Newman.
— Fico com Quem Tem Medo de Virginia Woolf? — afirmou o Paulo, com quem eu e o Raul concordamos sem hesitar.
E Horácio, ele mais uma vez, resolveu dividir a comemoração dos seus 70 anos com a saudação à sua atriz preferida:
— À minha saúde e ao descanso eterno de Liz!
Observamos que, apesar de a atriz desaparecer aos 79 anos, mais velha, portanto, do que qualquer um de nós, falávamos dela como se ainda fosse jovem. E Raul lembrou-se de uma entrevista em que ela afirmara ter vivido sempre em situações próprias dos adultos e que deixara de ser criança quando começou a fazer cinema, com menos de 10 anos.
— Ela também disse uma vez — lembrou o Paulo — que tinha o corpo de uma mulher e as emoções de uma criança.
— Ela sabia das coisas — garantiu seu admirador número 1.
Em menos de uma hora Horácio foi para casa e nós quatro secamos uma segunda garrafa, antes de nos dispersarmos e depois de muitas outras lembranças da vida e do trabalho de Liz.
*****
Nesta semana, os jornais noticiaram que Elizabeth Taylor deixou de herança perto de 700 milhões de dólares, destinando grande parte dessa quantia a instituições de caridade, a clínicas especializadas no tratamento de portadores de HIV e, principalmente, ao financiamento de pesquisas para a cura da aids.
E, entre as muitas declarações da atriz, em meio a menções a festas, diamantes, maridos, futilidades e bebedeiras, uma se destaca, fazendo dela uma celebridade de rara humanidade:
— Se não é para melhorar o mundo, para que serve o dinheiro?
Só por essa pergunta, a que ela acaba de responder com o seu testamento, Liz já merece ser lembrada para sempre.

JOÃO PEREIRA COUTINHO - Doentes e doentes


Doentes e doentes
JOÃO PEREIRA COUTINHO
FOLHA ONLINE 04/04/11

Terry Jones: lembram? Eu relembro: Jones, pastor na Flórida, ameaçou em tempos que queimaria o Corão por considerar o livro nefasto e diabólico. Acabou por desistir da ideia e, desistindo, regressou ao justo esquecimento de onde nunca deveria ter saído.

Por pouco tempo. No dia 20 de março, Jones voltou ao local do crime e queimou mesmo o Corão. A mídia norte-americana, dessa vez, ofereceu reduzido palco ao pastor. Mas um discurso do presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, condenou o ato e voltou a trazer Terry Jones para o mundo dos vivos.

Phelan M. Ebenhack -02.abr.2011/Reuters

Pastor americano Terry Jones, que ficou conhecido após ameaçar queimar o Corão

Ou, melhor dizendo, dos mortos: na cidade afegã de Mazar-i-Sharif, um ataque a funcionários da ONU provocou 7 vítimas. Em Candahar, mais 9, sem falar de incontáveis feridos, destruição de lojas, escolas e carros. E no Ocidente?

No Ocidente, é provável que o digníssimo leitor se sinta indignado pela atitude de Jones, questionando seriamente: por que motivo o pastor ofendeu a religião dos outros?

Não tenciono justificar Terry Jones, que merece tratamento psiquiátrico e não defesa pública. Mas a pergunta do leitor é a pergunta errada.

A pergunta certa é outra: será razoável matar e destruir porque alguém queimou o Corão do outro lado do mundo?

Responder a essa questão não é difícil. Basta que o leitor faça uma inversão de papéis e, mesmo sendo profundamente cristão, imaginar por momentos o que faria se um tresloucado afegão queimasse a Bíblia por considerar o texto herético.

Aposto que não sairia para as ruas de São Paulo decidido a matar e a destruir. Aposto que, na cabeça do leitor, existe uma diferença fundamental entre queimar livros e queimar gente. Ou não existe?

Terry Jones, no seu fundamentalismo fanfarrão, é com certeza um personagem doente. Mas nessa história do Corão queimado é preciso não esquecer onde está a verdadeira doença.

RUBEM AZEVEDO LIMA - A herança de Lula


A herança de Lula
RUBEM AZEVEDO LIMA
Correio Braziliense - 04/04/2011

No começo da semana passada, a imprensa mostrou vários problemas que preocupam, hoje, os brasileiros. O Correio Braziliense falou das usinas nucleares sem licença; dos golpes contra o INSS facilitados pela lei e dos desvios de recursos na construção de rodovias.

Outros veículos trataram da greve de protesto dos trabalhadores em programas da PAC, em vários estados, em condições subumanas e sem receberem salário. Da troca do presidente da Vale. Como se vê, não faltam, no Brasil, problemas para a presidenta — como a própria gosta de ser chamada — resolver.

Este escriba respeitou o prazo de cem dias da administração Dilma, tratando-a com consideração, tanto mais que a presidenta nos livrou do estilo Lula, de ocupar os meios de comunicação de massa a qualquer pretexto. Sua parlapatice — ufa! — cansava e ainda nos livramos da legião de ditadores que o cercavam.

A cobrança de resultados da presidenta começa dia 11 próximo. Até lá, esperemos o que ela fará dos problemas herdados de Lula. Em Lisboa, ele criou outro: pediu que Dilma ajudasse Portugal a sair da crise e a Fifa viu atraso na execução dos planos de Lula para o mundial de futebol.

O Supremo decepcionou, pois repeliu, por inconstitucionalidade, a Ficha Limpa nas eleições de 2010. Mas, com isso, o STF deu sinal de que não aceitará mais que a esmagadora maioria governista no Congresso viole os direitos constitucionais da minoria, como um rolo compressor.

Nesse caso, o Congresso pode voltar a funcionar livremente, sem brecar iniciativas da oposição. Não se acobertarão mais desvios e malfeitos na execução de projetos sociais, econômicos e administrativos, permitindo-se ao Brasil de Dilma avançar, em termos políticos e de democracia.

Quem sabe se o Congresso e/ou o STF não anulam os últimos atos de Lula, revelados no Senado? A senadora Ana Amélia mostrou que o governo, até o dia 10 próximo, tungará, dos estados e municípios, restos a pagar que lhes deve, deixando-os à míngua. O senador Álvaro Dias mostrou que Lula desviou R$ 21 bilhões do erário, para pagar parte da dívida interna que ele mesmo criou. Duas vergonhas na herança de Lula.

