terça-feira, novembro 22, 2011

Impasse gigante - MIRIAM LEITÃO



O Globo - 22/11/2011


De novo, a sombra da dívida americana ameaça a economia mundial. O supercomitê dos dois partidos admitiu ontem que fracassou a negociação para reduzir o gasto público de longo prazo. Parte desse aumento do déficit americano foi resultado de políticas de transferências governamentais para manter o consumo; mas a fatia do leão continuou indo para os militares.

Os gastos militares em 2010 atingiram o maior patamar da história, consumindo US$690 bilhões. O déficit mensal médio do governo americano nos últimos 12 meses foi de US$105 bi. A dívida chegou a US$15 trilhões. As contas públicas americanas estão fora da ordem nessa desordem mundial. Houve despesas que evitaram o aprofundamento da recessão. O problema é que apesar do gasto a ameaça de queda da atividade da economia americana continua rondando.

Em agosto, quando ocorreu o impasse da elevação do teto da dívida, foi feito um acordo político que incluía a criação desse comitê no Congresso, com integrantes dos dois partidos, para saber onde cortar US$1,3 tri em 10 anos. O ambiente político polarizado produziu o impasse. O prazo para o novo acordo termina amanhã, mas tem que ser apresentado ao Congresso com 48 horas de antecedência.

Além disso, na negociação anterior ficou acertado que se o comitê não chegasse num acordo haveria cortes maiores nas despesas militares. Um dos problemas da redução de certos gastos é que eles podem reverter a incipiente recuperação - hoje por volta de 2% de alta no PIB. Sem as transferências governamentais, a renda disponível das famílias estaria em patamar menor (vejam no gráfico). No final do ano, dois programas perdem a validade - o da redução do imposto de renda; e o que amplia o prazo de recebimento de seguro-desemprego. Pelos cálculos do Bank of America, se os programas forem suspensos cerca de US$130 bi não chegarão aos consumidores.

O banco aumentou a probabilidade de recessão no ano que vem, de 35% para 40%. Isso apesar dos bons números do comércio nos últimos dois meses, que tiveram aumento de vendas de 8%, anualizado. A poupança das famílias que em 2008 chegou a 6,2% caiu para 4,1%, no último dado disponível, e isso significa que o fôlego para continuar comprando está menor. Também está crescendo a possibilidade de contágio da crise europeia.

"Não acreditamos que os fundamentos darão suporte à melhora dos dados de consumo. O crescimento da renda é lento, o crédito está apertado, a poupança está mais baixa. Mas o maior risco vem de um transbordamento da crise europeia", escreveu o banco em relatório.

O Bank of America prevê desaceleração do PIB americano de 2012 para 2013, de 2% para 1,4%. O preço das residências deve cair 8% este ano, ficando 38% mais baixo que o pico, de 2006. O economista Roberto Prado, do Itaú BBA, explica que há três forças empurrando a economia americana para baixo: o corte de gastos; a redução do consumo na Europa e no mundo; a piora do crédito e do sistema financeiro. Por isso o presidente Obama está lutando para prorrogar as transferências de renda.

- Quando se falava de calote na Grécia, o risco para o sistema financeiro americano era pequeno. Agora, as perdas que os bancos estão tendo com os títulos soberanos já são significativas. O aumento dos juros de Espanha, Itália e França mexe com o balanço de bancos que carregam esses papéis. Isso dificulta a capacidade deles se alavancarem - disse Prado.

A Europa consome 14% das exportações americanas. Ainda assim, Prado explica que o efeito da crise será maior porque o consumo mundial como um todo ficará menor:

- A Europa é muito aberta e ela vai afetar o desempenho de outros países que compram dos EUA.

O mundo conseguiu produzir este ano uma quantidade expressiva de problemas, impasses, riscos, ameaças. Não há quem fique blindado contra isso. No Brasil, o crescimento veio minguando ao longo do ano deixando as empresas confusas sobre como se preparar para 2012.

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