domingo, julho 31, 2011

DINHEIRO POR FORA - REVISTA VEJA

DINHEIRO POR FORA
Revista veja

CLIQUE NAS IMAGENS PARA AMPLIAR






J. R. GUZZO - Poucos amigos

Poucos amigos
J. R. GUZZO
Revista Veja

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR

LYA LUFT - A dor do mundo

 A dor do mundo
LYA LUFT
Revista Veja

CLIQUE NA IMAGEM PARA AMPLIAR

MULHER RODADA - Origem da expressão


MULHER RODADA - Origem da expressão


É comum as pessoas dizerem "fulana é muito rodada".

Mas vocês sabem de onde vem o termo?

Como é feito o cálculo?

Os cientistas determinaram que uma transa dura em média 7 minutos. O cálculo médio de uma transa é de 60 penetrações por minuto, o que indica que o ato consiste em 420 penetrações.

Supondo que o pênis tem, em média, 15 centímetros (ESSE DADO NÃO É DO MEU rsrsrs), significa que a mulher recebe, em média, 6.300 centímetros de pica, ou seja, 63 metros a cada relação.

Geralmente, as mulheres transam 3 vezes por semana e, como o ano tem 52 semanas, então serão 156 vezes por ano. Isto quer dizer que a mulher recebe 9.828 METROS por ano, ou o equivalente a quase 10 km de pica por ano.

A 10 km por ano, uma garota de 25 anos, que teve a sua vida sexual iniciada, em média, aos 17 anos, já rodou (25 - 17 = 8 = 8 x 10) = 80 km !!!

Portanto, agora, podemos apresentar a mulherada da seguinte maneira: "Alberto, esta é a Maria. Ela tem 25 anos, mas tá novinha!!! Só rodou uns 55 km!!! Tá inteira, muito bem conservada é como se fosse ano 98, modelo 2000!!!"

Sugiro que repasse estas informações as suas amigas (e amigos), que certamente não resistirão à argumentação tão singela, caso não tenham alcançado a km padrão ou que já tenham alcançado a revisão dos primeiros 5.000 km !!!

CAETANO VELOSO - Amálgama


Amálgama
CAETANO VELOSO
O GLOBO - 31/07/11

Minha oposição ao programa dos Breiviks é visceral — e está em marcha apertada
Aders Breivik destaca o Brasil como prova de que a mistura de raças gera nações improdutivas. É a velha hipótese que tinha vigência dentro do próprio Brasil (e, claro, nunca foi descartada de todo — nem por todos), só sendo realmente abalada pela virada que representou “Casa grande e senzala”, digam o que disserem os neorracialistas. Gilberto Freire, “Gabriela, cravo e canela”, o “Amálgama” de Jorge Mautner e aquele hino à miscigenação que Aldir Blanc escreveu faz uns anos para a TV Globo parecem mais bonitos se confrontados com o criminoso norueguês que matou dezenas de jovens individualmente.

Por outro lado, acabo de ler que um tal Ricardo Coração de Leão (cujo nome verdadeiro é Paul Ray) foi citado pelo monstro de Oslo como sendo seu mentor. Ele nega. Mas confessa crer que o diagnóstico de que os muçulmanos querem dominar a Europa é correto. Ele lidera um grupo que se autodenomina Os Cavaleiros Templários. Consideramse continuadores dos Templários medievais, que guerravam mouros e inventaram o sistema bancário. Uma facção criminosa do tráfico de drogas mexicano também reinvidica esse nome. Os Cavaleiros Templários, que, acusados de heresia, demonismo e homossexualismo, foram perseguidos na França e na Inglaterra, se tornaram, em Portugal, os Cavaleiros da Ordem de Cristo — e a cruz que era seu símbolo estava estampada nas velas das naus que vieram com Cabral dar em Porto Seguro.

Este mundo dá muitas voltas.
Você pode ainda se filiar à Ordem dos Templários do Brasil. Basta buscar no Google e pagar R$ 40 de inscrição. Mas que é intrigante que o símbolo sob o qual um supremacista branco, o qual aponta o Brasil como o contraexemplo de tudo o que ele deseja, seja o mesmo sob o qual os navegadores portugueses atravessaram o Atlântico para colonizar esse grande pedaço de terra na América, lá isso é. O sentimento mais fundo que me surgiu ao me deparar com essa ligação de Breivik com os Templários foi um orgulho intenso de ter como irmã uma mulher que se chama Maria Bethânia, que tem uma voz única e que é uma mulata assararazada que tem a aparência de uma judia iemenita. É um tipo de beleza pelo qual tivemos que lutar desde dentro de casa. Essa é a minha marca de identidade. Minha oposição ao programa dos Breiviks é visceral — e está em marcha apertada. Tudo o que faço tem esse núcleo. Não me causa demasiado malestar que tenham dificuldades em me entender. Sei quem sou e o que sou. Dói e praz, é difícil, é singular — mas a única coisa que posso dizer é que é sempre assim. Fora disso não há nada.

■ ■ ■ ■ ■ ■

Duas mulheres russas dominaram minha mente nas últimas semanas. Uma era bem brasileira, Clarice. A outra era uma russa russa bem russa, moscovita e extraordinária poeta da concisão e das fórmulas incomuns. Marina era seu nome. Marina Tsvetaieva — e seu espantoso livro de anotações e cartas está nas livrarias em boa tradução de Aurora Bernardini. O título é “Vivendo sob o fogo”, e minha vontade é que todas as pessoas que conheço o leiam — e grande parte das que não conheço, também. Sobretudo as que querem ser poetas ou simplesmente gostam de poesia. Livros com seus poemas traduzidos para o português, não há muitos. Mas Augusto de Campos inclui poemas seus em “Poesia da recusa” — que pode ser encontrado nas livrarias — e Décio Pignatari lhe dedicou um livro inteiro — este, mais difícil de encontrar. Enquanto você não acha os poemas, pode ir lendo as cartas e anotações de “Vivendo sob o fogo”: isso já tem poesia de sobra.

Não faz muito tempo, mencionei uma nota tirada de um dos seus cadernos, uma nota de reflexão sobre sexo e gênero, que, de tão bem escrita, levou os editores deste caderno a suporem tratar-se de um poema e separarem seus parágrafos e frases por barras, como se fossem versos e estrofes.
Repito aqui, pedindo que lhe deem a diagramação adequada, para que se possa ter contato com a clareza sintética do seu estilo e da sua personalidade:
“Amar apenas mulheres (para uma mulher) ou amar apenas homens (para um homem), excluindo de modo notório o habitual inverso — que horror!

Amar apenas mulheres (para um homem) ou amar apenas homens (para uma mulher), excluindo de modo notório o que é inabitual — que tédio!

E tudo junto — que miséria.
Aqui esta exclamação encontra realmente seu lugar: sejam semelhantes aos deuses!

Qualquer exclusão notória — um horror.”

E leiamos os curtos parágrafos como o que eles são. (Nunca há interferência da editoria nos meus textos aqui — exceto uma ou outra bem-vinda correção — mas esse equívoco revelador escondeu os dentes com que esse pequeno trecho de prosa vem mordendo o real desde 1921.)

Tsvetaieva viveu em Moscou, Praga, Paris e, finalmente se suicidou em seu país de nascimento. Ela também escreveu:
“Não me submeteria a nenhum tipo de violência organizada, em nome de quem quer que fosse ou sob qualquer bandeira.”

Estou agarrado a Clarice, Marina e Bethânia, três belezas difíceis, enquanto olho o mundo aleijado (“Por que este mundo?”) e deselegante que produz assassinos fanáticos.

