domingo, novembro 22, 2009

ELIO GASPARI

A filantropia exige trabalho de quem pede

FOLHA DE SÃO PAULO - 22/11/09


Se as universidades forem à luta, receberão doações dos ex-alunos, como a PUC-RJ e o Insper


O REITOR do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, brigadeiro Reginaldo dos Santos, anunciou um ambicioso projeto de ampliação da escola e informou que espera reforçar seu orçamento com recursos de um fundo capaz de recolher "doações diversas, inclusive de ex-alunos e empresas". O doutor repetiu um velho sonho do baronato universitário: estimular a filantropia dos ex-alunos. Em 2002 o ITA anunciou a intenção de criar um fundo parecido e, quatro anos depois, contabilizava apenas uma doação, testamentária. Não é justo achar que os ex-alunos do ITA, formados numa das melhores escolas públicas (e grátis) do país, sejam capazes de tamanha ingratidão.
O brigadeiro e o ITA correm o risco de continuar na companhia da Universidade Federal de Pernambuco e da PUC de São Paulo. Uma, com um cadastro de 3.000 ex-alunos, conseguiu três doações. A outra expediu 40 mil cartas e não captou o que gastou na operação.
No ano passado a filantropia injetou US$ 41 bilhões no sistema educacional americano. É comum ouvir que esse tipo de generosidade não faz parte da cultura brasileira. E se isso for bobagem? Se for uma mistificação a serviço do ócio? O reitor diz que vai pedir dinheiro aos ex-alunos, expede suas cartas, vai jantar e, anos depois, ensina que os ex-alunos são ingratos, pois o brasileiro é culturalmente egoísta, tudo culpa da herança escravocrata dos colonizadores ibéricos.
As universidades americanas recebem doações porque seus reitores e professores rolam na lama. Cultivam laços com os ex-alunos, fazem campanhas regulares, ouvem as opiniões dos doadores e procuram saber o que devem fazer para conseguir mais dinheiro. No Brasil, são poucas as escolas onde há essa disposição. Uma das maiores instituições filantrópicas do país informa que jamais recebeu pedido de universidade pública. Para que não se fique no dilema do ovo e da galinha, vale a pena expor dois casos de sucesso:
1) O Departamento de Economia da PUC do Rio de Janeiro arrecada cerca de R$ 1 milhão por ano. Um único doador paga todos os livros de todos os alunos bolsistas do ProUni. Trabalhando, descobriu-se que os pedidos por carta de nada adiantam. Viu-se que não basta um só contato pessoal com o doador. Para conseguir freguesia, os doutores oferecem quatro seminários por ano para pessoas e empresas, a R$ 10 mil cada, com direito a dois lugares. Nesse esquema, professores como Pedro Malan e Gustavo Franco doam tempo. Para a crônica dos méritos das ekipekonômicas produzidas pela PUC do Rio, todos os seus sábios estão entre os doadores, com a estrondosa ausência do professor Pérsio Arida.
2) Trabalhando num universo maior que o dos ex-alunos, em quatro anos o Insper (ex-Ibmec São Paulo), arrecadou cerca de R$ 3 milhões para seu programa de bolsas de estudo. O Insper tem o curso de administração de empresas mais caro do país (R$ 2.500 por mês) e suas salas de aula replicam as melhores instalações de Harvard. Seria o caso de pensar que seus doadores são milionários amigos. Falso. A maior doação já recebida pelo Insper para o fundo de bolsas foi de R$ 150 mil. A doação média fica em R$ 6.000. Neste ano ele pretendia arrecadar R$ 500 mil e já entesourou R$ 540 mil. O número de doadores ficou em torno de 80.
O vestibular do Insper é duríssimo e, combatendo a fama de elitista, a escola caça bons alunos na rede pública. Como acontece nas boas universidades americanas, a seleção do Insper é financeiramente cega. Se o garoto não pode pagar, isso só se descobre depois que ele foi aprovado. O dinheiro, emprestado pelo fundo de bolsas, acaba aparecendo. Nunca houve caso de jovem que deixasse de estudar por falta de dinheiro, assim como não houve caso de prestação da dívida que não fosse cobrada. (O casal Obama só zerou suas contas com Harvard depois que entrou em casa o dinheiro dos direitos autorais dos livros do companheiro Barack.)
A PUC-RJ e o Insper conseguem recursos porque seguem a lei de Gentil Cardoso: "Quem se desloca recebe, quem pede tem preferência". Quem pede mas não se desloca, fica na mão.

