quinta-feira, dezembro 10, 2009

JANIO DE FREITAS

Os produtos de Jobim

FOLHA DE SÃO PAULO - 10/12/09


O poder de decisão pessoal do ministro ou é igual a zero ou só foge disso com o crime de improbidade, entre outros

"QUEM DECIDE sobre os produtos da defesa é o ministério, que hoje é controlado por um civil" -esta frase do ministro Nelson Jobim, da Defesa, alia uma presunção próxima da comicidade e, de outra parte, mais uma das falácias com que o governo procura impor o suspeitoso negócio que, sem base legal e sem aviso, tramou com a fábrica do avião de caça Rafale e com o presidente Nicolas Sarkozy.
Nelson Jobim formulou sua nova artimanha como resposta, pretensamente demolidora, de um abaixo-assinado dirigido por deputados ao presidente da Câmara, para que apoie o parecer da FAB na escolha dos novos caças, e não o negócio que Lula antecipou e Nelson Jobim batalha para efetivar.
Qualquer de dois motivos é suficiente para esclarecer a quem cabe a decisão "sobre os produtos da defesa". Por um, Nelson Jobim não tem autoridade para controlar nem a compra de uma botina sem condicionar-se às indicações do setor adequado das Forças Armadas e, em seguida, sem se submeter aos procedimentos de licitação entre fornecedores. O desconhecimento de suas atribuições pode ser total, mas seu poder de decisão pessoal, ou é igual a zero, ou só foge disso com o crime de improbidade, entre outros.
Pelo segundo motivo, como repete o próprio Lula, a escolha será submetida ao Conselho Nacional de Defesa, que, integrado também pelos presidentes do Senado e da Câmara, explica o abaixo-assinado de deputados. É claro que Lula confia em extrair a aprovação ao negócio já encaminhado, mas, de qualquer modo, aí está outro condicionamento a que Jobim é sujeitado.
Com a ilusão dos seus poderes, foi também dito por Jobim que a escolha dos novos caças precisa de mais um adiamento, este para o ano que vem. A responsabilidade foi atribuída à FAB, que não teria terminado a apreciação técnica dos candidatos Rafale, o sueco Gripen NG e o F-18 da Boeing. Apreciação técnica vista como abaixo de secundária, porque, segundo Jobim, "a escolha será feita pelas condições e pela transferência de tecnologia, ou seja, a escolha será política". Ou, como já disse várias vezes, "a escolha será política, portanto, do presidente".
Razões políticas podem entrar em assuntos assim. O caça russo Sukhoi, com altíssima cotação pela qualidade e objeto da disposição russa de ótimas concessões tecnológicas e comerciais, foi retirado da "escolha brasileira" para não contrariar pressões militares norte-americanas. E ainda considerando que Hugo Chávez, querendo comprar aviões sem sofisticação e mais baratos, como o Super-Tucano da Embraer, comprou o Sukhoi porque os Estados Unidos impediram o Brasil de vender-lhe o seu avião.
Mas as condições e a transferência tecnológica não são, contrariando Nelson Jobim, de ordem propriamente política. Antes são técnicas, quando não são apenas técnicas. Já por sua natureza e, muito importante no caso, porque não podem sobrepor-se às razões aeronáuticas. Ou seja, às especificidades militares, qualidades aviatórias e vantagens operacionais, inclusive de custo, consideradas as finalidades previstas.
Se tudo se aliar ou aproximar-se disso em dado avião, ótimo. Do contrário, a escolha da FAB não pode ser secundária. E, para começar quanto a condições, o Rafale é, de longe, o mais caro dos aviões em competição, um buraco na contabilidade francesa (o governo bancou, para a Dassault, 75% do custo de criação e produção do caça) e não foi comprado por nenhum país.
Por aí se entende tanto adiamento para a confirmação do negócio -se enfim Lula e Jobim conseguirem da FAB meios para a confirmação.

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