sexta-feira, setembro 23, 2011

CLAUDIA SAFATLE - Taxa de câmbio pode subir de patamar


Taxa de câmbio pode subir de patamar
CLAUDIA SAFATLE
VALOR ECONÔMICO - 23/09/11

Após a inesperada desvalorização do real, consecutiva desde o dia 1º de setembro, a expectativa do governo, no curto prazo, é de que a taxa de câmbio se estabilize num novo patamar, ao redor de R$ 1,70. Isso só viria a ocorrer, porém, num prazo de oito a dez dias, tempo suficiente para que os fundos de hedge, que ainda carregam posição vendida em cupom cambial da ordem de US$ 13 bilhões, se desfaçam desses contratos. Essa seria, inclusive, uma das muitas razões para explicar por que, em meio à crise externa, a desvalorização do real tem sido maior do que as das demais moedas frente ao dólar.

Enquanto o real teve nesses 23 dias uma depreciação de 16,31%, a valorização do dólar perante uma cesta de moedas foi de 6,01% no mesmo período. A aversão ao risco provocada pelo agravamento da crise na Europa, portanto, justifica um pedaço da história, mas não toda ela.

Especialistas em câmbio do governo e do mercado enumeram um conjunto de fatos que estariam na raiz da parcela de depreciação exclusiva do real. Uma delas é o fato de o BC do Brasil ter sido o primeiro a iniciar o processo de corte da taxa de juros. Mas há outros: a incidência de IOF sobre o mercado de derivativos afastou os vendedores de dólar, comprometendo a oferta, numa medida que se revela hoje inoportuna; por ser caro, as empresas que se endividaram em dólar deixaram para fazer "hedge" no último momento, pressionando os preços; há o temor de que, de uma hora para outra, haja a liquidação dos US$ 100 bilhões em fundos japoneses de varejo aplicados em real ("toshin"); e, assim como ocorreu em 2008/2009, há o receio, também, de uma repatriação importante de capitais de filiais brasileiras de empresas americanas e europeias.

A esse leque de motivos, fontes do mercado sublinham duas ações do governo que geraram muitos ruídos e dúvidas sobre o que quer mesmo a gestão da presidente Dilma Rousseff para a economia. Uma foi a decisão do Copom, menos pela redução da taxa em si ainda muito elevada (de 12% ao ano) e mais por fomentar a percepção de que o governo trocou o controle da inflação pela preservação do crescimento. Outra foi a polêmica medida de elevação do IPI para os carros importados. A decisão foi lida tanto no mercado financeiro quanto no setor real como uma declaração do governo de que, a partir de agora, não há mais regras estáveis nem previsibilidade no país.

Mesmo após a venda de US$ 2,7 bilhões no mercado futuro pelo BC, ontem, por meio de operações de swap, o dólar fechou em alta de 1,61%, cotado a R$ 1,8950.

O movimento no mercado de câmbio, porém, não é motivo só de preocupação para a área econômica. Uma face do governo, mais preocupada com a indústria doméstica, celebra a perda de valor do real que animou os exportadores. O fluxo de moeda estrangeira decorrente de operações comerciais chegou a US$ 14,3 bilhões na primeira metade do mês de setembro. Uma soma considerável, equivalente a praticamente todo o fluxo de igual mês do ano passado (de US$ 14,7 bilhões).

Não há clareza, porém, dos custos da depreciação para a inflação. Tudo dependerá de onde a taxa de câmbio vai se estabilizar e por quanto tempo. Sabe-se, hoje, que a desvalorização da moeda tem impacto menor sobre a inflação doméstica do que no passado (sete ou oito anos atrás). Tudo o mais constante, como raciocinam os economistas, o "pass through" cambial é de 2% a 3% no curto prazo (um trimestre) e de 7% a 8% no longo prazo (período de um ano). Assim, uma depreciação de 10% por um ano agregaria algo como 0,7 ponto percentual na inflação. Só que nada é constante num mundo em crise aguda, sob risco de default de países da Zona do Euro e recessão.

Quando, conforme a ata da última reunião do Copom, o Banco Central elaborou um cenário alternativo, incorporou nele uma certa depreciação do real. O BC não explicitou de quanto seria esse movimento, mas não se espera nada parecido com o que ocorreu em 2008/2009, quando a cotação do dólar frente ao real saiu de R$ 1,60 para R$ 2,50.

Desde o início do ano que o BC vinha alertando os mercados para uma possível "virada" no câmbio. Em janeiro criou o limite de US$ 3 bilhões para a posição vendida dos bancos em dólar no mercado à vista, a partir do qual incidiria o compulsório. Em julho, reduziu esse limite para US$ 1 bilhão. No mercado futuro, porém, o BC não atua com a mesma desenvoltura que no spot, que é um mercado dos bancos.

Ontem, de Washington o presidente do BC, Alexandre Tombini, monitorou as ações da autoridade monetária e a evolução do mercado e o diretor de Política Monetária, Aldo Mendes, que estava de malas prontas para embarcar para os EUA, onde ocorre a reunião anual do FMI/Banco Mundial, cancelou a viagem para conduzir as operações de swap.

O diretor disse, no fim do dia, que o BC continuará atuando no mercado futuro por meio de operações de swap cambial, "enquanto entender que as condições de liquidez nesse mercado não são as adequadas". Ou seja, enquanto houver alta volatilidade da taxa de câmbio o BC continuará vendendo dólar.

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