SERRA 2010
Encontrando-se na semana passada com Ciro Gomes, o governador Aécio Neves desafiou o destino. Se em algum momento ele achou que aprofundaria a indecisão de José Serra, fez a conta errada. O presidente do PSDB, Sérgio Guerra, assegura que o encontro de Minas estimulou o governador paulista a pular no ringue.

DOIS PTS
Para o Planalto se preocupar: a bancada do PT na Câmara rachou durante a votação da emenda constitucional que acabava com o foro privilegiado e salvava a turma do mensalão da lâmina do ministro Joaquim Barbosa. A emenda precisava de 308 votos e o governo trabalhou duro, mas só conseguiu 260. Na bancada de 56 deputados do PT, 19 abstiveram-se e 1 votou contra a manobra. (Os companheiros-mensaleiros não participaram da votação.)

BOLSA DITADURA
Nosso Guia pode ter os melhores argumentos para vetar mudanças nas contas da Previdência, mas ficaria numa posição mais respeitável se ao mesmo tempo abrisse mão de sua Bolsa Ditadura. Por conta de 31 dias de cadeia (com direito a cenas sombrias no filme "Lula, Filho do Brasil") Nosso Guia recebe perto de R$ 5.000 mensais. Se tivesse deixado na poupança todos os mimos que recebe desde 1996, teria mais de R$ 1 milhão.

RECORDAR É VIVER
Durante a crise financeira os sábios do banco Morgan Stanley tinham uma pequena obsessão: a cada 90 dias previam quadros sombrios para o Brasil. Tudo bem. Sabe-se agora que na semana seguinte à quebra da Lehman Brothers o principal executivo do Morgan Stanley foi informado que o banco quebraria antes do próximo sábado.

PARALELO
De um malvado:
"A Dilma Rousseff é o João Figueiredo do Lula".
Em 1978 o presidente Ernesto Geisel escolheu o general Figueiredo para sucedê-lo. Geisel achava que ele era aplicado, corajoso e frugal. Ademais, com oito anos de experiência no Palácio do Planalto, conhecia o funcionamento do governo.
Estava errado em todos os itens.

MANIA TEM PREÇO
Estourou uma bonita guerra de abaixo-assinados no Leblon. A escola infantil Espaço Educação tem que se mudar da casa que ocupa desde 1983, na rua Almirante Guilhem, e alugou um imóvel na Timóteo da Costa, a poucas centenas de metros de distância.
Os moradores da nova vizinhança não querem colégio por perto. Nem mesmo um pré-primário com 190 alunos, sem atividade noturna, fechado nos fins de semana. Conseguiram 1.200 assinaturas e levarão seu caso ao prefeito Eduardo Paes.
Os pais das crianças mobilizaram-se e esperam ter 2.000 assinaturas nos próximos dias.
Brava gente essa. Para conter os bárbaros, não quiseram edifícios com apartamentos pequenos por perto. Depois barraram os apart-hotéis. Agora querem escorraçar uma escola de filhos dos moradores do lugar.
As idiossincrasias são livres, mas não são grátis. Quando Louise Carnegie soube que iam construir um prédio alto em frente ao seu jardim, reclamou com o marido. Andrew Carnegie comprou o terreno, e o casal ficou em paz. Ele era um dos homens mais ricos dos Estados Unidos, podia pagar por suas manias.

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