Para começarmos a nos preparar para realizar a tarefa que o Brasil não pode mais esconder de si mesmo que tem pela frente, proponho-me a guiar meus eventuais leitores pelas ideias de Mangabeira Unger nas falas que ele gravou em casa e que podem ser vistas através do link bit.ly/robertounger no YouTube.

MARCO ANTONIO VILLA - Prévias? Não no meu partido


Prévias? Não no meu partido 
MARCO ANTONIO VILLA
O ESTADÃO - 31/07/11

Quem quer se candidatar ao Legislativo e Executivo tem de se sujeitar ao mandão partidário, pois não há candidatura avulsa


A história do Brasil republicano é marcada pela pobreza ideológica e por uma estrutura invertebrada dos partidos. Na Primeira República (1889-1930) as agremiações eram estaduais. Durante o populismo (1945-1964), por razão legal, os partidos se organizaram, pela primeira vez, nacionalmente. Quando estavam adquirindo um perfil ideológico, veio o golpe civil-militar de 1964. No ano seguinte, todos os partidos foram extintos e o regime impôs o bipartidarismo. Durante quase uma década, a Aliança Renovadora Nacional e o Movimento Democrático Brasileiro pouco se distinguiram. A eleição de 1974 acabou sendo o divisor de águas entre o partido do governo (Arena) e o da oposição (MDB). Cinco anos depois veio a reforma partidária. Surgiram cinco partidos. Um deles, o Partido dos Trabalhadores, ameaçou ter uma organização democrática, mas, anos depois, abandonou esse projeto. Deve ser recordado que, em 1988, o PT fez, em São Paulo, para a eleição à Prefeitura, prévias. E Luiza Erundina venceu Plínio de Arruda Sampaio (curiosamente, os dois não mais fazem parte do partido).

Foi passando o tempo, surgiram novos partidos (como o PSDB), outros foram mudando seu perfil histórico (como o PMDB). Contudo uma característica esteve presente em todos eles: a ausência de democracia interna. Falam em democracia, mas só para consumo extrapartidário. Consultar as bases? Realizar, tal qual nos Estados Unidos, um sistema de prévias para indicar seus candidatos? Nada disso.

Os partidos não têm programa. É muito difícil saber o que separa um do outro. São muito mais um ajuntamento de políticos do que a reunião de cidadãos defensores de um determinado projeto. Servem para alcançar cargos e funções no Legislativo e Executivo. Dessa forma, não deve causar admiração a mudança partidária, prática rotineira no Brasil. São conhecidos casos de parlamentares que, em uma legislatura, pertenceram a três ou quatro partidos. As mudanças nunca foram devido a alguma questão ideológica. Longe disso. Rigorosamente falando, não estiveram em nenhum partido, pois sempre agiram individualmente, visando à obtenção de favores e privilégios.

A tradição brasileira é marcada pelo partido sem rosto ideológico. A identificação é pessoal. Evidentemente que há uma ou outra exceção. Mas os partidos que eleitoralmente obtiveram êxito sempre estiveram identificados com alguma liderança expressiva, tanto no plano nacional como no regional. Na esfera municipal, o problema é maior ainda: a relação político/partido é mínima, quase desprezível. É sempre o candidato que se sobrepõe ao partido.

A discussão ideológica - marca essencial dos partidos políticos nas democracias consolidadas - é considerada no Brasil, por incrível que pareça, como um instrumento de divisão política, de desunião. A competição entre lideranças e programas é intrínseca e saudável à vida partidária. Desde que estejamos pensando numa democracia, claro. É no autoritarismo que o partido é uno, indivisível, em que a direção ou o líder máximo impõe sua decisão para a base sem nenhuma mediação.

Apesar de vivermos há 23 anos em um regime com amplas liberdades democráticas, com alternância nos governos e plena regularidade eleitoral, o partido - sempre considerado essencial para a democracia - funciona como um cartório, controlado com mão de ferro por lideranças que, algumas vezes, se eternizam na direção. E o cidadão interessado em ser candidato a algum cargo no Legislativo e Executivo tem de se sujeitar ao mandão partidário, pois a legislação impede candidaturas avulsas.

A realização de prévias pode mudar esse quadro. Caso algum partido efetue um debate interno com os pré-candidatos e tenha êxito nesse processo, é provável que o exemplo seja seguido por outros. As primeiras experiências não serão fáceis. Não temos tradição de um debate de caráter democrático de ideias. Muito menos de lideranças que se sujeitem às críticas. Os líderes gostam é de ser louvados. E adorados. É como se, no campo partidário, a República ainda não tivesse sido proclamada.

As prévias também podem oxigenar o debate político extrapartidário. Com a cobertura da imprensa e o interesse das lideranças de ganhar espaço, os grandes temas estarão presentes muito antes do início, propriamente dito, da campanha. Os eleitores poderão tomar conhecimento das propostas dos partidos e de seus pré-candidatos. Ou seja, a discussão política poderá ser ampliada, temporalmente falando, e melhorada, qualitativamente falando. E o espaço do marketing político vazio, tão característico dos nossos pleitos, ficará reduzido, o que é extremamente salutar.

Os adversários das prévias são aqueles que almejam ter o controle absoluto dos seus partidos. Não admitem a divergência. Desejam impor as candidaturas e alianças sem discussão. Consideram os filiados mera massa de manobra, sem direito a palavra. Querem vencer, sem convencer, na marra. No extremo, são adversários da democracia.

JOSÉ SIMÃO - Ueba! Sandy, a Volta da Devassa!

Ueba! Sandy, a Volta da Devassa!
JOSÉ SIMÃO 
FOLHA DE SP - 31/07/11

E mais um predestinado: um amigo meu trabalha com enfeites de Natal e se chama Ricardo Ghirlanda


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto de Bueiros Aires! Olha a faixa duma loja no Rio: "Promoção igual bueiro! VAI ESTOURAR!". Rarará! E a Light devia encher os bueiros de confete. Quando explodir, começa o Carnaval!
E a Dilma? Ela tá assinando tanta demissão que, se não tomar cuidado, vai acabar assinando a demissão dela! Ela tá igual os batedores de pênalti do Brasil: só chutando pra fora. E o Elano Errano? Diz que o único chute que o Elano acertou foi no traseiro da ex-namorada.
E o Piauí Herald: "Transportes aprova rodízio de propinas". E, com a Dilma, mudaram as placas das estradas. Não é mais "Homens na pista". Agora é "Mulher na pista". Cuidado! Dilma na pista. Rarará!
E a semana das declarações bundásticas. "Me sinto virgem de novo", Bruna Surfistinha. Perto das outras da "Fazenda", acho que ela virou virgem mesmo. Naquela fazenda, nem a mata é virgem! E a Valesca Popozuda? Aquilo não é uma bunda, é um altar. Bunda tipo marquise. A popozuda tem o calcanhar branco, nunca tomou sol! E um leitor disse: "Depois de ver a beiçola da Renata Banhara e as pelancas da Monique Evans, vou olhar com mais cuidado pra minha mulher".
E atenção! Socorro! Todos para o abrigo! Sandy! A Volta da Devassa! Olha a declaração dela na "Playboy": "É possivel ter prazer anal". Efeito Devassa! O efeito da cerveja bateu agora! E o novo slongan da Devassa: "Devassa, a cerveja pra quem dá o redondo". A Skol desce redondo e a Devassa é pra quem dá o redondo! E a "Playboy" tem fotos da Galisteu e entrevista da Sandy. Mas o anal da Sandy derrubou o frontal da Galisteu!
E a "Playboy" da Sandy devia se chamar Playground. "Playboy" de traveca é a Playbolas. "Playboy" da Hebe é a Playlanca. E a "Playboy" da Sandy é o Playcenter. E a Sandy falou tudo isso com aquela cara de garota-propaganda de Fanta Uva!
E essa foi a semana do Fora Ricardo Teixeira. O Sarney está revoltado. O Ricardo Teixeira tá no poder há uns 300 anos. Bateu o Sarney! E a filha do Teixeira é diretora da Copa. Então CBF quer dizer Confederação Brasileira da Família. Do Teixeira. Há mais tempo no poder que ele. A CBF é dinastia! E mais um predestinado: um amigo meu trabalha com enfeites de Natal e se chama Ricardo Ghirlanda. Rarará! Nóis sofre mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

