segunda-feira, maio 18, 2009

GEORGE VIDOR

Viés de baixa

O GLOBO - 18/05/09

A solução encontrada pelo governo para o conflito entre os rendimentos das cadernetas de poupança está longe do ideal, mas teve um aspecto muito positivo, que foi o de estabelecer na prática um viés de baixa para as taxas básicas de juros, quase definindo uma meta (7,25% ao ano), embora sem prazo para alcançá-la. Trata-se de um passo importante para vencer barreiras psicológicas.

Quando os juros nominais caírem para menos de 10%, o que provavelmente ocorrerá na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em junho, a economia brasileira estará pisando em terreno desconhecido por todos nós. Então, os mercados precisam estar previamente convencidos de que é possível conviver com juros mais baixos, sem pôr em risco as metas de inflação ou as contas externas do país. Nesse sentido, qualquer solução, mesmo que temporária, para o conflito cadernetas x fundos, já é bem-vinda.

Ainda que a expectativa seja de uma forte contração dos investimentos e até redução do Produto Interno Bruto (PIB) este ano, alguns setores continuam de vento em popa na economia brasileira, como é o caso da indústria da construção naval. O novo estaleiro Atlântico Sul, em Ipojuca (junto ao Porto de Suape, Pernambuco), por exemplo, está com 13 mil trabalhadores no momento. Cerca de 6,5 mil são operários contratados para construir as próprias instalações do estaleiro, e os demais trabalham nas áreas concluídas, montando navios que renovarão a frota da Transpetro.

O Atlântico Sul surgiu a partir de uma encomenda de 15 navios. O casco do primeiro deles deverá entrar em outubro no dique que está em fase de construção. Os blocos que comporão os navios são montados fora do dique com praticamente todas as peças que ficarão embutidas no interior do casco. Depois serão içados por um gigantesco guindaste para o dique e lá acoplados um ao outro. Assim, até abril de 2010, o navio será lançado ao mar, quase pronto para navegar.

A atividade no estaleiro já teve um impacto significativo na vida da região. Grande parte da mão de obra foi recrutada em lugares próximos, mas 300 trabalhadores experientes do Rio se mudaram para lá. Um dos atrativos é a possibilidade de casa própria oferecida pelo estaleiro. Serão construídas 2 mil moradias e os ocupantes pagarão um aluguel em torno de 5% do salário. Ao fim de dez anos, se tornarão proprietários. As primeiras 200 moradias ficaram prontas.

Tal impacto positivo deverá ocorrer também em outras regiões do país (Ceará, Santa Catarina e São Paulo) que receberão novos estaleiros. No estado do Rio, que concentra a maior parte dessa indústria, os municípios de Quissamã, Campos e possivelmente São João da Barra abrigarão estaleiros que vão ocupar terrenos onde nada se produz hoje. A licença ambiental para a dragagem do canal da Barra do Furado, no Norte fluminense, saiu em março e o edital de licitação para a obra (no valor de R$ 90 milhões) está caminhando. Concluída a dragagem, em cada uma das margens do canal surgirá um novo estaleiro.

O setor de petróleo e gás continua sendo o motor propulsor da construção naval no Brasil, mas a queda das cotações internacionais do produto não deixou de causar dor de cabeça aos estaleiros. A PDVSA, da Venezuela, que tem dez navios encomendados ao Eisa, na Ilha do Governador, passou a atrasar pagamentos e a obra praticamente parou. O aço para a construção das embarcações foi praticamente todo comprado e está armazenado no próprio estaleiro.

Há um aspecto importante na redução de Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos de fundos de investimentos: tal tributação não deixa de ser inflacionária e não é salutar para a economia enquanto grande parte do pagamento de juros da dívida pública for financiada pela emissão de títulos do Tesouro. A tributação seria uma maneira de atenuar o efeito dessa nova dívida, mas tal arrecadação acaba se transformando em despesa, até porque estados e municípios passam a ter direito a uma fatia dela, o que, de certo modo, equivale a uma emissão de moeda. O mais saudável mesmo é reduzir a tributação em troca de um corte de juros. Haverá simultaneamente redução de gastos, tanto de encargos financeiros quanto de despesas de custeio.

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