quarta-feira, fevereiro 04, 2009

DORA KRAMER

O melhor remédio


O Estado de S. Paulo - 04/02/2009
 
A melhor parte da proposta de Michel Temer, de estender a cobertura da TV Câmara às atividades legislativas nos Estados, é que o novo presidente da Casa não fala sério. Isso é dito em prol do deputado, em cuja trajetória não se inclui a falta de juízo.

Graças às boas relações do circunspecto Temer com o bom senso é possível afirmar com ínfima margem de erro que a sugestão tem por objetivo único fazer uma média com os colegas, agradecer os votos recebidos e deixar esse tipo de tolice morrer de fritura na gordura dela mesma.

O problema do Congresso, os dois presidentes pemedebistas estão cansados de saber, não é falta de divulgação de suas atividades. Esta está plenamente garantida no noticiário dos veículos privados de comunicação e por meio dos instrumentos oficiais: informativos, sites, emissoras de televisão e rádio.

O problema do Congresso, os dois presidentes pemedebistas estão cansados de saber - embora possam não concordar em admitir -, é ausência de compostura.

Temer usa como premissa uma verdade, desenvolve um raciocínio equivocado e chega obviamente a uma conclusão falsa.

Parte do princípio de que as atividades legislativas não se resumem ao plenário. É certo.

Argumenta que a imprensa só presta atenção aos momentos de votação, criticando o Parlamento com base na presença dos deputados nessas sessões e levando a população à errônea impressão de que a atividade parlamentar é um "dolce far niente" sustentado a benesses financiadas com dinheiro público.

Está parcialmente certo. Há muito tempo as críticas a respeito da conduta do Parlamento deixaram de lado o critério da presença no plenário para se dedicar aos inúmeros e crescentes exemplos de indiferença do Poder Legislativo com as demandas da sociedade.

Quando elas não se confrontam com os interesses da corporação, a "Casa faz o que o povo quer"; quando estes afrontam demais aquelas, dá-se um jeito, providenciam-se recuos, tomam-se meias medidas à guisa de satisfação. Mas, quando é possível administrar as reclamações e juntar esforços para enfrentá-las, a primeira vítima é sempre a voz da rua.

Aí é que reside o motivo da desmoralização do Parlamento como instituição representativa da população. Esta fica com a obrigação de votar e aquele não se sente minimamente obrigado a se conduzir nos conformes mais confortáveis ao eleitorado.

Há a semana de três dias que, assim como privilégios inaceitáveis, indispõe o Legislativo com a opinião pública.

Se nesses três dias e com todos os benefícios já devidamente incorporados aos costumes suas excelências andassem na linha, a imprensa ainda assim reclamaria por dever de ofício, mas haveria argumentos para contrabalançar a situação.

Nenhum deles, porém, suficiente para tornar a proposta de Michel Temer algo aceitável. Deputados federais são eleitos para prestar serviço no Parlamento. Por isso recebem auxílio para pagar telefonemas, despesas de correio e moradia na capital.

O trabalho "nas bases" diz respeito às respectivas carreiras, é com ele que sobrevivem politicamente e garantem a renovação dos mandatos. A propaganda disso equivale a financiamento público (ilegal) de campanha.

Inclusive porque os trabalhos transmitidos pela TV Câmara em Brasília não são editados e as transmissões das andanças estaduais se fariam mediante escolha unilateral - e induzida - de melhores momentos. 

Nó da madeira

A eleição de José Sarney devolve a Renan Calheiros instrumentos de poder. Este é, para ele, o lado bom da história.

O outro é que essa eleição o põe de novo na ribalta junto com seus contenciosos com a Justiça e o decoro parlamentar. Em geral, a luz dos holofotes e o som dos microfones não fazem bem a quem tem contas em aberto para com a sociedade.

Foi o conselho dado pelos companheiros de partido, em 2001, ao então senador Jader Barbalho quando ele insistiu em presidir o Senado. Seis meses depois renunciou, levado pela folha corrida.


Anacronismo

Em seu discurso final antes da eleição, o senador José Sarney lamentou que o considerem "velho" para presidir o Senado, quando não era esse o foco da questão. 

Não são os 78 anos de idade que tornam Sarney antiquado, mas a opção por um modo de fazer política sinuoso, personalista e patrimonialista.

A confusão proposital de conceitos faz parte do método. Amplamente aceito em todas as faixas etárias, correntes ideológicas e posições da República. 


Serrador

Muito mais que derrotar Sarney no Senado, o PSDB queria eleger Michel Temer na Câmara. O resultado final, contudo, saiu melhor que a encomenda, pois o partido assistiu à derrota do PT e ainda fez ar de moço bom.

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