MARCELO GLEISER - Em busca de significado

Em busca de significado
MARCELO GLEISER 
FOLHA DE SP - 31/07/11

A ciência nos ensina sobre a nossa íntima relação com o Universo: a matéria da qual somos feitos é também a de estrelas, planetas e luas

AQUI NA coluna, abordamos tanto questões mais imediatas, como o aquecimento global e a crise energética, como as mais fundamentais, como o significado do tempo e o debate entre a ciência e a religião.
Hoje, gostaria de abordar uma questão que, a meu ver, está no cerne do antagonismo entre a ciência e a religião: será que o desenvolvimento científico criou um vazio espiritual? Será que a ciência só serve para gerar fatos e dados sobre o mundo natural?
Ou será que pode ir mais fundo, talvez criando uma nova forma de espiritualidade?
Para começar, cito meu livro "O Fim da Terra e do Céu":
"O desenvolvimento da ciência nos séculos 18 e 19, baseado na interpretação racional dos fenômenos naturais, foi seguido, ao menos no Ocidente, por um abandono progressivo da religião. O conforto espiritual encontrado na fé foi gradualmente abandonado, em nome de um sistema de pensamento secularizado. O historiador da religião S. G. F. Brandon expressou claramente tal preocupação quando escreveu: 'Para os pensadores do Ocidente, nenhuma missão pode ser mais urgente do que a resolução desse dilema, se possível produzindo uma filosofia da história adequada, isto é, que justifique o sentido da vida dos homens dentro de sua duração temporal finita'."
Logo a seguir, pergunto se, ao vermos a ciência além de seu papel de quantificadora da Natureza, podemos talvez encontrar ao menos parte desse "sentido": "Talvez fosse isso que Einstein tinha em mente quando introduziu o seu 'sentimento cósmico religioso', a inspiração essencialmente religiosa por trás do ato racional de compreendermos o Cosmos. A ciência e a religião nascem das mesmas ansiedades que torturam e inspiram o espírito humano. E a conexão entre as duas é a nossa existência finita em um Cosmos aparentemente infinito".
Obviamente, o tempo também complica as coisas, pois a perda dos que amamos e a nossa própria mortalidade são causas de muita dor.
Nessas horas, encontro consolo em muitas coisas. Mas uma das mais significativas é o que a ciência nos ensina sobre nossa íntima relação com o Universo: a matéria da qual somos feitos é também a matéria das estrelas, dos planetas e de suas luas, e de todos os seres vivos.
O tempo que usamos para descrever as transformações que experimentamos é o mesmo da expansão cósmica. O tempo passa para o Universo também. Como escreveu o naturalista americano John Muir, "ao movermos uma única coisa na Natureza, descobrimos que ela está presa ao resto do Universo".
Não existe uma solução única para os nossos anseios. Não sei onde você encontra sentido para a sua vida. No meu caso, a busca se desdobra em muitas trilhas.
Ao tentar entender um pouco mais sobre os mistérios do mundo natural; na convivência com minha família e amigos; em saber que sou um ser humano no nosso raro planeta Terra. Para mim, o sentido não está na ciência em si, mas na busca pelo conhecimento. Talvez seja assim também com um músico, que dá sentido à sua busca tocando o seu instrumento. As técnicas nos dão os meios, mas não são um fim em si mesmas. É tocar, e dividir a música com os outros, que importa.

DANUZA LEÃO - Liberdade, oh, liberdade

 Liberdade, oh, liberdade
DANUZA LEÃO 
FOLHA DE SP - 31/07/11

Ah, que maravilha: vai aonde quer, volta na hora que bem entende, sem ninguém para reclamar


TODO MUNDO quer ser livre; a liberdade é o bem mais precioso, almejado por homens e mulheres de todas as idades, e a luta para conquistá-la começa bem cedo. Desde os primeiros meses de idade só se pensa em uma coisa: fazer apenas o que quer, na hora que quer, do jeito que quer.
Crianças de meses rejeitam a mamadeira de três em três horas, mas choram quando têm fome (só querem comer quando têm fome, o que é muito justo) e quando um pouco mais grandinhas, brigam para não vestir a roupa que a mãe escolheu.
Ficam loucas para ir sozinhas para o colégio, e quando chegam em casa além do horário previsto, ai de quem perguntar onde elas estiveram. "Por aí", é o que respondem, quando respondem -e as mães que enlouqueçam.
Quando adolescentes, as coisas pioram: querem a chave da casa (e a do carro), e quando começam a sair à noite e os pais tentam estabelecer uma hora para chegar, é guerra na certa, com as devidas consequências: quarto trancado, onde ninguém pode entrar nem para fazer uma arrumação básica.
Naquele território ninguém entra, pois é o único do qual ele se sente dono -portanto, livre. A partir dos 12 anos, o sonho de todos os adolescentes é morar num apart -sozinhos, claro.
Mas o tempo passa, vem um namoro mais sério, e quem ama não é -nem quer ser- livre (para que o outro também não seja). Dá para quem está namorando sumir por três dias? Claro que não. Se for passar o fim de semana na casa da avó, em outra cidade, vai ter que dar o número do telefone, e isso lá é liberdade? Os celulares permitem, pelo menos, que eles não atendam, já que sabem quem está ligando.
Aí um dia você começa a achar que para ser livre mesmo é preciso ser só; começa a se afastar de tudo e cancela o amor em sua vida, entre outras coisas. Ah, que maravilha: vai aonde quer, volta na hora que bem entende, resolve se o almoço vai ser um sanduíche ou nada, sem ninguém para reclamar da geladeira vazia, trocar o canal de televisão ou reclamar do fumacê no quarto. Ah, viver em total liberdade é a melhor coisa do mundo.
Mas a vida não é simples, e um dia você acorda pensando em mudar de casa; fica horas pesando os prós e contras, mas não consegue decidir se deve ou não. Pensa em refrescar a cabeça e ir ao cinema, mas fica na dúvida -enfrentar a fila, vale a pena? Vê a foto de uma modelo na revista e tem vontade de cortar o cabelo igual, mas será que deve?
Acaba não fazendo nada, e depois de tantos anos sem precisar dar satisfação da vida a ninguém, começa a sentir uma estranha nostalgia.
Como seria bom se tivesse alguém para dizer que é loucura fazer uma tatuagem; que aconselhasse a não trocar de carro agora -pra que, se o seu está tão bom?
Que mostrasse o quanto foi injusta com aquela amiga e precipitada quando largou o marido, o quanto foi rude com a faxineira por bobagem. Que falasse coisas que iam te irritar, desse conselhos que você ia seguir ou não, alguém com quem você pudesse brigar, que te atormentasse o juízo às vezes, para poder reclamar bastante. Alguém que dissesse o que deve ou não fazer, o que pode e o que não pode, e até mesmo te proibisse de alguma coisa.
E que às vezes notasse suas olheiras e falasse, de maneira firme, que você está muito magra e talvez exagerando na dieta; alguém que percebesse que faltando dez dias para o final do mês você só tem R$ 50 na carteira e perguntasse se você não está precisando de alguma coisa. E que dissesse sempre, em qualquer circunstância, "vai dar tudo certo".
Que falta faz um pai.

VINÍCIUS TORRES FREIRE - Como Dilma está dirigindo?

