quinta-feira, janeiro 15, 2009

ROLF KUNTZ

Otimistas versus informados


O Estado de S. Paulo - 15/01/2009
 

A boa notícia é que os brasileiros estão entre os mais otimistas em relação ao País e às possibilidades de aumento da renda familiar nos próximos 12 meses. No Brasil, 79% dos entrevistados disseram acreditar nesse aumento, enquanto nos Estados Unidos apenas 34% manifestaram essa expectativa e somente 11% no Japão, segundo pesquisa realizada em 17 países. A má notícia aparece quando se combina essa informação com os últimos dados sobre o emprego e sobre o desempenho de importantes setores industriais: se o quadro piora tão rapidamente enquanto os brasileiros estão confiantes, como ficará a situação quando mais pessoas se apavorarem com a crise?

O otimismo da maioria dos brasileiros dá ao governo um bom ponto de partida para definir e aplicar medidas contra a recessão. Boa parte da confiança captada na pesquisa deve estar vinculada à popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas essa confiança tende a se esgotar com a multiplicação das demissões, a contenção do consumo e o rebaixamento do padrão de vida de milhares ou até milhões de famílias.

Outro detalhe relevante é a associação entre classe econômica e otimismo/pessimismo. No grupo D/E, o mais pobre, 47% expressaram a esperança de melhora da situação do País nos próximos três meses. A porcentagem cai para 31% na classe C e para 25% no grupo A/B. Essas camadas não se diferenciam apenas pela renda e pelas posses, mas também pela educação e pela informação.

O otimismo registrado pela pesquisa varia inversamente ao grau de informação do entrevistado. Os mais informados não estão necessariamente em situação pior que a dos outros. Mas sabem mais a respeito do mundo, não só porque absorvem e processam mais notícias, mas também porque são mais atentos ao noticiário econômico mais complexo. Muitos, ao contrário do presidente da República e de boa parte de seus mais entusiasmados admiradores, leem jornais e revistas e assistem aos melhores programas informativos da TV.

Tudo isso explica seu menor otimismo, embora disponham, quase certamente, de melhores condições para enfrentar períodos de vacas magras.

Quanto mais informado o cidadão, menor a sua propensão a engolir a retórica presidencial sobre medidas anticrise, especialmente sobre a sustentação de investimentos. Boa parte dos investimentos financiados pelo Tesouro está emperrada, como já foi noticiado muitas vezes, e isso inclui numerosos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Se o presidente coordenasse e administrasse tanto quanto fala, o ritmo de execução dos projetos constantes do 
Orçamento da União seria com certeza muito mais satisfatório. Nenhuma outra pessoa pode exercer essa função no governo federal, porque há uma evidente escassez de liderança e de competência gerencial no primeiro escalão do Executivo. As poucas demonstrações de bom senso ficam a cargo do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, mas sua influência é restrita.

No gabinete palaciano, há quem tenha poder para neutralizar boas iniciativas e para dar péssimas ideias ao presidente, mas não há sinal de liderança administrativa. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pode ser apontada pelo presidente Lula como gerente e até mãe do PAC, mas sua atuação não tem a mínima correspondência com esses títulos. Basta ver alguns números: em 2008, dotação orçamentária de R$ 18,84 bilhões e desembolsos de apenas R$ 11,32 bilhões, incluídos neste valor R$ 7,56 bilhões de restos a pagar de 2007.

Investimentos federais seriam importantes para manter a economia em movimento. Mas não basta o presidente fazer um discurso por dia, em tom furioso, para ocorrer a execução das obras. Parte dos brasileiros pode até se impressionar, mas essa retórica não garante empregos no setor privado. Quanto aos estímulos fiscais, até agora tiveram pouco efeito. Em dezembro, a redução de impostos pode ter facilitado a venda de automóveis, mas o efeito dessa medida é limitado. O governo ainda não acertou a mão na política de incentivos e não deu atenção suficiente ao perigo cada vez maior de problemas no balanço de pagamentos. As melhores iniciativas partiram do Banco Central: oferta de dólares para o financiamento da exportação e para a liquidação de dívidas não renovadas. Pelo menos uma área da administração federal mostra alguma noção de foco e alguma percepção do que pode fazer diferença. Mas só os menos otimistas são bastante informados para perceber detalhes como esse.

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