EDITORIAL ESTADÃO - O atraso das obras para a Copa de 2014


O atraso das obras para a Copa de 2014
EDITORIAL ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 04/04/11

Divergências com o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo de 2014, Ricardo Teixeira, sobre a sucessão na Fifa, a entidade mundial do futebol, podem ter levado o presidente desta última, Joseph Blatter, a mudar sua opinião a respeito da atuação dos dirigentes do esporte no País e das autoridades envolvidas na organização da competição. Desde a escolha do Brasil para sediar a próxima Copa, Blatter elogiava a atuação do COL brasileiro e não apontava problemas na organização da competição. Em encontro com jornalistas estrangeiros segunda-feira passada, na Suíça, porém, fez críticas duras - e procedentes.

A mudança surpreende. Há pouco, numa reunião com dirigentes brasileiros na Suíça, Blatter elogiou o trabalho do COL, dizendo ser "muito bom" seu "comprometimento e progresso" na organização da Copa. Agora, observou que, "se formos comparar com a África do Sul três anos antes da Copa, há claramente um atraso do Brasil em relação ao estágio onde estavam os sul-africanos", disse. "A Copa é amanhã, mas os brasileiros acham que é depois de amanhã", declarou.

Embora a Fifa estivesse preocupada com os preparativos para a Copa, Blatter nunca se manifestara de maneira tão clara sobre a questão. Deixava a tarefa para o secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke. Em maio, por exemplo, numa de suas mais conhecidas manifestações, Valcke afirmou que o relatório sobre os preparativos da Copa de 2014 que chegara a suas mãos era preocupante. "Há alguns estádios com o alerta vermelho já aceso. É impressionante como o Brasil já está atrasado. E não estou falando apenas do Morumbi (na época, ainda cogitado para a abertura da Copa) e do Maracanã, estou falando de vários estádios", advertiu então.

Nessa semana, Blatter disse estar especialmente preocupado com a indefinição em relação ao Itaquerão, o estádio a ser construído em Itaquera para a abertura da Copa. A maior parte das obras para a Copa do Mundo precisa estar concluída até 2013, quando o Brasil sediará a Copa das Confederações, mas Blatter tem dúvidas sobre isso. "Corre-se o risco de que nem o Rio de Janeiro nem São Paulo possam organizar partidas", porque os estádios não estarão adequados para receber jogos da Copa das Confederações, que será uma espécie de teste para o Mundial.

Como era de esperar, os responsáveis pelos preparativos da Copa negaram a existência de problemas ou de atraso nas obras. O ministro do Esporte, Orlando Silva, disse que, para tranquilizar Blatter, vai convidá-lo para uma visita ao País, durante a qual verá que as obras estão sendo executadas "a todo vapor" e que os prazos acertados com a Fifa serão observados.

Em nota, a CBF desmentiu que haja o risco de as obras do Maracanã não serem concluídas até a Copa das Confederações, e quanto ao Itaquerão afirmou que, "apesar de a obra ainda não ter sido iniciada, temos trabalhado de forma intensa (...) para equacionar as últimas questões técnicas".

A polêmica entre Blatter e Teixeira pode ter alguma coisa a ver com a próxima eleição na Fifa, na qual Blatter tentará a reeleição e o dirigente brasileiro apoia outro candidato, o asiático Mohamed bin Hamman.

Quaisquer que sejam as razões para a mudança de atitude do presidente da Fifa, não se pode deixar de reconhecer que as críticas ao atraso nos preparativos para a realização da Copa no País são fundamentadas. As obras de alguns estádios estão atrasadas, e isso certamente inclui aqueles programados para sediar o jogo de abertura (Itaquerão) e a final (Maracanã).

Mais preocupantes ainda são as obras de infraestrutura, de responsabilidade do setor público, para assegurar o transporte adequado aos turistas que virão ao Brasil, e sobre as quais Blatter nada disse. O setor mais atrasado é o aeroportuário. Com a criação da Secretaria de Aviação e a profissionalização da gestão da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária, o governo federal mostrou estar atento ao problema. Mas é preciso executar com rapidez e eficácia os planos de expansão e melhoria, pois o prazo é curto. A Copa é amanhã, como disse Blatter.

ANCELMO GÓIS


Lula em Washington
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 04/04/11

Lula estará amanhã, em Washington, num seminário da Microsoft com líderes do setor público da América Latina. Cabral também participará. 

Chico e Bosco 
Chico Buarque e João Bosco, 27 anos depois, fazem nova parceria: escreveram a música “Sinhá”, que fará parte do novo disco de inéditas de Chico e já está sendo gravado. Em 1984, os dois compuseram “Mano a mano”. 

Marketing da bola

Para ajudar a viabilizar o novo estádio, que também deve receber jogos da Copa do Mundo, o Corinthians, no contrato de transmissão de jogos pela TV, deseja incluir que a emissora mencione nas transmissões o nome completo da arena. 

Demissão com honra 

Tem mais gente graúda no governo (não é o Palocci) condenando o jeito como Guido Mantega demitiu Roger Agnelli da presidência da Vale: — Era possível negociar a saída dele de forma mais honrosa. É. Pode ser.

Saliência no PAC

Ainda sobre Paulinho, da Força Sindical, que, na reunião no Palácio, reclamou da ausência de bordeis próximos às obras do PAC em Rondônia. Um parceiro da coluna, que sabe das coisas, garante que, no início da década de 1980, a Vale, na época estatal, estimulou
discretamente a instalação de um bordel próximo ao canteiro de Carajás, onde trabalharam milhares de homens.

Medida da vida
A Cosac Naify publica este ano “Virginia Woolf: a medida da vida”, considerada a mais importante biografia da inglesa. O autor Herbert Marder mergulhou nos dez últimos anos de vida de Woolf, quando atingiu o auge criativo.

Calma, gente

Veja o tamanho da confusão em que se meteu Jair Bolsonaro por causa de suas declarações homofóbicas e racistas. A travesti Jane Di Castro organiza uma manifestação em Brasília: — Ele precisa sair do armário. Precisamos convencê-lo a se assumir.

Segue...
Aliás, na opinião do advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, Bolsonaro pode ser processado por difamação, injúria e racismo:
— Suas palavras não terão a proteção da imunidade parlamentar por terem sido pronunciadas fora do Congresso. É. Pode ser.

Aliás,
A prevalecer a tese de Kakay, outro que pode ser processado é o deputado pastor Marco Feliciano, do PSC paulista. É aquele que no meio do debate sobre Bolsonaro postou em seu twitter que “africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé”. Meu Deus!