Como Dilma está dirigindo?
VINICIUS TORRES FREIRE 
FOLHA DE SP - 3107/11

Programa econômico da presidente é cada vez mais marcado por intervenções do governo no mercado


AOS POUCOS, mas de modo decisivo, Dilma Rousseff adota políticas que faz uns 20 anos estão no programa de economistas "mais à esquerda", "desenvolvimentistas", "dirigistas", "heterodoxos" etc.
A intervenção no mercado de derivativos cambiais é, claro, a mais recente das derivas "heterodoxas".
O governo não apenas criou um imposto mas se atribui o poder de regular volume, prazo e tipos de instrumentos de transações cuja referência é a moeda estrangeira.
Na prática, o governo assumiu a direção desse mercado; pode tabelar ou regular preços dos negócios.
Trata-se da medida mais importante do setor desde 1999, quando o câmbio deixou de ser quase fixo para se tornar mais ou menos flutuante. A respeito das "heterodoxias", lembre-se ainda de outras como:
1) o governo limita o fluxo de dólar por meio do imposto sobre investimentos financeiros do exterior;
2) o governo passou a intervir ainda mais nos preços de combustíveis;
3) a política monetária mudou: além de gradualista, considera que, no combate à inflação, a taxa de juros pode ser substituída por meios administrativos de controle do crédito, ao menos em parte;
4) a taxa "básica" de juros do BNDES, em termos reais, é zero (para grandes empresas);
5) não há um programa, explicitado ao menos, de longo prazo para conduzir a dívida pública e a meta de inflação a níveis decentes.
O ativismo de Dilma vai além. Seu governo quer sacramentar a prática reinaugurada nos tempos lulianos de organizar grandes empreendimentos em associação com grandes empresas. Oferece subsídios e parcerias estatais (como no caso do trem-bala e de certas hidrelétricas), de resto sem contrapartidas. Organiza e subsidia a formação de conglomerados e oligopólios.
É verdade que a empresa brasileira raramente se aventurou em empreendimentos grandes e novos sem o amparo do Estado, um problema para o desenvolvimento do país. Mas quais são as medidas para desmamar o empresário nacional?
Como se pode notar, gradualmente o regime de política econômica viajou para outro planeta: acidentalmente desde Lula 2 e, agora mais programaticamente, sob Dilma 1.
No dia a dia, o que mais chama a atenção nesse modus operandi é que a política econômica tem uma quantidade cada vez maior de objetivos e metas picotadas; por vezes, aparentemente incompatíveis.
O governo acha que pode conter a inflação dando impulso ao aumento do investimento no curto prazo sem reduzir o consumo do governo e deixando correr algo solto o consumo privado ("das famílias").
Note-se que o crescimento dos empréstimos do BNDES está ainda em ritmo de boom.
O governo quer reduzir a inflação e ao mesmo tempo espera produzir alguma desvalorização do real.
O governo quer reduzir impostos sobre empresas empregadoras de muita gente e exportadoras, mas não tem caixa, pois gastou além da conta em 2010, ao menos.
O governo se preocupa com o real forte e as avarias que isso causa na indústria. Mas o real é vitaminado pelos juros altos, que assim ficarão por um bom tempo, pois o combate à inflação é gradual e prejudicado pela demanda ainda aquecida, com apoio do governo.
É um malabarismo notável.

LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - Tem cada um...

Tem cada um...
LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO
O ESTADÃO - 31/07/11

Tem, por exemplo, o Victor, que não perde oportunidade de ostentar sua cultura; e o Pinheiro, cujo sono é lendário

Tem, por exemplo, o Victor, que não perde oportunidade de ostentar sua cultura, para divertimento e, às vezes, irritação da turma. Como na vez em que houve um silêncio na mesa do bar em que eles se reuniam e o Victor disse:

– Eu conheço este silêncio de um filme do Bergman.

O Marcão não aguentou.

– Como, de um filme do Bergman? Como um silêncio pode ser igual a outro silêncio, que não tem nada a ver?

O Victor apenas sorriu. Não poderia esperar que o Marcão, logo o Marcão, entendesse. O que mais irritava o Marcão era aquele sorriso do Victor.

Mas a melhor do Victor quem contou foi o Mendonça, médico, que também frequentava a turma. O Victor andava tossindo muito, e expectorando, e procurara o Mendonça no seu consultório.

– Acho que peguei a gripe.

– Você tem muito catarro? – perguntara o médico.

– Tenho.

– De que cor é o catarro?

E então o Victor pensara um pouco e respondera:

– Sabe o verde daquele afresco do Tiepolo no Palazzo Clerici, em Milão?

O Victor estava presente na mesa quando o dr. Mendonça contou o fato e apenas sorriu diante da gargalhada geral da turma. Depois deu de ombros e disse:

– O que eu vou fazer se vocês não viajam?

O Marcão ficou pra morrer.

E tem o Pinheiro, também chamado Pinho, cujo sono é lendário. Contam que o Pinho não pode ir ao cinema porque dorme no começo do filme, sempre. Filme de caubói, filme de guerra, inclusive intergaláctica... Não via nem os créditos completos.

– Você chegou a ver o nome do diretor, Pinho?

– Não, fui só até o produtor.

Mas não deve ser verdade o que contam sobre a separação do Pinho.

Contam que o casamento do Pinho e da Eneida não estava dando certo – em grande parte porque o Pinho invariavelmente dormia quando a Eneida começava a lhe dizer alguma coisa, às vezes no meio de uma frase. E que um dia a Eneida levantara da cama do casal, saíra à rua, contratara uma empresa de mudança e voltara com três carregadores, que passaram a tirar tudo de dentro do apartamento. Tudo. Geladeira, fogão, móveis da sala, televisão, mesa de jantar...

– Este armário também vai, dona?

– Tudo.

Deixaram o quarto de dormir, onde o Pinho ainda roncava em cima da cama, para o fim. E o quarto também foi esvaziado.

– E a cama, dona?

Eneida hesitou. Levava ou deixava a cama? Decidiu:

– A cama vai.

– E o doutor?

– Fica. Deixem o colchão pra ele.

Aqui as versões divergem. Há quem diga que a Eneida voltou atrás e mandou carregarem o colchão também, deixando o Pinho dormindo no chão. Outros dizem que o colchão, misericordiosamente, ficou. Mas todos concordam que, como não havia mais nada no apartamento onde colocar o bilhete de despedida que escrevera para o marido, a Eneida o colocara entre dois dedos do seu pé. Para o Pinho ler quando acordasse.

