quarta-feira, julho 08, 2009

FERNANDO CALAZANS

Vivendo de costas

O GLOBO - 08/07/09

Deu no Globo o que foi mostrado pelo “Esporte Espetacular”: em entrevista a Galvão Bueno, nosso Joel Santana, técnico da África do Sul, se queixou educadamente que, ao fim do jogo com o Brasil na Copa das Confederações, seu colega Dunga não o cumprimentou.
Joel relatou assim: fui falar com Dunga, mas Dunga não veio falar comigo. Quem se apressou a fazê-lo foi o auxiliar Jorginho.
Joel Santana disse que faltou cavalheirismo a Dunga, até porque Dunga tinha sido seu jogador no Vasco. Jogadores da seleção brasileira, em sua maioria, cumprimentaram o treinador brasileiro da África do Sul.
Mas cabe uma pergunta a Joel: será que, nos tempos em que os dois trabalharam juntos no Vasco, Joel não havia reparado que cavalheirismo não é o forte do Dunga? Conhecendo Dunga, como deve conhecer, não deveria ter lhe causado espanto ou estranheza o fato de Dunga não caminhar para cumprimentá-lo depois do jogo entre Brasil e África do Sul. Ao contrário, deu-lhe as costas.
Sejamos francos, Joel: não há nenhuma novidade nisso. Os tempos de Dunga na seleção brasileira são outros, mas o Dunga é o mesmo. No início de seu trabalho, diante de tantas hesitações, críticas de todos os lados caíram sobre Dunga — inclusive minhas.

Com o tempo, as vitórias, a evolução do trabalho e até os títulos da seleção, essas críticas viraram elogios — inclusive meus. O tom mudou, sim. Mas o Dunga, não. Dunga é o mesmo.
No meu caso específico, de todo modo, os elogios são mais comedidos, eles se relacionam apenas ao trabalho profissional do Dunga que, não resta dúvida, tem apresentado resultados importantes e eloquentes.
Quanto à figura humana, a que transparece no episódio com Joel Santana, não tenho por que elogiá-la. Dunga não tem cavalheirismo nem elegância. São termos estranhos ao seu parco vocabulário.
E não será agora, como já não tem sido desde que assumiu o cargo — considerado no Brasil tão relevante quanto o de presidente da República — que ele vai melhorar, quer dizer, que ele vai mudar. Se eu fosse o Joel, que já o conhece há mais tempo, nem iria cumprimentá-lo.

Pois é: mas repórteres esportivos — meus colegas e (alguns deles) meus amigos — têm que cumprimentar Dunga, têm que falar com ele, têm que entrevistá-lo, têm que se relacionar com ele. Aí é que está o problema.
E pior: não só com ele, Dunga, mas com inúmeros, incontáveis treinadores por aí, vários deles — eis o problema de novo — sem educação como o técnico da seleção brasileira.
Os envolvidos no assunto que me desculpem, mas há algo hoje na nossa imprensa esportiva que me incomoda profundamente.
É ver colegas repórteres de rádio, tevê e jornal, serem destratados e espezinhados nas famigeradas entrevistas coletivas dos professores doutores de falta de educação e, ao mesmo tempo, ver comentaristas em cabines herméticas, em estúdios de televisão, nas redações dos jornais ou mesmo em suas residências, jogando flores nos mesmíssimos treinadores, dedicando-lhes palavras de admiração e deslumbramento, embasbacados com as geniais elucubrações táticas desses seres superiores, essas divindades que conduzem os destinos do futebol brasileiro e, quiçá, do país.
Sim, meus caros, não temos que ir ao encontro desses senhores supremos, nem suportar-lhes os egos deformados. Se o fazemos, é ao menos à distância.
Mas alguém tem que fazer isso de perto. A esses bravos colegas repórteres, minha solidariedade. Podem contar comigo. Vocês sabem, não sabem?

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