Vítima da dengue
A universitária Fernanda Cristina Carvalho de Souza Freitas, 19 anos, morreu sábado, no Rio, vítima de dengue hemorrágica. Ela chegou ao Barra D’Or passando mal. Médicos tentaram ressuscitá-la por uma hora. O pai de Fernanda, Hernani de Freitas, diz que a filha foi levada, horas antes, ao Hospital da Barra (antiga Clínica São Bernardo) mas uma médica lhe deu alta. 

Ateliê de gravura
Artistas, entre os quais Ferreira Gullar, se movimentam contra a decisão do Viva Rio de despejar o Ateliê Villa Venturoza, criado por Rizza Conde, de um prédio na Glória, no Rio. 

Renascer das cinzas 

O Instituto Ciência Hoje, que funciona no campus da UFRJ, na Praia Vermelha, no Rio, vai doar à universidade R$ 100 mil para ajudar na restauração da capela e das demais áreas atingidas pelo incêndio de quarta passada. — Seria importante que outras iniciativas assim se somassem no apoio à UFRJ — diz Renato Lessa, presidente do ICH. 

Era pra ser...
O legado do Pan 2007 no Complexo Esportivo da Vila Militar de Deodoro, no Rio, virou desgosto. Partes das instalações para o pentatlo moderno estão ficando obsoletas. Além disso, a piscina olímpica ficou três meses com água suja, e o local de treinamento de
tiro, mal conservado, dá dó. 

Virou chique
Depois de Obama agora é a vez de Antonio Banderas, que chega ao Rio decidido a visitar uma favela pacificada. 

ZONA FRANCA

 O fotógrafo Renato Moreth abre quinta exposição “Panorâmicas” na Galeria Mariana Moura, em Recife.
 A Dress To faz festa quarta no Fórum de Ipanema com a banda Moinho.
 Hoje, representantes do Instituto sobre monitoramento socioambiental.
 Guilherme Puppin dirigiu a Associação Brasileira da Saúde (Rio) durante o encontro anual da entidade.
 Sexta, a Alerj faz sessão solene sobre a Campanha da Fraternidade. A iniciativa é do deputado Robson Leite.
 Maurício Maestro dará oficina de arranjo vocal no Centro Musical Antonio Adolfo, ainda este mês.

LUIZ AUGUSTO CARNEIRO - A doença do Brasil


A doença do Brasil
LUIZ AUGUSTO CARNEIRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/04/11

Ao ter um plano de saúde, o cidadão não abre mão do seu direito de usar o sistema público de saúde, um dever constitucional do Estado


A questão do ressarcimento ao SUS (Sistema Único de Saúde), pagamento dos planos de saúde ao governo sobre os gastos que seus beneficiários geram quando fazem uso de hospitais da rede pública, é assunto sério e deve ser amplamente discutido com o cidadão comum.
Muitos são os pontos conflitantes. O primeiro deles diz respeito ao direito do cidadão, pagador de impostos, à saúde pública. Está lá, registrado na Constituição que esse é um "direito de todos e dever do Estado", que deve provê-la por meio do "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".
Portanto, ao ter um plano de saúde, o cidadão não abre mão do seu direito de usar o sistema público de saúde. Ainda assim, as operadoras, desde 2000, vêm pagando o ressarcimento ao SUS, apesar de o questionarem na Justiça, pois o assunto ainda não foi definitivamente julgado pelo STF.
Diferentemente do que se imagina, as operadoras de saúde não lucram com o atendimento feito pelo SUS a seus beneficiários. O cálculo das mensalidades dos planos, hoje, não contempla o uso, pelos beneficiários, da rede pública.
Logo, caso o Supremo aprove o ressarcimento, haverá, inevitavelmente, um aumento no valor dos planos. Ou seja, o beneficiário passará a pagar duas vezes pelo mesmo atendimento na rede do SUS: uma via tributos e outra via mensalidade de seu plano.
O governo, sim, ganha com o ressarcimento, pois cobra das operadoras valores 60% maiores, em média, aos que o SUS paga a seus prestadores. Há também quem defenda o ressarcimento ao alegar que existe a renúncia fiscal do governo, devido à dedutibilidade tributária dos gastos com saúde incorridos pelos indivíduos e pelas empresas.
Porém, não cabe alegar renúncia daquilo que é essencialmente dedutível. As despesas com saúde dos indivíduos são dedutíveis de Imposto de Renda por serem essenciais e pelo fato de o Estado ser incapaz de lhes prover assistência à saúde de qualidade. Já as empresas, estas dependem essencialmente de seus recursos humanos para poderem funcionar e gerar riqueza.
O interesse pelos R$ 651,9 milhões referentes ao período de 2000-2006, que está em cobrança (a ANS ainda calcula os valores devidos de 2007 em diante), tem a ver com a conjuntura econômica nacional, necessitando de maior austeridade nos gastos do governo.
No entanto, se fosse pago tudo o que é cobrado pelo governo às operadoras, ainda assim o valor arrecadado representaria apenas 0,13% de todo o gasto público com saúde no mesmo período.
Além disso, o que é gasto para levantar os valores do ressarcimento certamente não compensa o que é recolhido. Contudo, o governo fala em ampliação do ressarcimento.
Centenas de outros pontos devem ser discutidos, sempre com o conhecimento da população, pois a saúde é um direito de todos. Portanto, enquanto não eliminarmos "réus" e "culpados" em francas negociações, que visem, acima de tudo, o bem-estar da população, o país permanecerá doente.

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO - Dependência e preconceito


Dependência e preconceito 
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

O ESTADO DE SÃO PAULO - 04/04/11

O começo de Dilma Rousseff na Presidência é mais bem avaliado do que foram todos os seus antecessores pós-ditadura. Considerados apenas os três primeiros meses de governo, ela supera até seu mentor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Nem por isso alguém a comparou a Hugo Chávez. A questão não é ser popular, mas como fazer uso dessa popularidade.
Para alguns, Dilma agrada mais do que Lula porque não fala diretamente ao eleitor. Sem um líder carismático, desaparece o fantasma do populismo. Sem ligação direta, os canais de intermediação entre o poder e a população readquirem influência.
Sob esse aspecto, Dilma está saindo melhor do que a encomenda para muitos dos que fizeram campanha contra ela na eleição de 2010.
Mas, do ponto de vista da maioria, essas diferenças de estilo passam batidas. Todos os indicadores da pesquisa CNI/Ibope sugerem que o governo Dilma é visto como uma extensão do governo Lula. Dele ainda emana o grosso de sua popularidade.
Além de Lula ter acabado o governo com 27 pontos de saldo a mais do que Dilma tem hoje, há uma grande diferença de intensidade. Em dezembro de 2010, para cada pessoa que dizia que o governo Lula era "ótimo", duas diziam que era "bom". No começo do governo Dilma, essa relação é de 1 para 5.
Se o empréstimo do antecessor explica a popularidade de Dilma no presente, seu futuro está condicionado ao desempenho da economia. Para sustentar sua aprovação no longo prazo, a presidente precisará diminuir a inflação e, por consequência, frear o consumo.
É um paradoxo: seu sucesso no futuro deve implicar uma perda de popularidade no curto prazo. Se isso ocorrer, não será na oposição que Dilma buscará apoio. Mas em Lula.

