sábado, outubro 23, 2010

ZUENIR VENTURA

Que campanha!
Zuenir Ventura
O GLOBO - 23/10/10


E ainda criticam a Marina por ter preferido a neutralidade, ou independência, como ela diz. De baixaria em baixaria, a campanha chegou enfim às vias de fato - da troca de ofensas à agressão física. O grande debate da semana foi para saber não o que se passava pela cabeça dos dois candidatos, mas para descobrir o que atiraram na cabeça de um deles. Teria sido uma bolinha de papel ou um objeto mais pesado ou os dois? Chamado pela TV Globo para resolver a questão, o perito Ricardo Molina, acostumado a opinar sobre casos de polícia, deu o seu laudo: "São dois eventos completamente diferentes. Um é o evento bolinha e o outro é o evento rolo de fita." Enquanto isso, outro "evento", esse da oposição, era registrado em Curitiba: Dilma quase foi atingida por dois balões cheios d'água atirados de um edifício sobre o carro aberto em que ia.

Tudo não teria passado de incidentes de campanha e excessos de militantes - lamentáveis, claro, mas sem maiores consequências políticas - se Lula não tivesse entrado precipitadamente no jogo, acirrado os ânimos e dado um de seus maiores foras. Baseado nas imagens do SBT e da Record, as únicas que pareciam existir até um determinado momento, ele se apressou a disparar ataques contra Serra, acusandoo de ter mentido e encenado a agressão. As imagens mostravam com nitidez uma bolinha de papel repicando na careca de Serra. Passados alguns minutos - vinte, dizia o locutor do SBT - o candidato recebia um telefonema e em seguida levava as mãos à cabeça. Logo depois, se dirigia para o hospital. Acontece que o repórter Italo Nogueira, da "Folha de S.

Paulo", que acompanhava a caminhada, fotografou com seu celular o instante em que o candidato era atingido uma segunda vez. A foto não é nítida, mas mesmo assim permitiu ao perito concluir que era o tal rolo de fita adesiva.

Pode-se alegar que Serra supervalorizou o incidente e seus efeitos. Afinal, nada de grave felizmente foi constatado pelos exames médicos, nem mesmo ferimentos ou sequelas. O que importa, porém, é que houve intenção e tentativa de agredir, e esse gesto é politicamente tão grave quanto o ato em si. É inconcebível que um presidente da República, em lugar de solidarizarse com a vítima, pedir-lhe desculpas, exigir providências para evitar a repetição do episódio, tenha preferido ridicularizála e compará-la com o goleiro chileno que encenou uma farsa.

Nesta reta final, seria melhor para sua biografia estender uma bandeira branca do que ficar estimulando a escalada de violência verbal, e agora literal, que ameaça a campanha.

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