quinta-feira, janeiro 21, 2010

LUIS FERNANDO VERISSIMO

Planos e direitos

O GLOBO - 21/01/10


Só li do tal Plano Nacional de Direitos Humanos o que saiu, em fragmentos, nos jornais. Se entendi bem, o que eu duvido, este plano é uma versão revisada de um anterior, que por sua vez era uma revisão de um mais antigo. O que sugere que ou o novo plano altera radicalmente as propostas dos outros ou o escândalo que se faz com ele é indefensável. Por que o escândalo, e só agora? Pelo que li, não são grandes as diferenças entre o terceiro plano e os dois anteriores, inclusive o que é dos tempos do Fernando Henrique. E não há discrepância entre suas propostas e o que está em discussão, hoje, no resto do mundo civilizado. Coisas como a descriminalização do aborto e o casamento de gays são debates modernos, mesmo que não impliquem em mudanças imediatas. A proibição de símbolos religiosos em repartições públicas é consequência lógica do velho preceito da separação de igreja e estado, que não deveria melindrar mais ninguém – pelo menos não neste século. A ideia de novos anteparos jurídicos para mediar os conflitos de terra é de uma alternativa sensata para a violência de lado a lado. E a obrigação de proteger os direitos e a integridade de qualquer um da prepotência do estado e do excesso policial, alguém é humanamente contra?
O novo plano peca pela linguagem confusa e inadequada, em alguns casos. A preocupação com o monopólio da informação de grandes grupos jornalísticos, e com a qualidade da programação disponível, também é comum em todo o mundo. Muitos países têm leis e restrições para enfrentar a questão sem que configurem ameaças à liberdade de opinião e de expressão. E sem sugerir o controle de redações e o poder de censura que o tal plano – em passagens que devem ser imediatamente cortadas, e seus autores postos de
castigo – parece sugerir.
Sobra a questão militar. Em nenhum fragmento do plano que li se fala em anular a anistia. O direito humano que se quer promover é o do Brasil de saber seu passado, é o direito da Nação à memória que hoje lhe é sonegada. Só por uma grande falência da razão, por uma irrecuperável crise semântica, se poderia aceitar verdade como sinônimo de revanche.

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