segunda-feira, maio 09, 2011

FERNANDO ABRUCIO - Decifrando a classe média, a queridinha dos partidos



Decifrando a classe média, a queridinha dos partidos
FERNANDO ABRUCIO
Revista Época 

A classe média virou a queridinha dos partidos, principalmente do PSDB e do PT. Parece que a conquista desse grupo passou a ser tratada como a garantia de vitória eleitoral. O raciocínio tem dois problemas. Primeiro, pela simplificação: muitos parecem ignorar que há várias “classes médias”, com variações regionais, de vinculação profissional, organização sociopolítica e valores socioculturais. Segundo: mais importante que atingir certo grupo é saber o que gera voto e, sobretudo, solidez política de longo prazo.

Em sociedades de trajetória complexa, como a brasileira, a classe média tende a ser muito heterogênea. A diferença não está só na renda – a divisão daqueles que estariam no estrato C ou B. Contam também o tempo de escolaridade, as variações regionais, o fato de ser profissional do setor público ou do privado, estar vinculado e atuar constantemente em organizações sociais, como sindicatos, ONGs e igrejas, e, como tem sido destacado, ser tradicionalmente de classe média ou ser um emergente.

Por essa linha de raciocínio, o argumento segundo o qual a classe média tradicional está com o PSDB não é totalmente verdadeiro. Membros da classe média que trabalham no setor público – principalmente nos níveis federal e estadual – tendem a ficar mais à esquerda dos tucanos. Igualmente importante é a questão regional. Parece evidente que a classe média do Sul do país não se comporta como a do Nordeste, onde a maioria votou em Lula e em Dilma nas últimas disputas. Da mesma maneira, não vale dizer, simplesmente, que os pobres já são propriedade do PT. Embora, nas últimas eleições, o petismo tenha conquistado setores desorganizados e com menor renda, as periferias urbanas de São Paulo, por exemplo, votaram mais em Kassab (2008) e em Alckmin (2010). Vale lembrar ainda que os 44 milhões de votos obtidos por Serra também contêm pobres.

O que está mais em jogo é a chamada classe C. É claro que a disputa por ela é importante, dado seu crescimento recente. Uma parte dessa batalha será feita no terreno dos valores. Porém, é preciso supor que a classe C realmente seja homogênea na sua visão de mundo. E tomar cuidado para que o discurso para esse grupo não bata de frente com os valores de outros estratos relevantes, como a classe média tradicional do setor público ou parcelas mais pobres da sociedade.
Muitos parecem ignorar que há várias “classes médias”, com variações regionais, de valores e vínculo profissional

Para sair da armadilha, o melhor caminho é pensar nos elementos que conquistam os eleitores. Há três instrumentos mais efetivos: a construção de boas bases políticas locais e regionais, a organização dos setores sociais ou a conquista dos organizados e, por fim, o perfil e o resultado das políticas públicas. É por essa trilha que o PSDB e o PT devem discutir a ampliação de seu apoio político, inclusive entre a classe média emergente.

No caso das bases locais e regionais, os partidos que conseguirem ter melhores estratégias, com conquistas de governos subnacionais e montagem de alianças com outras legendas, terão mais chances de ter bons resultados em 2014. As vitórias de Lula em 2006 e de Dilma em 2010 dependeram muito dessa variável. E a oposição perdeu terreno nesse campo, embora tenha conquistado governadorias estratégicas.

Também é fundamental organizar a sociedade, incluindo aí os batalhadores e emergentes da classe C, e conquistar os já organizados. A grande vantagem do PT é que ele tem apoio sólido em grupos com amplo poder derivado de sua organização. Desse modo, mesmo que o petismo perca as próximas eleições presidenciais, poderá fazer oposição com mais ímpeto e menos insegurança que o PSDB atual, para o qual falta uma base social mais articulada.

A forma mais certeira de atingir os grupos sociais é por meio das políticas públicas. Primeiro, definindo claramente o público-alvo, como no Bolsa Família e no ProUni. Segundo, alcançando bons resultados. O PT tem o governo federal e alguns Estados para atuar nesse campo. O PSDB tem governos estaduais importantíssimos. A principal chave para se chegar à classe média emergente está nessas máquinas.

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