SUELY CALDAS - Corrupção - cortar o mal pela raiz

Corrupção - cortar o mal pela raiz
SUELY CALDAS
O ESTADÃO - 31/07/11
Quanto custa uma obra pública? A limpeza em andamento no Ministério dos Transportes tem revelado custos disparatados, que extrapolam a racionalidade dos números, transitam pela ilegalidade e terminam em cifrasqueagridemocontribuinte.Grossomodo,aobradeveriaseguiromodelo do orçamento de um cidadão que planeja reformar a sua casa. Mas não. Afinal, por que é tão complicado?
Ao contrário da obra privada,a pública costuma incorporar custos extravagantes-doações de campanha eleitoral, a parcela do partido político do ministro, o lucro da turma intermediária do governo - ao valor do contrato com a empreiteira,quandoelaéescolhidasem licitação ou em obscuros adendos que triplicam o preço inicial que a empresa apresentou para vencer concorrentes. Há, ainda, custos decorrentes da duração da obra - propositadamente longa paraabsorverdinheiropúblicopormais tempo.Ao longo de sua existência,oTribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União colecionam milhares de casos estapafúrdios. Punições? Raríssimas, dá para contar nos dedos.
Há solução? Umcaminho para impedir a corrupção? A presidente Dilma tem tentado,nomeando gestores técnicos para o lugar de suspeitos.É um caminho pouco seguro,pois de pende da vontade política do governante de enfrentar a corrupção. Dilma a tem enfrentado, Lula deixou correr frouxo e até a incentivou. Resolver de forma institucional seria tirar da classe política a gestão de setores do governo que absorvem muita verba pública. Não é o que tem ocorridoeagovernabilidadeviroupalavra mágica para justificar o mal feito.
A mera substituição nada garante. Nem de pessoas nem de siglas. Desmoralizado diante da opinião pública, tal o histórico de corrupção, o antigo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (Dner) mudou de nome para Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Mudou a sigla, mas não a roubalheira.Também a Valec nadamaiséqueacontinuidadedepráticas desonestas que destruíram a antiga Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA).
No âmbito da reforma do Estado, FHC privatizo um uitasestataisque,administradasporpolíticos,eramsugadoras de dinheiro público, com crônicos e eternos prejuízos, causados justamente pelo seu uso político. Ferrovias da RFFSA, usinas siderúrgicas, telefônicas,distribuidoraselétricasebancosestaduais se tornaram empresas privadas lucrativas e bem-sucedidas. Com exceçãodealgumastelefônicasestaduais,todas só acumulavam rombos que o contribuinte era chamado a cobrir.
Aprivatizaçãoatraiuprotestos,sindicatoscontestavamnaJustiça-eraareaçãoaodesconhecido,numpaísquepassouumséculointeirovivendosobaproteção do Estado provedor. O mundo mudou, o papel do Estado ficou mais bem definido após a queda do Muro de Berlimeaprivatizaçãoensinouaosbrasileirosquesedesfazerdeestataisdeficitárias foi um bom caminho para desenvolveroPaíseeliminaracorrupção,pelo menos onde o estatal virou privado.
Além do reconhecimento da incompetência do Estado em concluir obras antesdaCopa,aprivatizaçãodetrêsdos maiores aeroportos do País vai evitar o queaconteceucomoschamados"puxadinhos" construídos pela Infraero. Só noAeroportodeGuarulhos(SP) foram desviados R$ 254 milhões.
Dos37 Ministérios (Lula criou 12, paraabrigar partidos aliados), há dois que merecempermanentevigilânciadeDilma, se ela realmente quer afastar e punir corruptos. Minas e Energia, responsávelpelaconstruçãodehidrelétricas,e Transportes,comsuasestradaseferrovias, são os que mais concentram obras gigantes, caras e vulneráveis a fraudes. Não só porque lidam com contratos de valoreselevados,mastambémpelasdificuldades de a fiscalização mensurar comexatidãocertoscustos,comoo volumedecimentousadonumabarragem oudeasfaltonumaestrada.Justamente pelo poder de camuflar fraudes e de canalizarrecursos públicos para fins político-privados, são Ministérios cobiçadíssimosporpartidosequeLulagenerosamente entregou ao PMDB e ao PR.

ANCELMO GÓIS - Melhor do mundo

Melhor do mundo
ANCELMO GOIS
O GLOBO - 31/07/11

Veja como os grandes eventos esportivos mexem com a economia de setores mais díspares. O espanhol Ferran Adrià Acosta, 49 anos, badalado chef de cozinha, vai abrir no Rio, mas só por dois meses, uma filial do seu El Bulli. Será durante a Copa das Confederações, em 2013, e a Copa do Mundo de 2014. 

Aliás...
O restaurante El Bulli é considerado por muitos o melhor do mundo. Mas há controvérsias. ‘My name is Dilma’ A “New Yorker”, revistona americana, mandou ao Brasil o repórter Nicholas Lemann para escrever um perfil de Dilma. Lemann, autor de livros e diretor
da faculdade de jornalismo de Columbia, circula entre Rio, São Paulo e Brasília. Tem marcada uma entrevista com Lula. 

‘S’il vous plaît’

Os ônibus de Paris estão exibindo uma grande campanha do turismo no Brasil. Só que, em julho, agosto, os parisienses já viajaram de férias — e a imensa maioria dos que veem a campanha é de... turistas, que, portanto, já compraram seus pacotes. 

Segue...

Muitos países fazem este tipo de campanha em Paris. Mas... nos meses de abril e maio, quando os franceses programam suas viagens.
Chico de ouro O novo CD de Chico Buarque ultrapassou a marca de 50 mil cópias. A Biscoito Fino mandou prensar mais 20 mil.

Estrela das Graças

Maria das Graças Foster tem uma tatuagem no braço em forma de estrela. Já houve quem achasse que é homenagem ao PT. Outros,
ao Botafogo, clube da diretora da Petrobras. Mas a estrela tem motivo religioso.

Castelo, o belo
Aos 90 anos, e em forma, o general Leônidas Pires Gonçalves contou semana passada a um amigo que, no dia 11 de abril de 1964, um sábado, ele, então tenente-coronel, acompanhou da casa de Castelo Branco a “eleição” indireta, no Congresso, do marechal a presidente do Brasil. 

Segue...
Depois de sacramentada a escolha, Castelo, que, digamos, não era um modelo de beleza — e não só pela falta de pescoço —, levou
Leônidas até o carro e ainda fez graça:
— Estão dizendo que sou mais bonito do que o Dutra. 

Mas...
Leônidas preferiu o silêncio. A vida é bela FH, 80 anos, está em novo tour de férias pela Europa. 

Luz fraca
Veja como não é de hoje que a Light apanha. Esta charge saiu no jornal “O Malho” em junho de 1920, na abertura da temporada lírica no Rio, para insinuar que a elétrica... “desafinava”. Estará na edição de agosto da “Revista de História da Biblioteca Nacional”.

Procura grande
Lula, como se sabe, gostou tanto do que viu no Hospital Dona Lindu, em Paraíba do Sul, RJ, que marcou consulta para o filho Marcos.
Mas quem sofre de problema na coluna ou no quadril, caso de Marcos, precisa esperar quase quatro meses para fazer a primeira avaliação.

A hora do social
Até o fim de outubro, todas as comunidades do Rio ocupadas pela polícia ganharão sua UPP social. O programa de ações da prefeitura chegará toda sexta a uma favela. A primeira foi a Cidade de Deus. 

Cena carioca
Quinta, por volta de 20h, no sinal da Gávea já perto da Autoestrada Lagoa-Barra, sentido Zona Sul, um guri de uns 7 anos, depois de fazer malabarismo, pediu dinheiro a um motorista e ouviu: “Hoje tá fraco, menino, só tenho isso...” Era uma moeda de 10 centavos. O miúdo, acredite, enfiou a mão no bolso, tirou várias moedas e disse: “Tio, tenho mais que você. Podemos dividir.” Há testemunhas.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

Golias
SONIA RACY
O ESTADÃO - 31/07/11

A Defensoria Pública entrou com ação indenizatória contra o governo de São Paulo por atendimento insatisfatório aos portadores de autismo.

Pede R$ 200 mil por entender que o serviço prestado pela Casa de David, conveniada ao Estado, é inadequado.

Golias 2

Cleize Bellotto, da Casa de David, fala que as acusações "não têm respaldo na realidade dos fatos". E informa: será aberta nova unidade de atendimento a 90 autistas em Atibaia.

Sem medo

Depois da recusa de Marieta Severo, Antonio de Assis convidou Regina Duarte para viver Dilma no cinema.

A atriz, considerada tucana, ainda não respondeu.

Patrimônio

O Instituto Lina Bo e PM Bardi quer abrir o arquivo da arquiteta a pesquisadores. Conseguiu aprovação do MinC para captar R$ 365 mil.Virão a público textos inéditos, correspondências e detalhes da trajetória de Lina no Brasil e na Itália.

