domingo, janeiro 10, 2010

ELIANE CANTANHÊDE

Quase unanimidade

FOLHA DE SÃO PAULO - 10/01/10



BRASÍLIA - Raramente se veem uma causa tão apoiada quanto a dos direitos humanos e um plano tão desastrado quanto o de direitos humanos. O alvo eram os chefes e torturadores da ditadura militar, mas a metralhadora giratória atingiu, como mostrou o repórter José Casado, setores tão diversos quanto igreja, imprensa, TV, rádios, ruralistas, planos de saúde e o próprio Congresso Nacional.
Tão acostumados com planos quilométricos que não chegam a lugar nenhum, tão cansados de um ano de trabalho, às vésperas do Natal, tão viciados em privilegiar o detalhe e desprezar o conjunto, o fato é que cometemos todos -a imprensa, primeiro; a opinião pública, depois- o tremendo erro de não ler, não levar a sério, não medir as consequências. Como o próprio Lula.
Tudo o que restou do lançamento do plano foi a foto da ministra Dilma Rousseff sem a peruca.
Enquanto isso, os bastidores do governo ferviam. Jobim não assinou o plano, os comandantes militares ameaçaram pedir demissão, Tarso Genro pairou sobre a confusão, Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) sumiu. O governo se dividiu e, agora, com a leitura detalhada e as críticas à mostra, é a sociedade que está dividida. Há que melhorar e rever o que nem foi visto.
O plano é o principal e mais complexo problema que Lula enfrenta neste início de 2010, ano em que ele não deve bater de frente com velhos aliados da esquerda, nem virar as costas ao resto para, pretensamente, ficar ao lado deles.
Lula precisa de um pretexto para fazer meia volta, volver, cumprir a palavra com Jobim (Defesa) e satisfazer por tabela a tropa de descontentes, militares ou civis. E o pretexto é um viés stalinista e excessivamente amplo do plano.
Aliás, bem mais urgente e concreto do que discutir direitos humanos acadêmica e ideologicamente é agir: acabar já com a tortura de pobre em cadeias e penitenciárias.
Sem isso, o resto é tertúlia.

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