quarta-feira, dezembro 22, 2010

ALON FEUERWERKER

Variável subestimada
Alon Feuerwerker
Correio Braziliense - 22/12/2010


Este talvez tenha sido um fator subestimado pelo governo brasileiro quando enveredou pela aventura de Teerã: o grau de parceria entre Washington e Pequim pela manutenção da estabilidade planetária


O presidente da República que sai vem reafirmando seguidamente a necessidade de reformar o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, segundo ele representativo de uma realidade já superada pela História.

Argumenta que o século 21 não pode ser lido apenas à luz das realidades produzidas na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Um diagnóstico razoável.

Nesses oito anos, a diplomacia brasileira esteve particularmente ativa nos investimentos para ampliar os espaços nos fóruns multilaterais, com resultados práticos imediatos modestos.

Sempre será possível argumentar, no futuro, sobre a veia visionária dos dirigentes brasileiros no início do século 21, mas aí a coisa passará ao terreno intangível.

O aumento da importância brasileira no mundo alimenta-se de vetores objetivos e subjetivos.

Estava escrito nas estrelas que quando o Brasil debelasse a inflação e entrasse numa rota de prosperidade nosso peso passaria a ser aceleradamente sentido. Com os Estados Unidos, a China e a Rússia, somos dos pouquíssimos no planeta com alta ponderação em território, população e economia. Simultaneamente.

E houve nas duas últimas duas décadas a forte presença do aspecto subjetivo. Uma boa sequência de governantes democráticos e empenhados na correção das nossas graves injustiças sociais.

Há diversos caminhos para ampliar o poder global, e a eficácia de um não é veredito da ineficácia de outros. A China, por exemplo, trabalhou em silêncio durante décadas, cuidando apenas de crescer, crescer, crescer. Os vetores inerciais da História conspiram a favor dos chineses e eles mostram perfeita noção disso.

Mais recentemente, nota-se alguma inflexão, com Pequim tateando crescentemente nas esferas política e militar. Só que sempre com a economia no comando. A preocupação mais recente dos líderes chineses parece ser com a garantia de desimpedimento das grandes rotas mundiais que cobrem a produção e o transporte de matérias primas.

Aqui um detalhe interessante. Poderia despertar curiosidade a relativa despreocupação da China com a hegemonia militar dos Estados Unidos. Acontece que ambos os projetos nacionais têm sido algo complementares.

Os investimentos militares de Washington ajudam a sustentar o domínio da superpotência, mas garantem também uma estabilidade planetária essencial para os negócios. E ninguém como a China tem mimetizado tão bem os Estados Unidos num aspecto central, bem explicado no bordão de que “o negócio dos Estados Unidos são os negócios”.

Há pendências, como a de Taiwan, que tem tudo para no futuro ser resolvida pacificamente, a exemplo do acontecido em Hong-Kong e Macau. Há temas mais complicados, como as Coreias, onde entretanto o consenso sino-americano é maior que o aparente. Que o diga o WikiLeaks.

Esta talvez tenha sido uma variável subestimada pelo governo brasileiro quando enveredou pela aventura de Teerã: o grau de parceria entre Washington e Pequim pela manutenção da estabilidade planetária.

Doce minoria
Todos os sinais apontam: ficou mais fácil a vida de Barack Obama no Congresso dos Estados Unidos depois que os democratas se arrebentaram nas eleições intermediárias este ano.

Para um governante como Obama, que no poder tem buscado fazer o que dissera na eleição, nem sempre é boa uma maioria congressual automática. O sujeito acaba ficando prisioneiro da própria agenda partidária.

Agora, quando os democratas protestam contra alguma coisa, Obama pode dizer — como fez no debate sobre a prorrogação dos cortes de impostos — que adoraria seguir a cartilha democrata, mas infelizmente precisa negociar com os republicanos.

Esperando Lula
Dias atrás, o presidente que sai protestou veementemente contra as pressões sobre Julian Assange, o chefe do WikiLeaks. Se foi o início de uma bela carreira internacional em defesa da liberdade de expressão, aparece agora uma nova — e até melhor — oportunidade para agir.
O cineasta iraniano Jafar Panahi acaba de ser condenado a seis anos de prisão e a 20 anos sem poder filmar, escrever roteiros, dar entrevistas ou viajar para o exterior. É acusado de apoiar a oposição ao governo do presidente Mahmoud Ahmadinejad.

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