quarta-feira, setembro 21, 2011

ANTONIO C. DE LACERDA - Copom, PIB e o 'chororô'


Copom, PIB e o 'chororô'
ANTONIO C. DE LACERDA
O ESTADÃO - 21/09/11

Quando a realidade muda, minhas con- vicções também mudam" (John Maynard Keynes, 1883-1946).

A frase do mais importante economista do século 20 foi uma resposta a um interlocutor que o questionou por que havia mudado de opinião. É uma boa ilustração do momento vivido pela economia brasileira e das ações que temos de tomar para enfrentar os desafios impostos pela nova realidade internacional de menor crescimento econômico, talvez recessão em muitos países, fase prolongada de juros muito baixos, até mesmo negativos, e "guerra cambial" explícita.

A recente decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de reduzir em 0,5 ponto porcentual a taxa básica de juros e sinalizar que ela continuará em queda gerou grande discussão. De um lado,representantes do mercado financeiro aludindo a uma improvável ingerência política na decisão. Do outro, muitos que, como eu, viram coerência e determinação na decisão. O fato é que, interesses específicos à parte, o melhor para o País é adaptar rápida e antecipadamente o conjunto da política econômica para estes "tempos bicudos".

É importante que haja previsibilidade, como querem alguns, nos movimentos das medidas econômicas, mas não podemos nos tornar reféns dela nem torná-la instrumento de ganhos especulativos fáceis e sem risco, em detrimento do que é melhor para a Nação.

Assim, fez muito bem o Banco Central (BC) em considerar a nova circunstância, de uma economia internacional que se está deteriorando. É fácil criticar a decisão com base unicamente nos indicadores passados. Difícil é perceber a dinâmica das variáveis e como elas impactarão os níveis de atividade, de preços e demais indicadores no futuro próximo. Especialmente em momentos de grande transição, como o atual, isso se torna ainda mais desafiador, e é preciso contar com boas análises e ousadia para tomar as decisões mais acertadas. Criticar, pois, a decisão de reduzir os juros com o argumento de que a inflação acumulada nos últimos 12 meses ultrapassou o teto de tolerância da meta, de 6,5%, é equivocado. Por várias razões.

Primeiro, porque inflação elevada não é uma particularidade brasileira. O mundo viveu até recentemente uma pressão de elevação de preços. A inflação acumulada em 12 meses é de 6,4% na China. Há, ainda, países com inflação mais alta que a nossa: Índia, com 8,7%; Rússia,9,4%; Argentina, onde a inflação oficial é de 9,7%; e Venezuela, com 24%! Segundo, porque inflação em alta é um fenômeno com data marcada para terminar. Assim que o cenário de desaquecimento, talvez recessão, se consolidar em economias como EUA, Europa e Japão (mais da metade do PIB mundial), os preços vão cair. Se no passado recente tivemos o efeito da pressão inflacionária internacional, a direção se inverterá, com a desinflação vinda de fora.

Terceiro, porque o nível de atividades da economia brasileira está em franca desaceleração e isso não se trata de um prognóstico. Basta verificar a evolução dos indicadores. O PIB brasileiro, que vinha crescendo em 12 meses a 9% no 2º trimestre de 2010, foi se desacelerando e subiu só 3,1% no 2º trimestre deste ano. Se ficarmos inertes, teremos uma recessão desnecessária à frente!

Quarto, apesar da queda, continuamos no topo do "campeonato mundial de juros reais", muito distantes do segundo colocado e, mais ainda, da média mundial. Ficar nesta posição, com o mundo desenvolvido em crise, significará, além da queda do PIB, valorização adicional da taxa de câmbio, desincentivo ao investimento produtivo e desperdício de recursos públicos para financiar a dívida pública.

Não nos deixemos impressionar, pois, pelo chororô de alguns analistas e operadores do mercado financeiro que tentam desqualificar a decisão do BC e intimidá-lo para os próximos passos.

Os membros do Copom já demonstraram sua independência, não só em relação ao governo, mas também, e principalmente, diante das pressões advindas de vozes nem sempre comprometidas como interesse geral, mas segmentado.

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