Combater as ideias

Estão tentando transformar Jair Bolsonaro (PP-RJ) em vítima - sob o argumento, falacioso e cínico, de que as críticas a ele pretendem cercear a liberdade de expressão do deputado.
É cínico porque Bolsonaro vive em um eterno 1.º de abril, defende até hoje a ditadura militar e, por tabela, a censura que o regime instalou no País.
É uma falácia porque nunca Bolsonaro foi tão instigado a falar quanto agora e, infelizmente, nunca foi tão ouvido. O que se discute é se o deputado deve arcar com as consequências do que diz, mesmo escondido atrás da imunidade parlamentar.
Levado ao absurdo, o argumento de que os parlamentares são inimputáveis pelo que falam no exercício do mandato permite que amanhã um deputado ou senador pregue o terrorismo ou o assassinato de adversários sem sofrer nenhum tipo de consequência. Será o preço da democracia?
Cassar Bolsonaro é legalmente complicado e politicamente duvidoso. Não apenas ele poderia posar de mártir da liberdade de expressão, como facilmente seria substituído por outros do mesmo calibre. Basta lembrar que há um Bolsonaro deputado estadual e outro vereador.
Mais importante é combater as ideias. Rechaçar o racismo, a homofobia e a ditadura. Bancar o avestruz e fazer de conta que nada aconteceu também pode ser trágico.
Após transformar em celebridade o pastor da Flórida que ameaçava queimar exemplares do Alcorão, a imprensa norte-americana baniu-o do noticiário. Para não dar visibilidade ao seu radicalismo. Como se o fato só existisse ao ser noticiado pelos meios de comunicação tradicionais. Nada mais superado.
Mesmo sem cobertura maciça da mídia, Terry Jones queimou o livro sagrado dos muçulmanos. Não foi preciso mais do que um par de fotos no Facebook e um vídeo no YouTube para que a fogueira religiosa de Jones alcançasse o outro lado do mundo. Fanáticos religiosos vigiam-se uns aos outros.
Clamando vingança pela queima do Alcorão, fundamentalistas mataram e degolaram funcionários da Organização das Nações Unidas que trabalhavam no Afeganistão. As vítimas não tinham nada a ver com as taras do pastor Jones nem com as de seus assassinos.
Essa tragédia mostra o quanto é perigoso ignorar pregações de ódio. Um discurso racista aqui, uma agressão a homossexuais acolá sinalizam que há tensões sociais se acumulando. Se não forem dissipadas, um dia elas podem explodir e espalhar estilhaços para todos os lados, inclusive onde estão os avestruzes. 

CARLOS ALBERTO SARDENBERG - Contribuição de piora


Contribuição de piora
CARLOS ALBERTO SARDENBERG
O Estado de S.Paulo - 04/04/11

Imagine que você tem uma propriedade rural com terras férteis, a uma distância razoável de um centro urbano populoso. Você pode cultivar ali hortifrútis, em associação com vizinhos, para ganhar volume, e abastecer o rico mercado próximo. Problema: não há estradas, apenas picadas pelas quais mal passa um jipe.

Suponha agora que o governo do Estado construa ali uma estrada vicinal, com bom asfalto, larga o suficiente para a passagem de furgões refrigerados. O negócio dos hortifrútis está viabilizado - ou qualquer outro negócio, de flores, por exemplo - e sua propriedade ganhou uma clara valorização.

E há meios de medir esse ganho privado com uma obra pública. Em casos assim, o governo paulista vai cobrar, sim, uma taxa sobre essa valorização - conforme anunciou o secretário estadual da Fazenda, Andrea Calabi, em entrevista ao jornal Valor na terça-feira passada.

O secretário citou outra hipótese. Imagine empresas instaladas em São Caetano, com oferta de transporte apenas local. Então, chega ali ao lado um belo trem de passageiros que parte de São Paulo, capital, e passa por alguns bairros do ABC. Obviamente, pelo menos os terrenos daquelas empresas ganham uma valorização extra. E têm de pagar a taxa.

Parece justo, não é mesmo? Uma contribuição de melhoria pode ser o nome da coisa que o governo quer cobrar. Mas por que o cidadão, as famílias ou as empresas não podem cobrar do Estado uma "contribuição de piora"?

Isso mesmo. O governo provoca malfeitorias específicas e universais. Você construiu sua residência num bairro tranquilo, e depois de um certo tempo sua casa começa a sofrer com enchentes, consequência de obras feitas ou autorizadas pelo Estado. Ou o bairro se tornou um inferno de trânsito, poluição e barulho por causa de uma ocupação desordenada, irregular e não coibida pela autoridade pública.

Para falar a verdade, se ampliarmos o olhar, o Estado no Brasil é mais malfeitor do que benfeitor. Pagamos, por exemplo, impostos elevados para ter um serviço público de saúde universal, gratuito e de qualidade, garantido pela Constituição. Se o governo entrega um serviço insatisfatório e, portanto, não cumpre a Constituição, os cidadãos e contribuintes não têm o direito de cobrar uma indenização, um ressarcimento ou coisa parecida?

Nada menos que 45 milhões de pessoas pagam planos de saúde privados, por não confiarem no Sistema Único de Saúde (SUS), administrado pelo Ministério da Saúde. Aliás, nem o pessoal que cuida do SUS confia no serviço que presta. No ano passado, o Ministério da Saúde gastou cerca de R$ 100 milhões pagando planos de saúde privados para seus funcionários.

Ora, essas pessoas que recorrem ao sistema particular deveriam receber a "contribuição de malfeitoria", pois estão pagando duas vezes pelo direito constitucional: os impostos e as prestações do seguro.

Mas ninguém está pensando nisso. Ao contrário, o ministro da Saúde quer cobrar dos planos de saúde quando algum segurado, por qualquer razão, é atendido pelo SUS.

Isso parece fazer sentido. A entidade de plano de saúde é uma instituição privada, que visa ao lucro. Se o seu segurado, seu cliente, vai ao SUS, então a seguradora deveria indenizar o sistema público. Ou seja, remunerar o SUS pelo serviço prestado, assim como a seguradora paga um hospital privado para que este atenda seu cliente.