Tô certo?

Empolgada com a volta de Sinhozinho Malta à telinha, Lilian Pacce bolou homenagem: o primeiro vídeo-editorial de seu site será dedicado ao célebre personagem da novela Roque Santeiro.

Free Palestine

Cerca de 340 mil pessoas já assinaram petição on-line a favor do reconhecimento da Palestina como Estado, criada pela ONG Avaaz. A ideia é endossar o movimento para votação que acontece em setembro, na ONU.

Responsabilidade social

A turma da Escola de Música e Cidadania da Cidade de Deus, no Rio, comemora. Ganhou patrocínio no valor de R$ 200 mil da Merck S/A. Agora, a meta é atender 200 alunos até o final do ano.

Caraigá Veículos do Morumbi armou campanha de doação de sangue. Seus funcionários estão sendo convidados a ajudar o hemocentro São Lucas. No dia 5.

A Ultragaz coloca na estrada, terça-feira, sua carreta de cinema itinerante. Sai de São Paulo e passará, este ano, por 25 cidades brasileiras. São 92 lugares, para jovens e crianças assistirem cinema de graça.

A ONG Adote um Gatinho fez as contas: conseguiu arrumar lar para 4.000 bichanos desde que abriu as portas, em 2003.

Tereza Bracher comanda noite de abertura do Salão de Arte. Dia 15, na Hebraica. Em benefício da ACTC.

São Francisco do Sul (SC) festeja. A ArcelorMittal Vega investiu R$ 500 mil na construção da Casa Johanna Stammerjohann Fischer, junto com a prefeitura. Acolherá jovens em situação de risco.

A Goodyear avisa: acaba de inaugurar em Gravataí (RS) a primeira revendedora de pneus de baixo impacto ambiental do Brasil. A loja, por exemplo, tem sistema de reutilização de água da chuva, além de estrutura para reciclagem dos subprodutos da recauchutagem.

Viko Tangoda comanda as caçarolas na Associação Travessia, dia 27. É o Sopa na Caneca, em prol da Associação Travessia. Em parceria com o Atelier Hideko Honma.

Detalhes nem tão pequenos...

1. Instalação "Narguilé sobre Romero Britto" ou simples influência do Oriente?

2. E o jeitinho "kiss me" dos festivais de rock continua vivo
na moda e nos acessórios.

3. Bons companheiros e, agora também, amantes de arte.

4. Homenageando Cartola, a cantora mostra que tem bem mais do que samba no pé.

5. Chaplin assinaria: qualquer semelhança com O Garoto é mera coincidência.

6.Legal no vernissage é levar seus próprios objetos de arte.

GAUDÊNCIO TORQUATO - O poder pelo poder


O poder pelo poder
GAUDÊNCIO TORQUATO
O Estado de S.Paulo - 31/07/11

O momento vivido pelos EUA, um dos mais tensos de sua contemporaneidade política, é fértil em simbolismos, não apenas pela possibilidade de a maior democracia do planeta vir a dar um calote nos credores externos (coisa ainda inimaginável), mas porque põe no centro do debate a missão dos atores políticos no seio das democracias modernas. Impressiona o fato de os Partidos Republicano e Democrata, deixando de lado o papel desempenhado pelo país na textura das nações, parecerem inclinados a continuar uma luta esganiçada pelo poder e a depositar na cesta do lixo a célebre lição de John Kennedy: "Não pergunte o que a América pode fazer por você, mas o que você pode fazer pela América". Mesmo que se chegue a um acordo sobre o limite da dívida do governo federal (aumento além de US$ 14,3 trilhões), a crise aponta para o ocaso de uma era, na qual a representação política, ante a ameaça de catástrofe, esquecia divergências partidárias e se dava as mãos pela salvaguarda do bem comum. Os partidos já não acendem aquela chama de civismo que tanto maravilhou Alexis de Tocqueville, há 180 anos, quando o jovem advogado de 26 anos foi enviado pela França para estudar o sistema penitenciário estadunidense.

Descrevia ele, na obra A Democracia na América: "Os grandes partidos são instrumentos que se ligam mais a princípios que a suas consequências, às generalidades que aos casos particulares, às ideias e não aos homens". A queda de braço entre as duas estruturas que se revezam no poder e o duelo verbal entre o presidente Barack Obama e o presidente da Câmara, John Boehner, mostram que a balança dos pesos e contrapesos está quebrada. A política refunda-se sob a égide do salve-se quem puder. O altruísmo, valor tão enaltecido pela democracia norte-americana, cede lugar ao pragmatismo; o fervor social esfria, basta ver a avaliação negativa que a população confere ao presidente Obama, aos dois partidos e aos líderes. Sob essa teia de tensões, os EUA ingressam na segunda década do século 21 com a imagem de liderança no painel das democracias planetárias em franco processo de declínio. Quais as razões para tal mudança de paradigma? A principal causa aponta para a alteração da fisionomia política na sociedade pós-industrial. A política deixa de ser missão para se tornar profissão, desvio que ocorre na esteira do desvanecimento das ideologias. Ademais, o motor econômico, principalmente na moldura da globalização, passou a movimentar a máquina política, como se aduz dos atuais embates que se travam nos EUA e na Europa. Ideários e escopos doutrinários perdem substância. Tornam-se apêndices da economia. É esta que torna viável a eficácia de governos.

Dito isto, cabe indagar: como essa "nuvem de disfunção" (é assim que alguns analistas veem a crise norte-americana) afeta países como o Brasil? Ora, o fio desse rolo já chegou até nós há muito tempo. Ou o Brasil não tem nada que ver com a prática da intransigência, do impasse político e da polarização entre situação e oposição? A lupa sobre nosso modelo mostra que, por aqui, a política não dá trégua aos competidores. A gana pelo poder é tão desmesurada que os climas eleitorais se intercambiam. O panorama da eleição seguinte é divisado tão logo a paisagem anterior acomoda os eleitos em seus cargos. Não há interstício entre uma urna e outra. Quem não enxerga, por exemplo, que o teatro do pleito de 2012 já está montado? Ou que o palanque das eleições gerais de 2014 já passou a ser usado por um matreiro cabo eleitoral disposto a energizar o País? A presidente Dilma nem bem completa sete meses e uma lista de pré-candidatos já está pronta para disputar o seu lugar. Nos espaços governativos de todas as instâncias, programas e projetos, mesmo os mais abrangentes, comportam ações de cunho eleitoreiro. Políticas de longo prazo, nem pensar. O Brasil é o território do "aqui e agora", fato que motiva o megaempresário Jorge Gerdau a fazer o alerta sobre, por exemplo, nossa política cambial: "Se é só pela visão financeira, do fluxo de capital, nós poderíamos deixar como está, porque a situação é cômoda a curto prazo. Mas, numa visão estratégica de longo prazo, é preciso ter políticas de desenvolvimento industrial, ter emprego de qualidade e não depender apenas de commodities e do minério".

A ausência de estratégia de longo prazo deriva da efervescência eleitoral que impregna o ânimo dos conjuntos. Como nos EUA, por aqui não se abre espaço para a busca de consenso entre blocos de um lado e de outro a respeito de temáticas relevantes. A disputa obedece a uma lógica que Thomas Hobbes cunhou de política de golpes preventivos: A teme que B ataque e decide atacar primeiro, mas B, temendo isso, quer se antecipar, fazendo que A, pressentindo o golpe, tente reagir, e assim por diante. O ataque não abriga armas de destruição ideológica (até porque as ideologias estão no fundo do baú), mas movimentos táticos. Como se sabe, as clivagens partidárias do passado, originadas em antagonismos de classes, perdem sentido no fluxo da expansão econômica e do consequente ingresso de parcelas das margens sociais no centro da pirâmide. Todas as siglas se assemelham e seus lemas, antes ancorados em escopos de cunho ideológico, agora ganham um uníssono eco: o poder pelo poder. O vezo socializante com que certas organizações tentam selar suas identidades não se deve a uma convicção ideológica, mas às bolsas e aos pacotes destinados a colocar o pão na mesa das massas carentes.

