terça-feira, novembro 24, 2009

LUIZ GARCIA

Portas abertas

O GLOBO - 24/11/09

Foi um dia só. Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irã, e mais 200 empresários passaram 24 horas em Brasília e certamente tiveram muito pouco tempo para aprofundar as relações econômicas entre os dois países.

No outro lado da moeda, o tempo também foi escasso para afetar negativamente o prestígio internacional do Brasil, por ter hospedado um chefe de Estado que defende fortemente — muitos diriam histericamente — uma visão fictícia da realidade mundial.

Ahmadinejad, por exemplo, não acredita no Holocausto. Para ele, não houve a matança de judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Ele aparentemente precisa desse argumento para justificar outro: o de que não há razão para a existência de Israel.

Essa posição oficial do governo iraniano cria para Ahmadinejad um sério problema de credibilidade. Se a política doméstica e externa do Irã é apoiada em grande parte pela sustentação de uma mentira absoluta e escandalosa, em que momento e com que argumentos o Brasil deve ou pode confiar em qualquer outra afirmação ou promessa do Irã? Se não existe a premissa de recíproca boa-fé, todo entendimento parece inevitavelmente comprometido.

Por outro lado, nunca fechamos as portas a chefes de Estado de países com os quais temos relações diplomáticas.

Um país com legítima ambição de ampliar seu prestígio internacional, dentro e fora dos limites das Nações Unidas, não volta as costas a quem até agora não nos ofendeu ou agrediu.

Existe o argumento de que, mantendo boas relações com o governo iraniano, Lula poderia dar um passo no sentido de obter concessões de Ahmadinejad no campo dos direitos humanos. Parece otimista demais.

Por outro lado, o mesmo pode ser dito sobre a esperança de que, ao levar um fora do Brasil, os aiatolás começariam a pensar em respeitar esses direitos.

No fim das contas, o melhor mesmo pode ser defender a imagem do país de portas abertas. Recebemos Shimon Peres outro dia, ontem foi a vez de Ahmadinejad. Sem fazer julgamentos, conversamos com ambos.

Parece uma solução razoável. Não tão satisfatória quanto uma opção ética — mas, como qualquer diplomata pode explicar, com fartura de exemplos — não dá para fazer opções éticas todo dia.

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