sábado, maio 16, 2009

O PUTEIRO BRASIL

REVISTA VEJA

Brasil
UM CURIOSO E APIMENTADO CASO DE AMOR...

...com o dinheiro público. No Tocantins, recursos 
oficiais são usados até para comprar as roupas
íntimas da mulher do governador


Alexandre Oltramari e Diego Escosteguy

Humberto Leão/Secom
SEM LIMITE O governador Marcelo Miranda e sua mulher, Dulce: joias, presentes e caridade. Mas quem paga é o contribuinte


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• Vídeo: trechos de cenas de corrupção explícita

O Tribunal Superior Eleitoral começará a julgar nesta semana mais um processo de cassação envolvendo um governador – o quarto nos últimos quatro meses. O réu é o governador do Tocantins, Marcelo Miranda, do PMDB, acusado de abuso de poder econômico na eleição de 2006. Se for inocentado, Miranda não terá muito tempo para comemorar. O governador está prestes a enfrentar outra encrenca colossal. No início deste mês, a secretária Ângela Costa Alves decidiu contar à Polícia Federal tudo o que viu e, principalmente, todos os trambiques que ajudou a fazer como principal assessora de Dulce Miranda, a mulher do governador. A ex-funcionária, que trabalhou com a primeira-dama de 2003 a 2006, disse que foi obrigada a abrir uma conta para receber dinheiro desviado do governo do estado, com o qual bancava, entre outras coisas, despesas como joias e roupas íntimas para Dulce. O depoimento, por si só, já seria devastador para a imagem do governador. Mas é pior. Ângela Alves também entregou à PF algumas provas do que ela testemunhou. A pilha de documentos inclui recibos do dinheiro vivo distribuído a eleitores, extratos da empresa que usou para lavar dinheiro do governo e até um vídeo com cenas de corrupção explícita (trechos podem ser vistos abaixo).

Segundo a ex-assessora, depois de várias denúncias de nepotismo, Miranda foi obrigado a exonerar a mulher de uma das secretarias do governo. Para que ela continuasse mantendo seu padrão de vida, o governador criou uma estrutura clandestina para drenar recursos públicos. Uma empresa simulava contratos com o governo e repassava os valores recebidos para a conta administrada por Ângela Costa. De acordo com extratos em poder da polícia, em apenas seis meses a empresa recebeu 3,6 milhões de reais. O dinheiro, conforme depoimento da secretária, era distribuído à primeira-dama e a um tio do governador, além de ser usado para pagar despesas pessoais do primeiro-casal. "Entreguei dinheiro nas mãos dela várias vezes. Entreguei dentro do palácio e até dentro do quarto dela", contou Ângela a VEJA.

No réveillon de 2006, a empresa Reis & Arruda recebeu 750 000 reais do governo do Tocantins para bancar as despesas da festa oferecida pelo primeiro-casal. O rega-bofe, porém, custou apenas 300 000 reais. Os 450 000 reais do superfaturamento, de acordo com a ex-servidora, foram divididos entre a primeira-dama (56 000 reais), um empresário (44 000 reais) e um secretário do governo (350 000 reais). Ângela entregou à PF extratos de sua conta mostrando o depósito de 750 000 reais, as despesas verdadeiras com a festa e o saque na boca do caixa de 450 000 reais. Também entregou documentos de outras despesas superfaturadas, que abasteceram o duto dos desvios. "Muitas só existiram no papel. O dinheiro eu usava para pagar despesas dela ou entregava a quem ela e o tio do governador mandavam", afirma. Ângela diz, ainda, ter comprado roupas para o governador e joias para a primeira-dama. "As joias foram presente de aniversário de casamento. Enrolei em uma camisola de seda, da cor dos olhos dela, e entreguei a ele. Ela abriu o presente pela manhã, em casa, na frente dos filhos."

TELA QUENTE Ângela Costa e o vídeo com cenas explícitas de corrupção: propina em nome da primeira-dama

A ex-assessora relatou ter distribuído dinheiro a beneficiários do programa Governo Mais Perto de Você, uma peregrinação que secretários e a primeira-dama faziam pelo interior do Tocantins. Nesses eventos, segundo Ângela, Dulce Miranda distribuía dinheiro vivo à população. Para provar, ela entregou à PF um relatório assinado por uma assessora do governo, listando, uma a uma, 97 pessoas atendidas por Dulce Miranda em Ananás, a 520 quilômetros da capital, no dia 29 de abril de 2006. Ao lado dos nomes, há uma descrição do atendimento solicitado, como cesta básica, colchão, material de construção, casa própria, botijão de gás, passagem e "ajuda de custo". Com a lista, a ex-assessora entregou dezenas de recibos, assinados pelos eleitores, atestando a distribuição do dinheiro.

Procurado por VEJA, o governo do Tocantins informou que tomou conhecimento do depoimento da ex-assessora na semana retrasada e desmente todas as acusações. "São alegações sem provas. Não há sequer um inquérito, uma investigação formal. Tanto que nem fomos notificados pela Polícia Federal", diz o secretário de Comunicação, Sebastião de Melo. Ele encaminhou a VEJA uma carta enviada pela ex-assessora ao governador em janeiro passado, na qual ela se mostra arrependida das acusações que, depois, veio a confirmar oficialmente à polícia, inclusive anexando uma novidade escabrosa. Trata-se de um vídeo gravado em outubro de 2008. Nele aparece José Francisco do Santos, gerente de compras do governo, extorquindo um fornecedor. Ele pede 3 500 reais. "A primeira-dama pediu pra eu comprar um notebook para ela por 3 500. Assim que eu conseguir, eu vejo aquele empenho pra você", diz Santos, ao embolsar um maço de dinheiro. Ao final, o empresário pede ajuda para sua empresa se livrar do pagamento de multas e impostos. O governo do Tocantins tomou conhecimento da propina em outubro passado, por meio de um amigo do empresário extorquido. O gerente de compras foi afastado do cargo – e, em seguida, transferido para uma empresa estatal, a Mineratins, cumprindo determinação do governador Marcelo Miranda.

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