Nem mesmo nosso sistema de coalizão partidária resiste à "política de emboscadas" que as entidades procuram engendrar para ganhar mais fatias de poder. Cada uma parece cobiçar o espaço da outra. A polis é um detalhe. As alianças, formadas ao sabor das circunstâncias eleitorais, não são firmadas sob a crença em ideários cívicos. O que há é um jogo de conveniências. O contrato de hoje pode se desfazer amanhã. A cada dia, a seiva política escorre pelo ralo.

JOÃO UBALDO RIBEIRO - A nova era na roda do chope


A nova era na roda do chope 
JOÃO UBALDO RIBEIRO
O ESTADÃO - 31/07/11

Tou te achando muito quietinho, ultimamente, muito caladinho… Não pode ser só o Botafogo. Todo caladinho, sem dar palpite em nada…

- Não tem nada disso, cara, tu tá querendo é me provocar, eu estou a mesma coisa de sempre. É que aqui nessa mesa só sai besteira e não é sempre que eu estou disposto a dar palpite em besteira.

- Deixa de ser cara de pau, aqui nesta mesa um dos que mais falam é você, os outros tu pode enganar, a mim tu não engana. Responde com toda a honestidade, sem subterfúgio nem meias palavras, é a presidenta, não é? Só dá pra falar bem dela e aí tu cala a boca. Eu te manjo, cara.

- Você quer dizer “a presidente”. Eu me recuso a usar esse barbarismo.

- Já está no dicionário e é como ela prefere, até nisso tu tem má vontade. Mas eu não quero discutir gramática, quero discutir fatos concretos. A faxina que ela está fazendo no Ministério dos Transportes, somente isso.

- Ela demitiu uns caras, eu li.

- Demitiu uns caras? Já rodaram bem uns 20 e você diz “uns caras”? Uma faxina desse porte?

- Não sei o que é que você quer dizer com “desse porte”. Nesse ritmo cata-piolho, ela não dá conta nem de uma ala do ministério antes do fim do mandato. Tinha que fazer era fumigação total e na máquina toda, ministério por ministério, repartição por repartição. O governo ia ficar bastante desfalcado, mas só fumigar é que dá jeito, catar piolho não vai levar a nada.

- É impressionante como os caras como você ficam insatisfeitos, por mais que se faça.

- Já eu acho impressionante como os caras como você ficam satisfeitos, por menos que se faça. Houve as demissões e está tudo bem, não é isso? Ela fez as demissões por quê?

- Ora, por quê. Porque todo mundo sabe que os caras estão envolvidos com os esquemas de corrupção do ministério. Aliás supostamente envolvidos, hoje a gente tem que ter cuidado com o que fala. Sim, os caras são suspeitos disso. E então? Ela foi lá e demitiu.

- Era pra condecorar? Se ela demitiu, foi porque sabia de alguma coisa. Ou de muitas coisas, senão não ia demitir. E aí eles, castigados pela demissão, vão ter que ficar mais ricos montando consultorias, triste exílio para quem trabalhou no governo. Eu tenho a impressão de que até o homem do cafezinho dos palácios vai abrir consultoria para futuros homens do cafezinho, muitos deles ganham bem mais que um professor, você sabia?

- Bem, eu não li nada sobre o assunto, mas é claro que, se houver indícios de irregularidades contra os demitidos, eles serão investigados e…

- …E, se considerados culpados, serão condenados, devolverão o que ganharam ilicitamente e assim por diante. É isso que você quer que eu comente, não é? Não era melhor a gente comentar o enredo completo da Bela Adormecida, não? Ninguém merece. O cara chega aqui no domingo, para beber um chope sossegado com os amigos e esfriar a cabeça e aparece logo um mané que quer ser enrolado novamente e não se cansa nunca de ser enrolado. Vê se te manca, cara, qual é a tua, com esses papos que são sempre a mesma coisa, embora querendo mostrar outra cara. Não mudou nada! Aliás, minto. Manda a honestidade eu reconhecer que ela demite e ele não demitia. Ele deixava estatizado mesmo, ela prefere privatizar. Bonita diferença. Fica tudo como era antes, com essa diferença de estilo, que sem dúvida marcará a história da República: um não demitia, a outra demitia; e ambos permitiam.

- Você está sendo sarcástico, assim não dá para conversar. Você é desses caras que se recusa a ver que as coisas estão melhorando. Isso não é bom, acaba se voltando contra a própria pessoa. Eu não, eu observo tudo com otimismo. Otimismo equilibrado, mas otimismo. Você não tem acompanhado esse movimento da busca da felicidade, tem? Agora tem um movimento da busca da felicidade. Já era estabelecido na Declaração da Independência americana, vai ser estabelecido entre os direitos humanos nas Nações Unidas e na nossa Constituição. De agora em diante, todo ser humano tem direito nato à busca pela felicidade.

- Vai estar na lei?

- No Brasil, provavelmente.

- Ah, então será criada a Agência Nacional da Felicidade, com delegacias em todo o território brasileiro. E aí, depois de muita discussão, se estabelece o Padrão Nacional de Felicidade, em que se tentará enquadrar todos os cidadãos, sem distinção. E fazer o teste da felicidade será como o voto atualmente: é um direito, mas também uma obrigação, todo mundo vai ter que fazer. Quem for reprovado no teste, recebe uma Bolsa Felicidade de seis meses, após o que faz novo teste. Se reprovado outra vez, será incluído no Cadastro Nacional de Brasileiros e Brasileiras Infelizes, tido como doente e obrigado a submeter-se a tratamento em clínicas públicas ou credenciadas. E, enquanto não dispuserem de seus atestados de felicidade, o brasileiro e a brasileira não poderão tirar passaporte, candidatar-se a cargo eletivo, comprar casa própria e assim por diante.

- Você sempre vê tudo dessa maneira descrente e debochada.

- É o hábito, eu moro aqui há mais de 60 anos.

- Mas não vai ser nada como você está pensando.

- Eu sei, vai ser pior. Eu também sou otimista.

FERREIRA GULLAR - Uns craseiam, outros ganham fama

Uns craseiam, outros ganham fama
FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SP - 31/07/11

Foi em 1955 que ganhei de Simeão Leal, diretor do Serviço de Documentação do Ministério da Educação e Cultura, um exemplar do livro "Tudo sobre a Crase". Tomei o ônibus que me levaria à revista Manchete, então na rua Frei Caneca, comecei a ler o livro e, antes de descer, já havia sacado um aforismo: "A crase não foi feita para humilhar ninguém".

Era de fato uma brincadeira com a preocupação dos gramáticos com o uso da crase. Esse primeiro aforismo desencadeou uma série de outros, que publiquei, meses depois, no suplemento literário do Diário de Notícias.

Essa mania de inventar aforismos me veio dos surrealistas, que faziam uso deles com humor e irreverência. Ainda outro dia citei aqui um deles, de autoria de Paul Éluard: "Bate em tua mãe enquanto ela é jovem". E este: "Parents! Raccontez vos rêves à vos enfants!" (Pais! Contem seus sonhos aos seus filhos!").

Naquela tarde, como quase não tinha nada a fazer na Redação da revista, aproveitei para bolar outros aforismos: "Maria, mãe do Divino Cordeiro, craseava mal. E o Divino Cordeiro mesmo não era o que se pode considerar um bamba da crase!".

