quarta-feira, novembro 30, 2011

Parece eterno - ALON FEUERWERKER



CORREIO BRAZILIENSE - 30/11/11


O brasileiro tem problemas para pagar as dívidas porque elas custam muito caro. E não é que elas custem caro pela dificuldade de cobrá-las. Aqui, sabe-se com precisão que a galinha nasceu antes do ovo. O sujeito fica inadimplente tentando pagar a dívida, e não porque tentou escapar dela



O Comitê de Política Monetária está reunido para analisar e decidir mais um corte no juro básico, a taxa que o governo paga a quem lhe empresta dinheiro. É algo mais complicado que isso, mas simplificar não chega a ser crime capital. Como ensinam os grandes líderes, o primeiro passo para tentar explicar a realidade é buscar simplificá-la. 
O Copom vem num bom momento, por ter vencido o cabo de guerra contra quem meses atrás criticou a decisão de começar a baixar radicalmente o juro básico, mesmo com a inflação inquieta. 
Deu certo. A inflação anda razoavelmente comportada, no teto da meta. Que foi aliás o prometido pelo Banco Central. 
As projeções para 2012 continuam aquecidas, é verdade, mas até o fim do ano que vem o BC tem margem para manobrar. Pois a promessa do BC é que o ritmo dos preços convergirá daqui a doze meses para 4,5%. 
Mesmo num país desmemoriado, como o nosso, é promessa com boa chance de ser cobrada. 
A antecipação do BC e do governo evitou que a mediocridade econômica, uma provável marca registrada deste quadriênio, virasse estagnação instantânea. 
E o governo Dilma Rousseff ganhou espaço operacional para pelo menos apresentar resultados não nulos nesse campo. Politicamente será um ativo. 
Para uma nação que abandonou o desenvolvimentismo e agora faz o jogo do contente, 3% pode até ser apresentado como trunfo. 
O governo Dilma beneficia-se de sermos um país com baixas expectativas. Aceitamos, por exemplo, e bovinamente, que o limiar da classe média fique num nível baixo, e daí festejamos o ingresso de milhões nessa mesma classe média. 
Por falar em juros, e não é a primeira vez que escrevo aqui, impressiona a nossa passividade diante das taxas cobradas do investidor e do consumidor. Com a notável exceção de quem tem acesso ao subsidiado. 
Isso explica em parte. O Brasil pratica um juro para quem tem poder e outro para quem não tem. E sobra a estes últimos reclamar, sem o mesmo impacto que haveria caso os primeiros estivessem no barco. 
O juro extorsivo já recebeu diversas explicações entre nós. Disseram que a coisa melhoraria com a introdução de novos mecanismos legais, como a lei de falências e o cadastro positivo. Aguardam-se os resultados. E convém esperar em posição confortável. 
Outro mantra diz que o brasileiro paga muito juro pois é muito inadimplente. Mas ninguém prova que somos mais caloteiros, na comparação. Eu aposto que é o contrário. O brasileiro tem problemas para pagar as dívidas porque elas custam muito caro. 
E não é que elas custem caro pela dificuldade de cobrá-las. Aqui, sabe-se com precisão que a galinha nasceu antes do ovo. O sujeito fica inadimplente tentando pagar a dívida, e não porque tentou escapar dela. 
É uma encrenca resistente. Parece insolúvel. Só parece, pois outros povos já a resolveram. Mas aqui prefere-se o esconde-esconde. Finge-se que tudo vai bem. A espoliação financeira é apresentada como um dado da natureza. 
Como o sol que nasce e se põe todo dia. 

O estiloHá uma certa tensão no Congresso, instado a votar a Desvinculação de Receitas da União (DRU) e pressionado a não emendar muito a peça orçamentária. 
Cerca de R$ 20 bilhões resolvem o problema das emendas, enquanto a DRU, no cálculo realista, vai dar de mão beijada pelo menos R$ 100 bilhões para o Executivo gastar como quiser. 
Ou seja, se houver vontade política resolve-se. Inclusive porque atenderia a segmentos dentro do governo, os insatisfeitos com o andar da carruagem. 
E porque o governo executa ou não as emendas parlamentares conforme a conveniência dele. 
Uma dificuldade, no Congresso, tem sido costurar a solução. Outra dificuldade é descobrir quem, no poder, pode efetivamente ajudar a resolver politicamente a coisa. 
É a primeira negociação orçamentária do governo Dilma. Vai servir para identificar um estilo. Se mais ou menos imperial. 
Até onde os lados vão esticar a corda? O governo tem os restos a pagar como um colchão de começo de ano. O Congresso só tem os problemas que pode causar ao governo. 

FériasAo longo de dezembro estarei em férias. Obrigado pela audiência, boas festas e um ótimo 2012.

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