terça-feira, fevereiro 16, 2010

BENJAMIN STEINBRUCH

Salvadores da pátria


FOLHA DE SÃO PAULO - 16/02/2010



O desafio dos candidatos à Presidência será mostrar como planejam a continuidade da boa fase do país


PASSADA esta semana de folia carnavalesca, o país vai entrar de corpo e alma no debate eleitoral. Ao que tudo indica outra vez a campanha presidencial estará centrada na discussão sobre quem é o salvador da pátria.
De um lado, o PT tende a apresentar os resultados dos oito anos do governo Lula sempre ligados à ideia do "nunca antes na história deste país". De outro, o PSDB tentará defender a velha tese tucana de que o sucesso do governo Lula se deve a herança, juízo e sorte. Herança porque Lula recebeu a economia arrumada do governo Fernando Henrique Cardoso, com privatizações realizadas, inflação baixa, setor público equilibrado e contas em dia.
Juízo porque Lula teve a inteligência de seguir a mesma política econômica neoliberal de FHC. E sorte porque ele pegou um período de franco crescimento da economia internacional, tanto no mundo desenvolvido quanto no dos emergentes.
O que ocorreu no mundo nos dois últimos anos enfraqueceu uma das pernas do discurso tucano. Não será mais possível incluir a sorte entre as razões do sucesso de Lula. A partir de 2008, a economia mundial viveu a sua maior crise desde os anos 1930. E, apesar disso, o país não enfrentou problemas sociais, continuou a criar empregos e tem, até por isso, um enorme prestígio internacional.
Por mais que esperneiem, tucanos e petistas precisam admitir que as duas administrações têm méritos. FHC dominou a inflação, promoveu equilíbrio fiscal e privatizou estatais, mas foi conservador demais. Falhou na promoção do crescimento econômico e na política social, talvez por medo de repetir desastradas experiências heterodoxas de períodos recentes. Quando acabou o governo tucano, as contas externas estavam complicadas, e o país apelou ao FMI.
Lula pagou o FMI, acumulou reservas em moeda estrangeira, foi muito agressivo na política social, mas também não teve coragem de fazer política monetária que reduzisse os custos internos e facilitasse o crescimento. Enfrenta hoje a valorização do real, que decorre, em parte, da política retrancada, que mantém os juros brasileiros entre os mais altos do mundo.
Curiosamente, as posições estarão invertidas na eleição deste ano em relação à de 2002. Quando José Serra enfrentou Lula oito anos atrás, o PSDB usou a estratégia de mostrar o risco que representaria para a economia a eleição de um presidente de oposição.
Agora, o PT vai tentar difundir a ideia do risco Serra, que nunca escondeu sua crença heterodoxa, sua aversão à independência do Banco Central e sua aprovação de uma política mais desenvolvimentista.
Talvez o PSDB precise mais hoje de uma Carta ao Povo Brasileiro, o documento no qual Lula prometeu, em 2002, não fazer mudanças drásticas na economia, do que o PT. Diferentemente de pleitos anteriores, o país entra na disputa eleitoral com excelentes perspectivas econômicas, inflação baixa, reservas de US$ 230 bilhões e crédito internacional, além da produção e do emprego em crescimento.
E o eleitor já está cansado da discussão sobre quem é o pai dessa criança. A criança já está aí e certamente terão mais crédito aqueles que apresentarem um plano para fazê-la crescer de forma sustentável. O desafio dos candidatos, portanto, será mostrar como planejam a continuidade da boa fase do país nas próximas décadas do século 21. Seja quem for o salvador da pátria, o que está feito, está feito. O eleitor precisa saber o que será feito.

BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

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