domingo, junho 07, 2009

DANUSA LEÃO

Pequenos prazeres da vida

FOLHA DE SÃO PAULO - 07/06/09


Quando telefona aquele amigo que você adora, e diz "vou já para aí". E, quando chega, te dá um grande abraço



A VIDA nos dá muitos prazeres, ah, isso dá. Dos mais simples aos mais sofisticados, dos singelos até aqueles que você batalha uma vida inteira para conseguir; no tema, é claro que dinheiro ajuda, e quem disser que não, está mentindo.
Um dia, em pleno Taiti, uma milionária surtou e começou a gritar "pra que dinheiro? As melhores coisas do mundo, como esse céu, esse sol, esse mar, não custam nada"; aí, alguém deu logo o troco: "É, mas para chegar aqui você gastou US$ 6.000 de passagem e seu hotel custa US$ 850 por dia". Foi um silêncio total.
Mas existem prazeres que não custam nada. Quando telefona aquele amigo que você adora, e diz "vou já para aí, estou louco para te ver". E, quando chega, te dá um grande abraço e diz que você está mais bonita do que nunca, tem melhor?
E quando seu filho liga e diz "estou com saudades", sem nenhuma segunda intenção -descolar uma grana, por exemplo-, tem alguma coisa que faça seu coração mais feliz?
Existem ainda outros tipos de prazeres que não custam nada, e que também são maravilhosos, como estar rodeada de pessoas felizes. Convenhamos: ser feliz sozinha não tem tanta graça, bom mesmo seria saber que o mundo inteiro está feliz -mas aí já é meio difícil.
Mas há também alguns prazeres que são de uma mesquinhez horrenda: quando entra na festa a ex do seu atual, por quem ele ainda baba, sem perceber que a pestana postiça do olho esquerdo está caindo; tem melhor? Avisar, nem pensar: é um prazer legítimo, e Deus, se fosse mulher, compreendia e perdoava.
Gente que estuda com sacrifício e um dia consegue se formar -emprego depois é outra história-, não é o máximo? E gente que luta com um monte de concorrentes e consegue vencer, seja no esporte, seja no trabalho? Sim, porque o importante não é competir e sim vencer, quem não sabe?
Existem coisas muito boas na vida -umas importantes, outras bem bobas. Um copo de cerveja gelada tomada de um gole só, numa tarde de calor; cheiro do carro novo; a empregada nova, quando você percebe que ela acertou com o tempero; o resultado do exame que diz que sua saúde está ótima; são sensações maravilhosas, de tão boas.
Mas tem uma coisa idiota, que para mim é das melhores: é quando eu estaciono meu carro numa rua e aparece, vindo das trevas, o flanelinha, já com o polegar para o alto. De medo que ele arranhe o carro, eu, com ódio, retribuo com o mesmo gesto: está selado o contrato.
Duas horas depois, eu volto, não vejo ninguém, e quando vou saindo de fininho, rezando para ele não aparecer, ouço um assovio: é ele, o flanelinha, correndo pela rua para me alcançar.
Tudo bem, R$ 2 não vão me fazer mais pobre, mas é uma delícia, quando dá tempo de escapar.
Quando me acontece, eu me sinto a mulher mais feliz do mundo.

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