segunda-feira, junho 08, 2009

RUY CASTRO

A década que não existiu

FOLHA DE SÃO PAULO - 08/06/09

RIO DE JANEIRO - Tenho uma tese de difícil defesa e baixa possibilidade de aceitação, que só revelo aos mais chegados quando eles prometem não rir: a de que os míticos anos 60, que apaixonam todo mundo- tanto os que os viveram como os que só os conheceram de livro, disco ou filme-, não existiram.
Com isso quero dizer que, até 1965, ainda não tínhamos saído completamente dos anos 50. E, a partir de 1966, já estávamos nos anos 70 e não sabíamos. Donde os anos 60 não existiram. Tudo bem, é um enunciado ousado, talvez antipático. Mas, somente para argumentar, eis alguns dos motivos que me levaram a tal conclusão.
Até 1965, os homens ainda usavam terno e gravata. Cuidavam para não desfazer o vinco da calça e aplicavam Glostora ao topete. Os rapazes dobravam as manguinhas da camisa-esporte ao estilo James Dean. As mulheres usavam anáguas, armavam o cabelo com Bombril e só saíam à rua de frasqueira. Ainda não havia a pílula, donde os casais tinham de se virar para fazer amor. Fumava-se Hollywood e se tomava Old Parr. Tudo como nos anos 50. E, como nestes, lia-se Sartre, Faulkner e Giselle Monfort.
A partir de 1966, tudo acima foi abandonado, exceto Sartre, premiado com alguma sobrevida. Os homens aderiram aos jeans, às camisas coloridas e às calças justas e sem bolso. Muitos nunca mais foram ao barbeiro. As mulheres converteram-se à minissaia, passaram para a maxissaia e acabaram na midissaia. Veio a pílula e nos locupletamos todos. Fumava-se maconha e se tomava LSD. Como nos anos 70. E, como nestes, já se lia Marcuse, McLuhan e Mao Tse-tung.
Ou seja, sobrou pouco que se pudesse considerar exclusivo dos anos 60. Godard. Barbarella. Twiggy. Ravi Shankar. Geraldo Vandré. Leno & Lílian. Vladimir Palmeira. Ted Boy Marino. Topo Gigio.

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