sexta-feira, março 05, 2010

GILLES LAPOUGE


Por trás do voto no Iraque, o embate entre EUA e Irã


O Estado de S. Paulo - 05/03/2010
 
 
O Iraque vai às urnas no domingo na segunda eleição livre no país desde a invasão dos Estados Unidos, em 2003. Raramente uma votação assumiu tanta importância e suscitou tantas esperanças.

Para toda aldeia iraquiana, por menor que seja, estará inaugurada uma nova época histórica. Ou melhor, o regresso do Iraque à História, depois das terríveis convulsões sofridas ao longo de 40 anos: a sórdida ditadura de Saddam Hussein, a guerra implacável contra o vizinho Irã, a guerra do Kuwait, os conflitos com os curdos, a guerra de George W. Bush... Os iraquianos "esperam um milagre" dessas eleições.

O interesse dos países estrangeiros não é menos profundo, como do Egito, Arábia Saudita, Síria. Mas dois países estão diretamente interessados: o Irã e os Estados Unidos. No caso de Washington, essas eleições, se tudo correr bem, constituirão o fim do "pesadelo" que foi a expedição de Bush, a possibilidade de repatriar de maneira pacífica os soldados americanos, e, finalmente, a volta a assuntos sérios, isso é, aos "negócios".

Washington acompanhará a disputa. Um dos candidatos é Ahmad Chalabi, ex-favorito de Bush, mas hoje considerado pelos EUA um "agente duplo", personagem intrigante, brilhante. O Irã gostaria de vê-lo à frente do governo iraquiano, no lugar do atual primeiro-ministro, Nouri al-Maliki, o qual, apesar de tudo, tem chance de conseguir um segundo mandato.

Assim como os EUA, o Irã, o grande país vizinho, acompanha atentamente o desenrolar dos fatos. Esse país - que, desde o aiatolá Ruhollah Khomeini, orquestra "o integrismo islâmico" em todo o mundo - está atualmente envolvido numa queda de braço com o Ocidente, e principalmente com os EUA, sobre a bomba nuclear.

A rivalidade entre os EUA e o Irã em relação ao Iraque é feroz. O problema fundamental é o seguinte: o futuro poder iraquiano continuará no círculo de influência americano ou penderá na direção do Irã?

Apesar de tudo, os iraquianos xiitas, que são árabes, mostram certa reserva diante do fluxo constante da ajuda e das pressões de iranianos, também xiitas, mas persas. Por outro lado, no momento em que o Iraque espera reencontrar uma legitimidade democrática, não devemos esquecer que o Irã é uma ditadura.

Mas é preciso pensar bem no que diz respeito ao futuro: os americanos deixarão o Iraque em 2011. Os iranianos ficarão. E a fronteira entre o Iraque e o Irã tem 1.400 quilômetros de extensão.

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