Certo?

Errado. O segurado, o cidadão, tem o direito constitucional de ir ao SUS no momento em que quiser. Se ele, por segurança, achar melhor se garantir com um seguro privado, o governo não pode puni-lo por isso.

Sim, punir, porque, se a seguradora ou o plano de saúde precisar remunerar o SUS, isso é custo adicional, que será repassado aos clientes.

O pessoal do governo faz um discurso ideológico: as seguradoras privadas, exploradoras da saúde, querem que o SUS atenda de graça seus segurados.

Mas o segurado é, antes, cidadão. Pagando ou não o plano privado, continua tendo direito ao SUS. Assim como o cidadão que resolve pagar um fundo de pensão privado continua tendo direito ao INSS. Ou como a pessoa que estuda em escola privada mantém o direito de entrar na universidade pública. (Aliás, nem é bom falar; daqui a pouco vão querer proibir.)

Na verdade, essa ideia de cobrar das seguradoras privadas é simplesmente mais uma forma de tomar "contribuição" da sociedade civil. Revela também uma onda de estatismo ou, visto pelo outro lado, uma bronca contra tudo o que é privado, especialmente o bem-sucedido.

Depois da crise global de 2008-2009, iniciada na pátria do capitalismo, o pêndulo voltou para o lado do Estado. Intervenção do Estado na economia passou a ser a saída mágica.

E, de fato, houve muitas intervenções que funcionaram. Mas no Brasil essa onda deu num viés antiprivado e no entendimento de que a visão moderna é entregar estatais e mesmo grandes companhias privadas aos correligionários políticos.

Neokeynesianismo é entregar a vice-presidência da Caixa Econômica Federal ao peemedebista Geddel Vieira Lima porque... ora, porque ele perdeu a eleição e precisa de um cargo para continuar na política.

Enquanto isso, onde estão os aeroportos, por exemplo? A Infraero é outra que deveria nos pagar uma "contribuição de malfeitoria". No meio disso, a presidente Dilma Rousseff anuncia que pretende conceder aeroportos a empresas privadas. É por necessidade, não por ideologia: se deixar por conta dos companheiros, vamos ficar todos amontoados nos estádios e nos aeroportos da Copa.

JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL - Reflexão sobre a legalização do aborto


Reflexão sobre a legalização do aborto
JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL
FOLHA  DE SÃO PAULO - 04/04/11

Que Dilma tenha a firmeza que lhe parece característica para implementar medidas mais efetivas que a alardeada legalização do aborto no país


Muito se fala sobre legalização do aborto, sendo diversos os argumentos favoráveis: o número de mulheres vitimadas, a ineficácia da proibição, o direito da mulher sobre o próprio corpo, o viés íntimo de decidir ser mãe, a origem religiosa dessa vedação.
Na esfera jurídica, respeitáveis estudiosos sustentam ser direito fundamental da mulher abortar.
No Brasil, a lei permite o aborto quando a gravidez decorre de estupro e quando a mãe corre risco de vida. Tramita no STF a ADPF (ação de descumprimento de preceito fundamental) nº 54, visando regularizar o aborto também em casos de anencefalia, para que gestantes e profissionais de saúde tenham um pouco de segurança quando deparados com tão difícil situação.
Permitir à mulher a escolha, nas três circunstâncias acima, é justo e tem um condão humanitário.
Nenhuma mulher pode ser condenada à morte em prol da gravidez. Nenhuma mulher pode ser condenada à tortura de, no caso de estupro, conviver com o fruto da violência a que foi submetida e, na hipótese de anencefalia, passar nove meses programando a cerimônia fúnebre do próprio filho.
O Estado não tem esse direito. Espera-se que o STF tenha sensibilidade para perceber que, em casos de anencefalia, o aborto é mais sentimental que no de estupro, pois neste a mulher ainda pode escolher ter e viver com seu filho.
Mas os defensores da legalização não se contentam com essas possibilidades: entendem ser um direito fundamental chegar a um hospital público e ter o aborto praticado. Desejam, portanto, mais que a descriminalização, que implica não submeter a mulher que aborta às agruras de um processo-crime. Com todo respeito, não há direito fundamental a ceifar uma vida. E o reconhecimento de que existe vida intrauterina não tem esteio apenas em crenças religiosas, trata-se de constatação científica.
Antes de pensar em legalizar o aborto, cumpre rever a lei nº 9.263/ 96, que regula o planejamento familiar e limita consideravelmente a esterilização.
Hoje, se um médico, a pedido da paciente, a esteriliza durante uma cesariana, estará sujeito a pena de dois a oito anos de reclusão, com aumento. A punição para quem realiza aborto com consentimento da gestante é metade disso.
Também é crime esterilizar pessoa casada sem que haja anuência do seu cônjuge.
Se tiver sucesso o pleito de legalização, estaremos diante de paradoxo: a mulher não tem direito a ser esterilizada, mas pode fazer quantos abortos julgue necessários.
O Brasil elegeu uma mulher presidente da República. Que esta mulher tenha a firmeza que lhe parece característica para implementar medidas menos invasivas e mais efetivas que a alardeada legalização do aborto.
Dentre tais medidas, toma-se a liberdade de sugerir, além da revisão da lei de planejamento familiar:
1) Instituir o parto anônimo, possibilitando à gestante fazer o pré-natal e o parto sem se identificar, deixando a criança para adoção;
2) Intensificar as campanhas de prevenção à gravidez e à contaminação por doenças sexualmente transmissíveis, utilizando, inclusive, a televisão, que é concessão pública. Pesquisa do Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas) mostra que muitas mulheres acreditam que sexo anal previne gravidez e Aids;
3) Popularizar todos os métodos contraceptivos, sobretudo a distribuição e educação para o uso de preservativos. O Brasil é mais carente dessas medidas, polêmicas, porém menos que a legalização do aborto. Estamos nos distraindo discutindo o mais e deixando de fazer o menos.
JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL, advogada, é professora associada de direito penal na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

CARLOS ALBERTO DI FRANCO - Cinismo e impunidade


Cinismo e impunidade
CARLOS ALBERTO DI FRANCO
O Estado de S.Paulo - 04/04/11

Domingo, 27 de março. Três reportagens, em jornais de referência nacional, foram um banho de água fria. O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e O Globo, cada um com pauta própria, mostraram o tamanho da impunidade que algema a cidadania. Revelaram, dramaticamente, a incapacidade do Estado de punir os crimes e os malfeitos.

