quinta-feira, setembro 01, 2011

CELSO MING - Engasgado no álcool


Engasgado no álcool
CELSO MING 
O Estado de S.Paulo - 01/09/11

A decisão do governo de reduzir de 25% para 20% o teor do álcool anidro na mistura com a gasolina não passa de paliativo. É um jeito de passar o recado de que se está fazendo alguma coisa.

O setor do açúcar e do álcool está em plena safra no Centro-Sul (87% da produção nacional) e todos os números (menos os do consumo) embicam para baixo. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), por exemplo, que faz levantamentos em escala nacional, prevê quebra de 5,6% na atual safra de cana-de-açúcar. A Unica, que reúne interesses de grande grupo de produtores, calcula redução de 4,4% no Centro-Sul. E a consultoria independente Canaplan também projeta perdas no Centro-Sul, em 14,5%.

Os problemas não se limitam à obtenção de massa verde, mas se concentram aí. Em parte, essa quebra de safra é creditada às condições climáticas adversas. No entanto, o principal motivo é a falta de investimento nos canaviais.

Um punhado de fatores vem sendo responsabilizado pelo problema. Os principais são o aumento de custos da produção (preços da terra, do equipamento e da mão de obra) e, simultaneamente, o achatamento dos preços do álcool. Por corresponder a 70% do poder energético da gasolina, sempre que os preços do álcool batem no teto dos 70% nos da gasolina o consumidor enche o tanque do seu carro flex (40% do mercado) com gasolina. Ou seja, o achatamento dos preços da gasolina, determinados pelo governo, desestimulam a produção de cana-de-açúcar. Enfim, o consumo de álcool cresce 5% ao ano e, no entanto, a produção está em queda, como mostra a tabela da Canaplan.

Reduzir de 25% para 20% o álcool anidro na mistura com a gasolina ficou longe da solução. O álcool anidro corresponde a apenas 35% da produção total de álcool. Significa que essa economia não passa de 1,75% do total. É uma decisão discutível sobre outros aspectos, mas, especialmente, por mais dois: não resolve o problema; e aumenta o consumo de gasolina - que, hoje, a Petrobrás também importa.

As projeções sobre oferta de etanol variam de instituição para instituição, mas são todas negativas. A Conab prevê uma redução de 14,1%; a Única, de 17,3%; e a Canaplan, de 22,4%. Em todo o caso, a redução de álcool anidro na mistura carburante reflete uma evolução positiva na política do governo federal. Há alguns meses, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão - que pouco entende de assuntos sucroalcooleiros -, fazia ameaças aos usineiros como se fossem culpados de tudo. Além de impor mais um organismo federal (há dezenas deles), a Agência Nacional do Petróleo, para supostamente conduzir a política do setor, pregava ser preciso fazer estoques reguladores durante a safra para ter o produto na entressafra. Isso já mostra a desinformação do governo. Se falta produto, não há o que estocar. E se, ainda assim, fosse preciso recorrer a essa solução, além da demanda atual, que está acirrada, criaria uma segunda, para a formação de estoques.

Cana-de-açúcar não é vaca leiteira, que bebe água hoje e produz leite amanhã. Um canavial leva pelo menos dois anos para se desenvolver. Por isso, recursos oficiais ajudam. Mas o governo só se livrará desse engasgo quando os preços da gasolina forem descomprimidos.

CONFIRA

Expectativas contrariadas

A decisão do Copom, tomada ontem, foi surpreendente por seis razões. Primeiro, pelo corte em si, em que quase ninguém apostava. Segundo, pela dose desse corte - em princípio, forte - de meio ponto porcentual ao ano. Terceiro, pelos dois votos contrários - e esses não optaram nem sequer por um corte menor, de 0,25 ponto porcentual; decidiram-se logo pela manutenção dos juros em 10,5% ao ano. Quarto, pela duração da reunião, de mais de quatro horas. Quinta razão da surpresa: o tamanho do comunicado, que fez questão de apresentar uma prolongada justificativa pela decisão tomada - quase sempre ele não passa de seis ou sete linhas, mas, dessa vez, teve duas páginas. E, sexto motivo, pela inusitada aposta na solidez da política fiscal anunciada pelo governo federal.

Piorou tudo

Referindo-se à crise externa, o Copom foi especialmente pessimista ao acentuar a "substancial deterioração, consubstanciada, por exemplo, em reduções generalizadas e de grande magnitude nas projeções de crescimento econômico para os principais blocos".

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