terça-feira, agosto 11, 2009

LUIZ GARCIA

Peculiar bazófia


O Globo - 11/08/2009

No miolo das crises políticas, palavras frequentemente têm peso igual ou, pelo menos momentaneamente, até maior que o dos fatos. Faz sentido. Não existe ação política sem o verbo, no princípio como no meio e no fim.

No fim de semana, uma frase do senador Paulo Duque, contribuição de parte do eleitorado fluminense para o folclore político nacional, ajudou o país inteiro a entender melhor as atuais atribulações do Congresso. Presidente do Conselho de Ética do Senado, cabia a Duque decidir o que fazer com um malcheiroso buquê de pedidos de investigação de alegados feitos e malfeitos do senador José Sarney.

Havia de um tudo: nepotismo, tráfico de influência, desvio de recursos, fraude fiscal. Duque não penou nem pensou: sem examinar um documento sequer, ou ouvir quaisquer membros do conselho, arquivou tudo.

E deu explicação lapidar: “Não temo a opinião pública. Adoro decidir sozinho.” Quem até agora não conseguira entender por que as tais atribulações aconteceram, na quantidade e na profundidade que se sabe, tem aí uma boa pista. Não se trata apenas da fraqueza de caráter de um número considerável de legisladores.

Há também outro dado negativo: a certeza, revelada pelo senador Duque e compartilhada por sabe-se lá quantos de seus colegas, de nenhuma necessidade de prestação de contas.

Em episódios não muito raros nem distantes, senadores têm sido punidos por seus iguais. Até mesmo pelo singelo pecado da indiscrição sem objetivo de ganho material, como aconteceu com o poderoso Antonio Carlos Magalhães. Foi, parece, no tempo em que o Senado ainda era tido como casa de respeito. Entre outros motivos porque tinha algum temor pela opinião pública.

Hoje, o patamar mais alto do Legislativo passa pela crise mais séria de sua história. Pode, ou talvez ainda possa, sobreviver à desmoralização absoluta — o que talvez seja muito pior do que qualquer dos perigos que já enfrentou, inclusive na ditadura militar.

Seja como for, mas isso só acontecerá por iniciativa própria.

O Conselho de Ética tem — ou tinha, até se conhecer o desprezo pela opinião pública do senador Duque, e sabe-se lá quantos de seus colegas — meios e maneiras de afastar as nuvens pretas visíveis no horizonte.

Não seria fácil, mas apenas questão de cumprir uma obrigação.

Há denúncias, atingindo o patamar mais alto da Casa, sobre nepotismo, falsidade, tráfico de influência, desvio de recursos e fraude fiscal

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