O Estado focou suas baterias no mensalão. Segundo informações do repórter Felipe Recondo, o processo de desmantelamento do mensalão do PT, a pior crise política do governo Lula, já tem data para começar: será a partir da última semana de agosto, quando vai prescrever o crime de formação de quadrilha. O crime, citado mais de 50 vezes na denúncia do procurador-geral da República - que foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) -, é o cerne do processo. Mas prescreverá sem que nenhum dos mensaleiros tenha sido julgado.

O primeiro sinal do desmonte do mensalão foi dado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ao deixar o governo, ele disse que sua principal missão, a partir de janeiro de 2011, seria mostrar que o mensalão "é uma farsa". A "farsa" a que se referia Lula derrubou ministros do seu governo, destituiu dezenas de diretores de estatais e mandou para o espaço a cúpula do seu partido. Encurralado, o então presidente só não caiu graças ao tamanho da incompetência da oposição. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso salvou Lula da derrocada. Quando se escrever a História isenta do Brasil, e se escreverá, bastidores projetarão muita luz. Réus do processo passaram a ocupar postos altos nas estruturas dos Poderes. João Paulo Cunha (PT-SP) foi eleito presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. José Genoino foi nomeado assessor especial do Ministério da Defesa, comandado por Nelson Jobim, ex-presidente do STF. José Dirceu, "o chefe da quadrilha" - segundo escreveu o então procurador-geral da República na denúncia em que acusou a antiga cúpula do partido do presidente Lula de se ter convertido numa "organização criminosa" -, transita com notável desembaraço nos corredores do poder.

Registro palavras proféticas do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). "Perplexos, percebemos, na simples comparação entre o discurso oficial e as notícias jornalísticas, que o Brasil se tornou um país do faz de conta. Faz de conta que não se produziu o maior dos escândalos nacionais, que os culpados nada sabiam - o que lhes daria uma carta de alforria prévia para continuar agindo como se nada de mau tivessem feito." Impressionante! A provável impunidade dos mensaleiros é a trágica sinalização da incapacidade do Estado de realizar a justiça.

Já levantamento feito pela Folha mostrou que empresas abertas em nome de outras pessoas (laranjas) são frequentemente usadas por especuladores, igrejas e políticos para obter concessões de rádio e TV em licitações do governo federal. A jornalista Elvira Lobato, em matéria bem apurada, analisou os casos de 91 empresas que estão entre as que obtiveram o maior número de concessões entre 1997 e 2010. Dessas, 44 não funcionam nos endereços informados ao Ministério das Comunicações. Entre seus "proprietários", informa a reportagem, constam, por exemplo, funcionários públicos, donas de casa, cabeleireira, enfermeiro, entre outros trabalhadores com renda incompatível com os valores pelos quais foram fechados os negócios.

Mas o mais estarrecedor, de longe, foi a reação do governo à reportagem. O secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, Genildo Lins de Albuquerque Neto, num jogo clássico de empurra, disse que a investigação cabe à Polícia Federal e que não há lei que impeça desempregado de abrir uma empresa. Fantástico! O governo, formalmente, declara-se incompetente para combater a fraude.

Por sua vez, O Globo, em sólida reportagem especial, traçou um retrato de corpo inteiro das fraudes do Sistema Único de Saúde (SUS). Criado em 1990 para assegurar o pleno atendimento médico-hospitalar à população, o SUS, cantado por Lula como um dos melhores do mundo, transformou-se num dos maiores ralos da corrupção. A reportagem de Roberto Maltchik mostra que investigações administrativas do Ministério da Saúde e da Controladoria-Geral da União (CGU), concluídas entre 2007 e 2010, apontaram desvios de R$ 662,2 milhões do Fundo Nacional de Saúde. O rombo pode ser bem maior, pois somente 2,5% das chamadas transferências fundo a fundo são fiscalizadas, de acordo com a CGU. De acordo com a reportagem, "gestores do Ministério da Saúde ouvidos no anonimato, técnicos de controle, procuradores e promotores afirmam que a pasta se satisfaz com relatórios que ninguém lê e não toma providências para conferir sua veracidade. O Sistema Nacional de Auditoria do SUS, que prevê a criação de grupos de controle, nunca saiu do papel".

Na área da saúde pública, como se pode ver, o Estado também é leniente com os malfeitos e incapaz de combater a impunidade. Mas, voraz como sempre, movimenta os bastidores para recriar a CPMF. Pode anotar, amigo leitor: tentarão recriar o imposto. É só uma questão de oportunidade e de tempo.

O último parágrafo deste artigo, uma amostragem da incompetência do Estado, deveria estar marcado pelo desalento. Mas não está. Estou convencido de que a imprensa brasileira, com seus equívocos e limitações, tem papel decisivo na recuperação ética. É aí que reside o meu otimismo. Jornalismo de qualidade é o melhor antídoto contra a corrupção e a bandidagem. E um governo que quer acertar só pode louvar o trabalho de repórteres éticos e competentes.

EDUARDO GRAEFF - Outras reformas


Outras reformas
EDUARDO GRAEFF
O Estado de S.Paulo - 04/04/11

Falou em reforma política, pensou no Congresso Nacional, não é? Como se a reforma política fosse problema só do Congresso. Ou, pior, como se o Congresso fosse "o" problema da reforma política.

Quem trata o Congresso como a Geni da República tem seus motivos. Nem sempre são os melhores. Um dos mais típicos e tortos é desviar as pedras do seu próprio telhado de vidro. Pense nos políticos que mais prejudicaram o País. A sua lista pode ser muito diferente da minha. Mas duvido que tenha mais congressistas que presidentes. Trezentos picaretas no Congresso (se Lula contou direito) incomodam muita gente. Mas, convenhamos, um picareta no Planalto incomoda muito mais.

A democracia tem dois remédios básicos para corrigir os erros dos governantes: eleições livres e divisão de Poderes. Nossa jovem democracia tem passado razoavelmente bem no teste das urnas. No teste da divisão de Poderes, nem tanto. O que torna o Planalto, e não o Congresso, na minha opinião, o foco das nossas mazelas políticas é a concentração excessiva do poder nas mãos do presidente.

Uma reforma eleitoral vale a pena se fortalecer o Congresso com uma injeção de legitimidade. Mas há outras formas de atacar a concentração do poder. Cito três.

