sexta-feira, fevereiro 27, 2009

EDITORIAL

Alguém leu a Lei

O Estado de S. Paulo - 27/02/2009
 
Enfim apareceu alguém, nos Poderes da República, que reproduziu para a sociedade brasileira, de forma simples, direta - e, justamente por isso, de maneira absolutamente inédita -, o que diz a Lei sobre as invasões e ocupações realizadas pelos sem-terra e a total complacência vigente, em relação a tal ilegalidade, que culmina com a concessão de dinheiro público a organizações clandestinas e criminosas, como o Movimento dos Sem-Terra (MST). O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, afirmou claramente que é ilegal o repasse de recursos públicos para movimentos sociais que ocupam terras. "O financiamento público de movimentos que cometem ilícito é ilegal, é ilegítimo", disse o ministro, enfatizando a verdade jurídica elementar, mas tão esquecida por autoridades do País: "No Estado de Direito, todos estão submetidos à lei." 

Essas palavras do presidente da mais alta Corte de Justiça do País vieram a propósito do "Carnaval Vermelho", comandado pelo líder dissidente do MST José Rainha Junior, que durante o carnaval produziu 20 invasões, com cerca de 2 mil militantes, no Pontal do Paranapanema - o que comentamos no editorial Onde a Justiça pouco vale, publicado na edição de ontem. Nesse editorial também comentávamos, a propósito, o massacre dos quatro seguranças da Fazenda Consulta, em São Joaquim do Monte (no agreste pernambucano), cometido por quatro militantes do MST - e justificado pelo líder Jaime Amorim com o argumento de que "não mataram pessoas comuns". O brutal cinismo dessa explicação só poderia derivar da sensação de absoluta impunidade que essa organização tem desfrutado há muito tempo.

Gilmar Mendes cobrou uma participação mais efetiva do Ministério Público, tanto em relação às invasões quanto ao repasse de dinheiro público a movimentos fora da lei. E, para deixar ainda mais clara a interpretação da lei fixada pelo Supremo, lembrou que em 2001 o STF analisou a legalidade do Estatuto da Terra, que proíbe o repasse em caso de invasões. Na época, os ministros rejeitaram liminar para que partes da lei fossem derrogadas, pelo que Mendes reiterou que "o tribunal rechaçou a inconstitucionalidade". 

Depois de condenar o massacre dos quatro em Pernambuco e referir-se ao tipo de violência "que começa com características de protesto", disse o presidente do Supremo: "Eu tenho a impressão de que a sociedade tolerou excessivamente esse tipo de ação, por razões diversas, talvez um certo paternalismo, uma certa compreensão, mas isso não é compatível com a Constituição, não é compatível com o Estado de Direito." De nossa parte - e não é de hoje que nesta página tratamos do MST e assemelhados - não cremos que a sociedade brasileira tenha um espírito de tolerância paternalista em relação a esses movimentos que, sistematicamente, praticam crimes contra as pessoas e desrespeitam (ou destroem) bens privados ou públicos. O que a sociedade tem sentido é impotência no combate a tais práticas, uma vez que o Poder Público não faz cumprir a lei ou não pune os que a desrespeitam. E quando proprietários de fazendas - às vezes as mais produtivas - tentam reagir a invasões, contratando seguranças para protegê-las, pois sozinho ou só com a própria família não terá como enfrentar centenas de pessoas, logo chegam as forças policiais para impedir que "perturbem a ordem"...

Aos invadidos restam as tentativas - às vezes tão insistentes quanto inócuas - de defender suas propriedades com pedidos judiciais de reintegração de posse, que ganham, mas não levam, visto que os invasores retornam, impunemente. Até podem haver iniciativas como a da União Democrática Ruralista (UDR), que pediu judicialmente a prisão do líder sem-terra José Rainha Júnior, por seu Carnaval Vermelho - até por ser este cidadão um recordista em processos judiciais, inclusive envolvendo crime de morte, dos quais sempre consegue escapar, mesmo depois de condenado, como está, a 10 anos de prisão. Há também fazendeiros que cogitam em processar o Estado e pedir indenizações pelo prejuízo sofrido em razão da leniência do Poder Público em relação ao MST e assemelhados. Para todos os que se sentem abandonados pela Justiça a declaração do presidente da Suprema Corte é uma mensagem de alento e de esperança.

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