quinta-feira, outubro 29, 2009

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Frente fria, tornados e IOF


Folha de S. Paulo - 29/10/2009



Ações baixam sob o peso da própria valorização, más notícias nos EUA e incertezas sobre juros nos emergentes


ALGUNS REPRESENTANTES dos povos dos mercados quiseram fazer do novo IOF o bode das quedas recentes da Bovespa, em especial a de ontem, a maior desde março. De fato, o lançamento das ações da Cetip, ontem, foi vítima do novo imposto. Mas a conversa do IOF é, pelo menos por ora, lorota.
As ações brasileiras levaram tiros vindos de diversas direções e, enfim, arriaram também sob o próprio peso de sua valorização. As estrelas da companhia, Vale e Petrobras, de maior peso na Bolsa paulista, caíram em torno de 4,5%, mais ou menos na média da baixa do Ibovespa (4,75%).
Outras grandes caíram ainda mais, como Itaú Unibanco (6,7%) e Gerdau (7,2%); a MMX, mineradora de Eike Batista, perdeu 9,3%. Mas a razia foi geral, batendo no setor de papel a outras instituições financeiras, de carnes a imóveis: caíram Klabin, JBS, Bradespar, Gafisa, Cyrela e Rossi e outras do ramo, que têm lançado novas ações copiosamente.
Entre pessoas mais ponderadas do mercado, atribuía-se a queda das empresas do setor imobiliário à superoferta e à supervalorização dos papéis dessas companhias. No caso das commodities, a "expectativa de lucro menor do que o esperado" na Vale teria derrubado os papéis da megamineradora. Além do mais, atribuiu-se ao mau resultado da ArcelorMittal, lá fora, a pancadaria sobre as ações das siderúrgicas.
Mas o motivo mais provável da liquidação de ontem na Bovespa foi a oferta vasta e variada de motivos para vender papéis que subiram demais. Como o mercado americano também tomou um caldo, havia todas as condições meteorológicas para um pequeno tornado de vendas. A ventania passou também por quase todas as Bolsas de "emergentes", em várias dos quais se começa a discutir o aumento de juros ou a redução dos estímulos anticrise, o que também não tem ajudado as ações nessas praças. Na China, o governo pretende restringir o crédito para pessoas físicas, com o objetivo, entre outros, de evitar a especulação com ações.
O mau resultado das vendas de casas novas nos EUA e a confiança ainda muito desconfiada do consumidor americano em seu futuro serviram de lembrete de como ainda vai mal das pernas a economia dita "real". Quem está ganhando dinheiro mesmo são os mesmos de sempre -os graduados dos bancos.
O lucro da Vale, no fim das contas, não foi nada mau: R$ 3 bilhões, com queda de 61% em relação ao do terceiro trimestre de 2008, trimestre que, porém, foi o ápice das matérias-primas. O lucro da empresa subiu mais de 100% em relação ao segundo trimestre do ano. Ruim?
O grande azar foi o da Cetip, que lançou ontem suas ações na Bovespa, caindo 9% na estreia. A Cetip é uma empresa responsável por registrar e compensar negócios do mercado financeiro, como os derivativos.
Pertence a um fundo de "private equity" (Advent), ao Itaú e ao Bradesco. A empresa, sim, sofreu com o vento contrário do IOF, com a realização geral de lucros e com a ressaca de IPOs. Mas os números dos últimos dias são péssima régua para avaliar o efeito do IOF sobre o mercado, trate-se de fluxo cambial, do dólar, de ações ou o que seja. A frente fria dos últimos dias criou neblina demais para enxergar e medir algo com precisão decente

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