O excesso de cargos de livre nomeação no Executivo é um convite ao loteamento político e um perigo para a boa gestão. Chamá-los "cargos de confiança" é brincadeira de mau gosto. Grande parte deles é ocupada por tipos suspeitos com uma única missão: arrecadar fundos para seus padrinhos. A lei precisa limitar o número desses cargos e estabelecer critérios e procedimentos transparentes para o preenchimento dos que restarem, tanto nos Ministérios como nas empresas estatais. O presidente deveria ser o primeiro a agradecer se puder invocar limites da lei contra exigências descabidas dos aliados, a começar por seu próprio partido. Lula talvez não mergulhasse tão fundo, primeiro no "mensalão", depois no loteamento político, se não tivesse de saciar o apetite do PT em primeiro lugar. E por que os outros aliados deixariam por menos?

As medidas provisórias continuam a ser uma excrescência numa Constituição democrática. Na língua da burocracia que as inventa, os critérios de urgência e relevância traduzem-se por negligência e prepotência. Transparência? Esqueça. Como as comissões especiais do Congresso nunca se instalam, as medidas provisórias são emendadas e votadas sem terem sido discutidas publicamente. O resultado são leis quase sempre mal feitas e às vezes mal-intencionadas, com penduricalhos que aparecem misteriosamente pelo caminho. Não sei se o melhor seria acabar com elas ou tentar mais uma vez disciplinar seu uso, o que a Emenda Constitucional n.º 32 não conseguiu. O que não dá é para ignorar o problema.

Depois dos avanços da Constituição e da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), está em curso um retrocesso em matéria de controle das despesas públicas. O Executivo refaz o Orçamento por medida provisória, ignorando a Constituição e driblando o Congresso. A explosão dos restos a pagar, os furos na meta de superávit primário, a emissão de dívida pública camuflada de injeção de capital nos bancos federais criaram um orçamento por fora do Orçamento. É preciso dar um freio de arrumação nessa "contabilidade criativa". O governo federal enquadrou os Estados e municípios, mas até hoje não quis enquadrar a si mesmo nos limites de endividamento previstos pela LRF. Falta uma resolução do Senado para isso. Talvez tenha chegado a hora de pensar seriamente em trocar o Orçamento autorizativo (o Congresso aprova e o Executivo gasta se quiser) por um Orçamento impositivo (o Congresso aprova e o Executivo é obrigado a gastar).

Sei das dificuldades para uma pauta como essa avançar no Congresso. O único projeto político real do PT é a sua própria hegemonia. Independência e equilíbrio de Poderes, só para os Estados e municípios onde ele é oposição. Os demais partidos governistas são, sabe como é, visceralmente governistas. Podem recobrar algum brio se o governo tropeçar na economia ou em algum escândalo mais escabroso. Mas, fora exceções honrosas, os parlamentares "da base" trocam sem problema as prerrogativas do Congresso por favores do Executivo.

Sobra a oposição. Hoje ela não tem número para fazer a pauta de deliberações do Congresso. Mas tem recursos para ao menos provocar o debate e manter acesa a expectativa de mudanças. Tem convicções autenticamente democráticas, para começar; acredita mais em alternância e divisão de Poderes do que em hegemonia. Tem acesso à tribuna e à mídia, tanto mais quanto mais consistentemente for capaz de criticar o atual estado de coisas. Tem a atenção da opinião pública que se importa com coisas como democracia e transparência; mais que isso, tem a responsabilidade de não deixar órfão politicamente quem acredita nesses valores. Por último, mas importante, a oposição tem o que mostrar nos governos que comandou e comanda.

Mais de 20 anos de experiência da democracia deixaram o cidadão eleitor mais cético. Não basta falar contra o loteamento político, o desrespeito às instituições e a falta de transparência. Também não basta propor alternativas. É preciso mostrar vontade e capacidade de fazer.

Os partidos hoje na oposição ao governo do PT podem legitimamente reivindicar a paternidade de quase todos os avanços e inovações democráticas que o Brasil experimentou desde a Constituinte. Transformar esse patrimônio histórico em ativo político presente não deveria ser mais difícil do que vender bravatas e clichês ideológicos surrados. Principalmente se a oposição for capaz, como em geral tem sido, de produzir mais avanços e inovações nos Estados e municípios onde é governo. Quem quer liderar mudanças dá o exemplo.

MÔNICA BERGAMO


LULA QUER 'NEW FACE'
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/04/11

Lula trabalha para que o candidato do PT à Prefeitura de SP seja um "nome novo", com boa comunicação com a classe média da cidade. No perfil se encaixam ministros como Fernando Haddad (Educação), Alexandre Padilha (Saúde) e José Eduardo Cardozo (Justiça), que já esteve estremecido, mas refez os laços com o ex-presidente.

CINTURÃO
O PT tem como desafio nas eleições de 2012 elevar a sua votação entre a classe média de regiões como Santo Amaro, Ermelino Matarazzo, Butantã, Pirituba e Vila Prudente, onde a legenda teve em média 40% dos votos.

NA FILA

Apesar da movimentação e da preferência de Lula, Aloizio Mercadante e Marta Suplicy continuam no páreo. Mercadante tem dito a interlocutores que só aceita disputar a sucessão municipal caso sua candidatura tenha a bênção firme do ex-presidente e de Dilma Rousseff.

SERRA LÁ

Já o PSDB municipal trabalha cada vez mais com a possibilidade de José Serra ser o candidato do partido à prefeitura em 2012. Os tucanos da capital consideram mais provável a hipótese de que ele não presidirá o partido, ficando fora do cenário nacional. A candidatura municipal seria um destino natural. Há também o fator Gilberto Kassab, cuja liderança e a pretensão de transformar seu novo partido, o PSD, numa legenda de certa relevância, só vingam se ele conseguir fazer o sucessor. Serra seria o nome mais forte.

BRAÇO CRUZADO
Os médicos de todo o país estão sendo conclamados a aderir a uma paralisação nacional contra os planos de saúde nesta quinta-feira. Lançada pelas principais entidades que representam os doutores (Conselho Federal de Medicina, Associação Médica Brasileira e Federação Nacional dos Médicos), a campanha pede que eles cruzem os braços e não atendam pacientes dos convênios.

BARATO
As associações afirmam que a paralisação terá a finalidade de pressionar, entre outras coisas, pelo "fim da intervenção antiética dos planos na assistência ao paciente" e "honorários profissionais dignos".

A CASA DE CLÔ 1
A morte de Clodovil já fez dois anos e nada da Casa Clô, orfanato para o qual ele legou seus bens. A advogada do estilista, Maria Hebe de Queiroz, diz que a fundação só poderá ser criada após o desfecho de todos os processos movidos contra e em nome de seu cliente. Segundo ela, só Marta Suplicy, que ganhou uma ação depois de ser xingada por ele na TV, ainda tem que receber R$ 200 mil de indenização.