Escrevia e ria. Borjalo interrompeu a charge que desenhava para vir saber o que me fazia rir tanto. Mostrei-lhe os aforismos e ele, rindo também, chamou o Otto Lara Resende, o diretor da revista. Este, brincalhão como era, pegou o papel de minha mão e leu alto. "Ouve aí, Armando!". Armando Nogueira, redator e repórter de fino humor, logo se juntou ao grupo. Foi uma farra.

Isso só me animou a prosseguir. Depois que o ambiente se acalmou e cada um foi cuidar de seus afazeres, continuei me divertindo: "Quem tem frase de vidro não joga crase na frase do vizinho". E este: "Frase torcida, crase escondida". Mas eis que chegou um texto para copidescar e deixei de lado os aforismos.

Voltei a eles naquela mesma noite, no quarto onde morava, em Copacabana. É que, àquela altura, ganhando melhor, mudara-me da pensão de dona Hortência, no Catete, onde dividia um quarto com Oliveira Bastos e Carlinhos Oliveira.

Sozinho, agora, no sossego daquele aposento silencioso, retomei minha tarefa divertida: "Antes um abscesso no dente que uma crase na consciência". E logo: "Uns craseiam, outros ganham fama". Escrevi mais alguns nos dias que se seguiram até que a fonte secou.

Publiquei-os com uma introdução engraçada, que infelizmente se perdeu. A verdade é que, já na semana seguinte à publicação, os estudantes universitários de Curitiba, que estavam em greve, puseram uma faixa no refeitório com o meu aforismo: "A crase não foi feita para humilhar ninguém". Mas, numa entrevista a um jornal do Recife, um crítico literário o atribuiu a Paulo Mendes Campos. Não gostei mas não dei muita importância, pois, no final das contas - disse a mim mesmo -, o que importa são meus poemas, que até agora ninguém atribuiu a outro poeta.

A vida seguiu até que alguém, escrevendo sobre erros gramaticais, citou o aforismo como sendo de Otto Lara. Comecei a ficar grilado mas me tranquilizei, lembrando que o Otto deve ter me citado e o cara não guardou meu nome. Mas não demorou muito e a autoria do mesmo aforismo foi atribuída a Machado de Assis e em seguida a Rubem Braga.

Este, porém, já a par da confusão que se armara, decidiu esclarecer as coisas: publicou uma crônica afirmando que o verdadeiro autor do aforismo, agora tão citado, era o poeta Ferreira Gullar. Fiquei felicíssimo, telefonei a ele, agradecendo.

Anos depois, veio o golpe militar e a ditadura. As circunstâncias me levaram à clandestinidade e foi no buraco onde me escondera que abri a revista Veja daquela semana e me deparei com um anúncio de página inteira: "A crase não foi feita para humilhar ninguém. Computadores IBM". Era demais. Senti-me mais que nunca explorado pelo imperialismo americano.

Nos últimos anos, talvez porque esqueceram a frase, os equívocos cessaram. Já estava tranquilo, certo de que finalmente me tornara autor do aforismo, quando, faz uns três domingos, surge um artigo em O Globo afirmando que "Carlos Drummond escreveu: ´A crase não foi feita para humilhar ninguém´". Minha esperança é que, no futuro, alguém mal informado atribua a mim, ainda que por equívoco, a autoria do aforismo que é meu.

DORA KRAMER - Chapa quente


Chapa quente
DORA KRAMER
O ESTADÃO - 31/07/11

“O complicado em uma aliança com Marina seria governar depois, cumprindo os compromissos inerentes a essa união.”


Marina Silva saiu do PV carregando 20 milhões de votos, certo? Talvez sim, mas não necessariamente.

Ainda está para ser demonstrado se a votação recebida pela então senadora candidata a presidente da República em 2010 disse respeito só àquelas circunstâncias, ao anseio do eleitor por uma alternativa à dicotomia PT-PSDB, ou se pode ser considerada como um patrimônio duradouro.

Prova mesmo só haverá quando 2014 chegar. A questão, contudo, torna-se desde já pertinente visto que os possíveis concorrentes se posicionam na cabeceira da pista.

Luiz Inácio da Silva faz campanha (para si ou pela reeleição de Dilma), José Serra nem bem fecharam as urnas avisou aos navegantes que não pensava em aposentadoria, Aécio Neves acumula forças articulando apoios e Marina já deu um lance. Rumo à construção de um espaço muito mais de base social que partidária.

O ex-senadora poderia ter ficado no PV - cujos defeitos conhecia antes de se filiar - para testar seu capital político na eleição intermediária de 2012. Seria o caminho tradicional. Foi o escolhido por Fernando Gabeira e Alfredo Sirkis, que ficaram a despeito da doença nada infantil do caciquismo que assola (também) o PV e para todos os efeitos provocou a saída de Marina.

Ela não fez movimento algum para criar um partido. Falou sobre um projeto “sonhático” suprapartidário que é bonito como gesto de impacto, mas inócuo para a execução de planos político-eleitorais.

E Marina os tem. Ou não teria saído do PT para concorrer à Presidência da República nem teria sido tão cautelosa ao preservar para si os 20 milhões de votos recusando-se a entregá-los na forma de aval a um dos finalistas da eleição de 2010.

Portanto, flanando na atmosfera qual um avatar de si mesma é que a ex-senadora não vai. Entrará no jogo, isso é certo. A dúvida é sobre como e ao lado de quem jogará.

Poderá criar um partido? Poderá. Mas as dificuldades além de muitas são quase intransponíveis numa eleição “casada” em que contam as alianças e as máquinas. Ainda mais quando se trata de uma eleição disputada como a que se antevê para 2014, em que os bons espaços estarão ocupados.

No PT com a Presidência, seja Dilma ou Lula o candidato; no PSDB por Aécio ou Serra; no PSB por Eduardo Campos; no PMDB pelo que der e vier ou pelo que vier e der. O resto é adjacência.

Como enfrentar essa concorrência? É tarefa árdua. Marina sempre pode arriscar, dependendo do que pretenda. Se a ideia for fazer bonito, vale o risco. Mas, se a valente quiser ir para a linha de frente, terá de ser profissional.

Uma pensata para compartilhar com o leitor: Marina vice de Lula em 2014.

Ela deixou o governo contrariada? Deixou, mas com Dilma, não com o PT e muito menos com Lula, por quem nutre veneração. Marina precisa de uma estrutura à qual se incorporar. Lula, em tese, não precisaria de nada, dado que venceu todas as etapas da desconfiança do grande capital depois que formou chapa com o empresário José Alencar.

Mas, na realidade, precisa sim de uma novidade para evitar o efeito fadiga de material. Precisa de uma fiança ética, precisa de um simbolismo para renovar o trato perdido com a utopia, precisa sacudir a poeira acumulada nos últimos anos de compadrio com o atraso, precisa, sobretudo, de refazer os termos do pacto de esperança que, em boa medida, descumpriu.

Precisa de um toque de modernidade, precisa se arejar, se reinventar, até mirando-se no exemplo de Fernando Henrique Cardoso.

Precisa reconquistar a juventude, resgatar a bandeira do sonho a fim de motivar o eleitorado e justificar a escolha de alguém que já presidiu o País por duas vezes.

Na hipótese de juntar-se a alguém como Marina Silva ainda sinalizaria superioridade em relação às estruturas partidárias tradicionais tão desgastadas e ainda transmitiria a mensagem de que é a vez da sociedade.

Difícil? Mas nada na vida ou na política é impossível.

O complicado em uma aliança com Marina seria governar depois, cumprindo os compromissos inerentes a essa união. Mas convenhamos que se tratando de Lula tudo é possível. Principalmente dar o dito pelo não dito.