segunda-feira, outubro 12, 2009

IVES GANDRA MARTINS

Reflexões sobre Honduras

O ESTADO DE SÃO PAULO - 12/10/09


A crise hondurenha tornou manifesto que a OEA é muito mais uma organização com clara vinculação ideológica ao populismo do que uma organização de Estados Americanos voltada para a preservação da democracia.

O estrangulamento da economia hondurenha, por terem seus líderes apenas cumprido sua Constituição ao depor um presidente golpista, demonstrou que a intervenção, com caráter exclusivamente ideológico, conforma a orientação daquele organismo, que conseguiu manipular de tal maneira “os politicamente corretos” ao ponto de se ter a impressão de que pretendiam apenas preservar a democracia em Honduras.

Esta já estava preservada pelo cumprimento da Lei Maior. Em seu artigo 239, declara que quem pretender introduzir a reeleição pelo simples fato de formular tal intenção será deposto do cargo em que estiver e que, se for o presidente da República, será substituído pelo vice-presidente, ou, não havendo vice eleito , pelo Parlamento, o substituto (artigo 242).

Mais do que isto, determina que as Forças Armadas (artigo 272) devem preservar a Constituição hondurenha e, no caso do presidente Zelaya, a pedido tanto do Parlamento quanto do Poder Judiciário, depuseram-no por ter convocado plebiscito para introduzir a reeleição, cuja proibição é cláusula pétrea.

Como se percebe, a democracia hondurenha impõe a alternância de poder, que os líderes vocacionados para o autoritarismo não desejam, como ocorre com Chávez, Mugabe, Morales, Kadafi, Corrêa e todos os ditadores africanos.

Como acentuou Dalmo Dallari, em artigo para a Folha, dia 3, a deposição de Zelaya foi absolutamente constitucional, porque descumpriu a Constituição hondurenha, e a pena, nestes casos, é a deposição.

A OEA denominou o governo constitucional de golpista e o presidente golpista, de democrático, insuflada pelo semiditador Chávez.

Seu secretário-geral soltou esta pérola ideológica: “A Constituição hondurenha é uma das piores constituições do mundo”! E Chávez armadilhou o presidente Lula com a ida do histriônico mandatário, colocando-o na embaixada brasileira, que passou a ser uma nação intervencionista, pois permitiu que sua embaixada se transformasse em escritório promotor da tentativa de guerra civil no país, o que felizmente não ocorreu.

A pressão internacional, liderada ideologicamente por semiditadores latino-americanos, enfraqueceu Honduras, que, sob intervenção econômica e política, foi cedendo, ao ponto de ser obrigada a negociar seus próprios fundamentos constitucionais e democráticos.

A lição que tiro do episódio é de que ou a OEA carece de constitucionalistas, o que seria lamentável, ou agiu exclusivamente por motivos ideológicos – e não democráticos – sufocando o segundo mais pobre país das Américas e, desrespeitando, claramente, seu estatuto maior.

Pior foi o papel do Brasil, cuja Constituição proíbe a intervenção e respeita a autodeterminação dos povos, que transformou sua embaixada em palanque político de presidente golpista.

Está-se chegando a um acordo para preservação das eleições democráticas de 29 de novembro, cujo processo eleitoral em Honduras segue sem máculas ou arranhões e, se Honduras conseguir sobreviver, o próprio presidente Lula, que envolveu a diplomacia brasileira na pior de suas aventuras, poderá ser redimido. Meu neto, Guilherme, define o presidente Lula como o Agente 86 da política, ou seja, aquele agente do Controle que, mesmo errando, acerta sempre. E Lula, com o capital da vitória sobre Chicago, Tóquio e Madri na Olimpíada de 2016, forjou sua imagem na história, que dificilmente será superada nos próximos tempos.

Que errou, todavia, errou, ao desrespeitar a Constituição hondurenha e abrigar um presidente canastrão no seio da embaixada brasileira.

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