A CASA DE CLÔ 2
Enquanto isso, cerca de R$ 10 mil da herança são gastos por mês com "o mínimo de manutenção necessária" da casa onde ele viveu, em Ubatuba. Quatro funcionários cuidam de podar as plantas, alimentar os pastores alemães da propriedade e limpar a piscina.

MILITAR POR ALENCAR
O prefeito de São Bernardo do Campo, o petista Luiz Marinho, quer mudar o nome da avenida 31 de Março, no bairro da Vila Pauliceia, para avenida José Alencar.

Se a proposta vingar, a via perderá a data do golpe de 1964 e homenageará o ex-vice-presidente - que foi cremado no dia 31 de março.

MADAME CHANEL

Rui Mendes

A cantora Pitty posou vestida como a estilista francesa Coco Chanel, em visual dos anos 20, para a campanha de inverno da grife de moda jovem Cavalera. A marca, com direção criativa de Alberto Hiar, elegeu ícones da moda para homenagear. O baterista Iggor Cavalera fotografou imitando uma cena do estilista inglês Alexander McQueen, morto em 2010.

NA REAL
A abertura do festival É Tudo Verdade, fundado e dirigido por Amir Labaki, aconteceu no Cine Livraria Cultura. O cineasta Jorge Bodanzky e a atriz Débora Duboc estavam entre os convidados. O documentário sueco "The Black Power Mixtape", de Göran Hugo Olsson, abriu a mostra.

TELA DA GAROA
Sérgio Bianchi venceu nas categorias melhor filme e melhor diretor por "Os Inquilinos - Os Incomodados que se Mudem" no Prêmio de Cinema Paulista, na Fiesp. A atriz Cláudia Missura estava no evento.

CURTO-CIRCUITO
Fernanda Eva expõe pinturas na Mercearia São Roque do Itaim. A partir das 19h.

O Cristo Redentor , o Monumento às Bandeiras, o Congresso Nacional e outros marcos mundiais ganharão iluminação em azul até quinta, em razão do Dia Mundial de Conscientização do Autismo, estabelecido pela ONU.

A chef Paola Carosella estreia amanhã cardápio de almoço no restaurante Arturito, em Pinheiros.

O projeto Back2Black, de música e arte, foi selecionado pelo Programa Oi de Incentivos para se apresentar na Olimpíada de Londres.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

LUIZ FELIPE PONDÉ - O parque temático do bem


O parque temático do bem
LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SÃO PAULO - 04/04/11


Por que existem guerras? Porque gostamos de matar. Resposta pouco simpática, mas definitiva.

Penso como o crítico literário norte-americano Edmund Wilson (século 20): as guerras não são causadas primariamente por razões políticas ou econômicas, estas são apenas o que na filosofia chamamos de "causas ocasionais" (isto é, a oportunidade que aparece para realizarmos as verdadeiras causas primárias de nossas atitudes).

A verdadeira causa primária é biológica: gostamos de matar e pronto.

O governo britânico lançou na mídia imagens de seus aviões bombardeando tanques das forças pró-Gaddafi na Líbia. Imagens como essas dão crédito para o marketing moral e político do Reino Unido: "Olhem como não matamos civis, somos legais".

Perguntado certa feita sobre a morte de civis em combate, o primeiro-ministro de Israel Bibi Netanyahu teria dito "Alguém perguntou aos britânicos quantos civis alemães mataram em seus bombardeios?".

Todo mundo sabe como guerra é, mas hoje em dia querem dizer que guerra pode ser combatida puxando o cabelo do inimigo. O mundo virou um "parque temático do bem".

O marketing é a ciência definitiva do inicio deste século. Se quisermos entender a política e a moral, devemos voltar nossos olhos para o marketing e não mais para a sociologia ou para a ciência política. Estas são ciências caducas para as sociedades contemporâneas.

Desde o século 18 a filosofia política, em grande parte, virou conversa de "teenager". Coisas como "o homem é bom e a sociedade o perverte" é conversa para boi dormir.

Sabe-se desde as cavernas que a vida moral comporta um tanto de hipocrisia, sem a qual seríamos obscenamente amorais. Mas o problema é que, desde Rousseau, a hipocrisia contaminou o mundo da filosofia política. Por quê? Porque ele criou a política para o mundo como parque temático do bem.

É ridículo ver como a classe intelectual, artística, e muitos profissionais da mídia se acham uma reserva moral da sociedade. Hábito nefasto porque corrói o pensamento público desde a raiz. Faz de cada um de nós um marqueteiro de nosso próprio pensamento.

Intelectuais, artistas e jornalistas aderiram a todas as diferentes formas de totalitarismos desde o século 18. Mas não todos, graças a Deus e a coragem de alguns de resistir às glórias de fazer parte da torcida e do rebanho.

Mas a mentira social não é privilégio da elite intelectual de um país. Se René Descartes, filósofo francês do século 17, disse que a razão foi dada a todos os homens em "quantidades iguais", deveríamos acrescentar, mais ao modo de outro filósofo francês do século 17, Blaise Pascal, que o pecado, sim, foi dado a todos em "quantidades iguais".

Aliás, suspeito que a razão não foi dada em "quantidades iguais" a todos os homens, mas, sim, o pecado.

Nada disso significa que devemos bater palmas para as guerras. Significa que devemos resistir à praga do modo "teenager" de pensar e dizer a verdade: gostamos de matar.

O argumento de Rousseau segundo o qual temos um "sentido empático" para o sofrimento alheio (isto é, sentimos junto com o outro seu sofrimento e daí agimos em defesa dele) é uma piada de mau gosto. Só reagimos à violência quando ela põe a nós mesmos (ou nossos interesses) em risco.

Sabe-se muito bem que filhos e cônjuges de pessoas que ajudaram vítimas do nazismo (ou qualquer outro sistema de violência) detestavam a atitude moral do "idiota da família" que colocava o cotidiano da família em risco para ajudar estranhos. Sempre que situações como essas se repetirem, a maioria esmagadora das pessoas fará o mesmo. E odiará quem não fizer.


Muita gente sai gritando quando isto é dito, movida apenas, em segredo, pela sagrada mentira social que sustenta a imagem pública de nós mesmos.

Genocídio é um horror, mas é a constante da humanidade e não a exceção. Preste atenção: quantos períodos históricos existiram sem algum genocídio? Nenhum ou talvez alguns minutos.

Cada um de nós está sentado sobre ossos. Ganhamos tecnologia, dinheiro, ciência e espaço com guerras. O gosto de sangue é o motor da história.