sexta-feira, dezembro 23, 2011

A invisível presença chinesa - RODOLFO LANDIM


FOLHA DE SP - 23/12/11


O modelo chinês de produção visa gerar o máximo de empregos para o país e ganhar mercados

Já há alguns anos, temos ouvido falar sobre a impressionante taxa de crescimento da economia e do parque industrial chinês, que, por incrível que pareça, mesmo depois de décadas, continua a produzir uma parcela cada vez maior dos produtos manufaturados do planeta.
O modelo chinês baseia-se em produzir internamente buscando a máxima geração de empregos para o país, aproveitando a competitividade gerada pelo baixo custo de mão de obra, e ganhar mercados. O seu sucesso associado à forte centralização do poder econômico nas mãos do Estado levou o país a uma condição extremamente favorável em termos de reservas cambiais e poder de investimento.
Com o passar do tempo, ficou claro um grande desafio a ser vencido para a continuidade do sucesso desse modelo: o acesso a matéria-prima. Assim, os chineses começaram a buscar oportunidades para assegurar o suprimento do seu país onde elas estivessem disponíveis e da forma que fosse possível.
No caso da África, onde há poucas barreiras de entrada e carência de profissionais capacitados, o que se viu foi a chegada de uma gigantesca quantidade de trabalhadores chineses atrelados a projetos de extrativismo mineral e agrícolas.
Já com o Brasil a situação é bem diferente. Apesar de termos mantido um forte comércio com a China, principalmente por meio da exportação de minério de ferro e de soja e da importação de carvão e de material eletroeletrônico, até bem pouco tempo atrás o investimento chinês no Brasil era praticamente inexistente. Essa situação começou a se modificar há alguns anos com a aproximação dos dois governos, algo necessário já que as decisões de investimento na China são centralizadas. E o setor de petróleo, estratégico para aquele país, foi até agora o principal alvo.
No entanto, o modelo de atuação precisava ser outro. Ao criar a política de conteúdo local, o Brasil estabeleceu como prioridade o desenvolvimento da sua própria indústria para suprir esse setor. Isso tanto impede a atuação chinesa nos moldes africanos como limita a exportação de produtos para cá.
Em 2009, quando o mundo ainda vivia os reflexos da grande crise de 2008, o Banco de Desenvolvimento Chinês forneceu empréstimo de US$ 10 bilhões à Petrobras tendo como garantia o fornecimento de 200 mil barris de petróleo por dia à China até 2019. Posteriormente, os chineses adquiriram da Repsol 40% das participações em concessões que a empresa detinha no pré-sal, em consórcio com a Petrobras, por US$ 7,1 bilhões. No mês passado, concordaram em pagar US$ 3,54 bilhões por 30% das participações da Galp em blocos da mesma área e agora se lançam na captura das participações da BG, outra consorciada da Petrobras no pré-sal.
A estratégia parece ser a de garantir o suprimento de petróleo ao país fazendo um hedge de longo prazo a preços baixos. Se somarmos o que vem sendo pago pelos direitos de concessão do pré-sal aos investimentos necessários ao desenvolvimento dos campos de petróleo, custos operacionais e impostos, chegaremos a valores bem inferiores aos preços de petróleo hoje praticados. Certamente, esses serão investimentos bem mais atrativos do que os títulos do Tesouro americano com os quais a China está abarrotada.
Já a tática parece estar voltada para associações em que a presença do governo brasileiro possa ser sentida. Isso explica terem deixado de lado outras oportunidades de associação no setor e escolhido exatamente aquelas onde estariam juntos à Petrobras como operadora.
Mas, se por um lado a Petrobras ganha indiretamente parceiros altamente capitalizados para desenvolver o pré-sal, a União pode estar perdendo. Se os leilões que foram interrompidos há três anos estivessem sendo realizados, a escolha chinesa poderia ser a busca de uma associação direta e de primeira hora com a Petrobras, pagando altos bônus de assinatura à União em vez de ter de optar pelas alternativas disponíveis no mercado, talvez pagando um prêmio estratégico.
O quanto isso poderá reduzir o sucesso dos futuros leilões dependerá do apetite chinês e da agilidade brasileira.

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